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É inconstitucional norma local que imponha limitações às sociedades uniprofissionais de arquitetura no regime SUP

O Judiciário acolheu nossa argumentação no sentido de que é inconstitucional toda e qualquer norma municipal que estabeleça impeditivos à submissão das sociedades profissionais de arquitetura ao regime de tributação municipal do ISSQN em bases fixas, pois não há norma nacional que imponha tais limitações.

9/3/2020
Caio Cesar Braga Ruotolo

Tema recorrente nas municipalidades é a eterna discussão entre fisco municipal e contribuintes que estão no regime fixo de recolhimento do ISSQN das sociedades SUP.

A questão central é que muitas sociedades uniprofissionais são diariamente desenquadradas do referido regime e autuadas retroativamente, sob as mais diversas fundamentações que as normas locais (municipais) trazem, com a única e exclusiva finalidade arrecadatória, eis que tais contribuintes recolhem o ISSQN em valores fixos e não com base em percentuais sobre as notas fiscais emitidas.

Em São Paulo, várias sociedades de arquitetura, por exemplo, foram desenquadradas do regime de recolhimento das sociedades profissionais, sob a alegação de não terem cumprido as exigências da lei municipal 13701/13, tais como, desenvolver mais de uma atividade de prestação de serviços – exigência essa constante somente da lei municipal 13701/13, artigo 15, § 2º alínea V.

Ocorre que essa regra, somente existente na lei municipal mencionada, é inconstitucional, pois tal não pode dispor sobre o tema, mas tão somente o decreto lei 406/68 e a lei complementar 116/03, normas nacionais.

Nesse aspecto obtivemos recente decisão em prol de uma sociedade de arquitetos, no processo distribuído o juiz, em sede de tutela de urgência, numa ação anulatória de débito fiscal, com pedido de tutela provisória de urgência, em caráter antecedente para suspender a exigibilidade do crédito tributário, determinou a suspensão da exigibilidade do tributo cobrado sem a necessidade de depósito judicial, pois, no entender do judiciário, carece de razoabilidade a decisão administrativa municipal que concluiu pelo desenquadramento da sociedade do regime SUP, de modo que além de suspender a exigibilidade, o juiz determinou a sustação dos protestos relacionados com o suposto débito retroativo.

A questão central da discussão é que lei municipal jamais poderá fixar regras para sociedade uniprofissional, pois o decreto lei 406/68 (que tem status de lei complementar) regula na integralidade a exigência de pagamento fixo do ISSQN para as sociedades uniprofissionais, além do mais tem-se a súmula 663 do STF – na qual o supremo entendeu que a tributação fixa foi recebida pela Constituição Federal, pois o valor fixo não é benefício fiscal não ofende o princípio da isonomia e da capacidade contributiva.

Por isso, aplicável à qualquer sociedade uniprofissional (inclusive de arquitetos, objeto do nosso processo) a recentíssima decisão do Supremo Tribunal Federal prolatada em sede de recurso extraordinário RE 940.769 com repercussão geral reconhecida no sentido de que o município não pode fixar regras para sociedade uniprofissional.

No indigitado acórdão do STF cujo processo tratou-se de mandado de segurança preventivo impetrado pela Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Rio Grande do Sul em face do Município de Porto Alegre, para o fim da municipalidade se abster de aplicar medidas coercitivas contra as sociedades profissionais de advocacia. Nesse processo asseverou-se que a norma local é ilegal na parte recorrida, porque afronta as normas gerais previstas no decreto lei 406/68 e porque fere a distribuição de competência em matéria tributária dos entes federativos prevista de forma rígida na Constituição Federal artigo 145.

O julgado é lapidar e se amolda também às sociedades de arquitetura que foram autuadas e desenquadradas do regime simplificado, pois o que se discute é que a lei municipal, ao fixar regras para manter uma sociedade no regime denominado recolhimento fixo – SUP – foi além de sua competência.

Decidiu o Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral o seguinte tema:

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 918 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário, com a declaração incidental de inconstitucionalidade dos arts. 20, § 4º, II, da Lei Complementar 7/73, e 49, IV, §§ 3º e 4º, do Decreto 15.416/2006, ambos editados pelo Município de Porto Alegre, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Marco Aurélio. Em seguida, por maioria, fixou-se a seguinte tese: "É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional", vencido o Ministro Marco Aurélio. Falaram: pela recorrente, o Dr. Rafael Nichele; pelo recorrido, o Dr. Roberto Silva da Rocha, Procurador do Município de Porto Alegre; pelo amicus curiae Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras - ABRASF, o Dr. Ricardo Almeida Ribeiro da Silva; pelo amicus curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil - CFOAB, o Dr. Mattheus Reis e Montenegro; pelo amicus curiae Centro de Estudos das Sociedades de Advogados - CESA, o Dr. Gustavo Brigagão; e, pela Procuradoria-Geral da República, o Dr. Humberto Jacques de Medeiros, Subprocurador-Geral da República. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes e Roberto Barroso. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 24.04.2019. (DESTAQUES NOSSOS)

No município de São Paulo a lei 13.701/03, em dispositivos que pretende impor regras para as sociedades uniprofissionais afronta numa só vez a Constituição Federal e o decreto lei 406/68 (recebido como status de lei complementar e fixa as regras em caráter nacional da base de cálculo do ISSQN e foi recepcionado pela CF) e as regras de competência da CF artigo 145.

Desse modo, o Judiciário acolheu nossa argumentação no sentido de que é inconstitucional toda e qualquer norma municipal que estabeleça impeditivos à submissão das sociedades profissionais de arquitetura ao regime de tributação municipal do ISSQN em bases fixas, pois não há norma nacional que imponha tais limitações.

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*Caio Cesar Braga Ruotolo é advogado tributarista em São Paulo. Membro efetivo do Conselho de Assuntos Tributários da Fecomercio. Foi membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/SP 17/18 e da Comissão de Assuntos Fiscais da CNI (2014-2020). Pós Graduado com Especialização em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Direito Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional. Experiência consultiva e contenciosa nas áreas de direito tributário, empresarial, aeronáutico e crimes contra ordem tributária.

Caio Cesar Braga Ruotolo

Advogado tributarista em São Paulo. Associado do escritório Luiz Silveira Sociedade de Advogados. Membro do Conselho de Assuntos Tributários da Fecomércio em São Paulo. Foi Coordenador Jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Foi membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/SP (2017/2018) e da Comissão de Assuntos Fiscais da CNI (2014-2020). Pós Graduado com Especialização em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Direito Constitucional pela Escola Superior de Direito Constitucional e em Gestão de Recursos Humanos. Experiência consultiva e contenciosa nas áreas de direito tributário, empresarial, ambiental, aeronáutico e crimes contra ordem tributária.

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