Introdução
Estados podem instituir adicional de até dois pontos percentuais na alíquota do ICMS para financiar FECP - Fundos de Combate à Pobreza, nos termos do art. 82, § 1º, do ADCT. Em consultas recentes, a Receita Federal sustenta que essa fração deveria integrar as bases do PIS e da Cofins, por suposta natureza distinta do ICMS "ordinário". O argumento não se sustenta, diante da jurisprudência vinculante do STF sobre o conceito de receita.
Natureza jurídica: O adicional é ICMS
O adicional do Fecp não cria novo tributo. Trata-se de "majoração" de alíquota do próprio ICMS, com a mesma hipótese de incidência, a mesma base de cálculo e o mesmo sujeito passivo. A vinculação da receita ao fundo estadual, a eventual cumulatividade verificada em cadeias específicas e a ausência de repartição com municípios não representam elementos capazes de atribuir natureza autônoma ao adicional do ICMS. São traços de destinação de receita e desenho federativo, não elementos capazes de transmutar imposto estadual em algo diverso.
Assim, se o adicional representa o ICMS, aplica-se a razão de decidir do Tema 69 do STF (RE 574.706). O imposto estadual não integra a receita do contribuinte para fins de PIS e Cofins, pois constitui ingresso juridicamente vinculado ao Estado. O adicional do Fecp acompanha essa natureza.
A posição da RFB e seus limites
A Receita Federal tem afirmado que o adicional possuiria caráter cumulativo, destinação vinculada e não se sujeitaria à regra de repartição, o que afastaria a incidência automática do Tema 69. Os três critérios são extrínsecos à natureza do imposto. Cumulatividade é técnica de cobrança. Destinação é regra de alocação de receita. Repartição é opção constitucional de partilha. Nada disso altera o núcleo jurídico do ICMS.
Além disso, o art. 19, VI, da lei 10.522 impõe à Administração Tributária a observância das teses fixadas pelo STF sob repercussão geral. Diante da identidade estrutural entre o adicional e o próprio ICMS, negar a aplicação da ratio do Tema 69 apenas para essa fração viola o dever de coerência e a vinculação administrativa ao precedente.
Jurisprudência com inclinação favorável aos contribuintes
O contencioso sobre o adicional do Fecp não possui a mesma capilaridade da tese-mãe do ICMS, mas há reiterados acórdãos em Tribunais Regionais Federais que acolhem a exclusão do adicional das bases do PIS e da Cofins, por extensão lógica do Tema 69. Existem manifestações monocráticas pontuais em sentido contrário, em geral no exame de tutelas de urgência, que destacam peculiaridades fáticas ou enfatizam a destinação vinculada. Nos colegiados, a tendência é reconhecer que a natureza de ICMS prevalece, o que impede a inclusão do seu adicional na base do PIS e da Cofins.
Conclusão
Se o adicional do Fecp é ICMS, essa parcela não deve integrar as bases do PIS e da Cofins. Nesse contexto, pode ser oportuno judicializar a questão, tanto para viabilizar a repetição de valores indevidamente recolhidos, quanto para obter proteção judicial quanto aos períodos futuros.