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STF inicia julgamento que pode limitar execução trabalhista ao valor da causa

Ação da OAB questiona regra da reforma trabalhista que exige valores certos na inicial, tema que pode afetar o acesso à Justiça do trabalhador.

23/10/2025
Cintia Roberta da Cunha Fernandes

O STF julgará, nos próximos dias, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.002, proposta em 2018 pelo Conselho Federal da OAB - Ordem dos Advogados do Brasil. A ação impugna a constitucionalidade de dispositivos da reforma trabalhista que impõem ao trabalhador a obrigação de indicar, já na petição inicial, valores certos e determinados para cada pedido - exigência introduzida pelos §§ 1º e 3º do art. 840 da CLT. O julgamento, em plenário virtual, está previsto para terminar no dia 3 de novembro.

A Corte decidirá se os valores indicados na petição inicial devem ser compreendidos como limites fixos da condenação, que não poderiam ser superados na sentença, ou como estimativas iniciais, passíveis de revisão posterior na fase de liquidação, quando os cálculos são definidos com base nas provas produzidas no processo.

A OAB sustenta que a regra introduzida pela reforma trabalhista restringe o acesso à Justiça, ao exigir do trabalhador a fixação de valores antes mesmo de ter acesso a documentos e informações que, em regra, estão sob a posse do empregador, condição indispensável para a correta apuração dos créditos devidos.

Nesse sentido, o TST já consolidou o entendimento de que os valores atribuídos na inicial têm caráter meramente estimativo, admitindo condenações superiores quando comprovadas na fase de liquidação. Ainda assim, alguns tribunais vêm limitando a condenação e a execução ao valor atribuído à causa, impondo uma espécie de liquidação prévia incompatível com a natureza célere e informal do processo trabalhista.

O valor estimado cumpre função apenas delimitadora e não pode ser interpretado como renúncia ou limitação de crédito. Em matéria trabalhista, de natureza alimentar e essencial à justiça social, vincular a execução ao valor da causa contraria a lógica protetiva do processo do trabalho e afronta os valores constitucionais da dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho e da justiça social, previstos nos arts. 1º, incisos III e IV, 6º e 7º da CF/88.

O julgamento do STF será decisivo para definir se a exigência de liquidação imposta pela reforma trabalhista deve ser interpretada em consonância com os princípios constitucionais do acesso à Justiça e da proteção ao trabalhador, ou se poderá, ao contrário, restringir materialmente a reparação integral de créditos de natureza alimentar.

Cintia Roberta da Cunha Fernandes

Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho. Mestranda em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas. Sócia do escritório Mauro Menezes & Advogados.

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