Com efeito, a análise técnica de diversos casos relacionados ao concurso público da Polícia Federal 2025 revelou uma peculiaridade que suscita reflexões jurídicas e filosóficas de grande relevância: a existência de padrões de resposta com colorações distintas - preto e vermelho -, o que levanta a hipótese de revisão pós-prova. Ainda que não haja confirmação oficial sobre o significado das cores, a mera possibilidade de que o padrão tenha sido alterado após a aplicação exige um debate sério sobre o dever de motivação dos atos administrativos, a publicidade dos critérios avaliativos e a garantia da previsibilidade que rege o concurso público.
A correção da prova discursiva é um ato administrativo complexo e vinculado, submetido aos princípios da legalidade, motivação e isonomia. O padrão de resposta representa a “lei interna” da correção, devendo orientar o avaliador de forma objetiva e previsível. Entretanto, a presença de trechos coloridos em preto e vermelho sugere, ainda que hipoteticamente, uma intervenção posterior ao momento da aplicação da prova. Caso confirmada, tal modificação configuraria inovação pós-prova - não apenas um ajuste técnico, mas uma alteração substancial do critério avaliativo. A questão, portanto, não se restringe à forma, mas à própria validade do ato administrativo que orientou a correção.
Em verdade, o art. 50 da lei 9.784/1999 impõe à Administração o dever de motivar todos os atos que impactem a esfera jurídica do administrado. Alterar o padrão de resposta após a prova, sem registro público e sem motivação expressa, afronta não só a boa-fé administrativa, mas o princípio republicano da transparência. O silêncio da motivação, nesse contexto, é a forma mais sutil de arbitrariedade: ele impede o controle social, inviabiliza o contraditório e compromete o próprio sentido da legalidade. Como reconhece a doutrina contemporânea, “o ato sem motivo é ato sem alma”, e a ausência de explicitação formal anula o caráter racional da decisão pública.
Noutra senda, o problema adquire contornos filosóficos e jurídicos mais profundos. Se o padrão de resposta é o comando normativo que orienta a avaliação, e se existem duas versões - uma inicial e outra presumivelmente revisada -, abre-se uma dúvida ontológica: qual delas expressa o ato administrativo válido? Sem estabilidade, não há legitimidade. No pensamento de Thomas Hobbes, a lei é o comando fixo que antecede o juízo; por analogia, a avaliação deve ser a aplicação fiel desse comando. Modificar o padrão após a prova é romper o nexo entre norma e aplicação, substituindo a razão pública pela vontade particular.
Deveras, a hipótese torna-se ainda mais grave quando o candidato, ao interpor recurso, não tem acesso aos fundamentos específicos de sua correção. A ausência de motivação inviabiliza o contraditório e desnatura o processo administrativo, que deve ser dialógico por essência. Os tribunais têm afirmado reiteradamente que a motivação é condição de validade, e não mera formalidade: ela transforma o ato de poder em ato de razão, e o administrador em servidor da legalidade. A falta de publicidade, portanto, converte o processo avaliativo em espaço opaco, incompatível com o ideal republicano de igualdade e imparcialidade.
Com efeito-, cabe ao Poder Judiciário exercer o controle de legalidade sobre situações em que a Administração se afasta do dever de motivação. Não se trata de reavaliar notas ou substituir o juízo técnico da banca, mas de assegurar que o Estado seja previsível e racional em seus atos. Quando a Administração altera o padrão de resposta sem motivação documentada, o Judiciário é chamado não a corrigir a avaliação, mas a corrigir a ausência de lei na avaliação. É, pois, o exercício do controle jurídico sobre o vazio da justificativa - o restabelecimento da forma sobre o arbítrio.
Em suma, a hipótese de revisão pós-prova no concurso da Polícia Federal 2025 suscita um alerta jurídico e institucional. Ainda que a coloração distinta dos padrões não constitua prova definitiva de alteração, ela evidencia a necessidade de maior transparência e publicidade nos atos de correção. O candidato confia na previsibilidade do Estado; a Administração, em contrapartida, deve justificar cada ato que possa influenciar o resultado do certame. Entre o preto e o vermelho, o que se exige é a clareza da motivação administrativa, porque a motivação é o oxigênio da legalidade.
Assim, reafirma-se que o concurso público é o último espaço de igualdade real entre cidadão e Estado. Quando a Administração inova sem transparência, o Direito deve falar - não para punir, mas para restaurar a confiança que sustenta a Justiça e a República.