Neste artigo, analisamos como funciona a cobertura do Cabozantinibe pelos planos de saúde, quais são os fundamentos legais que garantem o fornecimento do medicamento, o papel do relatório médico, as decisões judiciais recentes sobre o tema, e como agir rapidamente em caso de negativa.
O objetivo é esclarecer o caminho técnico e jurídico que assegura ao paciente oncológico o acesso efetivo a um tratamento aprovado pela Anvisa e prescrito pelo médico assistente - um direito que, muitas vezes, precisa ser garantido pela via judicial para que a vida não espere.
1. O que é o Cabozantinibe (Cabometyx) e quanto custa o tratamento
O Cabozantinibe, nome comercial Cabometyx, é um medicamento inovador utilizado no tratamento de diversos tipos de câncer - especialmente carcinoma de células renais avançado, carcinoma hepatocelular (fígado) e carcinoma medular de tireoide metastático.
Trata-se de um inibidor de tirosina quinase (TKI) que bloqueia a multiplicação desordenada das células tumorais e impede a formação de novos vasos sanguíneos que nutrem o tumor (angiogênese).
De uso oral e contínuo, o Cabometyx oferece uma alternativa menos invasiva e com resultados clínicos consistentes em controle tumoral e sobrevida.
O medicamento foi aprovado pela Anvisa, com base em estudos clínicos internacionais robustos, como o CheckMate 9ER, que demonstrou superioridade do cabozantinibe associado ao nivolumabe em relação à terapia padrão.
Segundo a bula aprovada pela Anvisa, o Cabozantinibe está indicado para:
- CCR - Carcinoma de células renais, isoladamente ou em combinação com nivolumabe;
 - CHC - Carcinoma hepatocelular após tratamento prévio com sorafenibe;
 - Carcinoma medular de tireoide metastático ou inoperável.
 
Essas indicações reforçam seu papel como terapia-alvo de última geração, desenvolvida para pacientes que apresentam resistência a outros tratamentos oncológicos.
Por seu mecanismo de ação seletivo, o medicamento representa um avanço farmacêutico expressivo, com menores efeitos adversos e melhor qualidade de vida em comparação à quimioterapia convencional.
O preço médio da caixa com 30 comprimidos de 40 mg pode variar de R$ 35 mil a R$ 45 mil, conforme a dosagem e o local de compra. Em regimes contínuos, o custo anual do tratamento pode superar R$ 400 mil, valor inviável para a maioria dos pacientes sem o custeio do plano.
Por isso, a negativa de cobertura viola o princípio da acessibilidade terapêutica e pode comprometer a continuidade do tratamento oncológico, justificando intervenção judicial imediata, e é isso que será tratado neste artigo.
2. O que diz a lei sobre a cobertura do Cabozantinibe pelo plano de saúde
Do ponto de vista jurídico, o Cabozantinibe deve ser coberto pelos planos de saúde sempre que houver prescrição médica fundamentada e registro sanitário válido na Anvisa - ainda que o medicamento não conste do rol da ANS.
Quando o medicamento é antineoplásico - ou seja, destinado ao tratamento do câncer -, possui registro sanitário vigente na Anvisa e foi prescrito por médico habilitado, o plano de saúde é obrigado a custeá-lo integralmente, independentemente do preço ou da via de administração (oral, subcutânea, intravenosa ou hospitalar).
Essa obrigatoriedade decorre de um conjunto normativo robusto.
O art. 12, inciso II, da lei 9.656/1998 determina que os planos de saúde devem garantir a cobertura dos procedimentos e tratamentos antineoplásicos previstos na segmentação contratada.
Com a edição da lei 12.880/13, essa regra foi ampliada para incluir medicamentos orais e de uso domiciliar utilizados no tratamento do câncer, eliminando a antiga distinção entre medicamentos administrados em ambiente hospitalar e aqueles utilizados em casa.
A ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, por sua vez, consolidou essa interpretação, reconhecendo que o fornecimento de medicamentos antineoplásicos é cobertura obrigatória sempre que houver prescrição médica, registro sanitário e indicação terapêutica compatível.
Assim, ainda que o medicamento não conste expressamente do rol de procedimentos da ANS, o dever de custeio subsiste, pois o rol tem caráter referencial mínimo, não exaustivo.
Negar o fornecimento de medicamento antineoplásico com base em seu alto custo, uso domiciliar ou ausência no rol da ANS contraria não apenas o arcabouço legal e regulatório, mas também princípios constitucionais - como o direito à vida, a dignidade da pessoa humana e a boa-fé contratual.
A saúde suplementar tem função complementar e solidária em relação ao Sistema Único de Saúde (art. 199, § 1º, da Constituição), e não pode subverter essa função impondo barreiras econômicas a tratamentos reconhecidamente eficazes e indispensáveis.
Em suma, uma vez preenchidos os requisitos o plano de saúde tem o dever legal e contratual de custear o tratamento integral, quais sejam:
- Registro vigente na Anvisa;
 - Comprovação científica de eficácia;
 - Indicação médica fundamentada;
 - Inexistência de alternativa terapêutica equivalente no rol;
 - E ausência de vedação expressa pela Conitec ou pela própria ANS.
 
Mesmo com prescrição médica clara, é comum que operadoras neguem cobertura sob alegações genéricas como “uso domiciliar”, “tratamento experimental” ou “fora do rol da ANS”.
Nesses casos, recomenda-se:
- Solicitar a negativa formal por escrito;
 - Reunir toda a documentação médica, incluindo relatório do oncologista, laudos, exames e comprovação do registro na Anvisa;
 - Protocolar recurso interno junto à operadora, anexando o relatório médico detalhado;
 - Buscar auxílio jurídico especializado, caso a negativa persista, para propor ação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgência.
 
A Justiça tem reconhecido que o tratamento oncológico é de caráter vital e alimentar, e decisões liminares costumam ser concedidas em 24 a 72 horas, determinando o fornecimento imediato do medicamento.
3. O que deve constar no relatório médico para garantir o Cabometyx
O relatório médico é o principal documento de suporte técnico ao pedido.
Deve conter:
- Diagnóstico completo com CID;
 - Histórico clínico e terapias anteriores;
 - Justificativa da necessidade do Cabozantinibe;
 - Referência científica (protocolo NCCN, SBOC, ESMO ou estudos publicados);
 - Menção ao registro sanitário na Anvisa;
 - E declaração da inexistência de alternativa terapêutica equivalente no rol da ANS.
 
Quanto mais detalhado e fundamentado o relatório, maior a chance de cobertura imediata - seja administrativamente, seja judicialmente.
4. Decisões judiciais sobre o Cabozantinibe e o dever de cobertura dos planos
A jurisprudência brasileira vem consolidando a proteção do paciente oncológico frente às negativas de cobertura de medicamentos inovadores pelos planos de saúde.
Decisões recentes têm reafirmado que a recusa de fornecimento de medicamentos com registro na Anvisa é abusiva, ainda que o fármaco não conste do rol da ANS ou seja de uso off-label.
Um exemplo é a apelação cível 1029089-08.2024.8.26.0100, relatada pelo desembargador Domingos de Siqueira Frascino, julgada em setembro de 2024 pelo TJ/SP.
O processo envolveu uma paciente diagnosticada com câncer renal avançado, cujo médico prescreveu o medicamento Cabozantinibe (Cabometyx) como parte essencial do tratamento. O plano de saúde recusou o custeio, alegando que o medicamento não estava incluído no rol de procedimentos da ANS e que a cláusula contratual excluía expressamente essa cobertura.
Diante da negativa, a paciente ingressou com ação de obrigação de fazer, obtendo sentença favorável em primeiro grau, que determinou o fornecimento do medicamento
O TJ/SP manteve integralmente a sentença de procedência, reafirmando três pontos fundamentais que hoje orientam a jurisprudência nacional sobre medicamentos oncológicos de alto custo:
(i) Rol da ANS não é taxativo.
O Tribunal aplicou o entendimento consolidado pelo STJ e pela lei 14.454/22, reconhecendo que o rol é exemplificativo e serve apenas como referência básica mínima.
Assim, a ausência do Cabozantinibe na lista da ANS não autoriza a negativa de cobertura, pois o medicamento possui registro sanitário válido na Anvisa e indicação médica devidamente fundamentada.
(ii) Prevalência da prescrição médica.
A Corte destacou que cabe exclusivamente ao médico assistente definir o tratamento mais adequado ao paciente, conforme o Código de Ética Médica (resolução CFM 2.217/18).
O plano de saúde não pode substituir o juízo clínico do profissional por critérios administrativos, sob pena de violar o princípio da boa-fé contratual e o direito fundamental à saúde (art. 196 da CF/88).
(iii) Proteção do consumidor e interpretação favorável ao paciente.
Com base no art. 47 do CDC, o Tribunal reforçou que cláusulas contratuais restritivas de direitos devem ser interpretadas da maneira mais favorável ao beneficiário.
Além disso, o acórdão citou o art. 35-F da lei 9.656/1998, que assegura o dever dos planos de garantir atendimento e tratamento de todas as doenças listadas pela OMS, incluindo o câncer.
O precedente também demonstra que o Cabozantinibe (Cabometyx), além de clinicamente necessário, está juridicamente amparado por um sistema normativo que protege o paciente oncológico contra práticas restritivas e incompatíveis com os princípios constitucionais da dignidade humana, solidariedade e boa-fé.
5. Conclusão: Cabozantinibe (Cabometyx): Inovação que salva vidas e deve ser acessível
O Cabozantinibe (Cabometyx) simboliza um dos avanços mais significativos da oncologia moderna.
Negar sua cobertura é negar tempo, esperança e dignidade a pacientes que dependem dessa terapia para prolongar e melhorar a vida.
A legislação, a regulação sanitária e a jurisprudência convergem para um mesmo ponto: A prescrição médica é soberana, e o plano de saúde deve custear o tratamento antineoplásico indicado, quando houver registro na Anvisa e respaldo científico.