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Compete à Justiça do Trabalho julgar aliciamento de jovens para o futebol, decide TST

Relatora destacou que a competência trabalhista abrange situações em que jogadores de futebol, mesmo sem contrato formal, estejam em fase de testes ou treinamentos, configurando uma relação de trabalho potencial.

11/1/2025

A 2ª turma do TST decidiu que cabe à Justiça do Trabalho julgar um caso envolvendo exploração sexual de crianças e adolescentes aliciados sob a promessa de uma carreira no futebol. A ação teve início após denúncia ao MPT em Aracaju/SE, indicando que um homem atraía jovens de diferentes Estados com falsas oportunidades no futebol profissional. O colegiado concluiu que a promessa de ascensão na carreira esportiva, usada como meio para a prática das irregularidades, fundamenta a competência da Justiça do Trabalho.

Segundo os autos, os jovens eram alojados em um apartamento em condições insalubres, com higiene e alimentação precárias, e sofriam abusos sexuais, inclusive com o uso de entorpecentes. O homem já havia sido condenado criminalmente por exploração sexual, tráfico de pessoas e estelionato.

Testemunhas no processo criminal, que também eram vítimas, descreveram o apartamento como “sujo, cheio de baratas e lixo”, com até 15 jovens hospedados simultaneamente.

O MPT ajuizou ação trabalhista, argumentando que a exploração sexual de crianças e adolescentes configura relação de trabalho ilícita e degradante, violando direitos individuais e interesses da sociedade. “Constitui-se, portanto, em grave violação da dignidade da pessoa humana e do patrimônio ético moral da sociedade”, afirmou o MPT.

Em 1ª instância, o homem foi condenado a pagar indenização por dano moral coletivo de R$ 50 mil, revertida ao Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente. O TRT da 20ª região, entretanto, reformou a sentença, alegando que não havia relação de trabalho, pois os jovens eram levados a Aracaju com o consentimento dos pais, que arcavam com as despesas. O Tribunal extinguiu o processo, remetendo-o à Justiça comum.

O MPT recorreu ao TST, argumentando que o caso envolvia menores em situação irregular, submetidos a condições degradantes e exploração sexual, o que justificaria a competência da Justiça do Trabalho, mesmo em fase pré-contratual.

JT é competente para julgar aliciamento de jovens no futebol, decide TST.(Imagem: Freepik)

A relatora no TST, ministra Liana Chaib, considerou que a promessa de carreira profissional, utilizada como pretexto para as ilegalidades, justifica a competência da Justiça do Trabalho. A ausência de vínculo formal de emprego não a descaracteriza, pois a expectativa de carreira foi o instrumento da cooptação.

A ministra destacou que a competência trabalhista abrange situações em que jogadores de futebol, mesmo sem contrato formal, estejam em fase de testes ou treinamentos, configurando uma relação de trabalho potencial. “Mesmo que o vínculo não tenha sido formalizado, a Justiça do Trabalho poderá analisar questões relativas a salários, condições de trabalho e direitos trabalhistas”, observou.

A relatora enfatizou ainda que, conforme o Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva da Infância e da Adolescência da Justiça do Trabalho, o direito à profissionalização de adolescentes e jovens não se limita à garantia contratual, iniciando-se antes dela.

Devem ser assegurados os direitos básicos que permitam o acesso ao mercado de trabalho, como políticas públicas de combate ao trabalho infantil e de capacitação de adolescentes. A decisão do TST foi unânime, e o processo retornará ao TRT da 20ª região para prosseguimento do julgamento.

O processo tramita em segredo de Justiça.

O advogado Maurício Corrêa da Veiga, do escritório Corrêa da Veiga Advogados, enalteceu a decisão da Corte do Trabalho.

“A 2° Turma do TST afirmou que o direito de jovens à profissionalização não é apenas uma garantia contratual, pois trata-se de um direito que é anterior à própria formalização do contrato. Trata-se de um precedente importante que afirma a competência constitucional da Justiça do Trabalho e protege o menor e o próprio desporto."

Informações: TST.

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