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STF: Ministros criticam fundos privados e citam "Fundação Dallagnol"

Toffoli e Gilmar destacaram falta de transparência e risco de abuso de autoridade, defendendo destinação de danos morais coletivos a fundos públicos.

2/4/2025

Nesta quarta-feira, 2, durante sessão plenária do STF, ministro Dias Toffoli fez críticas à destinação de valores obtidos em acordos judiciais — especialmente no âmbito do Direito do Trabalho — a entidades privadas. A posição de S. Exa. foi acompanhada pelo decano da Corte, ministro Gilmar Mendes.

Ambos citaram como exemplo negativo de fundo privado a "Fundação Dallagnol", projeto idealizado por integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, especialmente o então procurador Deltan Dallagnol, visando criar fundação privada para gerir recursos oriundos de acordos firmados no âmbito da operação.

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As manifestações ocorreram no contexto do julgamento que discute a destinação dos valores arrecadados em condenações por danos morais coletivos, resultantes de ações civis públicas trabalhistas. O cerne da controvérsia está em definir se esses recursos devem ser, obrigatoriamente, direcionados a fundos públicos.

Risco de abusos

Toffoli, ao votar contra a destinação de valores arrecadados em condenações trabalhistas por danos morais coletivos a fundos privados, afirmou que a prática pode ser resultado de abusos de autoridade, gerando intimidação às empresas que, mesmo podendo vencer a disputa judicial, optam por firmar acordos para evitar represálias.

O ministro relatou que, enquanto presidiu o STF, ao visitar um tribunal, impressionou-se com a estrutura física do local, e foi informado de que a infraestrutura havia sido custeada com recursos oriundos de acordos e termos de ajustamento de conduta firmados no ministério do Trabalho.

Segundo Toffoli, embora em certos casos esses recursos tenham destinação pública, há riscos significativos quando os valores são direcionados a entidades privadas.

Toffoli mencionou, ainda, a "Fundação Dallagnol", para exemplificar os riscos de desvio na destinação de verbas de acordos judiciais.

"Isso daí já existe também em âmbito trabalhista, em que os acordos com as empresas — e a empresa não tem outra solução, às vezes fazer um acordo até que ela poderia até ganhar ao fim, ao cabo, na Justiça — mas ela se vê intimidada em enfrentar abusos de autoridades que existem".

O ministro justificou a existência da lei de abuso de autoridade justamente pela prática recorrente desses excessos. Destacou que não é coincidência o fato de a CNI ter proposto a ação analisada.

"São pessoas jurídicas, seja na área da indústria, seja na área de serviço, seja na área da produção agrícola, ministro Fachin, que às vezes são pressionadas por abuso de autoridade a fazer acordos."

Ao encerrar a intervenção, Toffoli defendeu que a legislação específica sobre a destinação de valores deve ser respeitada, privilegiando fundos públicos regulados por lei e com participação da sociedade civil.

"Eu entendo que a legislação específica só pode ir para esses fundos, que têm regramento próprio, que têm participação da sociedade civil, que têm a sua presidência e a sua composição descrito em leis federais."

Veja a fala:

Criatividade preocupante  

Ministro Gilmar Mendes manifestou preocupação com a destinação de recursos provenientes de acordos judiciais, especialmente em relação à criação de instituições privadas para gerir esses valores.

Apontou a existência de práticas nebulosas no uso dessas verbas, mencionando como exemplo o caso da 13ª vara Federal de Curitiba/PR, durante a operação Lava Jato.

"O que me preocupa, e infelizmente os precedentes não são cerebrinos, é a possibilidade de criação até de instituições privadas para a obtenção desses recursos", afirmou o ministro.

Para o decano da Corte, já houve tentativas concretas de se estabelecer estruturas privadas com o intuito de captar bilhões de reais, oriundos de acordos com empresas. "Nós sabemos da criatividade com que se maneja esse recurso", alertou.

Gilmar citou o relato do ministro Luis Felipe Salomão a respeito do caso da vara de Curitiba, onde se estimou a movimentação de mais de R$ 5 bilhões, incluindo valores não rastreáveis.

Parte desse montante estaria relacionada à tentativa de criação da chamada "Fundação Dallagnol", projeto que visava administrar até R$ 2,5 bilhões.

"Uma outra fundação se organizava no Distrito Federal, sob os auspícios dessa Transparência Internacional, com assessoria específica de Joaquim Falcão e coisas assim, para receber mais de 2 bilhões", revelou.

Diante desse histórico, o ministro classificou como alarmante o fato de ainda haver incertezas quanto à correta aplicação dos recursos oriundos de acordos.

"Eu fico muito preocupado e é interessante que nós tenhamos essas perplexidades numa matéria que, a rigor, não deveria ter dúvida — os recursos desses acordos deveriam ir para finalidades públicas."

O ministro também criticou a recorrência de manobras que promovem o que chamou de "milagres financeiros", citando casos em que verbas foram direcionadas para órgãos como a PF, em decisões que classificou como pouco transparentes.

"A gente escuta esses milagrosos de sempre, o Bretas destinando dinheiro para a Polícia Federal, o Moro está fazendo esses milagres."

Veja a manifestação:

Veja a versão completa

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