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Novo modelo do IR traz inovações e incertezas legais, analisa advogado

Especialista analisou os principais pontos da proposta, suas inovações, obrigações para pessoas físicas e jurídicas e as lacunas que ainda precisam ser endereçadas no processo legislativo.

4/4/2025

O projeto de lei 1.087/25, que propõe a criação do IR-PFM - Imposto de Renda da Pessoa Física Mínimo, tem gerado amplo debate no meio jurídico-tributário. Em entrevista ao Migalhas, Alessandro Fonseca, sócio da prática de Gestão Patrimonial, Família e Sucessões do escritório Mattos Filho, analisou os principais pontos da proposta, suas inovações, obrigações para pessoas físicas e jurídicas e as lacunas que ainda precisam ser endereçadas no processo legislativo.

Veja a entrevista completa:

Estrutura do IR-PFM: tributação mensal e anual

O novo imposto incide sobre contribuintes com rendimentos superiores a R$ 600 mil anuais, com duas modalidades de incidência: mensal e anual. A tributação mensal ocorre via retenção na fonte sobre dividendos que excedam R$ 50 mil mensais, com alíquota fixa de 10%.

Já na modalidade anual, a alíquota é progressiva entre R$ 600 mil e R$ 1,2 milhão por ano, podendo atingir até 10%. Para rendimentos acima desse valor, aplica-se alíquota fixa de 10% sobre a totalidade da renda.

O contribuinte poderá deduzir tributos já incidentes sobre os rendimentos, incluindo tributos sobre salários e a própria retenção mensal sobre dividendos. Além disso, “o projeto de lei permite a aplicação de um fator de redução do tributo devido”, explicou Fonseca, destacando que o objetivo declarado da proposta é não aumentar significativamente a carga tributária das pessoas físicas.

Investidores não residentes

O projeto também estende a incidência do IR-PFM aos investidores não residentes, que estarão sujeitos à retenção na fonte de 10% sobre todos os dividendos recebidos. Assim como os investidores residentes, esses também poderão realizar compensações ou obter créditos se a retenção antecipada for superior ao tributo efetivamente devido.

Dupla obrigação: pessoas físicas e jurídicas

Fonseca destacou que o projeto tem uma “composição mista”, ou seja, impõe obrigações tanto às pessoas físicas quanto às jurídicas. A pessoa jurídica que paga dividendos acima de R$ 50 mil mensais deve realizar a retenção na fonte, mas também precisa fornecer informações que permitam o cálculo da “carga efetiva total”.

Essa carga será utilizada pela pessoa física para aplicar o fator de redução em sua declaração de ajuste anual. “A pessoa jurídica cumpre essa obrigação apurando um balanço patrimonial que precisa ser levantado, levando em consideração os princípios de contabilidade geralmente aceitos”, afirmou o profissional.

Caso a empresa não esteja no regime de lucro real, o projeto prevê um cálculo simplificado com base no faturamento deduzido de determinadas despesas, conforme a atividade exercida. Essa estrutura visa garantir que a pessoa física tenha os dados necessários para calcular corretamente sua obrigação tributária.

Inovação jurídica e questionamentos de competência

Segundo Fonseca, o projeto 1.087/25 é “bastante inovador em termos de concepção jurídica”, ao estabelecer uma tributação mínima sobre a renda. Diferentemente da estrutura tradicional do sistema tributário, que se baseia na tributação sobre fontes específicas de renda (capital, trabalho ou ambos), o novo modelo propõe um conceito de renda mínima sujeita à tributação.

Ele também alerta para possíveis questionamentos jurídicos: “muitas repercussões podem acontecer do ponto de vista jurídico, inclusive no que diz respeito à própria competência de tributar”.

Um exemplo citado é a limitação das deduções apenas a doações recebidas em antecipação de legítima, o que “no limite poderia até ser entendido como um tributo de competência dos Estados e não da própria União”.

Impacto no planejamento patrimonial e sucessório

Alessandro observou que o planejamento patrimonial e sucessório está passando por um momento de transformação, agora influenciado não só pela tributação tradicional, mas também por novas normas, como o IR-PFM. “Durante muito tempo, o planejamento foi pautado fundamentalmente pelas necessidades tributárias”, disse ele.

Com a nova tributação de altas rendas e projetos em andamento de reforma do Código Civil, “as necessidades das famílias precisam ser customizadas e adaptadas, não só em função da diretriz tributária, mas em função do real benefício que a organização patrimonial pode trazer”.

Dúvidas práticas e lacunas legislativas

Diversos pontos operacionais do projeto ainda suscitam dúvidas, principalmente quanto à compatibilização de prazos entre as obrigações das pessoas jurídicas e físicas. “A pessoa jurídica entrega sua informação de carga depois do prazo de entrega da Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física. Como é que a pessoa física vai receber essa informação?”, questionou Fonseca. Segundo ele, é necessário que “no mínimo, exista uma compatibilização desses períodos e datas”.

Outra dúvida refere-se à possibilidade de ajustes posteriores na carga tributária informada pela pessoa jurídica e seus impactos na declaração da pessoa física, o que pode gerar autuações ou litígios.

Ainda sobre deduções, ele pondera: “por que somente é possível a dedução de doações recebidas em antecipação de legítima?”, considerando que doações, em geral, não são tributáveis pelo IR, sendo classificadas como rendimentos isentos.

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