No plenário virtual, o STF analisa se a Assembleia Legislativa de Alagoas feriu a CF ao julgar as contas do governador relativas ao exercício de 2014 sem o parecer prévio do TCE, em razão do suposto esgotamento do prazo legal para sua emissão.
Até o momento, o relator, ministro Nunes Marques, votou pela improcedência da ação, entendendo que a Assembleia Legislativa não afrontou a Constituição. Ministro Flávio Dino divergiu e ministro Alexandre de Moraes pediu vista, suspendendo o julgamento.
Caso
A ação foi proposta pela Atricon – Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil –, que contesta dispositivos da Constituição do Estado de Alagoas (arts. 79, VII; 94, caput; e 97, I), além do decreto legislativo 460/16, que aprovou as contas daquele ano mesmo sem a manifestação técnica do TCE.
Para a entidade, a ausência do parecer prévio compromete a fiscalização contábil, financeira e orçamentária e afronta o princípio da separação dos poderes, enquanto enfraquece o controle externo previsto na CF.
A Atricon sustenta que os dispositivos questionados devem ser interpretados conforme a CF, para reafirmar a obrigatoriedade do parecer prévio como requisito para o julgamento parlamentar das contas do chefe do Executivo estadual.
Voto do relator
Ao votar, ministro Nunes Marques reconheceu a legitimidade da ação e a relevância constitucional da matéria, mas julgou improcedente o pedido principal.
O ministro afirmou que, embora o parecer prévio do Tribunal de Contas seja um instrumento técnico importante para embasar o julgamento político das contas, a ausência, decorrente de inércia da Corte de Contas, não impede o exercício da competência exclusiva da Assembleia Legislativa.
Nunes Marques ressaltou que o Tribunal de Contas deve elaborar o parecer prévio no prazo de 60 dias a partir do recebimento das contas, conforme determina o art. 71, I, da CF. No entanto, o descumprimento desse prazo não pode paralisar ou condicionar o exercício das atribuições constitucionais do Legislativo estadual.
"Não havendo parecer no prazo constitucional, não é razoável inviabilizar o julgamento pelo Poder Legislativo, que possui competência exclusiva para tal", afirmou o ministro.
Embora tenha julgado improcedente o pedido principal, o relator declarou inconstitucional a expressão "sob pena de crime de responsabilidade do Presidente do Tribunal" constante do art. 97, I, da Constituição do Estado de Alagoas.
Segundo o ministro, essa previsão usurpa competência legislativa privativa da União para definir crimes de responsabilidade, em afronta aos arts. 22, I, e 85, parágrafo único, da CF.
- Veja o voto.
Procedimento dialógico
Ministro Flávio Dino inaugurou divergência. Embora tenha acompanhado o relator quanto à admissibilidade da ação, o ministro divergiu no mérito.
Para S. Exa., não caberia ao STF declarar a inconstitucionalidade da expressão "sob pena de crime de responsabilidade do Presidente do Tribunal" contida no art. 97, I, da Constituição do Estado de Alagoas, pois esse tema não foi objeto do pedido principal da ação.
A controvérsia, para Dino, cinge-se à possibilidade de a Assembleia Legislativa julgar as contas do governador sem parecer prévio do Tribunal de Contas, especialmente em caso de omissão prolongada da Corte.
Flávio Dino reconheceu que a Constituição impõe deveres tanto à Assembleia Legislativa (julgar as contas do chefe do Executivo) quanto ao Tribunal de Contas (emitir parecer prévio). No entanto, enfatizou que o descumprimento do dever pelo Tribunal não pode inviabilizar a atuação do Legislativo, sob pena de paralisar a realização dos comandos constitucionais.
Segundo o ministro, embora o parecer prévio tenha caráter técnico e relevante, seu não fornecimento, após o prazo constitucional de 60 dias, não impede o julgamento político-administrativo pela Assembleia.
A ausência do parecer, nesse caso, não deve ser interpretada como licença para a desobrigação do Tribunal, mas tampouco como óbice intransponível para o Legislativo.
Como saída para a inércia da Corte de Contas, Dino propôs a adoção de um "procedimento dialógico":
- Após o término do prazo de 60 dias sem o parecer, a Assembleia Legislativa deve instar formalmente o Tribunal a prestar informações sobre o andamento da análise.
- Caso justificada, a Corte poderá solicitar uma prorrogação, limitada a mais 60 dias.
- Findo esse novo prazo sem resposta, a Assembleia estará autorizada a julgar as contas independentemente do parecer técnico.
O objetivo, segundo o ministro, é equilibrar a necessidade de controle técnico com a obrigação constitucional de julgamento, sem premiar a inércia nem paralisar o sistema de controle financeiro público.
Assim, Flávio Dino votou pela improcedência do pedido para anular o decreto legislativo que aprovou as contas de 2014, sustentando que, diante da omissão prolongada do Tribunal de Contas (quase dois anos sem parecer), a Assembleia tinha legitimidade para exercer sua competência constitucional.
O ministro propôs a seguinte tese:
"Ultrapassados os sessenta dias, cumpre ao Poder Legislativo instar o Tribunal de Contas, facultada a prorrogação por igual período, após o qual poderá julgar as contas independentemente da emissão do parecer."
Veja o voto.
- Processo: ADPF 434.
Precedente
O STF já enfrentou questão relativa ao mesmo Estado ao analisar a ADPF 366, também proposta pela Atricon, que questionava decretos legislativos da Assembleia Legislativa de Alagoas que aprovaram as contas do governo estadual referentes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, sem o parecer prévio do Tribunal de Contas do Estado.
425680
Na ocasião, o STF decidiu, por unanimidade, que o julgamento das contas pelo Legislativo é legítimo mesmo na ausência do parecer técnico, desde que caracterizada a omissão injustificada e prolongada do Tribunal de Contas.
O relator, ministro Gilmar Mendes, destacou que o parecer prévio tem natureza técnica e auxilia na análise política-administrativa feita pela Assembleia. No entanto, frisou que a inércia do Tribunal não pode impedir o exercício da função constitucional do Legislativo.
Segundo o ministro, a CF estabelece o prazo de 60 dias para emissão do parecer, a contar do recebimento das contas. No caso concreto, esse prazo havia sido ultrapassado em mais de um ano, sem justificativa plausível.
Para Gilmar Mendes, permitir que a omissão da Corte de Contas inviabilize o julgamento pelo Parlamento comprometeria o equilíbrio entre os poderes e os mecanismos de controle orçamentário.