A 3ª câmara Cível do TJ/GO declarou a incompetência do Procon para fiscalizar, autuar ou aplicar sanções administrativas contra cartórios do Estado. O colegiado reconheceu que tal atribuição cabe exclusivamente ao Poder Judiciário, conforme determina a CF e a lei 8.935/94.
Na ação, a Associação de Titulares de Cartórios de Goiás alegou que o Procon-GO teria realizado, indevidamente, atividades de fiscalização junto às unidades de serviço extrajudicial do Estado de Goiás, resultando em autuações e aplicação de multas.
Assim, argumentou que apenas o Judiciário pode fiscalizar os cartórios e que a atuação do Procon viola essa competência, além de gerar insegurança jurídica com a possibilidade de dupla fiscalização.
A entidade alegou ainda que a relação entre cartórios e usuários não configura relação de consumo, por envolver tributos, e não preços ou tarifas.
Em 1ª instância, o juízo julgou a ação improcedente, ao considerar que não haveria impedimento para a atuação do Procon junto aos cartórios.
Ao analisar o caso no TJ/GO, o relator, desembargador Fernando Braga Viggiano, pontuou que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público, mas que sua fiscalização é de competência exclusiva do Judiciário.
Segundo o magistrado, "a legislação é inequívoca ao atribuir ao Poder Judiciário a competência para fiscalizar os serviços notariais e de registro, inclusive no que tange à qualidade e eficiência do atendimento, que são justamente os aspectos que o Procon-GO pretende fiscalizar”.
O julgador também destacou que os valores cobrados pelos cartórios pelos serviços prestados possuem natureza tributária, sendo considerados taxas e não preços ou tarifas, o que afasta o vínculo de consumo.
“A relação existente entre os titulares das delegações e os usuários dos serviços é de natureza administrativo-tributária, mediante taxas, e não de consumo", observou.
Além disso, embora tenha reconhecido a divergência na jurisprudência sobre a aplicação do CDC aos serviços cartorários, o desembargador considerou que isso não autoriza a atuação do Procon sobre os cartórios.
“Admitir a fiscalização pelo Procon-GO seria permitir a duplicidade de fiscalização, o que geraria insegurança jurídica e poderia levar a situações em que uma mesma conduta fosse considerada regular pela fiscalização judiciária e irregular pelo órgão de defesa do consumidor, ou vice-versa”, afirmou.
Diante disso, por unanimidade, o colegiado seguiu o entendimento do relator, fixando obrigação de não fazer, sob pena de multa de R$ 500 por ato fiscalizatório.
Os advogados Dyogo Crosara e Guilherme França, do escritório Crosara Advogados, atuaram na causa.
“Essa vitória reafirma a legalidade e o devido limite de atuação administrativa no Estado. O Procon não pode assumir um papel que a Constituição reserva ao Judiciário. É uma decisão que garante segurança jurídica a toda a população usuária dos serviços notariais e registrais, além de resguardar a autonomia institucional desses serviços”, afirmou Guilherme França.
- Processo: 5413439-11.2021.8.09.0051
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