A 3ª câmara de Direito Comercial do TJ/SC anulou contrato de prestação de serviços e considerou inexigíveis as notas promissórias emitidas por empresa que oferecia renegociação de dívidas e consultoria jurídica sem ter advogados habilitados. Para o colegiado, a atividade exercida era privativa da advocacia, tornando nulo o negócio jurídico firmado.
Entenda o caso
A empresa de mediação e consultoria para renegociação de dívidas ingressou com ação monitória contra um cliente visando à cobrança de valores representados por notas promissórias, supostamente relacionadas à prestação de serviços de negociação extrajudicial de dívidas.
O juízo da vara Única de Herval d’Oeste/SC, no entanto, extinguiu o processo sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do CPC, após reconhecer de ofício a nulidade do negócio jurídico subjacente.
Na apelação, a empresa defendeu a legalidade do contrato firmado, sustentando que atuava apenas como mediadora, sem incorrer em atos exclusivos da advocacia. Alegou ainda que o reconhecimento da nulidade resultaria em enriquecimento ilícito da parte contrária.
O cliente, por sua vez, pediu a manutenção da sentença, argumentando que os serviços prestados pela empresa configuravam consultoria e assessoria jurídica, atividades privativas de advogados.
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Atuação sem habilitação
Segundo o relator, desembargador Getúlio Corrêa, embora as notas promissórias sejam títulos autônomos, sua exigibilidade pode ser afastada quando demonstrada sua origem ilícita, como no caso em que derivam de contrato nulo.
Nesse sentido, destacou que os documentos apresentados indicam que os serviços prestados pela empresa consistiam em renegociação de dívidas, obtenção de descontos com instituições financeiras e até aconselhamento jurídico sobre medidas judiciais, atividades que demandam habilitação legal na advocacia.
“Não há provas de que a negociação realizada entre o recorrente e a parte recorrida, a qual deu ensejo aos títulos cobrados na ação originária, tenha sido conduzida por advogado, conforme se observa dos documentos apresentados na origem.”
O desembargador fundamentou a nulidade com base no art. 1º da lei 8.906/94, que reserva à advocacia a consultoria, assessoria e direção jurídicas, bem como no art. 166, III, do CC, que considera nulo o negócio jurídico cujo motivo determinante, comum às partes, seja ilícito.
“Torna-se forçoso o reconhecimento da nulidade do negócio jurídico firmado entre as partes, bem como das notas promissórias acessórias que o acompanham, mormente porque decorrentes de ato jurídico nulo, ante a negociação de serviços de caráter privativo da profissão de advocacia.”
Atuação irregular reiterada
Outro ponto destacado no voto foi a atuação reiterada da empresa em práticas semelhantes. O relator pontuou que tramitam no mesmo juízo diversas ações idênticas, nas quais a demandante adota modelo contratual padrão que incorre em violação às normas que regulam o exercício da advocacia.
Além disso, destacou que a atuação da empresa já havia sido objeto de ação civil pública proposta pela OAB/SC, com trânsito em julgado, na qual ficou reconhecido que os serviços oferecidos configuravam indevidamente consultoria jurídica.
Assim, a 3ª câmara de Direito Comercial do TJ/SC concluiu pela nulidade do contrato e pela inexigibilidade dos títulos dele decorrentes. A decisão foi unânime.
- Processo: 0302001-44.2019.8.24.0075
Confira o acórdão.