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"Riobaldo, em 2025, teria infartado", diz Dino ao citar Guimarães Rosa

Ministro utilizou célebre frase da personagem para ilustrar preocupação com excesso de reclamações no STF.

18/9/2025

Nesta quinta-feira, 18, durante sessão em que o Supremo analisava a constitucionalidade das alterações no rol da ANS, ministro Flávio Dino fez referência literária a "Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa". S. Exa. afirmou que se Riobaldo, personagem central da obra, vivesse em 2025, "já teria infartado".

A menção surgiu quando Dino citava a célebre frase do personagem — "viver é muito perigoso" — para refletir sobre o sistema de precedentes judiciais e os riscos da judicialização excessiva.

Quem é Riobaldo?
Riobaldo é o protagonista e narrador do romance Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa. Ele conta a história de sua vida como ex-jagunço para um "Doutor", refletindo sobre seu passado, seus amores por Diadorim, Nhorinhá e Otacília, e questões existenciais como Deus, o Diabo, medo e coragem.

O ministro destacou que a eficácia dos precedentes exige "humildade dupla": tanto de quem os aplica quanto de quem os emite. Advertiu, porém, que a "tentação satânica da reclamação" pode incentivar a hiperjudicialização e gerar distorções na prática forense.

"Difícil é soltar a mão do precedente, é dizer: a instância ordinária aplique e Deus proteja. Porque, senão, nós estamos apenas deslocando. Eu não sou, longe disso, o ministro Moreira Alves, mas neste caso eu faço a profecia da catástrofe", afirmou.

Para ilustrar a complexidade do tema, recorreu à literatura:

"Eu lembro de Guimarães Rosa e Riobaldo: viver é muito perigoso."

Foi nesse momento que a ministra Cármen Lúcia interveio: "E olha que ele não estava em 2025".

Dino respondeu de pronto:

"Pois é, imagina se tivesse, Riobaldo já tinha infartado."

Veja o momento:

Reclamação em debate

A fala do ministro Flávio Dino sobre a "tentação satânica da reclamação" dialoga diretamente com outro debate recente do STF.

A reclamação constitucional, concebida como medida excepcional para resguardar a autoridade da Corte, tem se transformado, segundo os próprios ministros, em um verdadeiro atalho processual.

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Na 1ª turma, ao julgar a Rcl 73.811, ministros discutiram se o instrumento ainda cumpre a função original ou se passou a ser usado como via rápida para questionar decisões de instâncias inferiores, inclusive em matérias trabalhistas.

Ministros como Luiz Fux e o próprio Dino alertaram para a "ordinarização" do instituto, que estaria convertendo o Supremo em instância revisora de fatos e provas.

Já outros, como Alexandre de Moraes, defenderam sua utilidade em casos de descumprimento imediato de súmulas vinculantes ou teses de repercussão geral.

Os números confirmam o problema: em 2025, o STF recebeu mais de oito mil reclamações, quase o triplo do volume de habeas corpus, tradicionalmente o remédio mais recorrente da Corte.

Esse cenário explica por que Dino recorreu à literatura para lembrar Riobaldo: "viver é muito perigoso". A judicialização excessiva, para S. Exa., ameaça não apenas o sistema de precedentes, mas também o próprio papel institucional do Supremo.

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