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STJ: Ministro valida desapropriação apesar de mudança de finalidade

Para Bellizze, mudança de uso para construção de escola indígena mantém o interesse público da desapropriação.

29/10/2025

O ministro Marco Aurélio Bellizze, do STJ, considerou improcedente ação popular que havia anulado decreto de desapropriação de terrenos em Campo Grande/MS.

Segundo o relator, ficou comprovado que o ato administrativo teve motivação legítima e que a desapropriação visava à construção de uma escola indígena, o que caracteriza tredestinação lícita, preservando o interesse público.

Entenda o caso

A disputa judicial teve início com ação popular movida para anular decreto que declarava a utilidade pública de um terreno em Campo Grande/MS. A ação alegava que o ato era nulo por ausência de motivo e desvio de finalidade, uma vez que não foi executada nenhuma obra no imóvel desapropriado.

O pedido foi julgado procedente em 1ª instância e a sentença foi mantida pelo TJMS. O tribunal entendeu que a não realização da obra originalmente prevista e a subsequente mudança de destinação configuravam ilegalidade, anulando o ato administrativo e condenando os réus, incluindo o ex-prefeito, a ressarcir os cofres públicos.

Desapropriação é válida mesmo com mudança de finalidade, desde que mantido o interesse público(Imagem: Freepik)

Voto do relator 

Ao analisar o caso no STJ, em decisão monocrática, o ministro Marco Aurélio Bellizze deu provimento ao recurso para julgar a ação popular improcedente. O relator fundamentou a decisão em jurisprudência do STJ sobre a chamada "tredestinação lícita".

Segundo Bellizze, a desapropriação não pode ser considerada irregular se, mesmo não cumprida a finalidade original, o bem expropriado recebe uma nova destinação que também atende ao interesse da coletividade.

No caso em questão, a destinação do terreno para a construção de uma escola indígena demonstrou a manutenção do interesse público na utilização da área.

O ministro também ressaltou que a área enfrentava diversos imbróglios judiciais que impediam sua utilização pelo poder público, incluindo a venda ilegal dos lotes a terceiros, o que foi objeto de ações anulatórias e criminais.

Outro ponto relevante da decisão foi o reconhecimento de que a ação popular, instrumento constitucional previsto no art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição, deve ser utilizada para a tutela de bens jurídicos de natureza coletiva e não para a defesa de interesses exclusivamente particulares.

No caso analisado, o ministro identificou que o verdadeiro interesse subjacente era reaver a propriedade do imóvel desapropriado para os antigos donos. Conforme destacou, "esse fato levanta fortes dúvidas quanto à finalidade a que a subjacente ação popular está se prestando, pois o seu autor, em última análise, busca a tutela de um interesse particular".

O relator enfatizou que a ação popular constitui instrumento viabilizador do controle de condutas legítimas do Poder Público, não se prestando à mera tutela patrimonial dos cofres estatais ou à defesa de interesses exclusivos do cidadão autor.

Conforme afirmou, embora o exercício desse direito seja empreendido a título individual, seu objetivo é a tutela de bens jurídicos transindividuais.

Nesse contexto, entendeu que a declaração de nulidade do ato expropriatório atentaria contra o interesse coletivo e privilegiaria apenas interesses particulares. A manutenção da desapropriação, ao contrário, preserva a possibilidade de execução futura da obra pública, dada a permanência do interesse da gestão municipal na construção da escola indígena, ou de tredestinação lícita do bem.

Diante dessa fundamentação, o relator concluiu que não havia motivação suficiente para a declaração de nulidade, inexistindo qualquer prova de dano ao erário ou culpa do gestor público.

Com base nesses fundamentos, afastou qualquer irregularidade no ato de desapropriação e reverteu a condenação, julgando improcedentes todos os pedidos formulados na ação popular.

O escritório Kohl Advogados atuou na defesa do ex-prefeito.

Leia a decisão.

Veja a versão completa

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