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Procuradores podem ser indenizados por uso de carro próprio? STF julga

Plenário julga ação movida pela PGR que aponta caráter remuneratório em parcela vinculada ao subsídio.

4/12/2025

Procuradores do Estado, auditores fiscais e auditores internos devem ser ressarcidos por uso de veículo próprio? Esse é o caso que o STF começou a analisar, nesta quinta-feira, 4, em sessão plenária. 

A Corte julga o §4º do art. 1º da lei 7.881/89 e o art. 20 da lei 18.316/21, ambas de Santa Catarina, que instituiram o pagamento mensal de uma parcela a esses servidores públicos. 

A ação é relatada pelo ministro Nunes Marques.

Nesta tarde, foram realizadas as sustentações orais. Devido ao adiantado da hora o julgamento foi suspenso e será retomado oportunamente.

STF julga pagamento de parcela indenizatória a procuradores de Estado por uso de carro próprio.(Imagem: Arte Migalhas)

O caso

Na ação, a PGR sustenta que a verba, fixada em 14% do subsídio de auditor fiscal nível IV, foi criada sob o rótulo de indenização, mas na prática possui natureza remuneratória, em afronta ao regime de subsídio previsto na Constituição.

Alega que o pagamento independe de qualquer comprovação de despesas e decorre apenas da disponibilização do veículo, o que afastaria o caráter indenizatório.

Além disso, a vinculação do percentual ao subsídio de outra carreira configuraria equiparação salarial vedada pela CF, produzindo reajuste automático entre estruturas distintas da administração.

A ação afirma ainda que os valores podem, a depender da arrecadação estadual, aproximar-se do teto remuneratório, contrariando os princípios da moralidade, impessoalidade e probidade administrativa.

Por isso, o pedido inclui a suspensão imediata da eficácia das normas impugnadas e, no mérito, sua declaração de inconstitucionalidade.

Sustentação oral

O procurador-geral do Estado de Santa Catarina, Marcelo Mendes, defendeu, em plenário, a constitucionalidade das normas catarinenses e explicou que o modelo de indenização pelo uso de veículo próprio é adotado há mais de 50 anos no Estado.

Segundo ele, a opção foi por indenizar servidores que utilizam carros particulares, em vez de manter frota oficial ou contratar motoristas, porque estudos reiterados demonstram que o sistema é mais econômico e eficiente.

Afirmou que a parcela tem natureza indenizatória, pois visa ressarcir gastos e o desgaste decorrente do uso do veículo em serviço.

Para recebê-la, o servidor deve comprovar a propriedade do carro, cadastrá-lo no órgão competente e assumir responsabilidade por manutenção, seguro, combustível e demais custos, que deixam de recair sobre o Estado.

O procurador também levantou preliminar de perda de objeto, argumentando que a EC 135/24 alterou o parâmetro de controle ao determinar que caberá à futura lei nacional definir quais parcelas indenizatórias são computadas no teto remuneratório. Assim, segundo ele, o julgamento da ADIn perde sentido.

No mérito, sustentou que a vinculação da indenização ao subsídio de auditor fiscal nível IV funciona apenas como parâmetro quantitativo, não configurando equiparação vedada pela CF. Destacou ainda que, caso a ação seja julgada procedente, o Estado teria de adquirir veículos ou contratar motoristas, gerando custo maior ao erário.

Ao final, pediu o reconhecimento da perda de objeto e, subsidiariamente, a improcedência da ação.

Amici curiae

Falando em nome da Anape - Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do DF, o advogado Vicente Martins Prata Braga defendeu a constitucionalidade da indenização pelo uso de veículo próprio.

Segundo ele, procuradores, auditores fiscais e auditores internos utilizam seus veículos particulares não para deslocamentos ordinários, mas para cumprir atribuições institucionais, muitas vezes percorrendo longas distâncias entre diversas regiões do Estado. Por isso, afirmou, é inadequado tratar a legislação como "penduricalho" ou como afronta ao art. 37 da CF.

O advogado ressaltou que a indenização não tem natureza remuneratória:

Nesse sentido, disse, a parcela tem todas as características de verba indenizatória.

Também destacou o ganho econômico do modelo: segundo estudos citados, em 2019 a IUVP custou cerca de R$ 36,8 milhões, enquanto manter frota própria e motoristas ultrapassaria R$ 46 milhões. Para ele, a legislação catarinense deveria ser replicada, não questionada, por gerar economia e evitar desperdício de recursos públicos.

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O advogado Luiz Magno Pinto Bastos Júnior, representante do Sindiauditoria/SC, defendeu a constitucionalidade da indenização e afirmou que a verba possui natureza estritamente indenizatória, como já reconhecido pelo STF em precedente de 1996 sobre norma catarinense similar.

Bastos Júnior distinguiu o caso de Santa Catarina da ADIn 6.198, do Mato Grosso, lembrando que lá havia vínculo com incremento de arrecadação e adesão a programas específicos, características ausentes na legislação catarinense. Assim, disse, não cabe equiparar a verba a incentivo remuneratório.

Quanto ao parâmetro de cálculo baseado no subsídio do auditor fiscal, afirmou que não há equiparação vedada pela CF, pois se trata apenas de um critério uniforme para carreiras que enfrentam os mesmos custos de deslocamento - semelhante ao uso de valores fixos para diárias ou auxílio-alimentação.

Subsidiariamente, caso o STF entenda inadequado o parâmetro, pediu a aplicação da técnica de congelamento para manter o valor de referência atual.

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O advogado Alexander Andrade Leite, da banca Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia, representando a Fenafisco - Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital, defendeu a constitucionalidade da indenização e destacou que, no caso dos auditores fiscais, o deslocamento externo é uma obrigação legal prevista no CTN e na legislação estadual.

Segundo ele, não há possibilidade de teletrabalho ou atuação remota: o auditor precisa ir às empresas, verificar documentos, fiscalizar obrigações acessórias e atuar em operações que envolvem combate ao crime organizado, lavagem de dinheiro e sonegação - muitas vezes integrando forças de segurança.

Por isso, argumentou, a indenização pelo uso do veículo próprio não é um "penduricalho", mas instrumento necessário ao exercício das funções, já tradicional em Santa Catarina.

Ressaltou que apenas auditores em atividade fim recebem a parcela, e que férias, licenças e cessões ao serviço público excluem o pagamento, reforçando seu caráter indenizatório.

Chamou atenção ainda para o art. 37, XXII, da CF, que prevê prioridade de recursos para a administração tributária, afirmando que isso justifica tratamento diferenciado à carreira e reforça a legitimidade da política adotada pelo Estado.

Sobre o cálculo da verba - fixada em percentual do subsídio do auditor fiscal - o advogado afirmou que não se trata de equiparação remuneratória, mas de um critério uniforme para indenizar servidores que enfrentam os mesmos custos de deslocamento. Segundo ele, eventual reajuste salarial depende sempre de nova lei, o que afasta a ideia de vinculação automática.

Por fim, destacou que declarar a norma inconstitucional obrigaria o Estado a adquirir frota própria, medida mais onerosa, conforme estudos que apontam aumento de custos de até 25% ao ano.

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