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ADPF das Favelas: Fachin vê falhas na segurança pública e propõe soluções

Ministro relator indicou que, apesar de avanços, letalidade policial ainda é alta no Rio de Janeiro.

5/2/2025

Nesta quarta-feira, 5, o STF retomou a análise da "ADPF das Favelas" em sessão plenária. A ação busca a redução da letalidade policial no Estado do Rio de Janeiro.

Durante a sessão, o relator, ministro Edson Fachin, proferiu seu voto, destacando que, apesar dos avanços, ainda persiste um estado de coisas inconstitucional na política de segurança pública do Rio de Janeiro. S. Exa. apresentou uma série de propostas para fortalecer o monitoramento e a transparência nas operações policiais.

Devido ao adiantado da hora, a sessão foi suspensa e o julgamento será retomado em data ainda não definida.

Caso

Trata-se de ação apresentada em 2019 pelo PSB pleiteando que o Estado do RJ apresente plano de redução de letalidade policial.

À época, o partido questionava a política de segurança pública adotada pelo então governador Wilson Witzel, do Rio de Janeiro.

Segundo a legenda, a política adotada estimula o conflito armado e "expõe os moradores de áreas conflagradas a profundas violações de seus direitos fundamentais". 

Voto do relator

O relator, ministro Edson Fachin, em extenso voto, reconheceu que, apesar dos avanços na redução da letalidade policial no Rio de Janeiro, ainda persiste um "estado de coisas inconstitucional" na política de segurança pública do Estado.

Entendeu que as medidas cautelares determinadas pela Corte e o diálogo estabelecido nos últimos meses têm sido fundamentais para a queda dos índices de violência.

No entanto, considerou que o plano de redução da letalidade policial apresentado pelo Estado atende, mas não de forma plena, às determinações do Supremo, sendo proposta sua homologação parcial.

Sem nexo de causalidade

Ao votar, o ministro negou que decisões do STF tenham contribuído para o aumento da criminalidade no Rio de Janeiro. Segundo o relator, a alegação do Estado de que o Supremo teria fomentado o crime organizado é "grave equívoco" e "inverdade".

Fachin ressaltou que o Brasil enfrenta um conflito violento entre facções criminosas desde 2016, com sua expansão para outras regiões do país antes mesmo da ADPF. 

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Ao refutar a tese de que criminosos migraram para o Rio por proteção judicial, Fachin afirmou que o fortalecimento do crime organizado é um desdobramento de uma situação pré-existente.

Classificou a alegação do governo do Rio como "desacompanhada de respaldo fático e histórico" e reforçou que as decisões do STF não proibiram operações policiais, mas apenas impuseram exigências de planejamento, transparência e controle externo.

Veja o momento:

Fachin destacou que, ainda que a eficácia da letalidade policial fosse comprovada na redução da criminalidade, essa alternativa seria "inconstitucional e incompatível com o ordenamento jurídico pátrio e com o direito internacional dos direitos humanos".

Acrescentou que "dados concretos em paralelo ao debate jurídico constitucional refutam a tese de que a brutalidade do Estado possa produzir resultados efetivos para a segurança pública".

Ao abordar o papel dos agentes de segurança, o ministro ressaltou o "reconhecimento à dedicação e ao empenho de milhares de policiais civis e militares que em todo o Brasil e no Rio de Janeiro arriscam diariamente sua vida pelo próximo". No entanto, alertou que a deterioração da segurança pública "não é apenas uma ameaça para todos os cidadãos e cidadãs brasileiras, mas é também para os policiais que dedicam sua vida ao ofício e não raro as perdem em numerosos e inaceitáveis suicídios e também assassinatos".

O ministro criticou a perpetuação de um estigma histórico em relação às comunidades do Rio de Janeiro, mencionando o que chamou de "mito da marginalidade".

Para S. Exa., "as favelas foram redefinidas por essa percepção higienista como uma espécie de zona franca do crime, generalizando a milhões de pessoas a imputação da condição de criminoso". 

Assim, reconheceu que "o controle de territórios por organizações criminosas é sim um problema grave e real", mas advertiu que "a redução de tais espaços, a ideia de complexos territoriais criminosos a serem militarmente combatidos e confinados é uma simplificação que naturaliza um grau inconcebível de violência por parte do Estado".

Veja o trecho:

Medidas propostas

O ministro propôs a adoção de medidas permanentes para garantir a queda progressiva da letalidade policial. Entre elas, estão:

Acompanhamento da letalidade

Uso da força e armas de fogo

Saúde mental de policiais

Letalidade anormal

Uso de helicópteros em operações

Busca domiciliar

Naturalização do absurdo

Durante o julgamento, ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso criticaram a "naturalização do absurdo" na aceitação do domínio territorial por milícias e facções criminosas no Brasil.

Gilmar alertou para a gravidade da ocupação de áreas por grupos criminosos e a incapacidade do Estado em combatê-los, defendendo maior supervisão da PF e do MPF, além do uso de órgãos como o Coaf e a Receita Federal para desarticulá-los.

Barroso endossou a preocupação, ressaltando as violações de direitos humanos nesses territórios e o impacto sobre famílias pobres, coagidas pelo crime. O presidente da Corte afirmou que a sociedade precisa enfrentar o problema e buscar soluções efetivas.

Com a força máxima

Já ministro Alexandre de Moraes defendeu o uso de "força máxima" pelas polícias em operações contra milícias e o tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Criticou a visão de uso progressivo da força, afirmando que os policiais devem entrar com o armamento mais pesado disponível para garantir sua própria segurança. 

Tramitação

Em junho de 2020, o relator, ministro Edson Fachin, determinou a suspensão de operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro, durante a pandemia, salvo em casos absolutamente excepcionais, que deveriam ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente e comunicadas ao MP/RJ.

A decisão monocrática de Fachin foi confirmada pelo plenário do STF em agosto de 2020. 

Em dezembro de 2021, o plenário começou a julgar embargos contra a referida decisão. Ministro Edson Fachin e Alexandre de Moraes propuseram medidas para reduzir a letalidade policial. A diferença dos votos se deu na extensão das medidas - Alexandre de Moraes não referendou algumas propostas do relator. 

Em fevereiro 2022, os ministros confirmaram diversas medidas propostas por Edson Fachin, tais como (i) plano feito pelo Estado do RJ, em 90 dias, para a redução da letalidade policial; (ii) criação do Observatório Judicial sobre Polícia Cidadã e (iii) prioridade nas investigações de incidentes que tenham como vítimas crianças e adolescentes.  

Em dezembro daquele ano, Fachin determinou que o Estado do RJ apresentasse cronograma para instalação de câmeras em fardas e viaturas dos batalhões especiais das polícias (Bope e Core) e nas unidades policiais das áreas com maior índice de letalidade policial. 

Em maio de 2023, os embargos foram para plenário virtual. Naquela ocasião, Fachin proferiu voto em 11 determinações. Dentre elas:

À época, o debate foi interrompido por pedido de vista de Moraes. 

Vale lembrar que, no interregno, ocorreu a operação policial na Favela do Jacarezinho, que resultou em 28 mortes. 

Em 2024, Fachin, visitou o MP/RJ para analisar a atuação do órgão em políticas públicas de segurança e discutir o cumprimento das decisões da ADPF.

Veja a versão completa

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