Por unanimidade, a 6ª turma do STJ concedeu parcialmente habeas corpus para substituir a prisão preventiva de um acusado de fraude em licitação e corrupção ativa por medidas cautelares. O colegiado considerou que o réu é primário, não houve violência e o esquema já foi desarticulado, o que reduz o risco de reiteração delitiva. O réu se encontra foragido.
O acusado é apontado como integrante de um grupo que fraudou licitações e praticou corrupção em contratos entre sua empresa e o Instituto de Previdência dos Servidores de Gravataí/RS, com a intermediação de servidores públicos e indícios de pagamento de propina.
Entenda o caso
O habeas corpus foi impetrado contra ação penal instaurada a partir da investigação de supostas irregularidades na contratação de empresa para precificação da folha de pagamento dos servidores do Instituto de Previdência dos Servidores de Gravataí. A apuração foi desencadeada por informação do TCE/RS acerca de possíveis fraudes no pregão presencial de 2018, que teria favorecido empresa ligada ao acusado.
O réu responde pelos crimes de corrupção ativa, fraude à licitação e associação criminosa, sendo apontado como parte de um grupo que teria agido em conluio com servidores públicos para direcionar contratos.
A defesa alegou cerceamento de defesa, argumentando que documentos do TCE/RS teriam sido disponibilizados de forma seletiva e utilizados como base para autorizar medidas cautelares, como busca e apreensão. Sustentou, ainda, que a prisão preventiva foi fundamentada em fatos antigos, sem demonstração atual de risco à ordem pública ou à instrução criminal.
Medida excepcional
Ao votar, o relator destacou que o trancamento de ação penal por habeas corpus é providência excepcional, cabível apenas em hipóteses estritas, como clara atipicidade da conduta, falta de provas mínimas, inépcia da petição inicial ou extinção da punibilidade. Segundo o relator, o pedido exigiria análise aprofundada de fatos e provas, providência inadmissível na via do habeas corpus.
"O reconhecimento de alguma das hipóteses excepcionais para o trancamento da ação penal por meio de um habeas corpus exige uma clara atipicidade da conduta, evidente falta de provas mínimas para sustentar a acusação, inépcia da petição inicial ou uma causa que extingua a punibilidade, o que não se verifica no caso em questão."
Em relação à alegada nulidade decorrente do cerceamento de defesa, observou que o Tribunal estadual não analisou as alegações relativas à disponibilização seletiva de documentos do procedimento no TCE/RS, tampouco a eventual ilicitude da prova para fins penais. Assinalou, contudo, que o paciente terá oportunidade de apresentar essas alegações no decorrer da ação penal, quando o juiz poderá decidir sobre as preliminares com base em instrução mais completa.
Cautelares adequadas
O ministro ressaltou que há indícios suficientes de autoria e materialidade dos crimes atribuídos ao paciente, com destaque para a existência de pagamento de propinas e associação com servidores públicos. No entanto, considerou que medidas cautelares menos gravosas são adequadas, tendo em vista o perfil do réu e a desarticulação do grupo.
"Quanto à prisão preventiva, apesar de o paciente estar foragido e de gravidade dos fatos, é possível substituí-la por medidas menos severas. Trata-se de crime contra a administração, o réu é primário, não houve violência contra pessoas e o esquema criminoso foi desvendado. O grupo envolvido foi desarticulado, com o principal servidor público que supostamente favorecia o paciente já afastado de suas funções. Dessa forma, os riscos de reiteração delitiva contra o erário estão reduzidos. Existem medidas alternativas à prisão que são adequadas e suficientes para o caso concreto."
O relator defendeu a substituição da prisão por medidas cautelares diversas, como:
- Retenção de passaporte;
- Proibição de acesso à Prefeitura de Gravataí e às secretarias municipais;
- Comparecimento quinzenal em juízo;
- Proibição de ausentar-se da comarca sem autorização judicial;
- Proibição de contato com qualquer pessoa ligada aos fatos em apuração;
- Suspensão das atividades da empresa do réu;
- Proibição de contratar com a administração pública;
- Recolhimento domiciliar noturno e nos fins de semana;
- Monitoramento eletrônico.
A aplicação das cautelares depende da apresentação voluntária do réu em juízo, com atualização de endereço e telefone. Caberá ao juiz de 1º grau fixar e fiscalizar as medidas, podendo impor outras, ou decretar nova prisão em caso de descumprimento ou surgimento de novos motivos.
Com esses fundamentos, a ordem foi parcialmente concedida, por unanimidade.
- Processo: HC 996.315