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STJ analisa se cópia de arquivos digitais configura crime de furto

Ex-funcionária da Embraer é acusada de copiar, em pen drive, documentos sigilosos da companhia, mas o relator Rogério Schietti entendeu que a conduta não configura furto. O julgamento foi interrompido por pedido de vista de Carlos Pires Brandão.

18/11/2025

A 6ª turma do STJ começou a analisar agravo regimental interposto pela Embraer S.A. contra decisão monocrática do ministro Rogério Schietti que havia absolvido ex-funcionária acusada de copiar documentos sigilosos da empresa para um pen drive pessoal.

A acusação sustenta que a conduta se enquadra no crime de furto, mas, para o relator, a reprodução dos arquivos não retira o original da posse da empresa nem provoca prejuízo patrimonial, elementos indispensáveis ao tipo penal.

Os ministros Og Fernandes, Sebastião Reis Júnior e Antonio Saldanha Palheiro acompanharam o voto, mas o julgamento foi suspenso por pedido de vista do desembargador Federal convocado Carlos Pires Brandão.

O caso

A Embraer interpôs agravo regimental contra decisão em que Schietti dera provimento ao recurso especial da defesa para absolver a ex-funcionária. Na origem, ela havia sido condenada a dois anos, oito meses e vinte dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, além de multa, pela suposta prática de furto qualificado.

Segundo a acusação, a ré copiou para um dispositivo particular centenas de documentos internos contendo dados comerciais, margens de lucro, ferramentas de venda e outras informações sigilosas de acesso restrito. A empresa realizou análise forense interna e, meses depois, localizou o pen drive na residência da ex-empregada durante cumprimento de mandado de busca e apreensão.

Ao julgar o recurso especial, Schietti reformou a condenação e reconheceu a atipicidade da conduta, por entender que a mera reprodução de dados não configura subtração. A Embraer então agravou, alegando violação da súmula 7 do STJ e defendendo que documentos digitais têm valor patrimonial e podem ser objeto de furto.

Na sessão, a assistente de acusação afirmou que a decisão agravada ignora a relevância econômica e estratégica dos documentos e que a análise do relator exigiria reexame de provas, o que seria vedado pelo STJ. Argumentou ainda que, em um cenário em que documentos físicos são cada vez menos utilizados, dados digitais devem receber a mesma proteção penal.

A defesa da ex-funcionária, por sua vez, sustentou que “copiar não é subtrair”, ressaltando que não houve repasse de informações a terceiros e que o próprio relatório interno da Embraer não comprova retirada ou compartilhamento dos arquivos. Afirmou que o comportamento descrito não preenche os requisitos do crime de furto e que a decisão do relator está juridicamente correta.

Ex-funcionária é acusada de copiar, em pen drive, documentos sigilosos da empresa, mas ministro Rogério Schietti entendeu que a conduta não configura furto.(Imagem: Freepik)

Tipicidade penal

Inicialmente, o ministro Rogério Schietti explicou que o STJ parte das premissas fáticas fixadas pelo Tribunal de origem, já que a súmula 7 impede o reexame do conjunto probatório. Assim, toma-se como incontroverso que a ex-funcionária copiou arquivos da empresa, limitando-se o debate à subsunção dessa conduta ao tipo penal do furto.

Ao votar pela manutenção da absolvição, o relator afirmou que o furto exige a subtração de coisa alheia móvel e o consequente prejuízo patrimonial da vítima. No caso concreto, nenhum desses elementos estaria presente, pois a ex-funcionária apenas reproduziu os documentos, sem retirar o original da posse da Embraer.

Schietti destacou que a cópia não interfere na integridade ou disponibilidade do arquivo original, que permanece plenamente acessível ao titular.

Eventuais prejuízos decorrentes do uso indevido dos dados, explicou o ministro, não se confundem com o resultado jurídico próprio do furto, que pressupõe diminuição imediata do patrimônio em razão da retirada da coisa.

“O resultado jurídico do crime de furto consiste no prejuízo patrimonial. É dizer, o efeito da subtração é a diminuição do patrimônio da vítima. Esse resultado não se verifica quando a coisa é apenas copiada e, portanto, permanece em posse da vítima. A cópia não autorizada do documento não gera desfalque patrimonial. O eventual uso subsequente do documento para fins indevidos é que poderia gerar prejuízo à empregadora, mas não à subtração em si.”

A discussão, segundo Schietti, é exclusivamente de direito e diz respeito à possibilidade — que considerou inexistente — de equiparar a cópia de dados à retirada de coisa alheia móvel. Assim, concluiu que, embora a situação possa gerar repercussões civis ou trabalhistas, não há suporte legal para enquadrá-la como furto.

Com os acompanhamentos de Og Fernandes, Sebastião Reis Júnior e Antonio Saldanha Palheiro, formou-se maioria pela manutenção da absolvição. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do desembargador Federal convocado Carlos Pires Brandão.

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