A felicidade como direito fundamental
domingo, 8 de junho de 2025
Atualizado em 6 de junho de 2025 17:14
Na World Happiness Report 2025, pesquisa realizada pela Universidade de Oxford, o Brasil, dentre os 147 países avaliados, ocupa a 36ª posição no ranking de felicidade, que leva em consideração os índices de liberdade de expressão, renda, desigualdade e estrutura social.1
Trata-se, sem dúvida, de uma conquista relevante para o país que alcançou índices superiores aos da Espanha, Itália e Japão. A leitura que se faz é no sentido de que o Brasil, sem artificializar o espaço natural, há várias décadas vem passando por significativas transformações, demonstrando, de forma inequívoca, que saiu de um país essencialmente agrícola e, em pouco mais de 30 anos, atingiu um desenvolvimento em vários segmentos e agora já dialoga com certa facilidade com a inteligência artificial. E, pelo que se vê da pesquisa publicada, a felicidade do povo continua em alta.
A Constituição Federal é o maior diploma jurídico do país. Elenca em seu bojo um vastíssimo rol de tutelas e, como um caleidoscópio, vai girando e fazendo o movimento de rotação e, ao mesmo tempo, de translação em torno do ser humano, dimensionando-o como destinatário exclusivo de sua programação. Apresenta uma infindável relação de direitos e obrigações envolvendo Estado e cidadãos na órbita jurídico-política e, dentre eles, como ponto de destaque o direito fundamental à felicidade, conforme proposta da abordagem do título.
Assim é que a Constituição, na realidade, dita o projeto social, político e econômico a ser seguido pelos administradores públicos. Em contrapartida, em caso de descumprimento, o cidadão poderá pleitear a realização de seus direitos consagrados invocando a tutela jurisdicional. A esse respeito, preleciona Canotilho:
"Os direitos fundamentais cumprem a função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurídico-objectivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa)".2
E é interessante observar que a Constituição, como qualquer outra lei ordinária, não é estática e necessita, de acordo com os reclamos sociais, fazer os ajustes e acertos para que possa levar adiante o projeto idealizado pela nação.
Fica até difícil definir o que é felicidade. Muitos já se aventuraram em tão árdua tarefa e, por mais amplo e abrangente que seja o conceito, sempre ficará em descoberto determinada leitura, em razão da própria natureza humana, com sua dinâmica e mutabilidade variáveis. A conceituação de felicidade se modifica de época para época. Pode-se arriscar, sem muito compromisso, em dizer que se trata de uma emoção humana que procura retratar uma situação, mesmo que efêmera, mas que transmite a sensação de alegria, bem-estar e que possibilite usufruir as boas coisas da vida. Quer dizer, feliz é aquele que procura viver intensamente seus momentos e retirar deles a receita para o seu bem viver.
E, por incrível que pareça, as legislações não trazem, explicitamente, a consagração do direito à felicidade, que teria o condão de reunir, num artigo só, tudo que está sendo conferido como direitos e obrigações entre as pessoas, assim como seu relacionamento com o Estado. A Declaração de Direitos de Virgínia, que precedeu a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, idealizada por Thomas Jefferson, proclamava em seu art. 1º: "Todos os homens nascem igualmente livres e independentes, têm direitos certos, essenciais e naturais dos quais não podem, por nenhum contrato, privar nem despojar sua posteridade: tais são o direito de gozar a vida e a liberdade com os meios de adquirir e possuir propriedades, de procurar obter a felicidade e a segurança".
Nesta vinculação, as ações sociais são de vital importância para se atingir os propósitos almejados. Não se trata de um estímulo ao cidadão para carregar a bandeira em defesa da felicidade, e sim de uma garantia conferida pelo próprio Estado. O ideal seria um texto legal apontando a felicidade como um direito fundamental, porém, a felicidade carrega um caminho árduo para ser atingida e, necessariamente, passa por todos os percalços apontados na legislação vigente.
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1 Disponível aqui.
2 Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional - 7ª ed. - Coimbra: Livraria Almedina, Portugal, 2003, p.408.