Blindando a terceirização do vínculo empregatício: Cuidados formais importantes na prática
segunda-feira, 26 de maio de 2025
Atualizado em 23 de maio de 2025 13:36
Em um mercado cada vez mais competitivo e descentralizado, por certo que a terceirização de serviços deixou de ser exceção para se tornar regra em diversos ramos de negócios. Essa modalidade de contratação, ao permitir que empresas deleguem a terceiros a execução de determinados serviços, pode representar uma solução estratégica eficiente, especialmente quando se pensa em redução de custos ou especialização na execução de determinada tarefa.
Segundo pesquisa promovida pela Transparency Market Research, companhia especialista em inteligência de mercado, estima-se que o mercado de terceirização no Brasil teve previsão de alcançar até US$ 95 bilhões em investimentos em 2024, com crescimento de cerca de 14%1.
No entanto, apesar de promissora sob o aspecto econômico, quando a terceirização é realizada sem os devidos cuidados o tomador de serviços pode ser exposto a sérios riscos, inclusive ao risco de responsabilização direta pelas obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais do prestador.
Com efeito, apesar de o STF ter reconhecido a licitude da terceirização ampla e irrestrita, inclusive para as atividades-fim (ADPF 324 e RE 958.252), a contratação de terceiros continua sujeita a limites e requisitos legais, especialmente os previstos na lei 6.019/1974, que foi reformulada pelas leis 13.429/17 e 13.467/17.
Tais requisitos são tanto de ordem formal, envolvendo a análise de documentos e informações essenciais sobre a empresa prestadora, quanto de ordem prática, relacionados à forma como os trabalhadores terceirizados são efetivamente tratados no cotidiano da prestação de serviços.
Vejamos, a seguir, os requisitos de ordem formal (objeto central do presente artigo) com a finalidade precípua de demonstrar como a empresa tomadora/contratante pode, na prática, verificar se tais exigências estão sendo devidamente atendidas para a celebração do contrato pretendido.
Cuidados de ordem formal
Ao se cogitar a contratação de uma empresa para a prestação de serviços terceirizados, é imprescindível realizar, previamente, uma verificação criteriosa de uma série de requisitos legais, especialmente aqueles previstos nos artigos 4º-B, 5º-B, 5º-C e 5º-D, todos da lei 6.019/1974, a saber:
Os requisitos analisados até aqui representam o conjunto mínimo necessário para que se possa cogitar a viabilidade jurídica da contratação de serviços terceirizados. Entretanto, ainda que preenchidos ditos pressupostos, mesmo se considerando apenas o aspecto formal da contratação, ainda assim não se eximiria de riscos a empresa contratante.
Cuidados adicionais recomendáveis
Outro cuidado relevante e recomendável à tomadora/contratante é que faça constar no contrato de prestação de serviços cláusula dispondo que, no caso de qualquer quebra do contrato ou irregularidade por culpa da empresa prestadora de serviços, esta última ficará responsável por todas as obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais que decorrerem do vínculo de emprego entre o empregado por ela contratada e a empresa tomadora, bem como deverá tomar todas as medidas processuais ou administrativas cabíveis para que a tomadora não responda por nenhum débito ou tenha que cumprir quaisquer outras obrigações por conta disso.
Ignorar essas exigências formais representa um efetivo risco concreto de reconhecimento de vínculo de emprego do trabalhador terceirizado para com a tomadora, o que pode ocorrer tanto por um juiz do trabalho através de ação individual ou coletiva ajuizada nesse sentido, quanto por um auditor fiscal do MTE - Ministério do Trabalho e Emprego. A consequência disso, na prática, é a responsabilização solidária da empresa tomadora junto com à empresa prestadora de serviços, como se fosse a empregadora direta, podendo a primeira vir a arcar com todos os encargos decorrentes do vínculo reconhecido.
Exigir a comprovação dos pagamentos regulares de salários, dos recolhimentos de FGTS e INSS dos empregados terceirizados, também é sempre recomendável, mediante previsão contratual de exigência nesse sentido. Caso a empresa prestadora de serviços pare de fazer qualquer um desses pagamentos ou passe a fazê-los de forma irregular, haverá um forte indício de que tal empresa não está saudável financeiramente, valendo ressaltar que é reconhecido por lei que a responsabilidade da tomadora é subsidiária em relação à prestadora, nos termos do art. 5º-A, §5º da Lei nº 6.019/74 - isto é, se a prestadora não pagar, a tomadora deverá arcar com os valores.
Art. 5º-A. § 5o. Empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da lei no 8.212, de 24/7/1991.
Nesse contexto, e se possível, antes de se proceder à contratação da empresa prestadora de serviços terceirizados, que se faça uma criteriosa due diligence ("diligência devida"), analisando os pontos referidos acima, bem como demais aspectos relevantes, como o fato da empresa prestadora de serviços ser devedora, inclusive em ações trabalhistas (pode-se levantar certidões negativas de débito da empresa para verificar esse aspecto), a fim de se ter um parâmetro mais claro de riscos adicionais que podem estar envolvidos na contratação.
Deve-se ter em mente, portanto, que uma simples formalização de um contrato de prestação de serviços não basta para que a terceirização seja considerada regular, sendo necessário se verificar se a empresa que se está contratando para prestar serviços está em conformidade com as normas legais.
Além disso, durante a execução do contrato, é necessário assegurar o cumprimento contínuo dessas exigências, a fim de evitar a descaracterização da terceirização e o consequente reconhecimento de vínculo empregatício com a empresa tomadora, de modo que reavaliações periódicas de todos os aspectos inerentes à regularidade da contratação da empresa contratada são essenciais.
Nessa linha de raciocínio, é recomendável que a contratante mantenha mecanismos de acompanhamento e fiscalização contínuos enquanto perdurar o contrato, o que inclui a supramencionada exigência periódica de comprovantes de pagamentos de salários, FGTS e INSS dos trabalhadores terceirizados alocados, bem como da inclusão de cláusulas contratuais que prevejam sanções para descumprimento de obrigações legais, para além do próprio direito da contratante de auditar os documentos da prestadora de serviços.
Por fim, ainda são recomendáveis cuidados adicionais não relacionados a documentos ou a requisitos legais em si, mas a aspectos práticos do relacionamento com o prestador e da própria operação. A título de exemplo, uma boa prática como conhecer a operação do prestador de serviços, saber melhor sobre os trabalhadores que executam os serviços terceirizados, tudo, enfim, pode permitir ao tomador identificar eventuais riscos na prestação de serviços que possam afetar a tomadora de serviços.
Em arremate, antes de seguir com a celebração de qualquer contrato terceirizado de prestação de serviços, a empresa contratante deve de antemão verificar a regularidade jurídica da prestadora, sua estrutura operacional, sua capacidade econômica, bem como o histórico de cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, sendo também recomendável se exigir certidões negativas, contrato social atualizado, comprovantes de recolhimentos de encargos sociais e uma análise do objeto social da empresa, para ao final se garantir que ela esteja habilitada a executar o serviço pretendido.
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