CPC na prática

Legitimidade do espólio para responder pelas dívidas do falecido antes da partilha

Herdeiro não é devedor automático. TJ/SP reafirma: antes da partilha, quem paga é o espólio. Decisão firme contra cobranças indevidas e em defesa da legalidade.

25/7/2025

O art. 796, do CPC, estabelece que “o espólio responde pelas dívidas do falecido, mas, feita a partilha, cada herdeiro responde por elas dentro das forças da herança”.

Apesar de o dispositivo ser de uma clareza solar, há credores que insistem em colocar os herdeiros no polo passivo de execuções para responderem por dívidas de executados falecidos sem que exista partilha dos bens daquele que morreu e, muitas vezes, sequer inventário instaurado.

Imputar responsabilidade ao herdeiro legal antes mesmo da partilha ou da instauração do inventário é ato praticado para constranger a família do devedor falecido vedado pelo art. 796, do CPC.

Com o falecimento do devedor, quem responde pela dívida é o espólio. Se não há inventário aberto e não é possível identificar quem representa o espólio, essa é outra questão tratada pelos arts. 615 e 616, do CPC.

Com efeito, tem legitimidade para pedir a abertura do inventário e a partilha quem estiver na posse e administração dos bens do espólio, no momento do falecimento (CPC, art. 616). Têm, contudo, legitimidade concorrente para requerer a instauração do inventário: cônjuge ou companheiro supérstite; herdeiro; legatário; testamenteiro; cessionário do herdeiro ou do legatário; o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança; o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes; a Fazenda Pública, quando tiver interesse; o administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou companheiro supérstite (CPC, art. 616, incisos I a IX, sem os destaques).

Note-se, portanto, que o credor do autor da herança tem legitimidade concorrente (CPC, art. 616, inciso VI) com os demais legitimados a requerer a abertura do inventário previstos nos arts. 615 e 616, do CPC.

Portanto, com o falecimento do devedor, não é permitido cobrar diretamente dos herdeiros a dívida daquele que morreu. É necessário que o pagamento seja exigido do espólio enquanto não houver partilha (CPC, art. 796). Se o inventário não foi aberto pelos legitimados do art. 615, do CPC, cabe ao credor do autor da herança (CPC, art. 616, inciso VI) tomar esta providência, na omissão dos demais legitimados concorrentes do art. 616, do mesmo diploma legal.

Por isso, merece aplausos o recente acórdão do TJ/SP, da lavra do eminente desembargador Antonio Rigolin, da 31ª Câmara de Direito Privado, assim ementado:

COMPRA E VENDA DE BEM SEMOVENTE. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. ÓBITO DO EXECUTADO. INCLUSÃO DOS HERDEIROS DO POLO PASSIVO, COM PENHORA DE ATIVOS FINANCEIROS. NÃO PREVALECIMENTO. LEGITIMIDADE DO ESPÓLIO PARA ASSUMIR A QUALIDADE DE SUCESSOR PROCESSUAL, AINDA QUE INEXISTA INVENTÁRIO ABERTO. LIBERAÇÃO QUE SE DETERMINA. AGRAVO PROVIDO, COM OBSERVAÇÃO. 1. Enquanto não encerrada a sucessão, é do espólio a legitimidade para atuar ativa e passivamente na defesa dos interesses da massa patrimonial respectiva, ainda que não tenha sido aberto o inventário, cabendo a sua representação a quem se encontra na administração dos bens. 2. Assim sendo, não há que se falar na habilitação dos herdeiros, pois é o espólio quem deve figurar no polo passivo desta demanda. 3. Diante de tal quadro, impõe-se a liberação da constrição efetuada sobre contas bancárias de titularidade dos sucessores. (TJ/SP; Agravo de Instrumento 2143882-15.2025.8.26.0000; Relator (a): Antonio Rigolin; Órgão Julgador: 31ª Câmara de Direito Privado; Foro de Presidente Venceslau - 3ª Vara; Data do Julgamento: 2/7/25; Data de Registro: 2/7/25).

Trata-se de recente decisão muito acertada do TJ/SP porque aplica rigorosamente a lei e não admite atalhos que muitas vezes os credores do falecido querem adotar em prejuízo de herdeiros que - não raro - sequer têm conhecimento dos negócios do falecido.

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Colunistas

André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil nas Faculdades de Direito da Universidade de Lisboa (2015), da Universidade de Coimbra/IGC (2019) e da Universidade de Salamanca (2022). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil, com Pós Doutorado pela Unimar (2023/2024). Pós Doutorado em Direito Processual Civil na Universitá degli Studi di Messina (2024/2026). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial (2012) e Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). MBA em Economia pela USP (2026). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, USP-AASP e CEU-Law). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Chambers, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2025), tendo sido Vice Presidente nas gestões 2019/2024. Presidente da Comissão de Processo Empresarial do IASP (desde 2025). Presidente da Comissão de Processo Civil da OABSP-Pinheiros (desde 2013). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor de 2013 a 2023. Conselheiro da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb, Camagro e da Amcham. Membro do IBDP e do CBar. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do CFOAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021), Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021) e Presidente da Comissão de Direito de Energia do IASP (2013/2024).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).