CPC na prática

Honorários equitativos e a tabela local da OAB como piso na sua fixação

Rogerio Mollica mostra que os tribunais ampliam o uso da equidade na fixação de honorários, mesmo diante de limites legais, evidenciando divergências contínuas no STJ.

11/12/2025

Já vimos em diversos artigos nessa coluna que constantemente a jurisprudência vai se afastando da previsão legal e possibilitando em cada vez mais hipóteses a fixação de honorários equitativos1.

O CPC/15 procurou afastar a subjetividade constante no Código de 1973 quanto a fixação dos honorários advocatícios, mas em grande medida os nossos Tribunais vêm elastecendo os casos em que é possível a utilização da equidade.

Atenta a esse fato, a lei 14.365/22 incluiu os parágrafos 6º- A e 8º - A ao art. 85 do CPC:

“§ 6º- A. Quando o valor da condenação ou do proveito econômico obtido ou o valor atualizado da causa for líquido ou liquidável, para fins de fixação dos honorários advocatícios, nos termos dos §§ 2º e 3º, é proibida a apreciação equitativa, salvo nas hipóteses expressamente previstas no § 8º deste artigo.

§ 8º- A. Na hipótese do § 8º deste artigo, para fins de fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no § 2º deste artigo, aplicando-se o que for maior.”

O §6º- A reiterou a posição do legislador de que os honorários advocatícios não poderiam ser fixados fora das previsões legais, mas permanece sendo solenemente ignorado por muitos julgados, que continuam entendendo que os honorários advocatícios poderiam ser reduzidos pela equidade e não somente aumentados, conforme a previsão do CPC/15.

Já o §8º - A procurou mitigar os efeitos da fixação equitativa ao prever que as tabelas locais da OAB deveriam ser tidas como piso na fixação dos honorários advocatícios2. Entretanto, mais uma vez a previsão vem sendo mitigada pelos nossos tribunais:

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. ARBITRAMENTO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. ART. 85, §§ 8º E 8º-A, DO CPC/2015. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

1. "Segundo a jurisprudência desta Corte de Justiça, a previsão contida no § 8º-A do art. 85 do CPC, incluída pela Lei n. 14.365/2022 - que recomenda a utilização das tabelas do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil como parâmetro para a fixação equitativa dos honorários advocatícios -, serve apenas como referencial, não vinculando o magistrado no momento de arbitrar a referida verba, uma vez que deve observar as circunstâncias do caso concreto para evitar o enriquecimento sem causa do profissional da advocacia ou remuneração inferior ao trabalho despendido" (AgInt no AgInt na Rcl n. 45.947/SC, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 18/6/2024, DJe de 26/6/2024).

2. Agravo interno não provido.”

(AgInt no REsp n. 2.194.144/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 12/8/2025, DJEN de 15/8/2025.)

Esse entendimento das duas turmas que compõem a 1ª seção, que julga Direito Público também é acompanhado pela 3ª turma do STJ:

“AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. BAIXA DE GRAVAME FIDUCIÁRIO. HIPOTECA. VERBAS HONORÁRIAS. CONDENAÇÃO EM OBRIGAÇÃO DE PAGAR E EM OBRIGAÇÃO DE FAZER. PROVEITO ECONÔMICO INESTIMÁVEL. CRITÉRIO DE EQUIDADE. POSSIBILIDADE.

1. Consoante aludido na decisão agravada, a base de cálculo dos honorários deve incluir não só a indenização em danos morais, como também a obrigação de fazer. Precedentes.

2. Segundo a jurisprudência desta Corte, "nas ações mandamentais em que ausente proveito econômico auferível ou mensurável, e quando o valor da causa não refletir o benefício devido, deverá ser aplicado o critério subsidiário da equidade. É o que ocorre na ação de obrigação de fazer consistente na baixa de gravame hipotecário, porquanto não se pode vincular o sucesso da pretensão ao valor do imóvel". (REsp n. 2.092.798/DF, relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 5/3/2024 , DJe de 7/3/2024).

3. Ademais, "Não há qualquer vinculação do magistrado aos valores estabelecidos pela tabela da OAB para fixação dos honorários advocatícios, que possui caráter meramente referencial." (REsp n. 2.193.531/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 28/4/2025, DJEN de 5/5/2025.)

Agravo interno improvido.”

(AgInt no AgInt nos EDcl no AgInt no AREsp n. 2.506.581/RN, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 8/9/2025, DJEN de 11/9/2025.)

Entretanto, a 4ª turma do STJ possui entendimento favorável à aplicação da tabela da OAB local como piso na fixação dos honorários advocatícios:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CRITÉRIO DE EQUIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME

1. Agravo interno interposto contra decisão que não conheceu de recurso especial, com fundamento na Súmula n. 83 do STJ, em ação declaratória de inexigibilidade de débito e reparação de danos, onde a fixação dos honorários advocatícios foi realizada com base nos valores recomendados pela tabela da OAB. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. A questão em discussão consiste em saber se, na fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil. III. RAZÕES DE DECIDIR

3. A Segunda Seção do STJ consolidou entendimento de que, em casos de fixação equitativa de honorários, devem ser observados os valores recomendados pela OAB ou o limite mínimo de 10% estabelecido no § 2º do art. 85, aplicando-se o que for maior, conforme o art. 85, § 8º-A, do CPC.

4. A decisão do Tribunal de origem está em conformidade com a orientação do STJ. A aplicação da Súmula n. 83 é adequada, pois o entendimento jurisprudencial está consolidado, não cabendo a revisão da decisão agravada. IV. DISPOSITIVO E TESE

5. Agravo interno desprovido.”

Tese de julgamento: "1. A fixação equitativa dos honorários advocatícios deve observar os valores recomendados pela OAB ou o limite mínimo de 10% estabelecido no § 2º do art. 85, conforme o art. 85, § 8º-A, do CPC. 2. A aplicação da Súmula n. 83 do STJ é adequada quando o entendimento jurisprudencial está consolidado".

Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 85, §§ 2º, 8º e 8º-A.

Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt na Rcl n. 47.536/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 29/10/2024.

(AgInt no REsp n. 2.122.434/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 24/3/2025, DJEN de 28/3/2025.)

Conforme consta no referido julgado, a 2ª seção do STJ, que congrega a 3ª e a 4ª turma, entendeu, em outubro de 2024, pela aplicação da previsão do § 8º - A do CPC3.

Persistindo a divergência, novamente a questão foi afetada pela 2ª seção do STJ4 e espera-se que tenhamos em breve uma definição sobre o tema.

____________________________

1 Disponível aqui. Critiquei a constante fixação de honorários advocatícios equitativos em Execução Fiscal no artigo “A fixação de honorários equitativos e as Execuções Fiscais”, in Processo de Execução e Cumprimento de Sentença: temas atuais e controvertidos, volume 06, coord. Araken de Assis e Gilberto Bruschi, São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2025.

2 Nesse sentido é o entendimento de Leonardo Carneiro da Cunha: “A melhor forma de interpretar o § 8º-A do art. 85 é entender que está ali a previsão de um piso ou diretriz mínima. Ao fixar os honorários por equidade, o juiz não pode estabelecer um valor que seja inferior ao recomendado pelo Conselho Federal da OAB nem ao mínimo de 10% sobre o valor da causa. Se a recomendação da OAB for maior, não se pode fixar menos do que ela estabelece. Se os 10% sobre o valor da causa superar a recomendação da OAB, o juiz não pode, na apreciação equitativa, fixar menos que isso.” (Código de processo civil comentado: artigo por artigo / Leonardo Carneiro da Cunha. - 2. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2025.)

3 AgInt na Rcl n. 47.536/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 29/10/2024, DJe de 5/11/2024.

4 Foram afetados os seguintes processos de Relatoria da Ministra Daniela Teixeira: REsp 2.159.431, REsp 2.135.007, REsp 2.199.761, REsp 2.199.776 e REsp 2.199.778.

Colunistas

André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil nas Faculdades de Direito da Universidade de Lisboa (2015), da Universidade de Coimbra/IGC (2019) e da Universidade de Salamanca (2022). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil, com Pós Doutorado pela Unimar (2023/2024). Pós Doutorado em Direito Processual Civil na Universitá degli Studi di Messina (2024/2026). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial (2012) e Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). MBA em Economia pela USP (2026). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, USP-AASP e CEU-Law). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Chambers, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2025), tendo sido Vice Presidente nas gestões 2019/2024. Presidente da Comissão de Processo Empresarial do IASP (desde 2025). Presidente da Comissão de Processo Civil da OABSP-Pinheiros (desde 2013). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor de 2013 a 2023. Conselheiro da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb, Camagro e da Amcham. Membro do IBDP e do CBar. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do CFOAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021), Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021) e Presidente da Comissão de Direito de Energia do IASP (2013/2024).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).

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