A expansão urbana tem exigido do setor imobiliário o domínio não apenas da técnica jurídica de parcelamento e incorporação do solo, mas também da correta estruturação ambiental dos empreendimentos. Loteamentos, incorporações e os chamados condomínios de lotes envolvem etapas de licenciamento e regularização ambiental que não podem ser ignoradas, sob pena de graves consequências jurídicas, civis e patrimoniais.
No ordenamento jurídico brasileiro, os principais institutos de parcelamento do solo urbano são: Loteamento (lei 6.766/1979): criação de novos lotes mediante abertura de vias públicas; Condomínio edilício (lei 4.591/1964): edificação com frações autônomas e áreas comuns e Condomínio de lotes (art. 58 da lei 13.465/17): desdobramento do condomínio edilício, sem exigência de edificação prévia.
Cada um desses modelos exige análise jurídica própria, mas compartilham um ponto comum: a imprescindibilidade da regularização ambiental prévia à sua viabilidade urbanística e registral.
A legislação ambiental brasileira em vigor - especialmente a lei 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente), o Código Florestal (lei 12.651/12) e a resolução CONAMA 237/97 - impõe que empreendimentos potencialmente modificadores do meio ambiente estejam sujeitos ao licenciamento ambiental prévio.
Nos projetos imobiliários, esse licenciamento é frequentemente condição exigida pelos órgãos municipais e estaduais para a aprovação urbanística do empreendimento. Ainda que a resolução CONAMA 237/97 não preveja expressamente a precedência do licenciamento sobre os atos urbanísticos, ela estabelece, em seu art. 10, §1º, que o procedimento de licenciamento deve ser acompanhado da comprovação da regularidade fundiária e urbanística, como certidão de uso do solo e demais autorizações específicas.
No Estado do Paraná, por exemplo, tem-se recente atualização de lei estadual específica que dispõe sobre normas gerais para o licenciamento ambiental no estado (lei estadual 22.252/24) e, regulamentando as definições dessa legislação, o decreto estadual 9541/25, que dispõe sobre procedimentos administrativos referentes ao licenciamento ambiental de empreendimentos e/ou atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ao meio ambiente.
Afunilando ainda mais a especificidade do tema, o órgão ambiental estadual em questão editou IN 21, de 25 de abril de 2025, definindo critérios, diretrizes e procedimentos para o licenciamento ambiental de empreendimentos imobiliários urbanos no território paranaense.
Na mencionada instrução normativa observa-se critérios para enquadramento em diferentes tipos de procedimentos de licenciamento ambiental, levando-se em consideração o tipo de empreendimento ou atividade, os quais são assim elencados: parcelamento do solo urbano (loteamento, condomínio de lotes ou desmembramento); condomínios para fins habitacionais, industriais ou comerciais; construção de barracões e implantação de parques urbanos.
Na prática, o licenciamento ambiental se mostra complexo em razão de inúmeros atos normativos a serem observados para seu devido procedimento, que pode variar a depender da região em que se localiza a atividade a ser licenciada, mas é etapa essencial e muitas vezes condicionante da viabilidade urbanística e registral do empreendimento.
Com a recente aprovação da lei 15.190/25, denominada lei geral de licenciamento ambiental, de âmbito federal, que entrará em vigor em seis meses, essa complexidade em razão da existência de diversas leis esparsas tende a ser superada, uma vez que a lei federal visa promover a uniformização das normas em todo o território nacional.
Fato é que a ausência de uma boa estruturação em procedimentos de licenciamento ambiental pode acarretar: (i) Impossibilidade de registro no cartório de imóveis (art. 18 da lei 6.766/1979); (ii) Embargos e autuações ambientais; (iii) Responsabilidade civil e criminal dos empreendedores (art. 225, §3º da Constituição Federal); (iv) Riscos contratuais com adquirentes e financiadores.
A due diligence ambiental é uma etapa estratégica na análise de viabilidade jurídica de empreendimentos imobiliários. Consiste na investigação da situação ambiental da área pretendida, considerando: (i) Existência de reservas legais ou áreas de preservação; (ii) Passivos ambientais anteriores (multas, TACs, contaminações); (iii) Classificação fundiária, uso do solo e restrições legais; e (iv) Necessidade de licenciamento, EIA/RIMA ou estudos simplificados.
Do ponto de vista prático, é comum que empreendedores adquiram imóveis rurais ou urbanos sem conhecimento das limitações ambientais e acabem com áreas economicamente inviáveis, bloqueadas por restrições legais ou com passivos ocultos.
Um exemplo recorrente é a tentativa de implantar loteamentos em áreas de fundos de vale ou margens de cursos d’água, o que esbarra diretamente nas Áreas de Preservação Permanente (art. 4º do Código Florestal).
Com a crescente adoção do condomínio de lotes como alternativa urbanística, surgem novos desafios: embora previsto legalmente, muitos municípios ainda não dispõem de regulamentação própria. Isso implica exigências específicas em termos de licenciamento ambiental e infraestrutura mínima, que se confundem com os critérios aplicáveis aos loteamentos.
A doutrina tem destacado que a implantação desses empreendimentos deve respeitar tanto a lei 4.591/1964, quanto a legislação ambiental e urbanística local, sendo necessário o licenciamento ambiental prévio quando o empreendimento estiver fora do perímetro urbano consolidado ou puder causar impacto ambiental relevante. A ausência dessa etapa pode inviabilizar o registro e expor os empreendedores a riscos administrativos e judiciais.
Conclusão
A regularidade ambiental não é uma etapa secundária, mas sim um pilar estrutural do sucesso jurídico e econômico de empreendimentos imobiliários. Loteamentos, incorporações e condomínios de lotes, apesar de suas particularidades legais, compartilham a necessidade de uma atuação planejada e preventiva, com especial atenção ao diagnóstico ambiental da área desde a concepção do negócio.
Ignorar essa etapa significa não apenas comprometer o empreendimento perante os órgãos públicos, mas também gerar um passivo oculto que afeta a confiança do mercado, a segurança dos adquirentes e a própria liquidez do ativo.
A due diligence ambiental deixou de ser apenas um diferencial competitivo e tornou-se requisito essencial de diligência e responsabilidade corporativa. Incorporadoras, construtoras e investidores que compreendem essa realidade transformam um potencial risco em oportunidade, protegem-se juridicamente, fortalecem sua reputação e garantem a viabilidade ambiental e econômica de seus empreendimentos.
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Referências
BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Resolução 237, de 19 de dezembro de 1997. Dispõe sobre a competência e o licenciamento ambiental.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988.
BRASIL. Estado do Paraná. Decreto 9.541, de 11 de agosto de 2025. Regulamenta a Lei nº 22.252/2024, sobre procedimentos administrativos de licenciamento ambiental no Estado do Paraná.
BRASIL. Estado do Paraná. Lei 22.252, de 12 de dezembro de 2024. Estabelece normas gerais para licenciamento ambiental no Estado do Paraná.
BRASIL. Lei 4.591, de 16 de dezembro de 1964. Dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias.
Brasil. Lei 6.766, de 19 de dezembro de 1979. Dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano e dá outras providências.
BRASIL. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
BRASIL. Lei 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre normas para conservar, recuperar e utilizar de forma sustentável as florestas e demais formas de vegetação nativa no Brasil.