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Preocupações iniciais quanto ao prazo da exclusividade no contrato de corretagem no PL 4/25

Neste artigo, apresentam-se primeiras preocupações com relação à fixação de prazo de vigência de cinco anos para a cláusula de exclusividade em contratos de corretagem imobiliária, à luz do projeto de reforma do CC.

23/10/2025

A proposta de alteração do art. 726 do CC, trazida pelo projeto de reforma e atualização do CC (PL 4/25), reacende o debate sobre os limites da exclusividade nos contratos de corretagem imobiliária, diante das lacunas atualmente existentes na redação atual do dispositivo, cuja previsão é:

Art. 726. Iniciado e concluído o negócio diretamente entre as partes, nenhuma remuneração será devida ao corretor; mas se, por escrito, for ajustada a corretagem com exclusividade, terá o corretor direito à remuneração integral, ainda que realizado o negócio sem a sua mediação, salvo se comprovada sua inércia ou ociosidade.

No contexto contratual, a exclusividade corresponde à cláusula que assegura ao corretor de imóveis a sua remuneração, mesmo que o negócio se realize sem a sua intervenção, caso efetivado no curso do prazo contratual ou iniciado no lapso de sua vigência, com a apresentação do interessado pelo corretor, mesmo que a conclusão seja fora dele1.

Nas lições de Alexandre Junqueira Gomide: 

Muitas empresas também insistem que o contrato de corretagem seja firmado com exclusividade, prometendo ao cliente facilidades tais como publicidade em jornais de grande circulação, exposição do imóvel aos finais de semana, dentre outros benefícios. Em troca, a empresa de corretagem tem garantido o direito à comissão de corretagem caso a intermediação seja realizada por terceiros2.

O direito ao recebimento da comissão somente poderá ser afastado quando houver a efetiva comprovação de inércia ou de ociosidade pelo corretor, haja vista o seu dever de diligência e de probidade para a obtenção do negócio3.

Em consonância, o TJ/SP, representado por sua 42ª Câmara Cível, sedimentou, em recente julgado, o entendimento de que mesmo que o vendedor tenha alienado o imóvel por conta própria, na vigência de cláusula de exclusividade em contrato de corretagem, faz-se devido o pagamento da comissão4.

Todavia, a despeito de consolidado o entendimento de que haveria uma presunção relativa do direito à comissão, há celeuma quanto à delimitação do prazo para a vigência da cláusula de exclusividade, uma vez que a redação atual do art. 726 do CC foi omissa quanto à questão.

Acerca do tema, leciona Arnaldo Rizzardo que a ausência de prazo para a exclusividade vincularia o comitente de modo indefinido, em restrição ao próprio direito de propriedade, ensejando óbice à função do instituto5

Nesse viés, a proposta de alteração do art. 726, do CC, pelo PL 4/25, prevê que para a validade da exclusividade no contrato de corretagem faz-se necessária a observância não somente da forma por escrito, mas também de estipulação de prazo determinado para seu exercício, o que, no silêncio das partes, será fixado em cinco anos.

É a previsão do PL 4/25:

Art. 726. Iniciado e concluído o negócio diretamente entre as partes, nenhuma remuneração será devida ao corretor; mas se, por escrito, for ajustada a corretagem com exclusividade, terá o corretor direito à remuneração integral, ainda que realizado o negócio sem a sua atuação, salvo se comprovada sua inércia ou ociosidade.

§ 1º A exclusividade deverá ser prevista por escrito e por tempo determinado.

§ 2º Na falta de previsão expressa quanto ao tempo da exclusividade, esta será de cinco anos.

Em especial, há de se criticar a propositura da redação do § 2º do art. 726, pelo PL 4/25, consoante o qual, na falta de previsão contratual em sentido contrário, o prazo de vigência da exclusividade será de cinco anos. 

Nessa toada, aponta-se que o prazo de cinco anos demonstra-se demasiadamente dilatado, indo de encontro à função da exclusividade na corretagem, pautada na concentração de diligências para o alcance do resultado útil pretendido, com o resguardo ao corretor do direito à comissão caso, mesmo sem a sua intermediação, o negócio venha a ser realizado6.

Na praxe imobiliária, aponta-se que relevantes sociedades empresárias voltadas à intermediação se valem do prazo de 180 (cento e oitenta) dias para a vigência da exclusividade, demonstrando que a redação proposta no PL 4/25 destoa da realidade negocial.

Da leitura do relatório parcial apresentado pela subcomissão de juristas responsáveis pela parte de contratos na reforma do CC, constata-se a ausência de qualquer menção a dispositivos normativos, a jurisprudência e a enunciados firmados nas Jornadas do Conselho da Justiça Federal, de modo que não foram indicados os fundamentos que ensejaram a propositura de prazo tão amplo.

Nesse contexto, em que pese ser louvável a proteção ao corretor, fundamental para a viabilização de negócios jurídicos, com efetividade e segurança, a fixação do prazo de cinco anos para a vigência da cláusula de exclusividade, quando do silêncio contratual, enseja relevantes preocupações.

Em sugestão de lege ferenda, aponta-se a fixação de prazo mais reduzido, adequado ao que já costuma ser praticado no mercado, com a seguinte proposta de redação ao art. 726, § 2º, do CC, constante no PL 4/25: “Na falta de previsão expressa quanto ao tempo da exclusividade, esta será de cento e oitenta dias.”

Assim, a exclusividade no contrato de corretagem será exercida de modo compatível tanto com os interesses dos corretores quanto dos contratantes, ensejando segurança jurídica e suprindo lacunas atualmente existentes na redação do CC.

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1 VENOSA, Silvio de Salvo. Manual de contratos e obrigações unilaterais da vontade. São Paulo: Atlas, 1997, p. 377.

2 GOMIDE, Alexandre Junqueira; "Contratos de Corretagem: Responsabilidades Quanto à Segurança Jurídica do Contrato Pretendido e Comissão pelo Resultado Útil. Um Estudo à luz do Código Civil", p. 252. Direito Civil: Estudos - Coletânea do XV Encontro dos Grupos de Pesquisa - IBDCIVIL: Estudos - Coletânea do XV Encontro dos Grupos de Pesquisa - IBDCIVIL. São Paulo: Blucher, 2018.

3 DONDELLI, Luís V.; MACHADO, Costa (orgs.); CHINELLATO, Silmara Juny (coord.). Código Civil Interpretado. 10. ed. São Paulo: Manole, 2017, p. 556.

4 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n. 1091863-11.2023.8.26.0100. Relatora: Ana Lucia Romanhole Martucci. 33ª Câmara de Direito Privado, Foro Central Cível – 42ª Vara Cível, julgado em 16 jun. 2025, registrado em 17 jun. 2025.

5 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2023. E-book. p. 721. ISBN 978-65-5964-815-3. Disponível aqui. Acesso em: 6 ago. 2025.

6 RODRIGUES, Paulo Sérgio Romero Vicente. Contrato de corretagem imobiliária. 2023, p. 144. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. Disponível aqui. Acesso em: 06 ago. 2025.

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Coordenação

Alexandre Junqueira Gomide é doutor e mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Especialista e mestre em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Fundador e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – IBRADIM. Diretor de Relações Institucionais do Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP. Advogado, professor e parecerista.

André Abelha é mestre em Direito Civil pela UERJ. Fundador e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário - IBRADIM. Presidente da Comissão Especial de Direito Notarial e Registral no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Professor na pós-graduação em Direito Imobiliário da Puc-Rio e em outras instituições. Sócio do escritório Longo Abelha Advogados.