Migalhas Notariais e Registrais

Um novo passo adiante – Breve histórico do fenômeno legal extrajudicializante do inventário extrajudicial com incapaz/menor e a possibilidade de pagamento diferenciado - A efetiva intelecção da aplicabilidade do artigo 610 CPC em âmbito extrajudiciário

Juristas Thomas Nosch, José Renato Nalini e José Luiz Germano analisam, com olhar prático, o inventário extrajudicial com incapaz/menor e a possibilidade de pagamento diferenciado.

7/12/2022

Às vésperas do aniversário de 28 anos da publicação da lei 8.935/1994 e da comemoração do dia dos notários e registradores, foi deferida autorização judicial para lavratura de um inventário extrajudicial com incapaz de forma desigual, com prévia e arraigada análise do Ministério Público e da autoridade judiciária:

"[...] Ante a concordância do Ministério Público e não se verificando a existência de qualquer prejuízo para a herdeira incapaz, DEFIRO A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ para autorizar a Cessão de Direitos pelo viúvo meeiro aos herdeiros filhos e o processamento do inventário dos bens deixados por M.A.B.G. pela via extrajudicial. Por consequência, DECLARO EXTINTO o processo, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. A presente sentença valerá como permissão à realização de abertura de inventário extrajudicial dos bens deixados pela 'de cujus' M.A.B.G. Proceda a inventariante ao recolhimento das custas, sob pena de inscrição do débito na Dívida Ativa. Aguarde-se, por 30 (trinta) dias, apresentação da escritura de partilha finalizada. Oportunamente, arquivem-se os autos. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se." Processo Digital nº: 1002024-05.2022.8.26.0457 da 2º Vara da Comarca de Pirassununga/SP.

O motivo é de comemoração, o fenômeno extrajudicializante permitiu atender o dispositivo legal estabelecido no Código de Processo de Civil (artigo 610) com as mesmas cautelas e práxis do ordenamento jurídico, com prévia minuta elaborada pelo Cartório do Distrito de Cachoeira de Emas, Município e Comarca de Pirassununga, São Paulo.

Com efeito, o precedente inova substancialmente a outrora solução de pagamento igualitário, nesse caso, os autores da ação demonstraram a necessidade de rápida formalização do inventário, em virtude da avançada idade do viúvo e a urgência de regularização dos imóveis e das empresas. Pretendem os interessados realizar o inventário extrajudicial dos bens deixados pela de cujus, mesmo com a existência de herdeira incapaz (pessoa com deficiência).

A exordial deflagrada por advogado pirassununguense reuniu todos os precedentes desse fenômeno extrajudicializante, com as honrosas citações destes autores que cunharam essa solução disruptiva, assim como houve apresentação de tabela com o patrimônio, minuta elaborada pelo Cartório de notas com cessão de direitos, tornando os pagamentos hereditários diferenciados, e não igualitários como defendido previamente.

Nesse caso, houve cessão de direitos da meação pelo cônjuge supérstite, tornando assim os pagamentos diferenciados. Com efeito, percebe-se uma economia processual e um planejamento sucessório, tendo em vista que o cônjuge cedente já possui idade avançada.

Outrossim, de acordo com a petição: "...sem nenhum prejuízo ao incapaz envolvido, e que a requerente "incapaz" é pessoa com deficiência curatelada, requer desde já que seja expedido Alvará Judicial, para autorizar o processamento de Inventário pela via extrajudicial notadamente no tabelionato de Notas da Cachoeira de Emas na comarca de Pirassununga/SP, considerando-se a abertura do inventário na data da decisão de fls. 34 (09/06/2022) e inventariante a Autora."

Comprometeram-se os autores a apresentar a escritura lavrada e que a ação fosse convertida em AÇÃO DE EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ JUDICIAL, para autorizar o processamento de Inventário e Cessão de Direitos pela via extrajudicial, no Tabelionato de Notas da Cachoeira de Emas, nesta comarca de Pirassununga/SP.

Realmente, defendemos outrora que a desjudicialização das situações consensuais permite que a justiça se atenha à sua missão: compor litígios. O juiz é um profissional treinado para o enfrentamento do conflito. Já os delegatários do foro extrajudicial são insuperáveis na rápida e eficiente solução das situações consensuais.

Enquanto a mudança legislativa não se faz, nada impede que os advogados e os tabeliães procurem obter junto aos juízes, como se fez no caso mencionado, autorização para que, em casos de partilha ideal com presença de menores ou incapazes se possa fazer a partilha ideal, ante a ausência de qualquer prejuízo para a pessoa que mais precisa ser protegida.

Como premissa desse estudo, vale destacar que a mesma solução já foi implementada pelo Superior Tribunal de Justiça, por meio do RESP 1.808.767 – lavratura com testamento -, assim, o inventário extrajudicial com incapaz possui o mesmo arquétipo do referido acórdão, já pacificado no STJ e replicado na normatização administrativa da maioria das Corregedorias Estaduais.

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Coordenação

Carlos E. Elias de Oliveira é Membro da Comissão de Reforma do Código Civil (Senado Federal, 2023/2024). Pós-Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). 1º lugar em Direito no vestibular 1º/2002 da UnB. Advogado, parecerista e árbitro. Professor de Direito Civil e de Direito Notarial e Registral. Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Ex-assessor de ministro STJ. Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Civil Contemporâneo (RDCC). Fundador do IBDCont (Instituto Brasileiro de Direito Contratual). Membro da ABDC (Academia Brasileira de Direito Civil), IBDfam (Instituto Brasileiro de Direito de Família),do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário) e do IBERC.

Flauzilino Araújo dos Santos, 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de SP e presidente do Operador do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico (ONR). Diretor de Tecnologia do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB. Licenciado em Estudos Sociais, bacharelado em Direito e em Teologia e mestrado em Direito Civil. Autor de livros e de artigos de Direito publicados em revistas especializadas. Integra, atualmente, a Comissão de Concurso Público para outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas, realizado pelo CNJ.

Hercules Alexandre da Costa Benício, doutor e mestre em Direito pela Universidade de Brasília. É tabelião titular do Cartório do 1º Ofício do Núcleo Bandeirante/DF; presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção do Distrito Federal e acadêmico ocupante da Cadeira nº 12 da Academia Notarial Brasileira. Foi Procurador da Fazenda Nacional com atuação no Distrito Federal.

Ivan Jacopetti do Lago, diretor de Relações Internacionais e Coordenador Editorial do IRIB. Bacharel, mestre e doutor em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pós-graduado pelo CeNOR - Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra e pela Universidade Autónoma de Madri (Cadri 2015). 4º Oficial de Registro de Imóveis de SP.

Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Mestre em Direito pela EPD - Escola Paulista de Direito. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Professor de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios.

Sérgio Jacomino é presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR - Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra e Quinto Oficial de Registro de Imóveis da cidade de SP.