Migalhas Notariais e Registrais

Os extratos eletrônicos na lei 14.382/22: distinções, histórico, influências, impactos no procedimento registral e digressões sobre a regulamentação

O instituto traz uma mudança de paradigmas no Registro de Imóveis, ao prever novas regras para a apresentação de um título, e novos parâmetros para a qualificação registral.

8/3/2023

Um dos principais pontos "disruptivos" que a lei 14.382/2022 apresenta refere-se ao tema "extratos eletrônicos". Não pela figura do extrato que, como será visto, já era conhecida no ordenamento jurídico brasileiro. O instituto traz uma mudança de paradigmas no Registro de Imóveis, ao prever novas regras para a apresentação de um título, e novos parâmetros para a qualificação registral.

E, também, no Registro de Títulos e Documentos, uma vez que "O registro de extratos eletrônicos substituirá o registro integral de diversos contratos, especialmente no que se refere às garantias mobiliárias"1.

Este artigo consolida algumas das primeiras impressões acerca do tema, considerando as disposições da lei 14.382/2022, dos vetos à mencionada norma derrubados pelo Congresso Nacional e da recente Medida Provisória 1.162/2023.

a) Diferentes usos jurídicos para a palavra "extrato".

Para maior clareza de compreensão do instituto, deve-se diferenciar:

a.1) Extrato como técnica de escrituração:

O decreto 482/1846 previa, em seu artigo 11, que o registro das hipotecas seria feito verbo ad verbum, ou seja, pela transposição integral dos elementos do título. Com a lei 1.237/1864, houve uma reforma da legislação hipotecária e a regra de escrituração mudou: a norma previu que a transcrição seria feita por extratos (artigo 8º, § 1º), ou seja, pelo ato do registrador de extrair e registrar apenas os elementos essenciais do título.

Assim, um dos usos correntes para a palavra extrato é a sua utilização como uma técnica de escrituração, pela extração dos elementos mais importantes de um título para sua transposição para o registro.

a.2) Extrato como duplicatas dos títulos:

Uma outra utilização já adotada pelo direito brasileiro para a palavra "extrato" foi aquela dada pelo decreto 3.453/1864, que regulamentou a lei 1.237/1864 acima mencionada. Para esta norma, os títulos apresentados ao Registro de Imóveis deveriam vir acompanhados de um extrato em duplicada, que deveria conter todos os requisitos necessários à inscrição e à transcrição, e seria assinado pela parte, seu advogado ou procurador (artigo 53).

O extrato, aqui, seria o documento a ser apresentado juntamente com o título, contendo todos os elementos exigidos para inscrição ou transcrição. Nas palavras de Lacerda de Almeida2, tratava-se de "um resumo em separado das forças do título, contendo as declarações que devem constar da inscripção".

Por razões que serão dispostas a seguir, os extratos físicos foram dispensados expressamente pelo Decreto nº 18.542/1928, norma que regulamentou a seara registral constante do Código Civil de 1916.

__________

1 Abelha, André; Chalhub, Melhim; Vitale Jr, Olivar Lorena. Sistema Eletrônico de Registros Públicos - Comentada e Comparada (p. 290). Edição do Kindle.

2 LACERDA DE ALMEIDA, Francisco de Paula. Direito das cousas. Rio de Janeiro: J. Ribeiro dos Santos, 1910.

Veja a versão completa

Coordenação

Carlos E. Elias de Oliveira é Membro da Comissão de Reforma do Código Civil (Senado Federal, 2023/2024). Pós-Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). 1º lugar em Direito no vestibular 1º/2002 da UnB. Advogado, parecerista e árbitro. Professor de Direito Civil e de Direito Notarial e Registral. Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Ex-assessor de ministro STJ. Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Civil Contemporâneo (RDCC). Fundador do IBDCont (Instituto Brasileiro de Direito Contratual). Membro da ABDC (Academia Brasileira de Direito Civil), IBDfam (Instituto Brasileiro de Direito de Família),do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário) e do IBERC.

Flauzilino Araújo dos Santos, 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de SP e presidente do Operador do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico (ONR). Diretor de Tecnologia do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB. Licenciado em Estudos Sociais, bacharelado em Direito e em Teologia e mestrado em Direito Civil. Autor de livros e de artigos de Direito publicados em revistas especializadas. Integra, atualmente, a Comissão de Concurso Público para outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas, realizado pelo CNJ.

Hercules Alexandre da Costa Benício, doutor e mestre em Direito pela Universidade de Brasília. É tabelião titular do Cartório do 1º Ofício do Núcleo Bandeirante/DF; presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção do Distrito Federal e acadêmico ocupante da Cadeira nº 12 da Academia Notarial Brasileira. Foi Procurador da Fazenda Nacional com atuação no Distrito Federal.

Ivan Jacopetti do Lago, diretor de Relações Internacionais e Coordenador Editorial do IRIB. Bacharel, mestre e doutor em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pós-graduado pelo CeNOR - Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra e pela Universidade Autónoma de Madri (Cadri 2015). 4º Oficial de Registro de Imóveis de SP.

Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Mestre em Direito pela EPD - Escola Paulista de Direito. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Professor de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios.

Sérgio Jacomino é presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR - Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra e Quinto Oficial de Registro de Imóveis da cidade de SP.