Migalhas Notariais e Registrais

Estremação de imóvel rural abaixo da fração mínima de parcelamento: O impasse da regularização fundiária

A coluna aborda como a fração mínima de parcelamento, criada para proteger latifúndios, hoje dificulta a regularização de imóveis rurais menores.

1/10/2025

Introdução

“A própria arquitetura da casa-grande expressaria o modo de organização social e política do Brasil, o patriarcalismo... os senhores de engenho dominavam a terra, os escravos... parentes... filhos... esposa... amantes...”.1

A imagem descrita por Gilberto Freyre remete a um Brasil marcado pela concentração fundiária, em que a posse da terra era sinônimo de poder e de estrutura social. Décadas depois, já sob o contexto da reforma agrária dos anos 70, a fração mínima de parcelamento (FMP) foi instituída como mecanismo jurídico com a pretensão de evitar a pulverização das glebas e assegurar viabilidade econômica mínima às propriedades rurais.

No entanto, se a FMP nasceu sob o signo de um modelo agrário que via no latifúndio e na grande extensão a única forma de produtividade, hoje esse pressuposto se mostra cada vez mais questionável. Estudos recentes demonstram que minifúndios, quando manejados com técnicas intensivas e diversificação, podem alcançar alta produtividade por hectare, invertendo a lógica que justificava a regra. Nesse cenário, a FMP, antes pensada como instrumento de racionalização fundiária, transforma-se em verdadeiro entrave à regularização e à dinamização do espaço rural, especialmente em situações específicas como a estremação de imóveis.

A estremação, por sua vez, é instrumento de regularização fundiária que permite a dissolução parcial de um condomínio geral pro diviso, desde que cumpridos alguns requisitos. Trata-se de instrumento que não cria um imóvel, apenas reconhece juridicamente uma realidade fática pré-existente e permite sua regularização. É justamente neste ponto que surge a controvérsia central: como compatibilizar a estremação de imóveis rurais com a regra da fração mínima de parcelamento? A indagação ganha relevo quando se está diante de áreas inferiores à FMP, nas quais a aplicação literal da norma pode inviabilizar a regularização, perpetuando a situação de irregularidade fundiária.

É neste ponto que esse artigo assume uma dupla tarefa: (i) apresentar exceções legais à aplicação da FMP no contexto da estremação; (ii) questionar, à luz da realidade contemporânea, a própria pertinência da regra da FMP como instrumento jurídico. Trata-se de um artigo, ao mesmo tempo, prático e crítico.

Leia a coluna na íntegra.

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1 Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre.

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Coordenação

Carlos E. Elias de Oliveira é Membro da Comissão de Reforma do Código Civil (Senado Federal, 2023/2024). Pós-Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). 1º lugar em Direito no vestibular 1º/2002 da UnB. Advogado, parecerista e árbitro. Professor de Direito Civil e de Direito Notarial e Registral. Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Ex-assessor de ministro STJ. Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Civil Contemporâneo (RDCC). Fundador do IBDCont (Instituto Brasileiro de Direito Contratual). Membro da ABDC (Academia Brasileira de Direito Civil), IBDfam (Instituto Brasileiro de Direito de Família),do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário) e do IBERC.

Flauzilino Araújo dos Santos, 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de SP e presidente do Operador do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico (ONR). Diretor de Tecnologia do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB. Licenciado em Estudos Sociais, bacharelado em Direito e em Teologia e mestrado em Direito Civil. Autor de livros e de artigos de Direito publicados em revistas especializadas. Integra, atualmente, a Comissão de Concurso Público para outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas, realizado pelo CNJ.

Hercules Alexandre da Costa Benício, doutor e mestre em Direito pela Universidade de Brasília. É tabelião titular do Cartório do 1º Ofício do Núcleo Bandeirante/DF; presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção do Distrito Federal e acadêmico ocupante da Cadeira nº 12 da Academia Notarial Brasileira. Foi Procurador da Fazenda Nacional com atuação no Distrito Federal.

Ivan Jacopetti do Lago, diretor de Relações Internacionais e Coordenador Editorial do IRIB. Bacharel, mestre e doutor em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pós-graduado pelo CeNOR - Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra e pela Universidade Autónoma de Madri (Cadri 2015). 4º Oficial de Registro de Imóveis de SP.

Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Mestre em Direito pela EPD - Escola Paulista de Direito. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Professor de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios.

Sérgio Jacomino é presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR - Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra e Quinto Oficial de Registro de Imóveis da cidade de SP.