No dinâmico panorama tributário brasileiro, a recente lei 15.270/25 parte de uma reforma fiscal que busca maior equidade nas contas públicas, porém tem gerado controvérsias ao alterar regras para a tributação de lucros e dividendos.
A norma institui alíquota de 10% de IRRF - Imposto de Renda Retido na Fonte sobre valores remetidos ao exterior a partir de 2026, restringindo a isenção histórica prevista nas leis 9.249/95 e 9.250/95. Essa medida gera uma antecipação de tributo que pode ter caráter definitivo ou não, a depender do caso.
Além disso, para residentes brasileiros (apenas há tributação para a pessoa física), há tetos como R$ 50 mil mensais para isenção, mas remessas internacionais enfrentam restrições mais severas, sendo tributadas quase que indistintamente.
Ocorre que a nova legislação apresenta duas frentes de grande vulnerabilidade jurídica. A primeira, de ordem prática, tem gerado insegurança e preocupação, pois impõe condições bastante restritivas para a manutenção da isenção sobre os lucros e dividendos apurados até o ano-calendário de 2025, comprometendo a segurança jurídica e a própria lógica do direito societário e contábil brasileiro.
A intenção por trás dessas salvaguardas era, aparentemente, proteger direitos adquiridos e o princípio da irretroatividade tributária. No entanto, a forma como esses requisitos foram concebidos gerou uma verdadeira armadilha para as empresas, que estão em uma corrida contra o tempo para realizar procedimentos ad hoc e sem previsão específica na lei societária.
A lei das S.A.s (lei 6.404/76) e o Código Civil (art. 1.078) são claros que a aprovação de contas e deliberação sobre a distribuição de lucros deve ocorrer nos quatro primeiros meses seguintes ao término do exercício social. Ou seja, para o exercício de 2025, o prazo legal se estende até 30 de abril de 2026.
É contraditório e beira o inviável, salvo por meio de estimativas incertas, que uma empresa aprove a distribuição de lucros de um exercício (2025) antes mesmo que este se encerre, e antes que seus resultados sejam integralmente apurados, auditados e consolidados.
A deliberação prematura sobre os lucros apurados até dezembro de 2025, motivada pela necessidade de conformidade com a nova legislação fiscal, pode acarretar consequências adversas para a empresa. A antecipação de balanços pode não apenas gerar dificuldades operacionais e insegurança jurídica, devido a posteriores - e bastante possíveis - retificações e ajustes, mas também impactar negativamente o patrimônio líquido.
Além disso, a exigência de despender caixa para a distribuição forçada de lucros limita a capacidade de crescimento e de investimento, uma vez que as reservas da empresa seriam utilizadas para cumprir uma obrigação legal em vez de serem reinvestidas em suas próprias atividades.
O Poder Judiciário tem sido bastante compreensivo e afastado as exigências absurdas, em virtude do risco de danos irreparáveis, de modo que seja considerada válida, para fins da manutenção da isenção tributária, a aprovação realizada nos prazos e procedimentos estabelecidos pela legislação societária.
Para além dessa discussão, o segundo ponto a ser questionado desta legislação (lei 15.270/25), que possui efeito mais abrangente, reside na possível seletividade da tributação sobre remessas ao exterior, o que pode desequilibrar o tratamento entre contribuintes nacionais e estrangeiros, uma vez que a isenção se mantém para as distribuições de lucros/dividendos para pessoas jurídicas brasileiras, mas não para pessoas jurídicas situadas no exterior.
Os tratados contra a dupla tributação celebrados pelo Brasil são alinhados ao modelo da OCDE, de modo que contém cláusulas visando evitar a discriminação em situações específicas, como entre nacionais e pessoas (físicas ou jurídicas) no exterior). Trata-se de uma questão também de tratamento isonômico com relação ao capital estrangeiro e nacional, em potencial violação ao art. 150, II, da Constituição Federal.
Ora, a lei 15.270/25 colide com princípios constitucionais como a isonomia e a capacidade contributiva, tratando de forma desigual operações nacionais e internacionais. Tratados contra a dupla tributação proíbem ônus adicionais indevidos para estrangeiros (discriminação), e precedentes judiciais sugerem que exigências desiguais podem ser afastadas.
Essa tributação pode afetar o investimento estrangeiro direto, que caminha para que 2025 seja efetivamente um dos melhores resultados da série histórica do Banco Central do Brasil.
Setores com remessas regulares ao exterior, como serviços e tecnologia, enfrentam riscos de menor competitividade, diante do aumento da tributação nas remessas destinadas ao exterior.
Globalmente, o Brasil vai contra tendências de harmonização fiscal da OCDE, que visa combater a evasão fiscal por parte de grandes corporações e garantir que os lucros sejam tributados onde as atividades econômicas realmente ocorrem.
Nesse contexto, a edição da lei 15.270/25 pode desencorajar capitais estrangeiros que não possam compensar os prejuízos dela decorrentes, bem como reorganizar estruturas operacionais para mitigar esses efeitos.
A judicialização preventiva surge como estratégia viável para proteger interesses, principalmente em um contexto de incertezas normativas, em especial porque o equilíbrio entre arrecadação e segurança jurídica torna-se cada vez mais relevante para que se defina a atratividade do país, para fins de investimentos.