A 2ª câmara de Direito Privado do TJ/MT decidiu que grãos de soja dados em garantia em operação de barter podem ser penhorados, mesmo que a empresa devedora esteja em processo de recuperação judicial.
O colegiado autorizou o prosseguimento de execução movida por uma credora com base em uma CPR — cédula de produto rural com liquidação física, modalidade em que o pagamento se dá com a entrega dos produtos agrícolas.
Entenda o caso
A CPR é um título de crédito criado pela lei 8.929/94, utilizado principalmente no setor do agronegócio. Ela representa uma promessa de entrega futura de produtos agropecuários, como soja ou milho, e pode ter liquidação física (com entrega do bem) ou financeira (pagamento em dinheiro equivalente).
No caso julgado, a CPR estava vinculada a uma operação de barter, modelo contratual em que o produtor rural recebe insumos agrícolas (como sementes, fertilizantes e defensivos) e, em contrapartida, compromete-se a entregar parte da colheita futura. Trata-se de uma forma de financiamento bastante comum no campo, especialmente entre pequenos e médios produtores.
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Bem não essencial
O juízo de 1º grau suspendeu a execução sob o argumento de que os produtos agrícolas seriam indispensáveis à continuidade das atividades da empresa rural. No entanto, a relatora do caso, desembargadora Marilsen Andrade Addario, destacou que a proteção da recuperação judicial não se aplica aos grãos de soja garantidores da CPR.
Segundo a magistrada, “os produtos agrícolas, tais como soja e milho, não podem ser enquadrados como bens de capital e muito menos como essenciais à atividade empresarial, portanto, não incidindo sobre eles a norma contida na parte final do § 3º do art. 49 da lei 11.101/05”.
Natureza extraconcursal do crédito
A relatora também ressaltou que o crédito decorrente da CPR tem natureza extraconcursal, nos termos do art. 11 da lei 8.929/94, com a redação dada pela lei 14.112/20, o qual dispõe:
“Não se sujeitarão aos efeitos da recuperação judicial os créditos e as garantias cedulares vinculados à CPR com liquidação física, em caso de antecipação parcial ou integral do preço, ou, ainda, representativa de operação de troca por insumos (barter), subsistindo ao credor o direito à restituição de tais bens que se encontrarem em poder do emitente da cédula ou de qualquer terceiro, salvo motivo de caso fortuito ou força maior que comprovadamente impeça o cumprimento parcial ou total da entrega do produto.”
Risco de alienação dos grãos
Por fim, a desembargadora alertou para o risco de que os grãos sejam vendidos a terceiros durante o curso da recuperação judicial, o que poderia inviabilizar a satisfação da dívida.
“Caso os grãos objeto do título não sejam arrestados, estes, muito provavelmente, serão alienados a terceiros pelos recuperandos, em virtude da dinâmica desses bens.”
Com esses fundamentos, a 2ª câmara de Direito Privado do TJ/MT deu provimento ao recurso da credora para permitir a penhora e continuidade da execução, afastando os efeitos protetivos da recuperação judicial sobre os grãos de soja.
Informações: TJ/MT.