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3ª seção do STJ anula condenação de réu que não foi interrogado

Corte, por maioria, reconheceu nulidade por violação ao direito de autodefesa.

6/11/2025

A 3ª seção do STJ julgou procedente revisão criminal ajuizada por condenado a 10 anos e 6 meses de reclusão, em regime fechado, pelos crimes de peculato doloso, art. 312 do CP, e uso de documento falso, art. 304 do CP.

O colegiado acompanhou a divergência aberta pelo ministro revisor Joel Ilan Paciornik, reconhecendo que o réu foi condenado sem ser interrogado, em violação ao direito de autodefesa e às garantias processuais do acusado.

A defesa, representada pelo advogado Gustavo Badaró, sustentou que o acusado nunca foi ouvido no processo, embora tenha requerido o interrogatório por três vezes entre 2007 e 2012.

Os pedidos foram indeferidos sob o argumento de que, por ter sido revel no início da ação penal, o réu teria perdido o direito de ser interrogado, o que violaria os arts. 185 e 564, III, “e”, do CPP.

3ª seção do STJ reconhece nulidade por falta de interrogatório e anula condenação de réu.(Imagem: Lucas Pricken/STJ)

O relator, ministro Antonio Saldanha Palheiro, votou pela improcedência da revisão criminal, afirmando que o STJ não tem competência para analisar revisão quando o ponto questionado não foi objeto de decisão no recurso especial julgado pela Corte.

Destacou que, embora a revisão criminal seja medida excepcional, é cabível apenas nas hipóteses taxativamente previstas no art. 621 do CPP, dispositivo que visa proteger a coisa julgada e a segurança jurídica.

Saldanha observou que o acórdão impugnado está em consonância com a jurisprudência do STJ, segundo a qual não há nulidade pela ausência de interrogatório de réu revel, quando este não requer o ato na primeira oportunidade após o comparecimento aos autos e não demonstra prejuízo efetivo.

"O requerente limita-se a reiterar tese de nulidade por ausência de interrogatório, indicando contrariedade aos mesmos dispositivos já analisados e sob idênticos fundamentos já rechaçados na decisão anterior.(...) O inconformismo da defesa busca rediscutir o mérito da condenação, o que não é possível pela via da revisão criminal. Apenas a ofensa manifesta ao texto legal permite a revisão da sentença, protegida pelo trânsito julgado, diante da necessidade de ponderar as garantias constitucionais."

Nulidade por violação ao direito de defesa

O ministro Joel Ilan Paciornik, revisor, abriu divergência ao afirmar que houve equívoco na compreensão dos fatos no julgamento anterior do STJ e destacou que a defesa requereu tempestivamente o interrogatório do réu antes do encerramento da instrução processual, após a entrada em vigor da lei 11.719/08, que alterou a ordem dos atos processuais.

Segundo o revisor, o indeferimento do pedido, sob fundamento da revelia, suprimiu o direito de autodefesa, configurando nulidade absoluta. Citou precedentes do STF e do STJ segundo os quais a ausência de interrogatório do réu presente em audiência viola o art. 564, III, “e”, do CPP, sendo causa de nulidade processual.

Para o ministro, impedir que o acusado fosse ouvido em juízo comprometeu o exercício pleno da defesa e o próprio devido processo legal.

Com base nesses fundamentos, julgou procedente a revisão criminal para rescindir o acórdão anterior e anular o processo a partir da decisão que indeferiu o interrogatório.

Ato essencial

Os demais ministros da 3ª seção acompanharam integralmente o voto divergente.

O ministro Rogério Schietti Cruz reforçou o entendimento de que o interrogatório é ato essencial de autodefesa e direito fundamental do acusado. Para ele, o caso demonstrou erro material na origem do processo.

Schietti destacou que, ainda que a defesa não tivesse reiterado formalmente o pedido antes das alegações finais, o dever de ouvir o acusado subsiste como obrigação do magistrado.

Mesmo que não houvesse um requerimento expresso anterior às alegações finais, ainda assim, antes da sentença, é dever do juiz dar oportunidade àquele que vai ser julgado de ser ouvido. É o direito mais sagrado do acusado de ter o seu dia perante a corte, de ser ouvido na sua autodefesa e poder, com isso, dar oportunidade ao julgador de ouvir a parte contrária.”

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