1ª turma do STF tem 2 votos a 1 para condenar Bolsonaro e aliados
Ministro Fux divergiu dos pares Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
Da Redação
quarta-feira, 10 de setembro de 2025
Atualizado às 22:48
Nesta quarta-feira, 10, a 1ª turma do STF encerrou o quarto dia de julgamento da chamada "trama golpista" envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados.
O placar está em 2 a 1: votaram pela condenação o relator, ministro Alexandre de Moraes, e o ministro Flávio Dino; já o ministro Luiz Fux se posicionou pela absolvição da maior parte dos réus.
Restam votar a ministra Cármen Lúcia e o presidente da turma, ministro Cristiano Zanin.
O julgamento prossegue nesta quinta-feira, 11, com sessões às 9h e às 14h, e na sexta-feira, 12, nos mesmos horários.
Voto de Moraes
O relator, ministro Alexandre de Moraes rejeitou todas as preliminares e votou pela condenação integral dos acusados.
Para S. Exa., Bolsonaro chefiou estrutura hierarquizada que usou órgãos públicos para desacreditar eleições, ameaçar o Judiciário e preparar a tomada do poder.
Discursos, reuniões, encontro com embaixadores e a "minuta do golpe" demonstraram tentativa concreta de instaurar regime de exceção.
Voto de Dino
Ministro Flávio Dino acompanhou o relator na condenação, mas diferenciou a gravidade das condutas.
Reconheceu Bolsonaro e Braga Netto como centrais, mas sugeriu atenuar penas de Ramagem, Heleno e Nogueira.
Ressaltou que os atos ultrapassaram a preparação e avançaram para a execução, com violência como elemento central da trama golpista.
Voto de Fux
Nesta quarta-feira, 10, Fux sustentou três preliminares: incompetência do STF (e, especificamente, da 1ª turma) para julgar o caso após a perda de foro e cerceamento de defesa, diante da entrega tardia e caótica de 70 TB de provas - o que, para ele, anula os atos desde o recebimento da denúncia.
Validou a delação de Mauro Cid (com benefícios) e determinou suspender a ação contra Alexandre Ramagem quanto a organização criminosa.
No mérito, fixou premissas estritas de legalidade e tipicidade: rejeitou a existência de organização criminosa (faltaram estrutura estável e crimes indeterminados), tratou o dano como subsidiário e reforçou que abolição do Estado de Direito (359-L) e golpe de Estado (359-M) exigem violência/ato executório e dolo inequívoco.
Quanto aos réus, Fux absolveu integralmente Bolsonaro (sem dolo, nexo ou atos executórios; sem vínculo com 8/1) e absolveu Almir Garnier de todas as imputações.
Quanto a Mauro Cid, absolveu-o por organização criminosa e pelos danos, mas condenou por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito.
Quem são os réus?
No banco dos réus da 1ª turma estão figuras centrais do governo Bolsonaro.
Respondem pelo plano de ruptura institucional:
- o ex-presidente da República Jair Bolsonaro;
- o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid;
- o deputado Alexandre Ramagem;
- o almirante Almir Garnier;
- o general Anderson Torres,
- o general Augusto Heleno
- o general Paulo Sérgio Nogueira e
- o general Walter Braga Netto.
Crimes e penas
A acusação atribui aos réus, entre outros, os crimes de:
- Tentativa de golpe de Estado (art. 359-M, CP; 4-12 anos);
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L, CP; 4-8 anos);
- Organização criminosa armada (lei 12.850/13; 3-8 anos, com majorantes e aumento por liderança);
- Dano qualificado à União (art. 163, parágrafo único, III, CP; 6 meses-3 anos); e
- Deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I, lei 9.605/98; 1-3 anos).
Em tese, a soma das penas pode ultrapassar os 40 anos, mas, pela legislação brasileira, o tempo máximo de cumprimento efetivo é de 40 anos.
Além disso, eventual condenação não implica prisão imediata para execução definitiva da pena. Em 2019, o STF consolidou o entendimento de que a pena só pode começar a ser cumprida após o trânsito em julgado da decisão.
Da investigação ao julgamento
A investigação que resultou na denúncia contra Jair Bolsonaro e aliados começou em 2022 e foi concluída em novembro de 2024, quando a PF encerrou o inquérito que apurava a atuação de uma organização criminosa voltada a manter o então presidente no poder à revelia do resultado eleitoral.
No relatório final, fruto das operações Tempus Veritatis e Contragolpe, a PF indiciou 37 pessoas, incluindo Bolsonaro, generais de alta patente e dirigentes partidários.
O documento apontou crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe e organização criminosa, detalhando seis núcleos de atuação: desinformação, incitação de militares, jurídico, operacional de apoio, inteligência paralela e medidas coercitivas.
Pouco depois, a operação Contragolpe levou à prisão de cinco investigados por um plano que incluía, além da ruptura institucional, homicídios do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes.
Com base nessas apurações, a Procuradoria-Geral da República apresentou, em fevereiro de 2025, denúncia formal (Pet 12.100) contra Bolsonaro e outros 32 acusados.
O grupo foi imputado por organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
A PGR atribuiu a Bolsonaro o papel de liderança da trama, sustentando que ele comandou ações para desacreditar o processo eleitoral, pressionar as Forças Armadas e preparar decretos que poderiam servir de base para uma ruptura institucional.
Em março de 2025, a 1ª turma do STF, por unanimidade, recebeu a denúncia e tornou réus Bolsonaro e outros sete integrantes do chamado "Núcleo 1" da acusação, rejeitando todas as preliminares levantadas pelas defesas, como alegações de suspeição dos ministros, incompetência da Corte e nulidades relacionadas à colaboração premiada de Mauro Cid.
Na etapa seguinte, em julho de 2025, a PGR apresentou alegações finais em peça de 517 páginas, pedindo a condenação de todos os réus pelos crimes narrados na denúncia. O órgão classificou Bolsonaro como líder da organização criminosa e principal articulador das ações golpistas.
Veja a linha do tempo:
Um ponto específico diz respeito ao deputado Alexandre Ramagem.
Em razão do foro parlamentar, a 1ª turma decidiu suspender o processo apenas quanto aos crimes patrimoniais a ele atribuídos, relacionados a fatos posteriores à sua diplomação.
Assim, ele segue respondendo por organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
- Processo: AP 2.668
Preso por outro processo
Importante destacar que a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro não está ligada à ação penal julgada pela 1ª turma.
Ela foi determinada por Alexandre de Moraes no Inq. 4.995 e na Pet 14.129, após descumprimento de cautelares.
Segundo o ministro, o ex-presidente utilizou aliados e familiares para difundir mensagens que configurariam coação ao STF e obstrução da Justiça.
Diante disso, as restrições foram convertidas em prisão domiciliar integral, com medidas adicionais, como proibição de visitas e de uso de celulares.
A decisão foi confirmada pela maioria da 1ª turma em plenário virtual.