TRT-3 vê discriminação em dispensa de autista que pediu adaptações
Ele foi dispensado sem justa causa um mês após apresentar laudo médico com recomendações de inclusão.
Da Redação
sexta-feira, 19 de setembro de 2025
Atualizado às 11:42
Um trabalhador autista foi dispensado sem justa causa um mês após apresentar laudo médico com recomendações de inclusão. A Justiça do Trabalho reconheceu a dispensa como discriminatória. Na 31ª vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, a juíza do Trabalho Haydée Priscila Pinto Coelho de Sant'Ana condenou a empresa ao pagamento de R$ 25 mil por danos morais. Em grau de recurso, a 2ª turma do TRT da 3ª região manteve a condenação, mas reduziu o valor para R$ 10 mil, considerando essa quantia mais compatível com a gravidade do caso e a capacidade econômica da empresa.
O trabalhador, elogiado por colegas e utilizado em campanhas internas como símbolo de diversidade, apresentou laudo médico recomendando adaptações simples: espaço de trabalho mais calmo, iluminação suave, cores neutras, fones de ouvido para reduzir ruídos, softwares de produtividade, cadeira ergonômica adequada, pausas regulares em local tranquilo e acompanhamento de mentor para facilitar a interação social. Segundo a magistrada de 1º grau, eram medidas de baixa complexidade, necessárias para garantir bem-estar e produtividade.
A empresa providenciou apenas ajustes isolados, como a troca da cadeira e fornecimento de suporte para notebook, além de oferecer trabalho remoto, alternativa não solicitada pelo empregado nem indicada pelo médico. Pouco depois, o trabalhador foi dispensado sob alegação de reestruturação organizacional, sem provas concretas desse processo.
Testemunha do setor de RH confirmou que o laudo médico foi encaminhado à medicina do trabalho, mas não resultou em providências. Relatou também que a dispensa ocorreu sem análise do setor jurídico. A juíza destacou a omissão da empresa, inclusive nas respostas automáticas enviadas ao trabalhador quando ele buscou esclarecimentos sobre sua demissão.
O psiquiatra responsável pelo laudo explicou que o TEA - Transtorno do Espectro Autista pode afetar a interação social, a comunicação e o comportamento, reforçando a importância de ajustes no ambiente de trabalho. O trabalhador havia ressaltado, em depoimento para campanha interna de inclusão, o papel fundamental do convívio com colegas no desenvolvimento de suas habilidades sociais. Para a magistrada, a oferta de home office, desconectada das recomendações médicas, configurou exclusão sutil.
Em outra fala, ele destacou a dificuldade de reconhecimento do nível 1 do espectro, mencionando o alto índice de desemprego entre autistas e os preconceitos que ainda enfrentam.
A juíza citou a lei 12.764/12, que reconhece a pessoa com TEA como pessoa com deficiência, a Constituição Federal, o Estatuto da Pessoa com Deficiência e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Para ela, a recusa de adaptações razoáveis caracteriza ato discriminatório. A decisão também se apoiou na Súmula 443 do TST, que presume discriminatória a dispensa de trabalhadores com condições que envolvem estigma.
Na sentença, a indenização foi fixada em R$ 25 mil. A empresa recorreu para tentar reduzir o valor ou afastar a condenação, enquanto o trabalhador pleiteou majoração. A 2ª turma do TRT-3, sob relatoria da desembargadora Maristela Íris da Silva Malheiros, manteve o reconhecimento de que a dispensa foi discriminatória, mas reduziu a indenização para R$ 10 mil. O colegiado entendeu que esse valor é proporcional à gravidade do caso e às condições da empresa, alinhado a precedentes do Tribunal.
A relatora destacou que o trabalhador ocupava vaga destinada a pessoas com deficiência e que a dispensa ocorreu somente após a solicitação formal de adaptações. Ressaltou também que o autismo, embora não seja doença, ainda sofre forte estigma social, o que torna a dispensa discriminatória quando não há justificativas válidas.
- Processo: 0010196-10.2025.5.03.0110
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