Marizalhas

Aonde está a chave?

O texto trata das memórias e vivências de quando era estudante universitário, durante período acadêmico em São Paulo.

16/6/2025

O nosso mundo acadêmico não se limitava ao velho convento da Monte Alegre. Ele se estendia e expandia por várias regiões e diversos locais de São Paulo. Isso vale dizer que as nossas atividades eram múltiplas, não se limitavam ao estudo, aliás, esse para muitos não era a principal ocupação. Dentre os quais eu mesmo.

Frequentamos vários logradouros, dentre os quais bares, restaurantes, casas de shows, aquelas para se dançar, inclusive gafieiras, ainda existentes, campos de futebol, ginásios de esporte e tantos outros.

Uma vez por ano nos concentrávamos nos jogos, várias modalidades, disputados entre os Centro Acadêmico 22 de Acadêmico, da PUC e o 11 de Agosto da São Francisco. Era a 33 de agosto. Nós nos referíamos uns aos outros como nossos coirmãos. Nesses jogos, no entanto, a irmandade tinha os seus laços desfeitos. Eles se rompiam, mas logo eram reatados, após os jogos, na mesa de um bar.

Durante os jogos o pau comia solto. Eu, logo na minha primeira participação em uma 33, interferi com coragem e nenhuma agilidade.

Foi durante uma partida de futebol de salão, realizada no Ginásio do Pacaembu. Pulei, com dificuldade, a grade para socorrer um colega que estava sendo agredido. Quando tentava enfrentar um "adversário" realizei a proeza de machucar os dois pés. Um pé do meu sapato voou e desapareceu. Devo ter tomado um divertido e ridículo tombo.

Em uma outra ocasião, após o término de um jogo, um colega e eu, discutíamos com dois colegas do Largo. Eles insistiam para irmos brigar fora do ginásio. Meu amigo concordava. Eu me opunha com veemência, dizendo "vamos brigar aqui mesmo, é menos ariscado e mais saudável". Eu vira na cintura de um deles, por baixo da camisa, um pequeno revólver, fruto da minha recusa em sair.

Esse entreveiro, como tantos outros, terminou em chopes, com os quatro se confraternizando.  

Em uma de nossas viagens, essa a Araraquara, para o noivado de um colega nos hospedamos em um hotel muito antigo, creio que um dos primeiros da tradicional e importante cidade. Como imagino, os hotéis do início do século passado e de épocas anteriores não possuíam banheiros nos quartos. Existia apenas um, localizado no fim do corredor de cada andar. Todos os hóspedes deveriam utilizar-se do único existente. Imagina-se o alvoroço causado, a correria e aflição nas "“horas de aperto"!!!

Pois bem, a nossa precária situação financeira nos fez hospedarmos no vetusto hotel araraquarense. E, o mais grave, estávamos em seis e todos ficamos no mesmo quarto. Eram duas as camas e um vão de chão entre elas. Dois em cada uma e dois no "confortável" vão. Fui um dos agraciados com o entre camas. Eu e o companheiro do chão dormimos - força de expressão – com os pés voltados para os respectivos rostos. Não sei se foram os pés nada amigos do amigo ou algum outro fator, a verdade é que espirrei a noite toda, não deixando os colegas dormirem.

Nós não poderíamos deixar de marcar a nossa presença no hotel. Pensamos em dar um pendura. Tememos, no entanto, uma pronta ação policial. Resolvemos adotar uma conduta que mostrasse o nosso inconformismo pela noite não dormida: fomos embora e levamos a chave do único banheiro do andar. Creio que a fila na sua porta ficou extensa, causando óbvio desconforto para os necessitados.  Hoje, pensando bem, não há hotel que acolha com conforto seis em um mesmo quarto.

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Colunista

Antonio Cláudio Mariz de Oliveira é advogado.