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Política, Direito & Economia NA REAL

Enfoque político, jurídico e econômico.

Francisco Petros
quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 125

Não é para escrever ainda I Não é apenas de escaramuças ministeriais que estão vivendo os partidos aliados em Brasília. Além da formação do novo governo, há também as disputas por influência sobre o governo e ocupação de postos no Legislativo. Como no caso do ministério onde quase tudo é pura especulação, as intrigas e o diversionismo correm soltos, nem tudo o que é dito deve ser escrito e/ou deve ser tomado pelo valor de face. Um exercício para entender o futuro governo e, como se diz em Brasília, a nova "correlação de forças" do governismo, é tentar separar os diamantes dos falsos brilhantes. Não é para escrever ainda II Com exemplo, veja-se o caso da mais recente amizade política em Brasília - a do PT com o PMDB. Depois da primeira escaramuça, quando o PMDB protestou - e levou - por estar alijado do comando do grupo de transição, há uma lua de mel entre as siglas. José Eduardo Dutra e Michel Temer já são os mais novos devotados "amiguinhos de infância" e se entendem até por música. O que um diz, o outro assina. Dizem que vão se entender até pelos cargos na mesa da Câmara e do Senado. Nem tudo é bem assim. Os dois estão fazendo um pacto de conveniência contra as investidas de outros aliados. Partidos como o PSB, o PP e até o PC do B reivindicam mais espaços (leia-se, mais cargos), no governo Dilma. Como a presidente não tem mais o que inventar, exceto as estatais que vão surgir - a do pré-sal, a do trem bala -, "ceder mais" significa tirar de quem já tem muito - o PT e o PMDB. Do mesmo modo, não se deve assumir : (i) que estão todos interessados na verdade em colaborar com o novo governo, (ii) que a questão de cargos é uma consequência, (iii) que o PMDB só quer manter o que já tem, (iv) que não foram Lula e Dilma que induziram a discussão sobre a CPMF, (v) que vem por aí uma política de austeridade, (vi) que o principal critério para escolha da equipe será o do mérito e não as acomodações políticas, (vii) que Lula não está indicando ninguém a Dilma... e por aí vai... Voz autorizada ? O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, tido como nota certa também do ministério da Dilma, no mesmo cargo ou em outro posto nobre, tem se revelado o porta-voz das linhas econômicas do futuro governo. Já anunciou que o governo não aceita valor maior para o salário mínimo do que R$ 540, que um ajuste fiscal está em andamento, que a meta de inflação para 2013 será reduzida a 4% (até 2012 seria de 4,5%), que o superávit primário de 2011 será de no mínimo 3,3% do PIB, que até o fim de 2014 o juro brasileiro será de 2% e o déficit nominal será zerado e muito mais. Tudo bem. Acontece que muitas desses propósitos não combinam, por exemplo, com a aventura do trem bala, com as generosidades do BNDES (a última na MP 511), com as farras que pintam no horizonte para a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016. Casos clínicos (e geriátricos) O PSDB e o DEM, talvez até o PPS, estão necessitando urgentemente de boas sessões de psicanálise política. Estão sem rumo. Estão órfãos, sem propostas consistentes e sem projetos objetivos. Se o grupo de Marina Silva não se dispersar - fala-se menos do PV e mais de atores sociais e econômicos que a ela se juntaram - e ampliar seu leque de preocupações, tem chance de ocupar um bom espaço político no futuro. A oposição está envelhecida e o novo governo, pelas primeiras amostras, também já vai "nascer velho" - nos nomes e na direção das políticas. Ministeriômetro - Capítulo III Foram poucas as alterações na relação da coluna de terça-feira. Tivemos apenas acréscimos. Todos os citados ou auto-citados resistem bravamente ao processo de fritura geral. Educação - Newton Lima, Pedro WilsonCultura - Antonio Grassi, Ângelo OsvaldoComunicações - Moreira FrancoIntegração Nacional - Eunicio Oliveira, José Sergio GabrielliCidades - Jose Filippi Junior, Luiz Fernando PezãoSaúde - Sergio CortesAvulsos - Beto Albuquerque, Olívio Dutra Lulômetro Também um acréscimo : - A vaga deixada por Nestor Kirchner na Unasul. Brigas no éter Após um período de relativo com entendimento, voltaram a ficar tensas as relações entre o governo e a Anatel, hoje apenas um braço do Executivo, e o setor de telecomunicações. As empresas se queixam basicamente da preponderância quase absoluta da ressuscitada Telebrás no Plano Nacional de Banda Larga. Elas não consideram um plano de fato, mas um enunciado de intenções e das regras para o leilão da Banda H para celular, no qual as quatro grandes de hoje - Oi, Vivo, Tim e Claro - não podem concorrer na primeira rodada e já entraram até na Justiça. Vem mais queixa por aí. Dezembro quente Véspera das festas de fim de ano, o Congresso quase desacelerando e o governo em fim de mandato. Época, portanto, de mais prudência em grandes e polêmicas questões públicas. Não é, porém, o que a turma do presidente Lula quer : dia 14/12, se a Justiça deixar, correrá o leilão da Banda H. Dois dias depois, 16, a concorrência de R$ 34 bilhões do trem bala. Recursos panamericanos A injeção de R$ 2,5 bilhões de recursos no Banco Panamericano em função das possíveis fraudes contábeis ocorridas antes do processo de aquisição da instituição pela CEF demonstra, mais uma vez, que o controle acionário de empresas financeiras por parte de grupos não-financeiros é altamente problemático. Grandes grupos podem ser "engolidos" por subsidiárias financeiras aparentemente menos importantes do ponto de vista patrimonial. Radar NA REAL 9/11/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3737 queda estável - REAL 1,7095 estável estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 71.679,47 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.213,40 estável/alta estável - NASDAQ 2.562,98 estável/alta estável (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Inflação em alta Muito embora a elevação dos índices de inflação reflita aumentos significativos de preços agrícolas e de energia (etanol, sobretudo), aumenta a percepção de que a inflação está se espalhando pelos outros setores econômicos. O BC sabe disto, mas nenhuma alteração na taxa básica de juros é esperada para este ano. O custo ficará para o próximo mandato do presidente do BC o qual poderá ou não ser exercido por Henrique Meirelles. Todavia, já se comenta a voz pequena no tal do "mercado" que em 2011 poderemos ter um cenário desagradável do ponto de vista político : inflação e juros em alta e redução da atividade econômica. Um teste inicial para a nova presidente. Fed sob ceticismo Há aqueles que acreditam que a reunião do G-20 hoje e amanhã será um marco importante para as decisões tomadas pelos EUA (e não somente pelo Fed) em relação à recompra de títulos de longo prazo do Tesouro norte-americano. A nosso ver, a decisão americana é unilateral e deve passar incólume pelas pressões externas por duas razões : (i) trata-se de uma "decisão heroica" do atual governo para se salvar de uma letargia da atividade econômica que pode durar anos e (ii) os países que compõe o grupo nada tem a oferecer em troca. O maior risco para o governo americano, porém, está no campo doméstico. Há enorme ceticismo em relação à estratégia de redução a taxa de longo prazo injetando mais liquidez. Segundo estes, incluindo os republicanos que tomaram conta do Congresso nas últimas eleições legislativas, a injeção de liquidez não derruba as taxas porque as expectativas de alta da inflação também se elevam. Isto não é uma queda de braço, mas no final a complexa e confusa discussão pode deixar o Fed pouco efetivo e crível para executar a política por ele proposta. A coisa está muito mal parada. O "mercado" espera. Lula e os anistiados A visão de Lula sobre os exilados políticos no final da década de 70, durante o regime militar, não era tão generosa quanto os recursos dispendidos pelo tesouro para indenizá-los durante o seu mandato presidencial. É o que poderá ser conhecido num novo livro sobre o presidente que sairá neste final de ano.
terça-feira, 9 de novembro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 124

Lula e Dilma: diferenças vitais Para entender o que pode mudar no governo Dilma em relação ao governo Lula, em políticas e estilo, é preciso observar algumas diferenças entre o presidente e sua sucessora. Lula é pragmático, Dilma ideológica. Lula, não é dado a grandes elucubrações, seu projeto sempre foi, no fundo, acabar com a pobreza, fazer todos os brasileiros comerem três vezes por dia. Dilma tem projetos de transformações estruturais. Formado no sindicalismo, Lula é conciliador. Dilma é catequizada na luta política - tem lado escolhido, além do sentimento de classe e do companheirismo que move Lula. Lula não tem ideias pré-concebidas, Dilma tem posições sobre tudo. Lula age, trabalha e administra na base de, digamos, uma dialética muito peculiar. Deixa haver conflitos internos no seu entorno, ausculta as reações e decida pelo que entende ser o de maior aprovação. Foi assim na vida sindical. Nas assembleias, tinha um aliado para defender cada posição - a favor da greve, contra a greve, a favor da aceitação da proposta, contra a proposta. Olhava a reação da plateia e depois optava pela que tinha tido maior aceitação. Lula e Dilma no governo No governo não foi diferente. Veja-se na economia. Enquanto teve dois nomes afinados no comando da economia - Palocci e Meirelles - tinha no Planalto, principalmente na Casa Civil, primeiro com José Dirceu e depois com Dilma, a antítese. Para lembrar : foi Dilma, com a classificação de "rudimentar", que fulminou uma proposta de Palocci de zerar o déficit nominal do setor público. Curiosamente, a mesma ideia que, dizem, ela namora agora. Depois Lula deixou o contraponto ao BC para Mantega e Luciano Coutinho. E administrou a política pendularmente entre um e outros até a crise de 2008, quando passou a prevalecer a posição Fazenda - BNDES. Dilma, anuncia-se, não aplicará a mesma dialética lulista. A equipe econômica estará submetida inteiramente a ela e não terá contrapontos - seguirá a linha nacional-desenvolvimentista que ela adota. Por isso, não deve haver mais espaço para Meirelles no BC. E Palocci corre o risco de ter de pousar no ministério da Saúde. Para o bem e para o mal, é uma mudança e tanto. Lula em evidência Lula convocou uma entrevista conjunta dele e da presidente eleita, atrasando a viagem de férias de Dilma, somente para dizer que quem vai mandar no governo Dilma será ela mesma. Inusitado se dissesse o contrário. Depois, Lula convocou rede obrigatória de televisão e rádio para saudar a saudável eleição nacional, dizer bem do futuro com Dilma e propor um desarmamento dos espíritos. Inusitado se dissesse o contrário. Como as duas aparições não trouxeram novidades, eram totalmente dispensáveis, parecem inexplicáveis. Não são, não. Basta ver os noticiários de televisão, com a presidente entrante ocupando cada vez mais espaço e o presidente que sai desaparecendo do noticiário para se compreender tudo. Lula desmistificado em livro Vem aí um livro de um jornalista com todas as credenciais para analisar o poder e suas intimidades. Trata-se de uma obra que joga elevadas taxas de realismo sobre a mitificação de Lula. Esta coluna teve acesso ao conteúdo da obra. É explosivo. G-20 sob risco Muitas análises dão conta que o G-20 está sob o risco de deixar de ser um fórum funcional para tratar das grandes questões econômicas internacionais. Não é apenas uma possibilidade, caso os EUA mantenham sua posição em relação à desvalorização do dólar no mercado internacional. É quase certeza. Por duas razões agudas : (i) não há da parte dos países emergentes, sobretudo a China comunista, nenhuma estratégia alternativa que seja implementável e que seja satisfatória para os homens de Washington ; (ii) diante da ausência de uma estratégia alternativa é muito provável que os países emergentes e os países ricos se dividam para criar as suas próprias estratégias nacionais na defesa em relação à queda do dólar norte-americano. Neste item, a China mostrará seus dentes de dragão sem se preocupar muito com os outros "companheiros" emergentes (dentre os quais o Brasil). O FMI original O governo brasileiro se orgulhou muito de, juntamente com a China, ter aumentado sua participação no órgão multilateral. Pois bem : o FMI é algo decadente e disfuncional como vai provar, mais uma vez, a adoção da recompra de títulos do tesouro norte-americano por parte do Fed, e que resultará numa desvalorização do dólar. A guerra cambial que deve vir por aí foi a razão pela qual Lord Keynes sugeriu a criação do FMI na conferência de Betton Woods, em 1944. O FMI seria uma espécie de "caixa de compensação cambial" na qual os países superavitários depositariam suas reservas e financiariam os países deficitários nas contas externas. Assim, se evitaria a guerra cambial entre eles. Pois bem : o FMI nunca foi isto porque os EUA ao constatarem que iam ganhar não somente a guerra contra os nazistas e japoneses, mas que o dólar ia ser a moeda internacional em substituição à libra. A guerra cambial está aí e o FMI não serve para nada. O Leviatã Econômico Todos os caminhos de Dilma na economia levam a um aumento da presença do Estado na economia. A CPMF é a mais visível. Mas há muito mais. As obras da Copa do Mundo devem ganhar grande estímulo nas próximas semanas e meses com a participação de governos locais e o Federal ; o BNDES se prepara para ser uma espécie de seguradora para títulos privados de longo prazo (o balcão de negócios nesta área se agrega a um volume de crédito enorme para o setor privado) ; as obras do PAC ganharão reforço estatal significativo logo no início da nova administração. Não há no Brasil nenhuma força política relevante a impedir este processo. Ao contrário : a provável volta da CPMF mostrará que a docilidade do Congresso e dos governadores - de todas as cepas políticas - com o governo Federal deve ser maior que com Lula neste início da nova administração petista. Choremos a Argentina, de novo A morte de Kirchner foi apenas mais um capítulo na atual cena trágica do país rival do Brasil no futebol. A inflação de 30% - ou mais - e os efeitos da guerra cambial lá fora são fatores suficientes para jogar a Argentina numa nova, e enorme, crise econômica. Os investimentos brasileiros naquele país aumentaram demasiadamente nos últimos anos, com a Petrobras liderando este processo. Se somarmos à crise argentina os riscos estratégicos da Venezuela chegaremos à conclusão que há aí um ponto nevrálgico para os riscos externos do Brasil, além do problema cambial no mundo. Quem se dispõe a discutir isto no Congresso Nacional ? Radar NA REAL 5/11/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3943 queda estável - REAL 1,6964 estável/queda estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 72.606,53 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.221,06 estável/alta estável - NASDAQ 2.577,34 estável/alta estável (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Começo delicado Do ponto de vista do apoio da sociedade, não dá um bom pontapé um governo que, sem discutir as questões na campanha, esquecendo-se deliberadamente delas, pode se inaugurar com a recriação da CPMF e mudanças nas regras das cadernetas de poupança. Lula e Dilma puseram para circular as notícias sobre a CPMF, usando como laranjas um grupo de governadores. Assim, o tema já frequenta os debates do grupo de transição. Uma paraestatal ? Depois de uma trégua no segundo turno, voltou às mesas decisórias em Brasília o processo de caça  - ou cassa ? - ao presidente da Vale, Roger Agnelli. O novo governo quer indicar o novo executivo da empresa, para torná-la mais cordata. Agnelli caiu em desonra depois que demitiu funcionários no auge da crise e resistiu às sugestões oficiais de investir também fortemente em siderúrgicas. Pode ser uma "reestatização" branca. Em busca de piso e teto Vai demorar algum tempo para que todas as feridas da derrota oposicionista cicatrizem. Isso se as do tucanato vierem a cicatrizar de fato. Há mágoas profundas e vaidades ainda em profusão. A disputa pela liderança no PSDB pode ser fatal. As eleições municipais já estão na rua. Para além das questões pessoais - quem será quem no novo oposicionismo - há também o desafio de saber como será esse novo oposicionismo. A oposição só sobreviverá forte e unida se for capaz de formular um projeto para o Brasil diferente do que aquilo que sendo aplicado e será continuado. Terá de mostrar porque o que ela propõe é melhor, não basta apenas criticar e dizer que pode gerir melhor. Tem de apresentar alternativa, com detalhamento e profundidade. Ingenuidade Só quem acredita em mula sem cabeça acreditou, durante a campanha presidencial, nas promessas de desoneração de impostos. Só quem convive com sacis acredita que a proposta de volta da CPMF, com codinome CSS, é uma iniciativa autônoma de governadores estaduais e não tem nenhum dedo nem de Lula nem de Dilma. Incompatibilidade Continuam sem se dar bem o ministério da Educação e o Enem, eles não se entendem embora habitem o mesmo espaço oficial. Neste fim de semana, foi a entrega de um caderno de questões incompleto e com falhas e a distribuição da folha de gabaritos com erros que alertaram sobre a falta de credibilidade do exame. Certamente, a culpa será atribuída à gráfica e não a quem deveria conferir se estava tudo certo. Em 2006, o Enem foi cancelado depois que o Estadão revelou o vazamento da prova. Em 2009, houve erro no gabarito do INEP. No início de 2010, o mesmo INEP divulgou o gabarito errado de quase mil estudantes. Em agosto de 201,0 vazaram dados sigilosos de alunos. E, no entanto, o ministro Fernando Hadad é cotado para permanecer no posto no futuro governo ou ganhar uma nova missão. É um dos queridinhos de Lula e do PT para futuras missões eleitorais em SP. Deve ser a tal de "meritocracia" a que tanto tem aludido a presidente eleita quando fala na formação de sua equipe. Dois filões Para entender a razão de muitos partidos e muitos políticos desprezarem cargos ministeriais e propugnarem vagas mais modestas em estatais ou em fundos de pensão das empresas oficiais : - Para 2011 as estatais têm uma previsão de investimentos de R$ 107 bi. E mais de 600 cargos executivos de nível, com salários superiores de R$ 20 mil, preenchíveis sem concurso. - Os fundos de pensão dos empregados das estatais, em tese privados, mas que o governo controla com fervor, têm hoje um patrimônio de mais de R$ 500 bi para investir. Cotações do ministeriômetro - capítulo II Repetimos a lista da semana passada. Os novos nomes em relação a lista anterior estão em destaque em itálico. Ainda não tivemos exclusões. Acrescentamos uma nova categoria - "credores". São aqueles que fizeram algum tipo de sacrifício em nome da eleição de Dilma e agora esperam recompensas. Algumas foram solenemente prometidas. A partir da próxima coluna vamos registrar apenas as inclusões e exclusões. Dilma vai aproveitar a companhia do presidente Lula na viagem ao G-20 em Seul para discutir com ele os convites que pretende fazer. Nenhum nome surgirá esta semana. Já depois dos feriados a angústia dos candidatos deve crescer. Ainda mais para a gente do PMDB que, segundo Michel Temer, não reivindica cargos, mas está à mercê do que Dilma e Lula determinarem. Casa Civil - Antonio Palocci, Maria das Graças Foster, Fernando Pimentel, Paulo Bernardo Planejamento - Nelson Barbosa, Fernando Pimentel, Luciano Coutinho, Aloizio Mercadante Secretaria Geral da Presidência - Gilberto de Carvalho, Antonio Palocci Direitos Humanos - Gabriel Chalita Ciência e Tecnologia - Aloizio Mercadante Educação - Gabriel Chalita, Aloizio Mercadante Petrobras - Maria das Graças Foster, Guido Mantega, Antonio Palocci Saúde - Antonio Palocci Integração Nacional - PMDB, PSB, Ciro Gomes, PT Minas Energia - Graça Foster (assim ela gosta de ser chamada), Edison Lobão Cidades - Moreira Franco, Marta Suplicy, PP, PSB, PMDB, Fernando Pimentel Itamaraty - Antonio Patriota, José Maurício Bustami, José Viegas, Mangabeira Unger Fazenda - Luciano Coutinho Transportes - Henrique Meirelles, PMDB, PT, PR Cultura - rol abre-se com mais de 20 nomes, entre eles o ator José Abreu, a senadora Ideli Salvatti, o sociólogo Emir Sader, Celso Amorim BNDES - Ciro Gomes, Nelson Barbosa Porto de Santos - PSB Caixa Econômica Federal - Moreira Franco Banco Central - Alexandre Trombini, Luciano Coutinho, Nelson Barbosa Justiça - José Eduardo CardozoAgricultura - Blairo MagiVale do Rio Doce - Mantega, Gabrielli (ver nota acima)Comunicações - Hélio CostaPrevidência - Luis SérgioTurismo - Luis SérgioDesenvolvimento Agrário - Joaquim SorianoDesenvolvimento Social - Gilberto de Carvalho, Patrus Ananias Avulsos Fabio Barbosa (Santander)Abílio Diniz Empresário (grife, como Roberto Rodrigues e Luis Furlan no primeiro ministério de Lula) SindicalistaAntonio Carlos Valadares Miriam Belchior (no Palácio do Planalto) Clara Ant (no Palácio do Planalto) Alexandre Teixeira (Apex) José Eduardo DutraCredoresHenrique MeirellesAloizio MercadantePatrus AnaniasIdeli Salvatti Lulômetro   Vamos inaugurar esta semana também os postos que são cogitados para o futuro ex-presidente Lula. A especulação também corre solta nesse campo : - Fazer churrasco no sítio em São Bernardo (anunciada por ele há tempos, mas aparentemente descartada). - ONU - FAO - Banco Mundial - Dirigir um projeto específico para erradicação da fome na África - Conselheiro de Dilma - Palpiteiro no governo Dilma - Tutor da futura presidente - Caixeiro viajante das reformas, especialmente a reforma política.
quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 123

Um país mais dividido Ao comentar a conclusão do primeiro turno das eleições deste ano, esta coluna chamou a atenção para a divisão produzida no país pelos candidatos. A candidatura do PT tomou conta das regiões mais pobres do país, não apenas do ponto de vista da geografia política (o Nordeste, por exemplo), mas também nas regiões e micro-regiões dos Estados mais ricos. Ou seja, as classes menos favorecidas, do ponto de vista social, votaram no PT. O reverso ocorreu com a base de apoio a Serra. O Congresso haverá de refletir esta realidade, não tenhamos dúvidas. Há duas perguntas que decorrem desta realidade eleitoral : (i) há espaço fiscal para satisfazer as crescentes (e justas) demandas das classes menos favorecidas ? (ii) a presidente eleita levará em conta esta realidade em que medida ? Governará de fato para todos e observando os melhores interesses da Nação ? Há muitas tentações políticas envoltas nesta constatação. O populismo é uma delas. Sobretudo quando se observa que a melhoria da qualidade de vida dos mais pobres foi absoluta. Do ponto de vista da distribuição da renda, a mudança durante os oito anos de Lula foi mínima. Prestem atenção nas mudanças externas Não é apenas o governo brasileiro que mudará. Lá fora há uma mudança estrutural em curso e altamente relevante. Os EUA mudaram de estratégia econômica e estão forçando um ajuste cambial por meio de uma política monetária frouxa por dois lados : a taxa de juros negativa e a injeção de recursos por meio da aquisição no mercado de títulos do Tesouro norte-americano. As apostas sobre os efeitos destas medidas são muitas e variadas, mas uma coisa é certa : o capitalismo é um sistema não-cooperativo e qualquer alteração substantiva nas variáveis econômicas dos EUA será refletida nas políticas dos outros países, sobretudo a China. Nesse contexto, estamos sob riscos novos : se antes a continuação de uma atividade letárgica nas economias centrais era o aspecto mais relevante, agora o risco é maior ainda : duma inflação alta no médio prazo ou, até mesmo, uma guerra cambial. Quem contava com o mesmo perfil da economia mundial pode tirar o cavalinho da chuva. Há algo de novo no ar. Para o bem e para o mal. Os limites do poder No discurso da apoteose, a futura presidente Dilma, parafraseando Obama, soltou o slogan "nós podemos" para definir a nova situação política da mulher no Brasil, segundo ela interpreta, adquirida após sua eleição. O PT, que já estava tomado de uma grande euforia, já anterior à vitória de domingo, acreditou que ele também podia. Assumiu, pelo menos publicamente, as rédeas do novo governo e assanhou-se até a disputar internamente quem seria o presidente da Câmara - se Cândido Vaccarezza, se Arlindo Chinaglia, se Marco Maia. A festa durou segundos. O PMDB estrilou e Dilma, com o juízo no lugar, botou Michel Temer para coordenar a equipe de transição, pelo menos no papel em posição hierárquica superior aos petistas antes anunciados como comandantes do grupo - Antonio Palocci e José Eduardo Dutra. Como disse o experiente peemedebista Eduardo Cunha, "eles não vão governar sozinhos". O PMDB deu a primeira amostra de como será a vida da aliança governista no Congresso. Não deu, não levou. Com "nós podemos" e tudo mais, Obama acaba de sofrer uma derrota quase humilhante nas eleições legislativas de meio de mandato nos EUA. Recado direto O PMDB fez saber a quem de direito que não aceita perder um milímetro do que já tem, pela voz de seu candidato à presidência da Câmara, Henrique Eduardo Alves, no mesmo momento em que o partido ganhava uma vaga para Temer na equipe de transição. Ou seja, seis ministérios, o BC (Meirelles agora é da cota peemedebista, assim entendem eles), e direção e cargos em estatais de peso. Conversas podem haver se o ministério vier de "porteira fechada", ou seja, o partido nomear todo mundo de sua área, não dividir a área com ninguém. Aliás, "porteira fechada" é uma expressão da política nacional que voltou a freqüentar as conversas em Brasília. Lula e Dilma não deram esta prerrogativa ao PMDB no passado. Quando a futura presidente deixou o Ministério das Minas e Energia, ele foi alocado na cota do PMDB. Mas o partido de Temer não levou a presidência de todas as estatais de área - Petrobrás e Eletrobrás, por exemplo, ficaram de fora. Pelas escaramuças desses dois primeiros dias de conversas sobre o futuro governo, um experiente observador das coisas de Brasília diz que a equipe formada por Dilma para conversar sobre a nova administração está mais para transação do que para transição. Mais para cargos do que para políticas. Por duas razões : é um governo de continuidade, não há mistérios do atual para Dilma a parceiros - dele eles sabem tudo; o programa de governo, pelo menos assim se disse, já ficou pronto. O que falta mesmo é nomear. Cotações do ministeriômetro A corrida aos cargos já começou. Aliás, já havia começado muito antes, apenas ficou guardada discretamente para não prejudicar a campanha. Basta ler os jornais para se perceber as disputas e o vale tudo. As informações "privilegiadas" estão na ordem do dia. Há as fontes e os amigos prontos para avisar que determinado cidadão foi convidado ou está indicado para algum cargo de ministério ou de expressão nas estatais. Um dia se diz que Lula quer a continuação de fulano em tal lugar, de beltrano em tal outro e que não deseja certo amigo e determinada área. Fica-se de repente sabendo que um concorrente foi vetado por uma corrente adversária do seu próprio partido. Há os candidatos reais e os autocandidatos. Há especulação, plantações e até informações de boa confiabilidade. Difícil é separar cada uma delas. Por essas e outras esta coluna vai manter, em cada edição, um "ministeriômetro", uma lista dos nomes citados como prováveis ministros, até que a escolha oficial se dê. Não incluímos os atuais ministros, secretários especiais com status ministerial e presidentes de estatais. Até agora, sem exceções confessas, todos, absolutamente todos, são candidatos a continuar. Há nomes repetidos, cogitados para diversos lugares. São os polivalentes. Há indicações apenas do partido em muitos casos. E há uma lista de avulsos, pessoas listadas sem designação do destino. Não estranhem a designação apenas de "empresário" na relação dos avulsos. Dilma não vai abrir mão de um nome desta grife em seu ministério. Assim também como o de um sindicalista. E a cotas das mulheres deve crescer. Casa Civil - Palocci, Maria das Graças Foster, Fernando Pimentel, Paulo Bernardo Planejamento - Nelson Barbosa, Fernando Pimentel Secretaria Geral da Presidência - Gilberto de Carvalho, Palocci Direitos Humanos - Gabriel Chalita Ciência e Tecnologia - Aloizio Mercadante Educação - Chalita, Mercadante Petrobrás - Maria das Graças Foster, Mantega, Palocci Saúde - Palocci Integração Nacional - PMDB, PSB, Ciro Gomes Minas Energia - Maria Graça Foster, Edison Lobão Cidades - Moreira Franco, Marta Suplicy, PP, PSB Itamaraty - Antonio Patriota, José Maurício Bustami, José Viegas, Mangabeira Unger Fazenda - Luciano Coutinho Transportes - Henrique Meirelles Cultura - rol abre-se com mais de 20 nomes, entre eles o ator José Abreu, a senadora Ideli Salvatti e sociólogo Emir Sader. BNDES - Ciro Gomes, Nelson Barbosa Porto de Santos - PSB Caixa Econômica Federal - Moreira Franco Banco Central - Alexandre Trombini, Luciano Coutinho, Nelson Barbosa Justiça - José Eduardo Cardozo Avulsos Fabio Barbosa (Santander) Empresário (grife, como Roberto Rodrigues e Luis Furlan no primeiro ministério de Lula) Sindicalista Miriam Belchior (no Palácio do Planalto) Clara Ant (no Palácio do Planalto) Alexandre Teixeira (Apex) José Eduardo Dutra Uma lição Às voltas com tantos abnegados a um sacrifício federal e sem vagas de nível suficientes para atender a todo mundo, a futura presidente poderia se mirar numa história do avô de Aécio. Eleito governador do Estado, numa vitória apertada sobre o hoje senador Elizeu Rezende, Tancredo foi procurado certa tarde por um amigo e correligionário. O parceiro, inquieto com a falta de notícias oficiais ou oficiosas a respeito da formação da equipe do futuro governo, quis checar diretamente qual era a sua cotação, candidato que era a uma secretaria ou à direção de algum organismo estatal. Expôs logo sua angústia : - "Doutor Tancredo, os amigos e minha família, conhecedores das nossas relações, têm me procurado para saber qual a secretaria que vou ocupar na sua gestão. E eu não sei o que dizer para eles, já estou até meio constrangido." Com seu estilo sereno, meio irônico, meio paternal, o futuro governador deu a solução para o amigo : - "Sem problemas, você pode dizer para eles que eu convidei você para minha equipe, numa poderosa secretaria. E que você não aceitou." Dois vices, dois DNAs políticos De um ilustrado das coisas brasilienses, antes mesmo do episódio de terça-feira que guindou o presidente do PMDB ao comando da equipe de transição de Dilma : "Fiquem de olho no vice". De fato, há diferenças nada sutis entre ele e que podem marcar um novo tipo de relação entre o substituto eventual da presidente da República e a presidente. E também marcar o jogo de seu partido. José Alencar é estridente, porém bonachão e inofensivo politicamente. Além de cumprir missões com boa vontade, como a de falar mal dos juros e do BC, coisa que Lula não podia fazer publicamente. Temer é formal, assim como, digamos, o olhar de Capitu. Tem seus próprios missionários. Sem alarde, já passou por cima de petistas ilustres no segundo dia da eleição. As tarefas de Dilma Com a ajuda de Lula em alguns casos, em outros, sozinha, Dilma tem, até o fim do ano e os primeiros dias de seu governo, uma série de decisões cruciais a tomar e/ou participar, nem todas muito agradáveis, dependendo do que ele decidir. 1. A questão cambial.2. Se vai ou não fazer um ajuste fiscal - como e de que tamanho.3. O aumento do salário-mínimo.4. O reajuste das aposentadorias para quem recebe mais de um salário-mínimo.5. O projeto de partilha para a exploração do pré-sal, com a nova regra de divisão dos royalties com os Estados, coisa que causou já grande dor de cabeça a Lula.6. Reajuste salarial do poder judiciário.7. A emenda constitucional que cria um piso salarial nacional para as polícias militares e os corpos de bombeiros.8. A expulsão de Cesare Batisti.9. A nomeação de um Ministro do STF Ao vencedor, a glória Lula, e somente Lula, fez esta eleição. A grande contribuição dos parceiros foi não atrapalhar muito. E esta dívida será paga de alguma maneira. Por isso, a grande incógnita : qual será o papel de Lula e da própria Dilma no futuro governo Dilma ? É uma equação complexa, que ainda não está decifrada. O teorema talvez até nem tenha sido ainda formulado corretamente. Ao perdedor, as batatas Pelas circunstâncias - o prestígio avassalador de Lula, o bom momento da economia, seus próprios erros, vacilações e idiossincrasias - a oposição até que não fez feio nas eleições. Basta ver o mapa de votos no país. Mas está se comportando como se nada tivesse aprendido com esta derrota, como não aprendeu com as de 2002 e 2006. As mesmas vacilações posteriores, as mesmas vaidades, as mesmas disputas. Do jeito, vai amargar mais 20 anos na planície. Será que o Brasil vai passar outro mandato presidencial sem uma oposição digna, como é bom e necessário em qualquer regime democrático ? Radar NA REAL 2/11/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA Estável Alta - Pós-Fixados NA Estável Alta Câmbio ² - EURO 1,4011 Queda Estável - REAL 1,7002 Estável/Queda Estável/Baixa Mercado Acionário - Ibovespa 71.560,95 Estável/Alta Estável/Baixa - S&P 500 1.193,57 Estável/Alta Estável - NASDAQ 2.533,52 Estável/Alta Estável (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável
terça-feira, 26 de outubro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 122

Eles só falaram de flores O eleitor brasileiro chega aos dias finais da eleição presidencial sem a mais vaga noção do que os dois concorrentes a seus votos pensam - e pretendem fazer - diante de cruciais decisões que precisam ser adotadas para botar um pouco de rumo na economia nacional e evitar que o bom momento vivido agora comece a degringolar perigosamente. O primeiro é o câmbio, o preço da moeda nacional, responsável pela deterioração da qualidade de nossas contas externas e pondo em risco a capacidade de competição da indústria nacional. O segundo, o equilíbrio das contas públicas e o compromisso de manter um bom superávit primário, suficiente para que a dívida pública não cresça demais. Há gastos em excesso e o superávit está sendo sustentado por contabilidade artificial e manobras como os cerca de R$ 30 bi que "sobraram" da capitalização da Petrobras e serão devolvidos ao tesouro nacional em forma de receita. Em nome da elegibilidade o governo tem evitado agir com presteza e a dureza necessária. Em nome da caça aos votos, os candidatos têm contornado o tema. O depois pode ser amargo... Elegibilidade Ninguém menos loquaz nesses dias do que o sempre loquaz ministro Guido Mantega, só visível para anunciar duas medidas pontuais para o câmbio, cuja eficácia ainda precisará ser comprovada, mas que a maioria dos especialistas considera limitada. Nem a reunião preparatória do G-20, na qual o Brasil ganhou mais poder no FMI, o ministro compareceu. O que não quer dizer que Mantega esteja em fase de desaceleração, esperando o substituto. Há nele um desejo genuíno de ficar onde está, se o favoritismo de Dilma continuar. Mas as ações preferenciais da presidenciável petista estão, no momento, no BNDES de Luciano Coutinho. Saldos externos, câmbio e expansão monetária Definitivamente os EUA estão decididos a superar a crise que se instalou no país em meados de 2008 debitando boa parte do ajuste ao resto do mundo. O Fed deve comprar títulos do tesouro, expandir a moeda e forçar o consumo e o investimento. O dólar norte-americano deve cair ainda mais frente às moedas de outros países ricos e dos emergentes. Assim, o saldo das operações externas destes países frente aos EUA deve cair e alavancar a atividade interna americana. Trata-se de um jogo perigoso de vez que o capitalismo é um sistema não-cooperativo de transferência de renda : se todos agirem da mesma forma estará instalada uma guerra cambial. Por mais coordenado que seja este processo entre os países, qual deles está disposto a abrir mão de um emprego para dá-lo a um norte-americano ? Há muito em jogo e há poucas indicações de como isto tudo pode caminhar. O Brasil neste contexto está mal posicionado : a elevada taxa de juros, a expansão fiscal e os saldos externos negativos são variáveis muito sensíveis às alterações engendradas por Washington. Este enorme ponto de interrogação está sendo subestimado internamente. A persistente especulação As reformas das estruturas do mercado financeiro mundial, bem como das instituições multilaterais depois da crise de 2008, arranharam os interesses de certos segmentos do mercado, mas não alteraram a dinâmica financista que domina as estruturas capitalistas. Alterações bruscas no cenário econômico serão, portanto, impactados por esta realidade. Se hoje as operações dos bancos com seu próprio capital estão mais limitadas, de outro lado os fundos de investimento especulativos estão assumindo formas cada vez mais sofisticadas. Lord Keynes, o grande formulador da criação do FMI, Banco Mundial e BIS, disse em certa ocasião que "o capitalismo é muito importante para ser cuidado apenas pelos capitalistas". Uma lição ainda por ser aprendida. FMI : reforma e obsolescência O diretor-gerente do FMI Dominique Strauss-Kahn anunciou com pompa neste último fim de semana "a maior reforma da história do FMI". Referia-se a redistribuição de quotas entre os sócios do fundo que resultará em um alargamento do poder da China e outros emergentes, dentre os quais o Brasil. O governo comunista de Pequim será o terceiro maior sócio do organismo que foi criado na Conferência de Bretton Woods (1944) para salvar o capitalismo. Dura ironia. O que o senhor Strauss-Kahn não contou é que as funções do FMI neste século XXI estão obsoletas frente aos novos desafios econômicos e políticos. Por exemplo, como se comportaria o FMI diante da desorganização cambial que pode se originar da nova estratégia monetária dos EUA ? Outra pergunta incômoda : o FMI tem recomendações sobre a política cambial chinesa que desvaloriza artificialmente a sua taxa de câmbio ? Mercosul sem rumo A formação de um mercado comum é tarefa de longuíssimo prazo. Sabe-se disso. Todavia, a cada ano é preciso estabelecer metas macroeconômicas conjuntas entre os países-membros e de progresso institucional com o objetivo de liberar mercados. O que se vê no Mercosul é uma absoluta letargia em todos os campos. E o pior é que os riscos estão aumentando velozmente. A Argentina, comandada pelos populistas Kirchners, está com inflação ao redor de 20%, déficit público crescente, investimentos irrisórios e uma política monetária pouco crível. Estas variáveis tem implicações diretas sobre o Mercosul, mas parece que tudo isto é pouco para movimentar os sócios deste pacto. Política externa esquecida Não é somente o Mercosul que não interessa ser discutido na atual campanha eleitoral. Toda política externa brasileira ficou de lado. Pouco se sabe o que os candidatos pensam em relação ao posicionamento do Brasil no mundo global. Radar NA REAL 22/10/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3982 queda estável - REAL 1,7071 estável/queda estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 69.529,71 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.183,11 estável/alta estável - NASDAQ 2.479,39 estável/alta estável  (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Acabou a trégua O aumento da vantagem de Dilma nas pesquisas contra José Serra pôs fim ao armistício celebrado entre grupos divergentes do PT a respeito das políticas que Dilma, se eleita, deverá adotar, e sobre os cargos que distribuirá. As entrelinhas dos jornais registram caneladas por debaixo das mesas cada vez mais grosseiras. E o ambiente ficará ainda mais pesado depois de domingo. Se Dilma vencer, porque terá passado todo o risco e será a hora de extinguir os concorrentes internos ou pelo menos neutralizá-los com honrarias sem poder. Se ela perder, pela distribuição de responsabilidades. Uma trégua precária A duras penas, o PMDB mantém obediente silêncio. Mas está com todas as armas revisadas e prontas para não ser passado para trás na partilha dos bens do novo governo. A cota de cinco ministérios está sendo considerada muito pequena. Nas reivindicações, estão também estatais de peso, além das do setor elétrico, feudo sarneysta nos últimos anos. Bom faro Maria Graça Foster, diretora da Petrobras pelas mãos de Dilma, já entrou no foco dos gigantes da petroquímica. É aposta certa para o primeiro escalão de um provável governo da favorita de Lula. O que explica, em parte, o "pitibulismo" político dos últimos dias do atual presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli. Luta pela continuidade Como Gabrielli, auto-incluído numa lista de promoções ou pelo menos de permanência com Dilma no Planalto, o crescimento do favoritismo da candidata petista nas pesquisas tem sido proporcional ao crescimento dos auxiliares de Lula que fazem tudo para mostrar serviços, para aparecer. Uma esfinge O problema, de todos, é que a ex-ministra é uma incógnita. Ninguém diz ao certo o que ela é. Há quem diga que ela cederá às influências e até já fez várias concessões. E há os que dizem que ninguém perde por esperar. Para uns, será teleguiada de Lula, do PT e do PMDB. Para outros, vai surpreender. Credores Por isso, o esforço dos parceiros, Lula, PT, PMDB para se mostrarem credores da vitória da ex-ministra. Crédito ilimitado Lula está fazendo tudo e muito mais por Dilma, o fato de quase ter abandonado a presidência para cair na campanha comprova sua disposição de ter da provável futura presidente uma nota promissória em branco. Mas Lula está fazendo muito mais por ele mesmo. O adversário real Nem Serra, nem Fernando Henrique, nem outro tucano oposicionista qualquer. A mira de Lula esta apontada mesmo é para a cabeça do mineiro Aécio Neves, que um dia ele até pensou levar para seu rebanho. A desenvoltura que o senador eleito mineiro tem demonstrado no seu oposicionismo do segundo turno, o prestígio que vem amealhando, parecem a sombra mais perigosa para os planos futuros de Lula. O mineiro e algum arroubo de independência que Dilma pode exibir depois que não precisar mais de votos populares. A esperança tucana O PSDB não vai jogar a toalha. Os tucanos estão convictos de que, digamos assim, "falhas metodológicas" nas pesquisas que na semana passada apontaram o aumento da diferença, favoravelmente à adversária, entre ele e Dilma. O tom da campanha está subindo e o ápice deve ser o debate da Globo. A verificar : desde o início da campanha fala-se em uma virada depois do debate. Só para lembrar Está na agenda do PMDB : o projeto que troca o modelo de exploração de petróleo no Brasil de concessão para partilha ainda não foi aprovado pelo Congresso. Como nunca antes O país que sairá das urnas de domingo será um país dividido e com rastros de ódio como nunca se viu antes, nem depois da eleição de Fernando Collor.
terça-feira, 19 de outubro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 121

A nova estratégia americana I Muito embora a eleição brasileira seja fundamental para a análise da política e a economia no médio prazo, temos de considerar um novo e importante fator externo na avaliação das perspectivas para 2011. Trata-se da decisão do Fed de recomprar títulos de longo prazo - 10 e 30 anos - do tesouro norte-americano. Com isto o Fed pretende aumentar ainda mais a liquidez do mercado, derrubando a taxa de juros destes títulos e produzindo um movimento adicional de desvalorização do dólar frente às demais moedas, inclusive dos países emergentes, sobretudo a China. Há algum tempo as autoridades dos EUA cogitavam esta estratégia, sobretudo diante da resistência da China em valorizar espontaneamente sua moeda. A nova estratégia americana II Como qualquer estratégia econômica, nada pode ser considerado "certo" nesse processo. Ao contrário : uma eventual desvalorização do dólar americano pode ser compensada por desvalorizações equivalentes das moedas dos outros países. Afinal, o que os EUA tentam é minimizar sua fraqueza econômica por meio de exportações mais competitivas. Nenhum país aceita receber a recessão de outro de forma passiva. Especialmente no caso da Europa, onde o crescimento econômico ainda é frágil. Dessa forma, pode ocorrer uma série de "desvalorizações competitivas" para evitar os efeitos negativos do dólar fraco. O aumento da volatilidade das moedas é talvez o maior e mais indesejado risco neste momento. Por que então os EUA tentam este caminho ? A nova estratégia americana III Claramente o governo de Obama tenta reativar a economia e evitar o doloroso desgaste que vem sofrendo e que pode minar suas pretensões na reeleição de dois anos à frente. Esta nova estratégia, apesar de ser engendrada pelo Fed, tem o apoio da Casa Branca e do tesouro. De outro lado, claramente o governo Obama está priorizando os benefícios internos em detrimento de seus aliados. Estes últimos terão de pagar a conta, mas antes terão de aceitá-la. Logo, o que pode iniciar-se é um processo cheio de senões e riscos e, dependendo do vigor, os riscos podem aumentar muito no mercado. Os efeitos sobre o Brasil Não está claro ainda o que Brasília pensa da nova estratégia americana. O governo brasileiro está de olho mesmo é na eleição presidencial. Todavia, para um país cuja moeda foi a que mais se valorizou nos últimos anos, este assunto é vital. O movimento clássico de reação em termos de política econômica seria o BC reduzir a taxa de juros. O limite desta reação é a política anti-inflação. Assim, dificilmente veremos este movimento do BC nos próximos meses. O que resta ? Mais impostos sobre operações financeiras que se apropriam dos elevados ganhos financeiros no Brasil e a compra - custosa - de dólares no mercado. Ou seja, a possibilidade de uma nova onda de valorização do real é concreta. O risco é a menor competitividade das exportações e os investimentos industriais no país. O novo presidente terá árdua tarefa para executar, tão logo a foto oficial for colocada nas paredes da administração pública Federal. Radar NA REAL 15/10/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3968 queda estável - REAL 1,6611 estável estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 71.830,18 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.176,19 estável/alta estável - NASDAQ 2.468,77 estável/alta estável  (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável O espírito de Minas I No início da campanha, quando as candidaturas não estavam nem oficializadas, o senso comum dizia que a sucessão presidencial poderia ser decidida em Minas, segundo colégio eleitoral do país, com seus mais de 14 milhões de eleitores. O raciocínio era simples : igualdade no centro-oeste, grande vantagem de Dilma no norte e no nordeste e no Rio, compensados pela vantagem de Serra em SP e no sul. Os mineiros alterariam a balança. Marina Silva, a inesperada, alterou o equilíbrio. Em Minas, Dilma fez 1,7 milhão de votos a mais do que Serra e não levou no primeiro turno. O espírito de Minas falhou. No segundo turno, porém, ele voltou a levitar e a assombrar tucanos e petistas. O espírito de Minas - II Para quem está estranhando o empenho de Aécio por Serra no segundo turno e para quem acha também que tudo não passa de um jogo de cena do senador eleito : Aécio não tem outra saída, para seu futuro político, do que se agarrar ao PSDB. Não dá para fundar outro partido nem há espaço para ele nas legendas de maior peso como o PT, o PMDB, o PSB. Terá, então, de mostrar serviço aos tucanos e não deixar que Alckmin, totalmente empenhado na campanha de Serra, fixe uma imagem nacional superior à dele. Os dois disputam a futura liderança nacional do partido, mesmo com Serra presidente. Espírito de Minas - III A grande pergunta para a oposição é : qual foi o acordo que fizeram Serra e Aécio em relação a um futuro governo Serra e principalmente em relação a 2014 (ou 2015) ? Lá atrás se dizia que Serra havia oferecido a Aécio, para ser vice, o comando da área social do governo e a desistência da reeleição, com um mandato de cinco anos. (Lula é quem não vai gostar nada de um acordo desses, se vier - e se Serra vencer.) Espírito de Minas - IV Qualquer que seja o resultado da eleição, mesmo com a vitória de Dilma (o que ainda parece o mais provável, segundo as cada vez mais discutidas pesquisas), Lula terá cometido seu mais brutal erro político em Minas Gerais. Erro que no limite pode custar caro a Dilma. Ao impor ao PT mineiro a candidatura de Hélio Costa, do PMDB, para ajudar Dilma, não conseguiu seu intento no primeiro turno (não teve os 2,5 milhões, 3 milhões de vantagem), não derrotou Aécio, destroçou o PT e humilhou os principais líderes locais do partido. E agora, quando Minas voltou a ser o provável centro de decisões, há muitas indefinições, divisões e mágoas na aliança governista local. O espírito do PMDB É maldade dizer que o PMDB está se preparando para botar um pé mais firme no barco serrista, só porque o diretório estadual do RS, governista no primeiro turno, recomendou aos filiados apoio ao candidato tucano no segundo turno. Os líderes peemedebistas, entre uma cobrança e outra ao PT - com certo regozijo, é claro, por terem sido escanteados da campanha de Dilma no primeiro turno e ter dado o que deu - têm reafirmado seu compromisso com a candidata de Lula. Porém, o PMDB está muito low profile nesta fase, estranhamente para quem se diz empenhado em ganhar a eleição presidencial. O PMDB se assanhou porque o PT mostrou que sozinho não sabe ganhar eleições. O partido aumentou seu poder de barganha. E aumenta ainda mais quando flerta, às escondidas, mas não muito discretamente, com os tucanos. A contribuição de Alckmin Alckmin teve para governador neste primeiro turno 2,5 milhões de votos a mais do que Serra para presidente. A contribuição de Lula Durou menos do que uma partida de futebol o arroubo de alguns conselheiros de Dilma em tentar separar a imagem da candidata da de seu mentor. A ideia era mostrar que ela tem autonomia não é apenas uma espécie de "sublula". O cálculo era que ela estava perdendo pontos entre formadores de opinião por parecer que não tem vontade nem ideias próprias. Porém, falou mais alto o cacife de Lula com seus 80% de popularidade e sua perfeita identificação com as camadas populares, o maior contingente de eleitores no Brasil. Falou também, mais alto ainda, a vontade de Lula. A dívida de Dilma e do PT com Lula vai dobrar. À venda As boas casas do ramo ainda têm em seu estoque sandálias da humildade, em modelos masculinos e femininos. Mas só em tese Quanto aos números de oposição e apoios na Câmara e no Senado que cada um se eleito supostamente terá, são números que valem apenas como estatística, só no atacado. Cada projeto importante terá de ser exaustivamente negociado, com toda a carga que esta palavra carrega. Negociação parlamentar legítima e negociação no varejão. Notáveis contabilistas Sincero - ou indiscreto - o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que Dilma (seria o caso de José Serra também) terá de fazer um ajuste fiscal no ano que vem. Pequeno, segundo ele. Não é o que se pensa no ministério da Fazenda nem na campanha da candidata, pelo menos de público. O "fiscalista" José Serra também arquivou estrategicamente o tema em suas falas. Para boa parte dos especialistas independentes, no entanto, o ajuste é um imperativo. E provavelmente nem tão pequeno quanto diz o ministro Bernardo. Com ironia, diz-se até que o futuro presidente terá inicialmente de montar um grupo de trabalho com os notáveis contabilistas da área pública e privada para desvendar os artifícios contábeis adotados para mascarar o superávit primário das contas públicas. Anotem Correios, BNDES, Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica... Ainda a Petrobras Não são poucos os investidores que estão se debruçando sobre os números da Petrobras para entender o que está acontecendo de fato na empresa. Alguns advogados, inclusive no exterior, examinam se a empresa cumpriu todas as normas de divulgação requeridas na recente operação de capitalização da empresa. Ademais, há muita curiosidade para saber as razões para tantos analistas terem mudado tão rapidamente de opinião sobre as suas recomendações de investimento em relação às ações da petroleira brasileira. Novidades sobre o tema podem pipocar inclusive antes da conclusão do processo eleitoral.
terça-feira, 5 de outubro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 120

Um país dividido Qualquer eleição permite que se faça uma gama enorme de análises dos resultados. Nesta eleição, não foi diferente. Uma das mais notáveis diz respeito à divisão de votos entre Estados ricos e pobres. Do lado de Dilma, sua vitória foi nos nove Estados nordestinos - ganhou em 18 Estados. Enquanto isto, os eleitores de Serra se concentram nas classes mais elevadas e nos Estados mais ricos. Tal divisão terá efeito relevante nos próximos anos no Congresso e nas pressões políticas de regiões mais pobres e demandantes de projetos de desenvolvimento. Assim, a despeito de quem seja o presidente, os projetos presidenciais estarão pressionados por agendas crescentemente inclusivas do ponto de vista social e fiscal. A composição do Congresso - 72% dos parlamentares são governistas - ampliará o poder do PMDB como "fiel da balança", seja quem for o eleito. Exatamente o partido sobre o qual pouco se conhece em relação as suas proposições políticas, sociais e econômicas. Está aberto o caminho para o fisiologismo. Pouco a acrescentar Do ponto de vista programático, o segundo turno não deve trazer nenhuma mudança. Tudo deve ficar na superfície. Os dois candidatos deverão fixar suas críticas em aspectos mais aparentes da personalidade de cada um, bem como nas "bandeiras" partidárias. Tudo sem detalhamento e sem maiores explicações de como governarão. Conversas de bastidores na campanha tucana dão conta que "agora é tirar a máscara de Lula do rosto de Dilma". Isto significa que a luta será mais pessoal que política do ponto de vista tucano. Já os petistas tentarão grudar a imagem de Serra à de FHC, uma estratégia que retira votos, segundo os petistas. As estrelas da propaganda eleitoral continuarão a ser os marqueteiros. O resto é detalhe. Quem é a direita no país ? O DEM, sucessor direto do PDS que deu sustentação à fase final do regime militar é o grande derrotado do momento. Seja do ponto de vista desta eleição, quando o partido perdeu 14 de suas 56 cadeiras, seja na última década, quando o partido perdeu 63 de sua 105 cadeiras, num total de 513. Enfim, o partido não é mais a representação da histórica direita brasileira. Há notória dificuldade dos partidos brasileiros se identificarem como "de direita" ou "liberais" (no sentido clássico da palavra). O que ocorre é que a antiga direita está espalhada em diversos partidos, com maior concentração no PMDB e no PSDB. Mesmo para aqueles que não acreditam mais na terminologia direita/esquerda, temas como a presença do Estado na economia, privatizações e reformas trabalhista e tributária ainda carregam fortes componentes ideológicos. Todavia, a defesa das ideias liberais hoje está a cargo de "facções" ou parcelas dos partidos, já que do ponto de vista orgânico os programas políticos não são nada consistentes. Resta saber se algum partido ocupará formalmente o espaço deixado pelo DEM. A grande razão Há pequenas e grandes explicações para o fato de Dilma, favorita absoluta (mesmo descontando-se as vacilações dos institutos de pesquisa) ter escorregado para o segundo turno, quando tinha tudo para levar no primeiro. Entre elas, o caso do sigilo fiscal, as estripulias da família Erenice e até as vacilações da candidata oficial na questão do aborto. Cada uma dessas coisas, no último mês, tirou pontos da candidata. Mas a questão crucial foi outra, definida em dois vocábulos - arrogância e humilhação. A prepotência exibida pelo presidente Lula quando sua predileta ganhou fôlego, o ar superior de quem sabe tudo, o sorriso superior dos vitoriosos, somados à agressividade com que passou a tratar concorrentes e imprensa, assustaram. Completou este quadro a ameaça de extirpar os adversários, humilhá-los. O brasileiro é cordato, cordial (num estilo, aqui, diferente do definido por Sérgio Buarque) e costuma optar ou simpatizar com a vítima. Certo que se Dilma tivesse aparecido mais como ela mesma e menos como um apêndice de Lula, nada disso teria tido influência decisiva. Porém, como criatura não se desgrudou do criador, foi engolfada pelos sustos que ele causou. Um exemplo Caso mais típico da reação do eleitor com as ameaças de Lula deu-se em SC. Foi lá que Lula ameaçou extirpar o DEM da vida política nacional. Pois bem, naquela ocasião Raimundo Colombo, o candidato do partido, liderava a pesquisa local, mas não levava no primeiro turno. Pós-ameaça foi crescendo e ganhou no primeiro turno. Chá de sumiço Desde domingo pela manhã, quando passou a admitir que poderia haver segundo turno, o sempre eleitoralmente loquaz e onipresente Lula, recolheu-se. Passou a manifestar-se apenas por meio de porta-vozes oficiais e oficiosos. Para estes, traça estratégias e retempera as forças para o segundo turno. Para quem conhece Lula, ele curte frustrações e mágoas. Um grande equívoco Na contabilidade negativa do governo nesta eleição está também o fato de não ter levado a sério, ter subestimado a candidatura Marina Silva, ter até tentado em alguns momentos humilhá-la. Marina, como alguns previram, inclusive esta coluna, num texto lá atrás sobre o fator Marina, virou um pequeno fenômeno, com possibilidades de crescer se for bem gerido. Hoje, Dilma, uma das principais responsáveis pela saída de Marina do ministério do Meio Ambiente de Lula, tece loas à ex-companheira. No privado, porém, o que se diz dela, do PV e dos grupos sociais que a apoiaram não é nada publicável. Mágoas Lula não deveria estar insatisfeito. Afinal, fora o segundo turno, teve umas vitória em regra. Eliminou até alguns dos adversários mais jurados por ele, como os senadores Tasso Jereissatti, Arthur Virgílio e Marco Maciel. Mas como ele se pôs como principal missão este ano no governo eleger Dilma, deu um frio na barriga. Embora Dilma saia como franca favorita (independente do que digam os institutos de pesquisa). Reinvenção Por falar em institutos de pesquisas, eles erraram mais do que acertaram este ano, alguns mais que os outros. Vão ter de rever metodologias, métodos e motivações. Não dá para institutos trabalharem para governos, candidatos, partidos e ao mesmo tempo se pretenderem neutros. Não dá também para entender como entidades sustentadas por dinheiro público - CNT, CNI, com imposto sindical - patrocinem pesquisas eleitorais. Não é do escopo de suas atividades. O dilema da oposição : o que fazer ? Se quiser ter alguma chance no segundo turno, a oposição terá de descobrir primeiro onde e como Lula, Dilma e parceiros falharam. Afinal, o governo foi para o segundo turno mais por sua obra e graça do que pelas virtudes da oposição. Depois, terá de ser mais incisiva, mais agressiva, mais propositiva, com linguagem menos empolada. Sem perder a ternura, porém. E agora, Serra ? Aloysio Nunes provou, na sua campanha, que Fernando Henrique não tira votos, pode até acrescentá-los. E agora, Aécio ? O ex-governador de Minas, eleito apoteoticamente senador, não tem mais a desculpa de que precisava ficar restrito regionalmente para garantir seu poder no Estado. Está livre para voar com Serra. Alckmin, seu principal concorrente na futura liderança nacional tucana, vai voar. Injunções eleitorais A decisão do ministro da Fazenda, Guido Mantega, uma dia após o primeiro turno, de anunciar a duplicação do IOF na entrada de capital estrangeiro no país é a maior prova de quanto o cálculo das urnas conta nas considerações de ordem econômica no momento. Cabe perguntar : o que poderá vir depois de 31 de outubro. Para temer O governo fez maioria na Câmara e no Senado suficiente para aprovar, sem sufoco, qualquer projeto de seu interesse, até reformas constitucionais, ignorando a oposição. Para não temer Se a oposição, o que hoje se afigura quase impossível, vencer a eleição presidencial, não há o que temer : em 15 dias ele terá maioria no Congresso. Explicação Por que a cara de total constrangimento de Michel Temer e Guido Mantega no palanque em Brasília na noite de domingo quando Dilma apareceu para falar do segundo turno ? Aliás o que fazia lá o ministro da Fazenda se não fosse para a festa da vitória ?
terça-feira, 28 de setembro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 119

Dilma, o novo governo e a quadratura do círculo - I As pesquisas continuam dando vantagem suficiente para Dilma Rousseff para vencer no primeiro turno. Tirar cinco ou seis milhões de votos da candidata oficial nos cinco dias que faltam para eleição é algo muito próximo do milagre. Isso embora a perda de cinco pontos na vantagem da escolhida de Lula sobre os adversários tenha criados esperanças na oposição e certo temor no governo. Assim, é provável, bem provável, que o Brasil amanheça segunda-feira com sua primeira mulher eleita presidente da República. Parte da sociedade, especialmente aqueles que têm a ganhar ou a perder mais diretamente com a forma que são conduzidos, direcionados os negócios do Estado, já se dão ao esporte de especular a respeito de quem será quem no futuro governo Dilma e que rumos ele tomará. Não há indicações precisas, pois a par de Dilma passar boa parte do tempo enevoada pelo marketing e pela presença avassaladora do presidente Lula, quando falou mais abertamente, deu sinais contraditórios. Dilma, o novo governo e a quadratura do círculo - II Um discurso para cada público foi a tônica oficial. Empresários acreditam que a reforma trabalhista virá, destravando as regras de contratação e dispensas de empregados e reduzindo os custos fiscais da mão-de-obra. As centrais sindicais estão convictas de que estas questões serão exacerbadas, do ponto de vista deles. E não houve programa de governo para ser cobrado oficialmente, apenas rascunhos e promessas. O governo terá de se formar no dia a dia. Sob fortes pressões do que a sociedade acreditou que Dilma faria e as ambições políticas e de outro teor dos parceiros de jornada - Lula, PT, PMDB, aliados menores, centrais sindicais... A tendência de Dilma, até para não começar com atritos, é tentar contentar a todos. Será como encontrar a quadratura do círculo. O grande perdedor Lula - ele e quase mais nada - confirmada Dilma presidente, terá ganho a eleição presidencial. E a oposição perdeu para ela mesma, desde que passou oito anos sem saber se opor e perdida em sua fogueira de vaidades. Para se recompor, terá primeiro de tomar um banho de humildade. Contabilidade Não é preciso esperar os últimos dias de campanha, que prometem ainda bom aquecimento, para algumas constatações : 1. Foi, de um modo geral, a campanha mais rica do país em todos os tempos. Não devemos descartar futuras histórias de caixa dois pipocando. 2. Foi a campanha mais pobre em ideias, discussões consistentes e debates de programas de nossa vida política. 3. Foi a campanha mais agressiva, mas radicalizada que já tivemos, embora não tenha alcançado algumas baixarias como a de 1989. 4. Foi a campanha em que os plantonistas de poder - no âmbito Federal e no âmbito dos Estados - mais envolveram as máquinas públicas em favor de seus candidatos. 5. Foi a eleição que menos atraiu a atenção dos eleitores. Realidade ou estratégia ? Depois de semanas de ataque cerrado à "mídia golpista", Lula baixou o tom. Essas idas e vindas dele em relação à imprensa são periódicas. Um dia Lula chegou até a dizer que não lia jornais para não ter azia. O que teria levado o presidente a conter sua escalada ? Há dúvidas, mas a melhor aposta é a de que o confronto chegara a um ponto que não estava favorecendo a candidatura de Dilma. A dúvida é se é uma retomada do bom senso ou apenas um recuso estratégico. Nem Lula, nem o partido dele, escondem que seus conceitos de liberdade de imprensa e liberdade de expressão são os mesmos vigentes no Brasil e nas mais avançadas democracias do mundo. De outras fontes Não somente dos sonhos autoritários de parcelas do universo político-burocrático se alimenta a ameaça à liberdade de imprensa. Também do poder responsável pela preservação da Constituição e das leis, o monstro também solta labaredas tenebrosas. Por obra e graça do Judiciário em Brasília o jornal O Estado de S. Paulo está sob censura há 424 dias, completados hoje, por conta de estranhas histórias da conexão oficial Maranhão - Capital da República. Por diligência da Justiça de Tocantins, 84 órgãos de imprensa estão proibidos desde ontem de publicar notícias sobre as extravagâncias do governo estadual. Nos dois casos, protege-se uma gama de suspeitos de corrupção. O medo dos dois documentos Na última hora - a lei foi aprovada há dois anos e regulamentada há tempos pelo TSE - o PT entrou no STF com uma ADIn contra a obrigação de o eleitor apresentar dois documentos - o título de eleitor e outro com foto - na hora de votar, sob pena de exercer esse direito. Há temor de que muitos eleitores se esqueçam dessa exigência e não possam botar seu voto na urna. O que poderia aumentar significativamente o índice de não votantes no país. Tradicionalmente, ele já é alto, em torno de 20%. No eleitorado de hoje, cerca de 27 milhões de votos. O PT parece desconfiar que o eleitor que mais se dispõe a votar em Dilma (seus índices entre as classes D e E e de baixa escolaridade são estratosféricos) é o que mais estaria a não votar por esquecimento ou falta de um dos dois documentos. Pode ser. Porém, não seria uma demonstração de preconceito de quem se diz tão ligado ao popular ? Em tempo : a exigência é dessas coisas que somente nossa tradição burocrática, cartorial, explica. Estelionatos eleitorais Embora o ministro Guido Mantega anuncie - e de vez em quando até adote - medidas para conter a excessiva valorização do Real, a verdade é que o dólar continua patinando frente à moeda brasileira. O governo parece não querer fazer onda em período eleitoral. Faz lembrar FHC em 1998. Na ocasião muitos especialistas e empresários alertavam para o Real valorizado e para os problemas que isto trazia para a economia, as contas externas e a competitividade das indústrias nacionais. Em busca da reeleição, FHC ignorou as advertências. Depois das eleições, para evitar uma crise, teve de soltar a moeda. Começou neste momento a perda da confiança da sociedade. Havia sido reeleito em primeiro turno. Saiu do governo com popularidade regrada. Foi, de acordo com seus adversários, o segundo "estelionato eleitoral" da história da política brasileira pós-ditadura militar. O primeiro foi de José Sarney escondendo o fracasso de Cruzado em 1986. Deu no governo mais impopular de nossa Nova República. Sem subterfúgios O STF se apequenou na questão dos "fichas sujas". E ainda terá de assistir ao escárnio de Joaquim Roriz talvez chegar ao governo do DF por uma interposta laranja - a própria mulher. Como o processo de Roriz se extingue, os ministros não terão como julgar antes das eleições se a lei vale agora ou somente a partir de 2011. Depois das eleições, como cassar eleitos pela vontade popular ? Há no ar um impasse político sério. No Congresso, já há propostas para mudar as regras de fidelidade partidária impostas pelo STF. Não será surpresa - já se fala nos partidos - que venha também uma proposta para invalidar cassações pós-eleição. Afinal, a lei "ficha limpa" foi aprovada com má vontade e para não valer este ano por deputados e senadores. E, afinal, cinco ministros do STF disseram que em certas circunstâncias a lei pode retroagir. Fazendo escola Na esteira de Roriz, outros complicados na Justiça, como Cássio Cunha Lima, Jader Barbalho e Paulo Rocha, pode também indicar laranjas para seus lugares. E os votos ? Que será feito dos votos dos "fichas sujas" das eleições proporcionais se eles forem cassados ? Se forem anulados, poderão alterar as bancadas dos partidos na Câmara e nas Assembleias, alterando o que o eleitor expressou nas urnas, votando no candidato de tal ou qual legenda. Se não forem anulados, teremos parlamentares beneficiados pelos "fichas sujas", maculando o espírito da lei. Não será pouca coisa. Pela última contagem oficial, são 228 candidatos de 25 partidos com candidaturas impugnadas. Coisas de outro mundo Sindicato de Jornalistas (o de SP) dando guarida a manifestações contra a imprensa. OAB/SP defendendo a censura a uma obra de arte. O Brasil é mesmo um país surrealista. Ações da Petrobras e desenvolvimento humano De fato, foi um sucesso. De público e de palanque. Porém, há questões a observar : 1. Muitos princípios da boa governança corporativa foram simplesmente para a lata de lixo, sob o olhar complacente de muita gente boa, como a CVM e BMF/BOVESPA. 2. Vendeu-se o futuro para consumir no presente. 3. O governo vai pegar algo entre R$ 20 e 30 bilhões do dinheiro da capitalização para pagar despesas correntes e fingir que faz um superávit primário de qualidade quando é pura lambança contábil. 4. O acionista minoritário foi desrespeitado ao extremo, como nunca antes... Há muita coisa a ser esclarecida, a começar pela engenharia financeira entre Tesouro, BNDES, fundo de pensão das estatais. Guimarães Rosa ensina que o diabo mora nos detalhes. Apesar de tais e outros senões, tudo oficialmente cheira a mil maravilhas. Foi o maior lançamento da história do capitalismo, a BOVESPA já é a segunda maior bolsa do mundo, a Petrobras está prestes a se tornar a quarta maior empresa do planeta. Num país, cujo IDH - Índice de Desenvolvimento Humano é o 75º do mundo. E ainda há gente rindo à toa. Sustentação do crescimento é vital A sustentação do crescimento econômico ainda é o ponto-chave para economia brasileira. Muito embora o país tenha superado o pessimismo que imperava em relação ao tema, a taxa de investimento público e privado continua relativamente baixa para que tenhamos convicções sobre o nível de crescimento que pode ser tolerado sem que existam processos de elevação da inflação. O mercado estima um crescimento para o ano que vem ao redor de 4,5% o que representará uma desaceleração significativa em relação a este ano quando o PIB deve crescer acima dos 7%. O PAC é importante neste sentido e, enquanto plano de investimento em infra-estrutura, necessário ao país. O problema é que este carece da prometida velocidade, fruto de problemas gerenciais, e de um maior estímulo à parceria com o setor privado. O próximo governo terá que administrar este processo com muito cuidado. O risco em relação ao tema é muito maior que a sua aparência. A "herança maldita" de Lula Não são poucos os vazamentos da cúpula da campanha da petista dando conta de um "ajuste fiscal" logo no início da gestão de Dilma. Bem, este assunto está muito longe de ser consenso entre os ideólogos da candidata e, até mesmo, da própria, conforme já reportamos nesta coluna nas últimas semanas. Porém, é possível que este ajuste não seja apenas necessário. Talvez seja "exigido" pelo mercado para que o Brasil permaneça como queridinho dos investidores internacionais. Obviamente, o país é soberano e pode navegar em águas mais turbulentas, mas o que parece é que os investidores estão menos condescendentes com os indicadores brasileiros. Testarão a política econômica de Dilma logo no início de sua gestão. Se ela ganhar, é claro. O Brasil vive uma "bolha" ? - I Os principais centros financeiros mundiais estão vivendo um período de revisão de projeções para o próximo ano. Os analistas estão quase que repetindo os mesmos diagnósticos em relação aquilo que prognosticaram para 2010. Os mercados emergentes persistirão como os mais promissores enquanto as economias centrais persistirão em ritmo lento. Esta coluna conversou com alguns analistas de importantes instituições internacionais. Há preocupações crescentes com o Brasil, apesar de pouca coisa acabar sendo escrita - os grandes negócios que têm sido feito com as empresas brasileiras moderam opiniões mais contundentes. A deterioração das contas públicas, a baixa taxa de investimento, o déficit externo (crescente e baixa competitividade das exportações de manufaturados), a corrupção e a fragmentação política, são alguns dos aspectos que ocupam as mentes dos analistas. O Brasil vive uma "bolha" ? - II Quando se olha o preço dos ativos brasileiros em reais a valorização foi estupenda ao longo dos últimos anos e, principalmente, depois da recessão mundial do período 2008/09. Apesar desta valorização, em termos relativos tais ativos não parecem caros. No caso do mercado de ações o índice preço da ação/lucro por ação (P/L), um dos mais utilizados no mercado, gravita ao redor de 12x, o mesmo patamar dos EUA. Teoricamente o crescimento dos lucros por aqui será maior que no caso dos EUA. Por esta lógica, vale a pena recomendar ações brasileiras, apesar destas não serem a "barganha" de há alguns anos. O problema, dizem estes analistas, é que grande parte das empresas brasileiras é de produtoras de commodities que tem pouco conteúdo tecnológico e são dependentes do desempenho da economia mundial. Assim, o baixo risco aparente do mercado não é tão baixo assim. Quando se coloca este aspecto "micro" sob os holofotes dos "macros" (conforme consta na nota anterior) é que o medo de que o Brasil esteja numa "bolha" aparece. Radar NA REAL 24/9/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3478 queda estável - REAL 1,7084 estável estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 68.196,47 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.145,95 estável/alta estável - NASDAQ 2.380,40 estável/alta estável (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável
terça-feira, 21 de setembro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 118

Ao vencedor, as batatas I Não há quem não perceba que o grande eleitor dessas eleições foi Lula. Sem ele, sem sua imposição e sem suas ações o rumo do processo eleitoral poderia ter sido muito outro. Se Lula tivesse agido como FHC em 2002, a disputa presidencial este ano seria certamente muito diferente - muito mais acirrada do que está. O candidato governista de fato é Lula - com sua realidade e a extraordinária mitologia popular que foi se formando em torno dele. É isto que explica a razão pela qual, denúncia vai, denúncia vem, e Dilma permanece impávida nas pesquisas eleitorais. No imaginário da maioria da população, ela é apenas, como diz o povo humilde do nordeste, a "muié do Lula". E vai fazer tudo o que o seu senhor mandar. Eis então o grande mistério da fé lulista : qual será o papel de Lula num futuro governo Dilma ? Observador ou mentor ? As indicações são as de que o presidente não se reserva apenas para platitudes. Ao vencedor, as batatas II Pelos sinais emitido por Lula, passando a sensação de que pode estar nascendo, com um prestígio nunca antes visto, um novo condestável da República, e depois do "recado" quase direto do ex-ministro José Dirceu de que o PT terá papel preponderante no provável futuro governo comandado pela favorita nas pesquisas, surgiu um outro mistério de fé, este de parte da sociedade : qual será o papel Dilma num futuro governo Dilma Rousseff. Ao vencedor, as batatas III O terceiro mistério da fé da política brasileira atual é a função a ser destinada ao PMDB : é parceiro preferencial na aliança, sócio-cotista com o mesmo número de cotas do PT no condomínio do poder - como querem os peemedebistas - ou como um parceiro secundário, com cargos vistosos, mas sem capacidade de decisão (como sonha Dilma) ? A definição desses mistérios dará os rumos do governo Dilma, sua opção preferencial entre o pragmatismo lulista, o ideologismo do PT que Dirceu encarna ou o fisiologismo do PMDB. Para equilibrar essas tendências Dilma terá de mostrar uma habilidade política e uma liderança até aqui adormecidas em seu currículo. Para evitar confrontos Não é à toa que até agora a aliança oficial não apresentou seu programa definitivo de governo, elaborado por uma comissão de "notáveis" sob o comando de Marco Aurélio Garcia. Nem mesmo o prometido resumo de 13 princípios prometido há mais de dois meses. Nem apresentará para não fazer "marolinhas". No máximo, o que se vê são promessas na campanha e balões de ensaio na imprensa para acalmar algum setor da economia. Ajuste fiscal ? - I Com a "inconfidência" de José Dirceu de que Dilma, no governo, representa a opção pelo projeto do PT - o que Lula não representou por ser "duas vezes maior" que o partido -, voltaram a circular informações, de fontes ocultas, que a ex-ministra caso eleita como indicam as pesquisas, promoverá um ajuste nas contas oficiais. Um antídoto contra o temor que certas ideias petistas em matéria de economia causam em determinados agentes econômicos. Porém, Dilma parece pender mais para Zé Dirceu do que para, por exemplo, Antonio Palocci. Veja-se, a título de ilustração, o que ela disse recentemente em entrevista ao jornal O Globo : "O papo de ajuste fiscal é a coisa mais atrasada que tem. Não se faz ajuste fiscal porque se acha bonito. Faz porque precisa. E eu quero saber : com a inflação sob controle, com a dívida caindo e com a economia crescendo, vou fazer ajuste fiscal para contentar a quem ? Quem ganha com isso ? O povo não ganha." Até algum ajuste verbal ao contrário, ajuste fiscal em governo Dilma é conversa para engambelar a elite econômica e financeira e os economistas neoliberais. Ajuste fiscal ? - II Parece ter o mesmo sentido "engambelatório" a informação, também com origem desconhecida, de que Lula está disposto, principalmente depois das eleições, a fazer tudo que se mostre necessário para que Dilma possa começar seu governo com tranquilidade, sem riscos de desgostar eleitores. Até maldades se elas forem mesmo indicadas ? Para lembranças : Fernando Henrique, com Pedro Malan e Armínio Fraga, fizeram duas elevações pesadas na taxa de juros em seus últimos 15 dias de governo, evitando assim que Lula iniciasse sua gestão com tão impopular medida. Esta foi uma das muitas heranças malditas que FHC deixou para seu sucessor. Alvo Jornalistas e órgãos de imprensa de valor não entregam seus informantes, o sigilo da fonte é matéria de fé. Se entregassem, porém, salvariam da angústia algumas almas corroídas do petismo de fé com Dilma, ensandecidos para descobrir de qual trincheira amiga partiram os obuses que abateram Erenice Guerra : se de companheiros abespinhados com o prestígio de outros companheiros ou se de aliados agastados com perdas de espaços postais. Assim, sumiram discretamente as alegações oficiais que as histórias do sigilo fiscal e das estripulias guerreiras seriam tramóias da oposição. E se fosse poderosa ? A "imprensa comprometida, fraca, mentirosa", com uma semana de noticiário derrubou quatro pessoas no governo Federal, entre elas uma ministra e um diretor dos Correios, e deixou ao relento membros da família Guerra que se aboletavam na administração. Já pensaram se ela fosse forte ? Que estragos ! Mais que uma ameaça ? Depois do discurso de José Dirceu na Bahia e do recrudescimento dos ataques do presidente Lula à mídia, é difícil não imaginar que não esteja vindo por aí alguma coisa, patrocinada por Lula ou mesmo por Dilma, para conter o "excesso de liberdade da imprensa" existente hoje no Brasil segundo classificação do ex-ministro chefe da Casa Civil. Na mira, a prefeitura de São Paulo O produto principal da campanha petista em São Paulo é a eleição municipal de 2010 na capital paulista. Aloizio Mercadante foi para o sacrifício - trocou uma reeleição para o Senado quase certa por uma derrota anunciada para o governo estadual - para aumentar seu cacife na sucessão de Gilberto Kassab. Marta Suplicy faz da ida para o Senado e do sonho de um novo ministério com Dilma como sua plataforma para a prefeitura. Os dois sonham reconquistar o lugar de novo para o PT, ainda mais que vêem a atual situação local sem um candidato incontrastável e prestes a se dividir. Um, agora nem muito nas aparências, deseja enfeitar o bolo do outro. Marta faz uma campanha quase do "eu sozinha" e os petistas de Mercadante fazem festas para o sambista Netinho emplacar uma votação bem superior à da ex-prefeita. Último suspiro A derradeira esperança da oposição são os desdobramentos do escândalo da Casa Civil da família Guerra, com ramificações nos Correios e possíveis tentáculos também na ANAC. Por enquanto. Calcula-se que Dilma teria de perder cerca de 7% nas suas intenções de voto hoje, transferidos para Serra e/ou Marina para provocar o segundo turno. Quinta e sexta-feira teremos três novas pesquisas, iniciadas ontem, que dirão se as estripulias guerreiras terão efeito sobre o eleitorado maior do que teve a história do sigilo fiscal da filha de Serra e outros quatro tucanos. Este, pelo menos até agora, teve um efeito puramente marginal, atingindo apenas alguns formadores de opinião. O outro, porque ocorreu no lugar onde Dilma operava e por tratar de coisas mais próximas à população - corrupção, empreguismo - tem mais apelo eleitoral. Foi por perceber isto, talvez movido por pesquisas internas, que Lula chutou tão rapidamente Erenice Guerra do Palácio do Planalto. Ela não teve o mesmo período sabatino que beneficiou Dirceu e Palocci antes de serem defenestrados. Mesmo sendo a esperança a última que morre, oposicionistas mais prudentes tratam já de se preparar para o futuro. Como oposicionistas. Afinal, não basta apenas ir para o segundo turno. Será preciso depois arrumar um discurso que desconstrua o prestígio e a estratégia do grande eleitor. O outro lado da oferta da Petrobras A oferta de novas ações da Petrobras será um sucesso em que pese os aspectos menos claros da operação, sobretudo no que tange à possibilidade de diluição da posição dos acionistas não-controladores por parte do governo. A capitalização ficará próxima dos R$ 135 bilhões, um patamar significativo. Todavia, há uma questão de fundo que mereceria maior discussão pela sociedade : esta capitalização servirá como plataforma para uma extraordinária expansão dos investimentos da estatal no setor petrolífero. É interessante que o país invista tão massivamente neste setor ? Os aspectos ecológicos estão sendo levados em consideração ? O cálculo dos custos de extração é razoável ? Os investidores estão cientes do fato de que o retorno do pré-sal se dará no longo prazo ? Resta saber quem neste momento eleitoral está disposto a discutir o tema... Novas medidas para conter a queda do dólar Está aberto de novo o debate sobre o excesso de valorização do real frente ao dólar. Comenta-se que o governo poderia comprar dólares via Fundo Soberano e/ou mercado futuro (swap reverso). Ora, a valorização do real não é um fenômeno natural e imprevisível. Resulta da fraqueza da economia mundial frente à fortaleza da demanda interna e, principalmente, em função do desequilíbrio entre a taxa de juros doméstica e a externa. (O Brasil paga em termos nominais quase três vezes a taxa de juros dos títulos do Tesouro dos EUA). Portanto, as medidas que possam ser adotadas agora e à frente para administrar o câmbio terão efeitos passageiros e a tendência de queda do dólar permanecerá. Repensar a política cambial requer um exame muito profundo de todo o modelo, inclusive do ponto de vista dos efeitos sobre o nosso processo de industrialização. Assuntos (externos) eleitorais esquecidos Alguém lembrará dos temas de política externa durante esta campanha eleitoral ? Como será a política brasileira em relação ao Irã ? Como ficarão as relações com a Bolívia, grande fornecedora de gás para o país ? O governo Dilma se manterá distanciado dos EUA ? Como será a postura do Brasil em relação à licitação dos aviões de caça da Força Aérea ? Como serão tratados os contenciosos comerciais do país na OMC ? O Mercosul continuará a evoluir lentamente ? Como serão as relações do Brasil com o FMI ? Qual a estratégia do futuro presidente caso Hugo Chávez venha a ser derrotado nas próximas eleições parlamentares do país ? Temas relevantes numa campanha pobre de ideias e debate... Radar NA REAL Houve uma saudável estabilização dos diversos segmentos do mercado financeiro e de capital ao redor do globo. Os investidores estão mais calmos e cientes de que a crise é longa e que a liquidez persistirá elevada enquanto um dos elementos essenciais para que o desemprego seja reduzido. Assim sendo, na semana passada tivemos a valorização de grande parte dos ativos de risco. O Brasil segue na sua trajetória positiva e deve continuar a ser uma dos países prediletos pelos investidores. Não alteramos o nosso radar nesta semana de vez que já tínhamos feitos muitas e significativas alterações na semana passada. 17/9/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3078 queda estável - REAL 1,7185 alta estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 67.089,12 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.125,59 estável/alta estável - NASDAQ 2.315,61 estável/alta estável (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Desemprego estável Há claras evidências de que as autoridades econômicas das principais economias mundiais afinaram o discurso e as políticas e manterão a altíssima liquidez para sustentar o consumo e, em menor medida, o investimento. Todavia, não deixa de ser gritante o fato de que a taxa de desemprego sequer dá mínimos sinais de melhoria na maioria dos países desenvolvidos. Vai mês, vem mês e a taxa de desemprego não oscila. Trata-se de um péssimo sinal : a confiança para investir e consumir permanece baixa, muito embora certos indicadores antecedentes de expectativas mostrem sinais de melhoria. Na hora do consumo, contudo, o consumidor acaba por conter o próprio ânimo. Nos EUA, a paciência do eleitor/consumidor será testada nas próximas eleições parlamentares de novembro. Os lobistas e os bancos oficiais Reparados os supostos fatos envolvendo a ex-ministra Erenice e seu filho, um "consultor" especializado na atração de recursos oficiais para empresas e projetos privados, não seria o caso de se pesquisar com mais afinco os critérios, padrões e formas de deliberação que os bancos oficiais adotam na concessão de crédito e efetivação de investimentos junto ao setor privado ? Há algo de muito obscuro na interação entre certos "consultores" e o setor público. Com a palavra o TCU e os políticos...
terça-feira, 14 de setembro de 2010

Política & Economia NA REAL n° 117

A política como maior risco I Não é preciso ser um "cientista político" com vasto cabedal de cultura e informação para perceber a substancial ausência de funcionalidade do sistema político brasileiro. Os avanços econômicos do país nos últimos vinte anos e, acentuadamente nos últimos dez, não foram acompanhados por mudanças equivalentes - para melhor - no sistema político. Os partidos, sejam os de oposição, sejam os governistas, não representam sequer razoavelmente os maiores e melhores anseios da sociedade. Todavia, cumprem o papel de "mediação" dos mais diferentes interesses e, neste campo, exercem barganhas que retardam a modernização do país. Um jogo de interesses corporativos, pessoais e que favorecem a corrupção, o tráfico de influência e a defesa dos piores interesses. A política como maior risco II Lula foi um hábil administrador da aliança política que sustenta seu governo e sua popularidade; foi uma espécie de garantia de que não houvesse maiores desequilíbrios entre o Legislativo e Executivo, face o perfil da política descrito na nota acima. Ora, a provável eleição de Dilma em outubro não resistirá ao teste de sua capacidade de administrar tal aliança sustentada por múltiplos e, em muitos casos, duvidosos interesses. É difícil imaginarmos substantivos riscos do lado econômico no curto e médio prazo (um ano à frente). Porém, os riscos políticos são enormes e a contradição entre as ideologias, as ambições em relação ao poder instalado pelos votos, a distribuição vertical e horizontal do poder nos estados e a influência do atual presidente sobre o novo governo, indicam que a tarefa da nova presidente será muito delicada. O risco, em suma, é a - pequena - política contaminar a economia. E isto não é algo que esteja tão visível neste momento em que os agentes econômicos comemoram o excelente desempenho da economia e dos negócios. A política como risco maior III Pelas indicações possíveis, a provável futura presidente terá uma maioria da Câmara e no Senado como nunca antes neste país teve outro presidente em nossa história política recente, a não ser o dos ciclos militares, por razões óbvias. E é nisto que estaciona o perigo : nenhum Congresso, em tempos recentes, pelo abandono da política na campanha, será tão fisiológico e tão glutão quanto o que espreita o Palácio do Planalto na curva de 2011. Até com um primeiro-ministro "ad hoc". "Instituições em frangalhos" Este foi o título de um nunca esquecido editorial do jornal "O Estado de S. Paulo" no dia 13 de dezembro de 1968, um dia após a edição do famigerado AI-5 pelo governo militar de turno. Caso sigilo da Receita, negócios na Casa Civil, a reação do governo e dos governistas... instituições em desmoralização. A taxa de câmbio. De novo. A relativa fraqueza das economias centrais em relação à brasileira e a elevada taxa de juros local podem motivar uma nova rodada de valorização do real frente às principais moedas internacionais. Isto não apenas gerará o custo, digamos, "conjuntural" às nossas exportações. Há riscos sérios em relação ao processo de industrialização do país no médio e longo prazo. Não à toa a China continua cuidando com esmero em não provocar nem maiores turbulências na sua taxa de câmbio e nem maior valorização da sua moeda. O país olha o futuro mais distante. Por aqui, este tema está restrito a poucas conversas de bastidores e à percepção de que os artigos importados e as viagens internacionais valem a pena. Neste fim de governo Lula e início do próximo governo será a taxa de câmbio o tema mais importante para os programadores da política econômica. Por enquanto, há pouco a ser feito. Paranapanema e Vale Pessoas próximas à operação de aquisição da Paranapanema, cujo leilão fracassou, estão especulando muito sobre o que teria acontecido para que o casamento não se realizasse. Ora, sabia-se da pressão do governo para que esta fusão fosse realizada e também era conhecido o preço (R$ 7,50 por ação) que os fundos de pensão venderiam as suas posições para a Vale. A oferta da Vale foi baixa e os fundos ficaram inertes. Perguntam alguns dos envolvidos : (i) teria a Vale apenas feito um "jogo de cena" fazendo na aparência o que o governo queria e na prática deixando que a operação fracassasse ?; (ii) estariam os fundos de pensão demonstrando "independência" perante um governo que tem interferido muito nas suas estratégias de investimentos ? Ora, não se sabe a resposta para tais questões, mas que o tema é intrigante, isto é mesmo ! Fed em ação A fraqueza da recuperação da economia norte-americana deve motivar uma nova rodada de queda da taxa de juros dos títulos de renda fixa com prazos mais longos (5 e 10 anos). Há evidências de que o Fed vai fazer novos estímulos monetários para que a economia cresça. Nas próximas semanas é possível e provável que os mercados de ativos reais, incluindo o de ações, reajam a esta expectativa e subam. Será provavelmente algo passageiro, mas poderemos ver mais otimismo entre os investidores que voltaram das férias de verão no hemisfério norte sem muito apetite por ativos de risco. Portugal e Irlanda O euro tem caído no mercado internacional por conta de muita especulação sobre a solvência de alguns países europeus, no caso, Portugal e Irlanda. Resta saber se a Alemanha e a França, sócios mais poderosos da UE vão deixar estes países ao sabor das especulações dos hedge funds e tesourarias de grandes bancos. A economia grega pagou caro pela postura desunida da União. Mais capital para os bancos A decisão deste final de semana dos 27 principais reguladores de sistemas financeiros reunidos na Basiléia num encontro do Comitê de Supervisão Bancária imporá mais rigores ao sistema financeiro mundial. Em oito anos, o volume de capital próprio dos bancos necessário para a execução das operações bancárias dobrará. Trata-se de um aperto forte para evitar novos colapsos financeiros como o ocorrido em 2008. Os reguladores continuam tentando impor medidas que retirem os temores dos investidores em relação ao sistema financeiro mundial. No Brasil, tais medidas também influenciarão aos políticas do BC em relação aos bancos, apesar de não haver nenhuma desconfiança em relação a higidez de nosso sistema. Radar NA REAL Alteramos algumas das nossas posições no radar. Como informamos em nota acima, a queda dos juros de longo prazo no exterior podem motivar maior fluxo de recursos para os ativos de risco. É difícil prognosticar os efeitos e a duração deste processo, mas este nos parece mais provável que incerto. Se será sustentável, é muito mais difícil afirmar. Todavia, os sintomas de que este movimento pode acontecer são múltiplos : volta dos investidores ao mercado de commodities (sobretudo no mercado de metais e energia), maior ingresso de recursos nos fundos de ações nas principais economias, declarações de diversos "formadores de opinião" mundo afora, bem como de autoridades governamentais. Assim sendo, estamos alterando a tendência de curto prazo das moedas (euro se desvalorizando e real e dólar dos EUA se valorizando), mercados de ações para cima e taxas de juros externas declinando. Veremos as próximas semanas. 10/9/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,2718 queda estável - REAL 1,7222 alta estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 66.806,69 estável/alta estável/baixa - S&P 500 1.109,55 estável/alta estável - NASDAQ 2.242,48 estável/alta estável (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Frente anti-PMDB ? Os peemedebistas estão na muda, quietos como nunca. Não querem ser responsabilizados por qualquer tropeção desestabilizador na campanha de Dilma. De aloprados bastam outros parceiros mais coroados. Mas se não estão preocupados, deveriam estar. É cada vez mais visível que se arma na aliança governista uma espécie de "subaliança" para se contrapor ao poder que se acredita o PMDB tirará das urnas. Motivo pelo qual algumas derrotas peemedebistas, como em Minas Gerais, por exemplo, não seriam muito choradas. Uma frente com PT, PDT, PSB e PC do B poderia contar com o dobro de deputados que deve ter o PMDB, sem contar os evangélicos do partido do vice José Alencar e Marcelo Crivella. E sem contar ainda com a ajuda pontual de uma oposição que estará sem rumo caso a derrota presidencial venha a ser avassaladora. Razões eleitoreiras ? Voltaram a circular as informações de que Dilma, se eleita, fará mesmo um ajuste fiscal de boas proporções. Na lista entra até a regulamentação das mudanças na previdência do setor público, que Lula não conseguiu fazer, e alterações também na previdência dos empregados do setor privado, para aumentar o tempo de contribuição para a aposentadoria. Pode ser que sim, pode ser que não. Estranha-se apenas que a candidata não assuma esses compromissos publicamente, antes das eleições. A razão, porém, é simples : isto pode tirar votos em territórios nos quais a ministra navega livremente - empregados do setor público, sindicalistas. Contas a pagar Quem já mergulhou mais fundo no orçamento de 2011, enviado há dias ao Congresso, não gostou do que viu. Do lado das despesas, faltam provisões : para as emendas dos parlamentares do tamanho que eles esperam e vão exigir, para ressarcimento dos Estados pela isenção do ICMS nas exportações pela Lei Kandir, para o aumento pretendido pelo Judiciário, para o novo teto salarial das policiais e corpo de bombeiros... Do lado da receita, a estimativa de arrecadação está no limite do otimismo. Mais impostos ? Por essas e outras, há desconfianças de que vem por aí um aumento de carga tributária - e não apenas por conta de ganhos de eficiência da Receita Federal. A chave poderia ser a votação de regulamentação da EC 29, aqui já referida, com regras para a transferência de recursos para a saúde. O que se prevê é que com ela o setor ganhará mais cerca de R$ 10 bilhões ao ano. No projeto está contemplada a volta da CPMF, com o novo apelido da CSS - Contribuição Social para a Saúde. A proposta está pronta para ser votada na Câmara. Contas a pagar - II Multiplicam-se os truques contábeis para garantir um superávit primário - de papel - no governo Federal este ano do tamanho do que está prometido. Até a capitalização da Petrobras vai entrar na roda. Na prática, o governo garante o gasto real e contabiliza papéis, com chumbo trocado entre o Tesouro e estatais. Desfazer este novelo será um dos desafios da próxima administração Federal. Sono inquieto Preocupa muito mais que transpareceu a revelação de tráfico de influência no governo do filho da ministra Erenice Guerra. Não é a toa que Dilma, de quem a atual ministra chefe da Casa Civil foi auxiliar de inteira confiança, está tão cautelosa, fez apenas uma declaração protocolar de confiança na parceira, sem veemência. O caso do sigilo bancário da filha e do genro de Serra, conforme se pode ler na última pesquisa DataFolha, teve efeitos negativos limitados sobre as intenções de votos na ex-ministra - atingiu apenas as camadas mais bem informadas, o que foi compensado por avanços dela na parcela do eleitorado que idolatra Lula. O tema, digamos assim, não é popular. O da Casa Civil, por envolver suspeitas de corrupção, facilitação de negócios, tem ingredientes explosivos para atingir a classe média em todos os seus extratos. Se prosperar, é claro. Últimas esperanças Há 20 dias da eleição, a única esperança da oposição é que histórias como esta desestabilizem Dilma e seu comando de campanha. O efeito Lula está irresistível. O bloco do eu sozinho Não passa despercebido, nem da oposição nem dos adeptos mais fiéis de Dilma, que a participação do presidente Lula na campanha presidencial está cada vez mais autônoma, com vôos muito próprios. Há incômodos com esta postura.
terça-feira, 31 de agosto de 2010

Política & Economia NA REAL n° 116

Temporada de caça aos tucanos Está desencadeada, na seara governista, com o crescimento de Dilma nas pesquisas, a fase de assédio aos tucanos, em duas direções : para matar e para atrair. A primeira, sob o comando do próprio presidente Lula visa dar um tiro de misericórdia nos adversários em áreas consideradas vitais para os projetos futuros do presidente, cada vez mais escancarados, como em São Paulo e para atingir "inimigos" jurados de Lula, como os senadores Arthur Virgílio e Tasso Jereissati, duros combatentes do governo no Congresso, Marconi Perillo, candidato ao governo de Goiás, pelo pecado de ter "alertado" o presidente duas vezes para as histórias do mensalão. Se possível, serão salgados e deixados ao sol. O jogo da sedução Na outra ponta do assédio aos tucanos, de modo mais ou menos discreto, por conta da própria Dilma e assessores discretos, desenvolve-se um processo de sedução a tucanos tidos como mais confiáveis. A pretensão é atrair o grupo que se imagina gravitará em torno de Aécio Neves no PSDB para uma aliança, nem que seja pontual, com alguns dos partidos apoiadores de Lula. Já se desenvolveram conversas neste sentido, não diretamente com tucanos de plumagem real, mas com quem pode fazer chegar a eles estas ideias. Há dez dias é tema de bastidores. Acabou vindo ao proscênio com uma entrevista do governador do Ceará, Cid Gomes, tão palavra aberta quanto seu irmão Ciro, em entrevista ao jornal Valor Econômico, e depois pela própria Dilma, em entrevista, quando anunciou, anteontem na tevê, que depois de eleita irá estender a mão para Serra. O propósito, já não muito secreto, seria criar uma "banda boa" de apoio ao governo Dilma para contrapor-se ao que seria uma espécie de "banda podre" da atual aliança que sustenta a candidatura da ex-ministra. Num ângulo, o PT, o PSB, o PC do B, uma face dos tucanos... Adeus ano velho O dia do trabalho nos EUA - 3/9 - inaugura uma espécie de novo ano no mercado financeiro mundial. A partir desta data as projeções para o ano seguinte passam a ser as novas referências para os cálculos de "preço justo" dos ativos baseados, por sua vez, nas estimativas macroeconômicas (PIB, taxa de juros, câmbio, etc.). Aqui no Brasil não é diferente : os analistas começam a avaliar as perspectivas do ano que vem. Esta coluna coletou de diversas fontes as principais avaliações do mercado e há dados muito interessantes para a economia local que merecem atenção. Vejamos a próxima nota. Feliz ano novo Segundo a média das projeções de mercado, o PIB brasileiro deve crescer algo ao redor de 4,5%. Trata-se de uma queda relevante frente aos 7% - 7,2% esperados para este ano. Este crescimento é, segundo a opinião corrente dos analistas, o número possível para que seja cumprida a meta de inflação (4,5%) de 2011. Um avanço maior no crescimento seria abortado por meio de uma política monetária (ou fiscal) mais restritiva. De outro lado, o crescimento dos lucros das principais empresas cotadas em bolsa alcançaria 7% o que parece ser ótimo frente ao crescimento médio da economia. A taxa de juros nominal estipulada pelo BC permaneceria ao redor da atual (10,25% ao ano). O Brasil continuaria relativamente protegido das variações dos humores em relação à economia mundial. Segundo os analistas, os países centrais, sobretudo os EUA, apresentariam um desempenho letárgico, mas benigno na medida em que não se prevê um retorno do quadro recessivo de 2009. O fluxo de investimentos externos para o Brasil, neste contexto, continuaria sólido, embora decrescente em relação a este ano. Como se vê, estas projeções reproduzem o desempenho que deve se configurar no último trimestre deste ano. Como foi no passado ? O tal do mercado leva a sério tais projeções e são elas que norteiam as principais decisões de investimento. Todavia, um exame das projeções passadas indica que a capacidade de previsão dos analistas não é tão sólida quanto se possa imaginar. Um exemplo : o PIB brasileiro projetado para este ano estimado ao final do ano passado indicava um crescimento de 4,5% - 5%. O que se vê agora é um crescimento de mais de 7%. Da mesma forma, esperava-se um desempenho muito melhor para a economia norte-americana. O que de fato ocorreu é que a Europa, agitada pela crise de confiança, apresenta mais consistência no crescimento, influenciado pelo razoável desempenho da economia alemã e, em menor medida, pela França. A "bola de cristal" do mercado pode ser relevante, ao ser observada, mas apenas como uma referência de momento e não como algo provido de ciência exata. A nova visão dos reguladores A presidente da CVM encerrou o Congresso da APIMEC - Associação dos Analistas do Mercado de Capitais ocorrido em Belo Horizonte na semana passada com uma observação extremamente interessante sobre a nova visão dos reguladores na sua tarefa de "xerife". Dentre as diversas observações feitas, salta aos olhos uma que prega que "os reguladores não devem acreditar na eficiência do mercado". Junta-se a esta a nova premissa de que é importante não apenas regular os mercados organizados e formais (bolsas de valores e de derivativos), mas também os segmentos onde as negociações são "no balcão", ou seja, entre agentes e sem maior transparência. Esta "nova visão" é consequência direta da crise instalada em 2008. Todavia, se observarmos o arcabouço normativo, sobretudo nos EUA, a capacidade de regular e punir das autoridades reguladoras não é tão compatível com esta nova visão mais intervencionista. O mercado continua relativamente dominante no que tange à formação das expectativas, sem que os governos possam controlá-lo de forma mais efetiva. É o tempo do hipercapitalismo financeiro. O BNDES e a sustentabilidade Justiça seja feita. O BNDES está adotando políticas cada vez mais rígidas na concessão de créditos no que tange à sustentabilidade. Um exemplo disso é a política para o setor de pecuária para o qual as metas de rastreamento dos rebanhos são requisitos básicos para a obtenção de crédito. Em cinco anos, quem quiser obter crédito junto ao banco oficial terá de ter absoluto controle sobre a origem do gado a ser abatido. O ponto dissonante destes novos critérios de sustentabilidade do banco é o fato que do lado do governo a tendência é a maior flexibilidade em relação às regras de sustentabilidades. Ou seja, há um gap entre as legítimas ambições do BNDES e a visão "desenvolvimentista" do atual governo e Dilma, a provável eleita em outubro. Meirelles e o mercado Entre as elites empresariais está consolidada a ideia de que a eleição deste ano para presidente está encerrada : Dilma será eleita. De outro lado, não são poucas as articulações para que Henrique Meirelles fique no BC. Seria uma certeza perante certos temores em relação aos riscos de mudança do rumo da política econômica. Não se trata de uma novidade, mas o interessante é que tais articulações nunca estiveram tão intensas. Michel Temer é o grande interlocutor desta articulação uma vez que Meirelles é parte do PMDB, um companheiro de Sarney, Barbalho e companhia limitada. Sem marolas Ortodoxos e não ortodoxos desta vez estão em linha em suas previsões. O Copom amanhã vai se fingir de morto e nem tocará na Selic, de 10,75%. Mexer para cima pode ser qualificado, em certas áreas, de crime eleitoral, mexer para baixo pode ser classificado como temeridade e gerar perigosos movimentos defensivos e ainda gerar expectativas negativas para o futuro. Radar NA REAL 27/8/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,2677 estável estável - REAL 1,7591 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 65.585,14 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.064,59 baixa baixa - NASDAQ 2.153,763 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Cuidados com pelos do rosto Barbas na política brasileira atual são uma marca registrada do PT - Lula, Palocci, Genoino Dirceu e um magote da companheirada. São raros os petistas que em alguma fase de sua militância não exibiram uma. Mas quem agora vai precisar cultivar urgentemente também um bom punhado de pelos no rosto, para colocá-los devidamente de molho, é o PMDB, mesmo que seus principais líderes prefiram a cara bem aquinhoada com Aqua Velva, apenas com algumas concessões a vistosos e hirsutos bigodes. Por conta das conversas transversais nos bastidores da política, descritas em notas acima, de um vocábulo pronunciado com asco em territórios oficiais - "refém" - que se acautelem os donos do PMDB. Podem ganhar sem levar o que já dão como favas contadas. Em lugar de um parlamentarismo de coalizão no ano que vem, sonho de suas estrelas, podem estrelar um governo com parceiros inesperados. Libertas quae sera tamem Um bom teste para a segurança dos compromissos governistas e petistas com o PMDB se desenrolará em Minas Gerais. Com o crescimento de Antônio Anastasia, o candidato da ligação PSDB/DEM/PPS, o situacionista (Federal) e oposicionista (Estadual) Hélio Costa, do condomínio PMDB/PT et all, está desesperado pelo reforço direto de Lula e Dilma e sua campanha, injeção direta na veia. Vamos ver que dose, real, será aplicada, na campanha peemedebista. Será que interessa cutucar demais o futuro senador Aécio Neves ? Será que não será bom cortar um pouco as asas do PMDB não deixando em suas mãos dois dos três maiores Estados brasileiros ? Em tempo : só estranha a ascensão de Anastasia quem não conhece as minudências da política mineira. É mais que disputa pessoal O Estadão deste fim de semana explicitou o que, como se dizia no jornalismo de antigamente, já corria a boca pequena no mundo político e algumas vezes foi referido nesta coluna : as disputas pelo poder em um provável governo Dilma e a volta das escaramuças José Dirceu e Antonio Palocci tão frequentes na primeira fase da gestão Lula. Não é questão pessoal, de desgosto. Ou pelo menos não é apenas. É mais profunda : é pela condução da política econômica num mandato Dilma. De um lado está Palocci, com Henrique Meirelles, com uma visão tida como conservadora e de outros Dirceu, com Luciano Coutinho, Guido Mantega e mais Alexandre Teixeira (APEX) e Nelson Barbosa (secretário de Política Econômica da Fazenda), com visões tachadas de progressistas. A notícia de um possível ajuste fiscal no início do governo Dilma, passadas por Palocci e depois desmentidas pela própria candidata, fazem parte desta guerra. O desmentido foi estratégico. Não que a ex-ministra já se tenha definido por este ou aquele, mas qualquer apelo a ajuste fiscal - para muitos sinônimos de arrocho - atinge diretamente interesses de aliado. Melhor não agitar agora. Velha briga De qualquer forma, em matéria de ideias econômicas, Dilma e Palocci nunca se bicaram, nem quando ela estava no Ministério das Minas e Energia nem na Casa Civil. Dilma chegou a classificar de rudimentar uma ideia de Palocci de acabar com o déficit nominal no setor público, não apenas fazer um superávit primário. Acontece que Palocci é visto pelo setor financeiro, por boa parte dos empresariados e no exterior como um fiador de que aloprados econômicos não envolverão a futura presidente. E ele ainda tem a confiança de Lula. Já Dirceu fala para o público interno, sindicalistas, servidores e é de total confiança deles. Escaramuças da guerra Esta disputa tem gerado histórias curiosas. Por fontes não identificadas, para afastá-lo do centro das decisões (diz-se que poderia ir para a Casa Civil), Palocci já foi lançado para o ministério da Saúde e para a presidência da Vale, como se o governo pudesse - ou será que pode ? - nomear dirigentes de uma empresa privada. No contra-ataque, Guido Mantega, em plena campanha para permanecer onde está, acaba também de ser anunciado como um provável presidente da mesma Vale. Lula no futuro Quem estava perto do palanque no qual Lula e Dilma subiram sexta-feira em Salvador não deixou de notar o ar de satisfação, quase angelical, do presidente Lula quando a plateia começou a gritar "Lula, você vai voltar/Lula, você vai voltar". A desunião não faz a força O desenho da derrota espalhado no ar está levando tucanos, DEMs e ex-comunistas a se estranharem cada vez mais. O risco é que a fuga presidencial esvazie também disputas nos Estados e para o Congresso. Há quem ache que a oposição, somada, não fará mais 160 deputados para um bancada total de 513 parlamentares na Câmara. Como Lula joga tudo agora para fechar boas eleições para o Senado, Dilma terá, em tese, melhores condições que Lula para passear com suas propostas pelo Legislativo. Diz-se em tese porque o Legislativo, com um PMDB reforçado, tem lá suas razões que todas as razões conhecem e não cede antes de muito tergiversar. Isto embora o presidente do PMDB e vice na chapa de Dilma tenha dito recentemente, com altivez e sem corar, que, "no próximo governo, é possível que o PMDB não tenha nenhum cargo, e mesmo assim nós vamos colaborar". Mancha no lixo Foram necessários 19 anos para se aprovar, no Congresso, com algum consenso entre as partes envolvidas, uma lei nacional de Resíduos Sólidos. Agora, o governo quer regulamentá-la em três meses, segundo notícias desta semana, ainda antes das eleições. Estranhe-se a pressa. E com normas que podem tornar partes da lei inócuas, ou de difícil aplicação ou de custos elevados para o consumidor. Ou tudo junto. É que se pode chamar efeito Marina Silva nas eleições. O STF e a política A reportagem da revista Veja na semana passada revelou parte da luta de bastidores, nada amistosa, que está cercando a disputa pela vaga do ministro Eros Grau no STF. A reportagem reacendeu ódios e abalou favoritismos e certezas. Já se diz que a decisão vai ficar para depois de outubro e que desta vez pesará mais a questão de qualidade jurídica do que qualquer outro tipo de ponderação política.
terça-feira, 24 de agosto de 2010

Política & Economia NA REAL n° 115

Chaves para o terceiro mandato I Desde que as pesquisas de opinião passaram a convergir e a apontar a probabilidade até de uma vitória de Dilma no primeiro turno, tanto no centro do poder quanto nos setores da sociedade mais bem informados, mudou-se o eixo da discussão. Não mais se debate o que seria um possível governo de oposição, que mudanças de rumo poderiam ser feitas caso José Serra se elegesse, mas como será um governo Dilma - se uma continuidade perfeita da gestão Lula ou um governo de fato novo, menos pragmático na política e mais intervencionista na política. No entorno da ex-ministra garante-se que ela imprimirá sua própria marca a sua administração, sem renegar os legados de Lula, principalmente na área social. Manterá também os pilares da política econômica, em suas linhas gerais uma construção do mandato de Fernando Henrique. Porém terá linhas próprias, mais desenvolvimentista ainda. Chaves para o terceiro mandato II A grande definição da política econômica virá do papel que dois personagens, que já estão com o terno de posse prontos, terão : Antonio Palocci e Luciano Coutinho. Se as opiniões de Palocci prevalecerem, as ideias válidas no primeiro mandato de Lula, estarão de volta. Se der Coutinho, vai valer a fase inaugurada com a entrada de Guido Mantega no ministério da Fazenda. Mas quem acompanha os humores do presidente Lula e suas cada vez mais explícitas manifestações públicas, não tem dúvidas : ele está vendo na sua frente o terceiro mandato que não pode disputar por não ter encontrado respaldo suficiente no mundo político e ter enfrentado resistências na sociedade. A chave desse terceiro mandato estaria no movimento multipartidário que o presidente já avisou que vai liderar com alegado propósito de facilitar a aprovação no Congresso das reformas estruturais que ele não conseguiu realizar. No entanto, há quem veja nisto o nascimento do PL - Partido do Lula - com o qual Lula manteria influência decisiva na política e na administração pública a partir de 2011. A economia sob Dilma É um erro pensar a política econômica da provável eleita Dilma como uma reprodução ou continuidade daquela estabelecida pelo presidente Lula. Dilma tem uma visão mais "burocrática" da economia, centrada em critérios "técnicos" e com objetivos determinados. Sua visão política da economia está estruturada na crença de que o Estado é a força-motriz do processo de crescimento. Não há aversão ao setor privado, mas Dilma acredita que as suas limitações e aversão ao risco são consideráveis num país emergente como é o Brasil. Lula prefere-se ocupar da política e estrutura a economia sobre pilares gerais (macroeconômicos) e sabe escolher prioridades a partir de sua sensibilidade política. Dilma está acostumada a lidar com aspectos microeconômicos. Ainda terá de ser provada em temas mais sistêmicos. É difícil que, diante de uma conjuntura tranquila, ela venha a mudar os pilares macroeconômicos. Todavia, é difícil estimar como Dilma avaliará cenários menos favoráveis. Os agentes econômicos permanecem tranquilos com Dilma na crença de que a macroeconomia seguirá sem maiores variações. O tempo dirá. Mas que fique o alerta : Dilma não é pessoa sem ideias próprias. O cenário externo Temos insistido nas últimas semanas para a inversão das expectativas nas principais economias mundiais. Agora o questionamento sobre a possibilidade de uma recessão prolongada é aberto e os temores com a redução da atividade econômica na China começam a pipocar, aqui e ali. O Brasil tem uma economia relativamente fechada e os efeitos sobre as expectativas ainda são pequenos. Todavia, não se deve subestimar os riscos externos. Estes são significativos e começam a rodear o mundo emergente, no caso a Índia e a China. O Brasil não será exceção muito embora o bom fundamento no curto prazo seja uma barreira positiva para que a contaminação externa seja minimizada. Dilma eleita terá de lidar com isto, uma tarefa nova para o seu primeiro mandato da vida. Confissão ? Lula, Mantega, Dilma e companhia garantem que não há nada de errado na política fiscal do governo, não há nenhum desarranjo como dizem os oposicionistas e muitos economistas. Pois bem, a Folha de S.Paulo de segunda-feira, pelos bem informados repórteres Kennedy Alencar e Valdo Cruz, anunciou que Dilma já está discutindo com Lula e seus assessores um duro ajuste na contas oficiais para ser aplicado no início de seu governo. Coisa que pegaria, até mesmo, os generosos reajustes dos funcionários públicos. Ora, se não há desarranjo, por que o ajuste fiscal ? Radar NA REAL 20/8/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,2674 estável estável - REAL 1,7635 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 66.677,16 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.071,69 baixa baixa - NASDAQ 2.179,76 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável A equipe de Serra e a derrocada Não são poucas as notícias que dão conta da falta de ânimo dos partidários de Serra. Dão a eleição como perdida. No círculo mais próximo de Serra comenta-se a personalidade centralizadora do candidato (não é fato novo), sua visão arcaica da comunicação e a sua pouca disposição em relação às mudanças. O mais incrível de tudo isto, é a passividade : diante de uma eleição difícil e do avanço de Dilma nas intenções de voto, por que não ser inventivo do ponto de vista da propaganda ? Por que não ser arrojado na "forma" da apresentação do candidato oposicionista ? A única inovação sensível foi chamar o candidato de Zé. Convenhamos : um político que foi chamado a vida inteira de Serra ser chamado agora de Zé soa ridículo. Além disto, foi perdida a oportunidade da primeira semana da campanha de TV do candidato na qual os eleitores estão mais propensos a ouvir o que os presidenciáveis tem a dizer. É muito provável que tudo continue igual, exceto as pesquisas que devem continuar apontando o favoritismo de Lula. Agora, é o Congresso Garantida, na ótica oficial a vitória de Dilma no primeiro turno, as atenções oficiais vão se concentrar um pouco mais nas eleições para alguns governos estaduais - São Paulo, por exemplo - e nas eleições para a Câmara e o Senado. O plano é fazer bancadas fortes na Câmara e no Senado, esmagar a oposição nas duas casas para que Dilma tenha uma vida legislativa sem aborrecimentos. É quando eles divergem Nesse ponto, PT e PMDB deixam de ser aliados e passam a ser inimigos. O PMDB sabe que se não fizer as maiores bancadas na Câmara e no Senado terá de ceder o comando de um das duas casas - seria a Câmara, onde ele pode ficar menor que o PT - para o aliado. No Senado o governo ficará mesmo com um novo mandato para José Sarney, um aliado que bem fornido não cria problemas. Perder a Câmara mancha os planos do PMDB de dividir ao meio o poder com Dilma, sustentado no tripé presidência da Câmara - presidência do Senado - vice-presidência da República. O governo conta com um crescimento legislativo expressivo do PSB para tentar contrabalançar o peso do apetite peemedebista. A divisão do bolo Alheios aos debates sobre os rumos políticos e ideológicos que terá um provável governo Dilma, os partidos aliados, pragmáticos como eles só, já fazem suas listas de ministérios e outros cargos que pretendem ocupar. E dentro dos partidos já começam a surgir disputas entre companheiros. Está crescendo o recurso ao velhíssimo fogo amigo. O silêncio dos inocentes Experientes, os peemedebistas hibernaram. Deixaram os aliados se atritarem. Enquanto isso, na surdina, acertam suas contas e fazem a lista de cobranças. Que, pelo que se sabe, não será pequena. Informações levantadas pelo Estadão dão conta de que querem espaço até na área econômica. Os peemedebistas finalmente perceberam que, mesmo com ministérios com bolso recheado, como Minas e Energia e da Integração Nacional, por exemplo, se não estiverem na boca do caixa, também, podem ter suas ações restringidas por contenções orçamentárias. A esperança não morre Celso Amorim, Guido Mantega e Henrique Meirelles alimentam a esperança de permanecerem em Brasília em 2011 com Dilma no Planalto. Os dois primeiros nos mesmos lugares onde estão hoje, Meirelles com um upgrade para um dos ministérios econômicos, segundo se diz um compromisso do atual presidente. Poderia ser também o "homem do PMDB" na seara da economia. A lista dos que querem continuar é imensa. Este é um dos dilemas da candidata petista, caso vença como apontam as pesquisas : se mantém as mesmas caras, dá a impressão de que Lula ainda dá as cartas no governo. Isto pode até ser bom na identificação com a população. Porém, será este o papel que ela própria se reserva - guardando o lugar do titular enquanto ele está impedido de atuar ? Tédio noturno O grande Stanislaw Ponte Preta (pseudônimo do jornalista Sérgio Porto) dizia, tal a pobreza estilística da tevê brasileira em meados dos anos 1960, que o melhor da televisão no Brasil era o botão de desligar. Os partidos nacionais, com sua propaganda de boa qualidade técnica, mas nenhuma qualidade política, estão fazendo um grande esforço para tornar o aforismo do sobrinho de Tia Zulmira uma realidade em 2010. Não é de graça que na primeira semana de campanha obrigatória tenha caído em cerca de 10% o número de televisores ligados na hora em que os políticos vão ao ar. Os avestruzes Reunidos no litoral paulista, os dirigentes das empresas de telecomunicações no Brasil soltaram uma "Carta de Guarujá" com as reivindicações do setor para os próximos anos. O palavrório de sempre, que certamente vai parar em alguma gaveta dos comitês eleitorais, depois de receber uma manifestação formal dos candidatos, a favorita nas pesquisas à frente. E tudo ficará na mesma. Eles ainda não perceberam - ou não querem - que, se eleita, a ex-ministra Dilma vai aprofundar o avanço governamental neste setor. Se há duas áreas em que Dilma vai ser mais Dilma e o PT ideológico mais PT será na das telecomunicações e da comunicação social. Só no Brasil mesmo A Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados considerou inconstitucionais os projetos de autoria do STF e da Procuradoria Geral da República que fixam o valor do subsídio mensal de ministro do STF e do Procurador Geral em R$ 30,6 mil em janeiro de 2011 e atribuem ao presidente do Supremo e ao procurador o direito de fazer a revisão desse valor a partir de 2012 por simples ato administrativo, a revelia do Congresso. Só falta agora o STF e a PGR estabelecerem novos cálculos da inflação e as normas de política monetária no Brasil. Bobagens à parte, invasão de competência de lado, as duas propostas e ensejam, sim, discussões políticas e econômicas mais aprofundadas.
terça-feira, 17 de agosto de 2010

Política & Economia NA REAL n° 114

De volta ao primeiro turno Com a confirmação, via DataFolha, de boa vantagem de Dilma frente a Serra, com o buraco de três pontos a menos para fechar logo a disputa no primeiro turno, a estratégia, o desafio de oposição não é mais tentar passar a frente da preferida de Lula. É ultrapassar o primeiro turno. E o tempo é curto - e as armas até agora apresentadas, ligeiras. A estratégia de ser oposicionista sem criticar Lula não está funcionando, pois é Lula o eleitor de Dilma - é ele e nada mais. E será que atacar um presidente com 80% de aprovação é producente ? O horário eleitoral, uma das apostas dos serristas, pode ter efeito limitado : todos aprenderam a vender bem sabonetes e outras quinquilharias. E Dilma está aprendendo a se comportar nos debates e entrevistas, o que parecia seu ponto fraco. À espera de um tropeço Resta à oposição, tropeços improváveis da concorrente. À parte, apostar num fato novo, inusitado. Um "Nelsonrodriguiano Sobrenatural de Almeida", personagem que não tem aparecido com frequência nas eleições presidenciais brasileiras desde a redemocratização. Quem abriu frente, por volta de julho, levou o troféu. Exceção de 1994 : Lula tinha extraordinária vantagem sobre FHC naquela ocasião. Foi então que sobreveio o "Sobrenatural", com o codinome de Plano Real. Não há sinais de novas feitiçarias no ar. Em tempo : nas contas oficiais, não muito disfarçadas, este jogo não terá prorrogação. Mais : hoje temos mais uma pesquisa Ibope. Veio na linha das outras : Dilma 43%, Serra 32%. Em que ponto ele errou ? Quando Serra lançou oficialmente sua candidatura, num evento em Brasília, para um público mais entusiasmado do que o que acompanhou a festa parecida do PT para Dilma, teve-se a impressão de que a estratégia do tucano de segurar a candidatura ao máximo, criticada pelos parceiros, tinha sido correta. Parecia também que tudo estava em paz na seara oposicionista. Os próprios adversários petistas chegaram a se preocupar, o que os levou a fazer concessões além do que pretendiam, aos aliados, especialmente ao PMDB. De lá para cá, fórmula Serra desandou. E hoje, parceiros e imprensa especulam sobre como e em que momento Serra errou. A resposta é simples : Serra não errou, Lula acertou. Parodiando mote de campanhas de Maluf, "foi Lula quem fez". O risco do efeito manada Se os tucanos e aliados não conseguirem nos próximos dias estancar o crescimento de Dilma, a campanha de Serra pode sofrer uma debandada nos Estados. Em alguns, aliás, os candidatos regionais da aliança oposicionista já não estão muito convictos da parceria. Ventos frios do norte O Japão apresentou números de crescimento mais fracos no segundo trimestre em comparação ao primeiro : não cresceu. A China está diminuindo a atividade econômica. Os EUA estão capengando no setor laboral e o consumo se estabilizou num patamar baixo. A Europa cresceu mais que o esperado, mas concentradamente (Alemanha e França praticamente cresceram sozinhas). Todo este quadro sugere que o risco de que a atividade econômica mundial venha a passar por momentos difíceis nos próximos 12 meses é significativo. Este quadro irá se refletir no Brasil no final deste ano e na inauguração do novo governo. O quadro é instável. Pode melhorar lá fora. Todavia, não é o que os números estão a mostrar. Radar NA REAL A queda significativa dos principais mercados mundiais na semana passada é claramente um aviso de que o cenário está pior. Foi uma reação aos números macroeconômicos de diversos países desenvolvidos, à decisão do Fed (dúbio no seu comunicado ao mercado) e ao enfraquecimento da atividade chinesa. É um aviso aos investidores mais otimistas : a tendência dos mercados é de piora, sendo a estabilidade o melhor cenário. Desde março deste ano, as cotações dos ativos gravitam em torno dos mesmos níveis. Sinal de que não há o desespero do final de 2008, mas não há a euforia dos mercados de 12 meses, entre março do ano passado e este ano. Tudo se revela confuso, mas a hora é de "caldo de galinha". Temos alertado para estes fatos. Não acreditamos no pior, mas não podemos descartá-lo. Infelizmente. 13/8/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,2810 estável estável - REAL 1,7568 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 66.264,43 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.079,25 baixa baixa - NASDAQ 2.173,48 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Em Minas, um enigma Mineiro tem fama de desconfiado e dissimulado, por isso mesmo Minas é sempre um desafio para os institutos de pesquisa. Coisas como "não sei", "ainda não decidi" - ou mesmo a confissão de uma escolha - podem ser apenas um disfarce, para não comprometer e até enganar o adversário. Porém, a discrepância de números entre as pesquisas do Vox Populi e do DataFolha para a eleição de governador nas terras das alterosas é de tal magnitude que não pode ser imputada apenas aos conterrâneos de Tancredo. Há um equívoco muito grande em um dos dois levantamentos. Veja-se : 1. Vox Populi - Hélio Costa 36%; Antonio Anastásia 26% - diferença de 10 pontos. 2. DataFolha - Hélio Costa 43%; Antonio Anastásia 17% - diferença 26 pontos. Nem os mais argutos experts em mineirismo político estão entendo esta. (...) e o dilema pessoal de Aécio Como Dilma passou Serra na preferência presidencial dos mineiros, põe-se um dilema para o ex-governador : vai de alma com o candidato tucano ? Ou deixa este barco ao léu para tentar captar votos petistas e dilmistas que engoliram a contragosto a aliança com o PMDB de Hélio Costa ? Outra : desagradando os tucanos paulistas, que tudo indica farão com facilidade o governador do Estado, em que barco Aécio ancorará seus planos de futuro ? Prudentemente calado Com o mundo eleitoral bem governado para sua candidata, o PMDB recolheu-se a um obsequioso silêncio, parou até de dar recados a respeito de suas pretensões. A hora da cobrança será depois de outubro. Contas erradas Aumenta entre os petistas que eles pagaram, nas alianças regionais, além da conta para ter os parceiros que hoje têm gravitando em torno de Dilma. Quem tem Lula, diz-se, não precisava ter ido a tanto. A compensação será em Brasília, quando Dilma, se eleita, começar a juntar sua turma. "Falta de educação" Em alguns lugares, costuma-se usar a expressão acima, como sinal de aprovação ou condenação de alguma coisa. "Um drible desses é até falta de educação [do autor para com o adversário]." "Perder desse modo é falta de educação [para uma derrota eleitoral acachapante]." Pois bem, os seguidos erros que o Ministério da Educação vem cometendo em relação ao Enem é, literalmente, "falta de educação". Ou melhor, de ineficiência gerencial e de respeito aos estudantes. Banda estreita Entra semana sai semana, e Rogério Santana, escalado para comandar a rediviva Telebrás, aparece para anunciar como será um aspecto do PNBL - Plano Nacional de Banda Larga. Porém, até o momento ele não saiu do papel, está exatamente apenas a carta de intenções oferecida ao país por Lula e Dilma há pouco mais de dois meses. Nem as 100 cidades que comporão a leva das primeiras beneficiadas do plano ainda foram definidas. Por razões de geografia eleitoral - têm de entrar no roteiro cruzado de viagem presidente e pupila. Mesmo com tantas indefinições em Brasília se sabe que uma paraestatal de telefonia, que recentemente adquiriu um sócio estrangeiro com as graças oficiais, é a favorita disparada para tocar o negócio, milionário, diga-se, em parceria com a Telebrás. Como diria Ibrahim Sued, "colunista mundano" em tempos mais amenos, em "sociedade tudo se sabe". Oi, com dinheiro da casa própria Segundo o jornal O Globo, a ex-supertele nacional Oi, utilizou uma manobra para reduzir os custos de seus empréstimos. Diz a reportagem : "Ela usou 263 imóveis de sua propriedade para captar R$ 1,6 bilhão a custos mais baixos. Os prédios foram transferidos a empresas controladas, a quem a Oi pagará aluguel. Os bancos Itaú e Safra compraram os contratos de aluguel de 12 anos - transformados em valores mobiliários - com dinheiro da poupança. O lastro imobiliário permite reduzir o custo de captação da Oi. Ao mesmo tempo, os bancos cumprem a meta de aplicação da poupança em crédito imobiliário." Ilegal a operação não deve ser, pois do contrário os bancos não aceitariam e o BC certamente suspenderia o negócio. Porém, para dizer o mínimo, é coisa estranha num país com as carências habitacionais do Brasil, com um ambicioso programa de construção de moradias, o badalado "Minha Casa, Minha Vida". E mais inusitado ainda que alcance uma empresa que levou alguns bilhões do BNDES e do BB para fazer um ajuste acionário e tem entre seus patrocinadores fundos de pensão de estatais.
terça-feira, 10 de agosto de 2010

Política & Economia NA REAL n° 113

  Um novo PMDB na praça ? Depois de eleito em 2002, como animal político que é, Lula percebeu que precisava fazer alianças políticas nada ortodoxas para governar. Mas quis manter certa pureza política e ideológica de seu governo e do PT, e tomou duas providências : 1. Vetou um acordo formal com o PMDB, negociado pelo então ministro chefe da Casa Civil - o PMDB já era a imagem acabada do fisiologismo que Lula então execrava ; 2. Arranjou algumas legendas auxiliares para acomodar os adesistas de sempre, sem manchar o governo. O mensalão derrubou toda a estratégia e as portas tiverem de ser escancaradas sem pedidos de atestados de antecedência. As bancadas do PT que surgiram das urnas já não tinham o mesmo pedigree de antanho, embora ainda mantivessem certas características. O governo, no entanto, começou a ter uma cara mais parecida com o PMDB nascido depois que o partido chegou ao poder com Sarney. Pelos arranjos partidários patrocinados por Lula para eleger Dilma e manter seu grupo no poder, O PT das urnas de 2010 deverá sair mais forte nos legislativos, mas também mais parecido com o PMDB que um dia Lula não quis a seu lado. O autêntico PMDB A referência bíblica de Michel Temer a um grupo de senadores, sobre a arte de repartir o pão e as artimanhas de compartilhar - ou repartir, esquartejar - o governo diz bem dos propósitos governistas ao entoar loas à candidatura oficial. O PMDB não nega sua vocação, desde que perdeu a aura de partido da resistência à ditadura e provou as delícias de Brasília. Obséquio do silêncio Não foi a primeira vez nas últimas semanas que o presidente da Câmara e vice de Dilma expõe, sem máscara e cruamente, o fato de não ser um mero coadjuvante num futuro governo comandado pela petista. Como a estratégia da campanha de Dilma agora é mostrar que ela tem e terá luz própria, as intervenções peemedebistas estão desagradando. Sem espaço Em Brasília, na área de quem sabe dos ventos, analisa-se as declarações de Temer não como simples escorregões, fruto de desatenção ou afoiteza. Afinal, Temer não é nenhum neófito, tem reconhecida habilidade política. De fato, o vice estaria apenas dando voz à insatisfação peemedebista com o ambiente da campanha oficial. Não há nenhum peemedebista - ou outros aliados - no alto - nem no médio - staff que assessora Dilma e o tal conselho suprapartidário, que nem funciona. O PMDB está de verdade apenas na equipe de programa de governo. E ninguém ignora o valor que esses documentos têm : nenhum. São destinados à prateleira das coisas inúteis da política brasileira. A questão é outra O PT cedeu espaços regionais. Nacionalmente, não cede sequer um ladrilho. Os aliados estão estrilando, mas em conluios fechados, pois o objetivo é eleger Dilma, e ponto. Depois de outubro, Dilma e Lula terão de dançar diferentes minuetos para evitar tiroteios entre aliados, com mortos e feridos. E o PMDB então entrará com sua principal arma, como disse e acredita Temer : o tamanho de sua bancada na Câmara e no Senado. A microeconomia está em ritmo lento Nos últimos anos não tivemos nem as reformas micro e nem as macroeconômicas. Questões centrais, tais como a tributação, proteção alfandegária, política industrial, etc., ficaram no falatório ou nas prateleiras. O que temos hoje é uma política de crédito oficial que privilegia empresas com critérios duvidosos de eficiência e interesse público. Os próximos meses serão ainda mais curiosos nesta rota do governo : a eleição traz certa paralisia dos negócios à espera do novo governo. Já se sente isto em setores de infra-estrutura, por exemplo. Há mais um dado : nenhum dos candidatos traz à tona uma discussão consistente sobre o futuro do desenvolvimento brasileiro. Existe um deserto de ideias e a possibilidade da continuidade das políticas "dos amigos" é elevada. Para o mal do país. Primeiro o nosso Soou extraordinariamente "espontâneo" o manifesto assinado por doze entidades empresariais da indústria defendendo as generosas linhas de financiamento subsidiado do BNDES. Também deve ter sido uma mera coincidência o documento, como matéria paga, ter surgido no mesmo dia em que, em Londres, começava a circular o prestigioso semanário The Economist com uma reportagem com as mesmas críticas que se fazem no Brasil e o manifesto tenta explicar. Ele teria sido mais forte e "espontâneo" se tivesse vindo acompanhado de uma relação dos empréstimos do banco, a juros módicos, para os associados das entidades. Nenhuma suspeita pairaria sobre interesses particulares. E tudo poderia ser comemorado com um grande churrasco com carnes carimbadas pelos frigoríficos que receberam gorduchos empréstimos. Ficaria, como se diz, tudo em família. Exclusão financeira Duas reportagens saídas nos últimos dias mostram a atual vocação do BNDES : 1. O jornal Valor Econômico mostrou que o banco aprovou empréstimos de bilhões de reais para apenas dois frigoríficos e negou apoio a outros médios e pequenos, com dificuldades. 2. Segundo a Folha de S. Paulo, 57% dos R$ 168 bilhões de financiamentos contratados pelo banco de 2008 a junho deste ano foram para a Petrobras, a Eletrobrás e apenas dez grupos privados. É o que podemos chamar de exclusão financeira, o contrário do discurso oficial. Para uns poucos, tudo. Para alguns, migalhas. Sem trocadilho. Decepção nos EUA Depois de quase três anos de políticas fiscais e monetárias frouxas, os números do setor laboral dos EUA, divulgados na última sexta-feira, foram um balde água fria nas expectativas. Há três meses, o desemprego não melhora e a economia patina. Um pouco notável, porém pouco comentado no Brasil, é que a paciência da população americana está caindo velozmente e o Congresso pode começar a ser uma fonte ainda maior de problemas para Obama. Se os EUA seguirem o exemplo europeu e apertarem o lado fiscal, a possibilidade de recessão nos EUA passará a ser muito concreta. Atenção aos navegantes. Euro forte O fortalecimento do euro nos últimos dois meses é fruto da decisão dos principais países europeus de, mesmo em recessão, reduzirem os déficits fiscais. Estão apostando que o welfare state aguenta as taxas de desemprego nos céus. Está se somando ao baixo consumo doméstico europeu os problemas de competitividade conhecidos (custo de mão-de-obra, excesso de regulação, etc.) e conjunturais (euro forte). Se nos EUA a possibilidade de retorno de uma recessão mais forte está cada vez mais concreta, na Europa talvez a recuperação não venha nos próximos anos. Radar NA REAL Férias no hemisfério norte, números macroeconômicos fracos nos EUA e Europa, e poucas notícias do lado corporativo, são notícias que têm feito os diversos segmentos do mercado financeiro e de capital ficarem letárgicos. Assim deve prosseguir o ritmo nos próximos dois meses. No Brasil, a atividade econômica está se moderando e os movimentos eleitorais paralisam os investidores. Tudo sem emoção e sem motivação para que os investidores mudem de posição. A volatilidade cai, mas o movimento também. Um tempo sem graça e sem tendência definida. O acúmulo de riscos de médio prazo não é pequeno no Brasil, sobretudo do ponto de vista fiscal. Mas quem há de lembrar isto quando ninguém nem sequer está disposto a conversar sobre o assunto ? Os tempos são de calma. Como no deserto. Melhor ficar parado, por enquanto. 6/8/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3240 estável estável - REAL 1,7533 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 68.094,76 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.121,49 baixa baixa - NASDAQ 2.288,47 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Desmilinguindo Do modo como as coisas estão andando no cabriolé eleitoral, o DEM caminha celeremente para passar a integrar o bloco dos partidos intermediários. Sua sorte mais do que nunca está atrelada ao desempenho presidencial de Serra. Trabalho árduo Não será das mais fáceis a missão dos organizadores da campanha de Serra para encontrar o tom certo para ele combater o discurso da dupla Dilma/Lula e encontrar um ou mais motes para empolgar um eleitor até agora frio, distante. É uma situação que beneficia Dilma - a inércia, pela força de Lula e a imagem de seu governo. O primeiro debate entre eles não trouxe nada inovador. Sono tranquilo Se os outros encontros entre os presidenciáveis - teremos mais quatro até 3/10 - seguirem a toada do de quinta-feira passada na Bandeirantes, vão encalhar os estoques de medicamentos para dormir nas farmácias brasileiras. Meros 10 minutos em frente ao vídeo dos debates bastam para fazer adormecer o mais recalcitrante dos insones. O efeito mais importante do ponto de vista da comunicação será dado no curto prazo pelas entrevistas dos candidatos na TV Globo, nos principais telejornais. São os dez minutos de fama dos candidatos. Em ebulição A espanhola Telefônica sozinha na Vivo. A Mexicana Embratel - grupo Carlos Slim - comprando a parcela dos acionistas minoritários na Net e tornando-se o maior acionista da empresa enquanto espera melhores dias para ficar oficialmente com o controle da maior operadora de tevê por assinatura no país. A Portugal Telecom virando a maior acionista individual da supertele brasileira Oi, talvez até como controladora, o que o tempo dirá. A inglesa Vodafone lançando seus tentáculos sobre a Tim no Brasil. A francesa Vivendi controlando a GVT. Nada de estranho num mundo globalizado, multinacional. Mas diante de tudo isso soa muito falso o discurso nacionalista do presidente Lula. Vem por aí muita discussão sobre questões regulatórias e de concentração nesta área. E talvez o governo tenha de patrocinar novas mudanças nas leis brasileiras - como no caso BrOi - para acomodar todo este novo quadro.
terça-feira, 3 de agosto de 2010

Política & Economia NA REAL n° 112

Um eleitor que é uma incógnita A "nova" classe média brasileira ou ainda a "classe média do Lula" contingente engrossado nos últimos anos com a classe D, já significa mais de 50% de todo o eleitorado brasileiro. Isto é : sozinha, se votasse em uníssono, elegeria o novo presidente da República. Naturalmente isso não ocorrerá, mas como nunca antes neste país ela será tão decisiva eleitoralmente. Mais até do que as elites, ditas formadoras de opinião, que o presidente Lula ataca de quando em vez em seus discursos para agradar à "nova" classe média. E mais que os descamisados definidos por Collor nos idos de 1989, dos extratos sociais D e E, do bolsa-família e dos programas sociais. Achado decisivo Desvendar esta "nova" classe pode ser o grande achado decisivo dos candidatos. Não se pode esquecer que ela foi engrossada com a aquisição, nos últimos anos, de 20 a 30 milhões de novos componentes egressos do mundo D e E. Dois dados devem ser considerados : 1 - os egressos tendem a incorporar os valores de seus novos parceiros, entre eles certo conservadorismo, tornando-se mais sensíveis a temas como ordem, segurança ; 2 - conquistada a ascensão, suas aspirações são outras, tornam-se mais exigentes em relação aos serviços públicos como saúde, educação, qualidade de vida de um modo geral. Este é o público a ser conquistado pelos marqueteiros. E onde se encontra, ainda, a maior parte dos indecisos. Para alerta dos marqueteiros Uma das conquistas que o novo contingente da classe C incorpora é uma assinatura de tevê a cabo, sonho de consumo que vem acoplado ao de uma tevê de muitas polegadas e avançada tecnologia. Entre 2009 e 2010, depois de um período de estagnação, o setor de tevê por assinatura cresceu fabulosos 40%. Prevê-se que chegará ao fim do ano com 9 milhões de domicílios plugados nos canais pagos, o que pode representar 40 milhões de brasileiros. E a tevê por assinatura não passa o programa eleitoral obrigatório. É nela que costumam se refugiar os eleitores que não suportam o artificialismo da publicidade eleitoral imposta. Quem está apostando na propaganda televisiva... BC : ao modo Chacrinha A súbita mudança de opinião do BC sobre os movimentos da economia brasileira em relação à atividade dos negócios e à inflação, com dois informes contraditórios em um curto espaço de tempo, deixou uma parte dos analistas de mercado confusa e outra desconfiada. E deu aos adversários da autonomia operacional do BC o argumento de que ele também pode errar - e feio. No caso, ter puxado demais para cima a taxa de juros. O mundo político-eleitoral oficial está esfregando as mãos de alegria. Chacrinha não teria feito melhor se a idéia era mesmo confundir não explicar. Radar NA REAL É provável que na próxima reunião do COPOM seja registrada a última alta dos juros básico deste ano e do mandato de Meirelles à frente do BC. A taxa de juros já está alta, mas o acúmulo de riscos externos (recessão continuada e instabilidade dos mercados), bem como de riscos fiscais no Brasil, deixarão a política monetária sob constante vigilância dos agentes econômicos. Nos mercados internacionais, o mês é de férias no hemisfério norte. Os diversos segmentos do mercado estão com liquidez mais restritas e todos estão a esperar os próximos números econômicos dos principais países do velho continente e dos EUA para decifrar para onde está indo a economia. Tudo muito quieto e, ao mesmo tempo, tudo muito instável. É possível que os mercados permaneçam estáveis e levemente positivos. O tempo de decisão da tendência do mercado será provavelmente em setembro/outubro quando as apostas para 2011 começarem a ser feitas. 30/7/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA estável alta - Pós-Fixados NA estável alta Câmbio ² - EURO 1,3060 estável estável - REAL 1,7549 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 67.515,40 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.101,90 baixa baixa - NASDAQ 2.254,70 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável A deplorável invasão O dossiê divulgado pela Folha de S.Paulo relativamente à presumida influência da filha do ministro Guido Mantega no BB é lamentável do ponto de vista ético no que se refere à evidente invasão de privacidade dela. De outro lado, também fica evidente o renovado interesse político de grupos nos vultosos recursos da Previ destinados aos investimentos. Este sim é um ponto que mereceria mais publicidade e atenção das autoridades, Congresso e da sociedade. Há "algo de estranho no reino dos fundos de pensão". Fim de semana azedo Foi de difícil digestão para tucanos e aliados o consumo da pesquisa do Ibope que deu Dilma com cinco pontos percentuais à frente de José Serra, portanto fora de curva da margem de erro, de dois pontos para cima ou para baixo. No tucanato esperava-se que a pesquisa confirmasse o resultado do DataFolha, com empate entre os dois, e não que avalizasse o Vox Populi, com os cinco pontos para Dilma e sinais de ascensão continuada da candidata de Lula. Foi uma decepção que se procura atenuar com a tese de que Dilma, pelo interposto presidente Lula, continua tendo mais exposição que Serra. É tese a conferir depois do debate de quinta-feira, na Band. Nestes debates reside a grande aposta tucana. Pode ser um erro. Ó Minas Gerais - 1 A maior decepção dos tucanos serristas veio das montanhas mineiras : o Ibope aponta por lá Dilma com 12 pontos de vantagem sobre Serra. Mais do que a vantagem que Lula alcançou sobre Alckmim em 2006, de pouco mais de 10%. A avaliação é a de que Aécio Neves ainda não arregaçou de fato as mangas, o que explicaria também a enorme vantagem que Hélio Costa tem sobre o candidato do ex-governador, Antonio Anastásia. Em Minas também há esta impressão : Aécio ainda não foi com toda a vontade para as ruas, nem por Serra nem por Anastásia, o que passaria a acontecer esta semana. Ele não pode perder o Palácio da Liberdade para não ficar sem espaço em Minas e com o futuro comprometido. A dúvida é sobre o que Aécio quer no Palácio do Planalto. Em Brasília a fofoca política diz que o jogo do mineiro seria outro e envolveria a presidência do Senado para ele já em 2011, em mais um surpreendente lance de nosso "presidencialismo de coalizão". Ó Minas Gerais - 2 Na interpretação dos tucanos, a estratégia do marqueteiro Duda Mendonça de colar a imagem do candidato Hélio Costa a de seu vice Patrus Ananias, de boa imagem no Estado, reforçada pelos anos de gerência do programa bolsa-família, expõe toda a fragilidade da candidatura do peemedebista. Ninguém vota em vice, insinuam os tucanos. Vê-se também, no caso, o tamanho do sacrifício que Lula exigiu dos petistas mineiros - a chance de tentar chegar, com um candidato competitivo, pela primeira vez ao Palácio da Liberdade. E ainda por cima com o risco de queimar eleitoralmente um bom nome como o do ex-prefeito Fernando Pimentel. Não vai ser fácil para Pimentel bater o ex-presidente Itamar Franco na disputa pela segunda vaga mineira no Senado, uma vez que a primeira vai ficar com Aécio mesmo. Para completar, se a chapa de Hélio Costa perde, Patrus Ananias também sai prejudicado. E Dilma, se eleita, não poderá compensar dois derrotados de Minas com bons lugares em Brasília. Se tudo isso ocorrer, o que não é improvável, o PT de Minas Gerais terá de começar de novo a partir do caos. Persona versus persona Será muito provavelmente no confronto entre as pessoas de Dilma e Serra que a campanha de TV e rádio tucana se desenvolverá. Na ausência de um discurso sedutor do ponto de vista programático, as lideranças tucanas acreditam que a personalidade "explosiva e antipática" de Dilma há de ser revelada ao público que tenderá a rejeitá-la. Uma aposta e tanto. Contudo, diante dos últimos números das pesquisas, já existem pressões da aliança oposicionista gritando por um plano B caso o confronto pessoal não surta efeitos. O tal plano B ainda não está totalmente idealizado, mas consistiria em atacar o governo Lula de frente, sobretudo no que tange aos escândalos conhecidos. Também seria uma aposta e tanto. Choro multipartidário Mesmo esvaziada politicamente pelo recesso do Congresso e pela campanha eleitoral, a Brasília partidária estava na semana passada mais para carpideiras do que para alegres candidatos em busca das urnas. A queixa é geral : os cofres dos investidores ainda estão muito modestos. Parece que há muito receio com a vigilância da imprensa e o ativismo do TSE. Até as "contribuições ocultas", aquelas feitas aos partidos para serem posteriormente distribuídas aos candidatos, sem necessidade de identificação do doador, estão arredias. Para a sociedade, esta conjuntura é positiva. Ataques eletivos Abriu-se a temporada de divulgação dos resultados dos bancos no Brasil no segundo trimestre do ano. Pelos primeiros já conhecidos, do Bradesco e do Santander, com excelentes desempenhos. Agora, porém, não ouviremos, pelo menos dos ares que sopram de Brasília de alguns políticos e de alguns partidos, nenhuma grita ensurdecedora contra os banqueiros e seus lucros inescrupulosos. Afinal, estão em plena temporada de caça aos investidores em campanhas eleitorais. Barganhas estatais Há mais de dois meses anunciamos nesta coluna que coisas muito estranhas estavam ocorrendo nos Correios. Semana passada, discretamente para não fazer marolinhas eleitorais, o presidente e um dos diretores da empresa foram afastados, homens de fé do PMDB e do ministro Hélio Costa. Para o lugar da presidência nomeou outro homem de fé do PMDB, agora da extração brasiliense. E para compensar Costa e o PMDB foi nomeado um diretor de time de basquete, ligado ao cabeludo suplente do candidato peemedebista ao governo de Minas, Wellington Salgado, para uma vaga na ANTT. Os nomeados nem precisam ser nominados. Sua credencial é a filiação partidária e o QI (nada relacionado com inteligência). A supertele nacional Muita água do Rio São Francisco ainda vai ser desviada até que sejam contados todos os detalhes políticos da entrada da PT - Portugal Telecom na Oi, ou BrOi. Outra quantidade idêntica de águas franciscanas ainda rolará até que sejam descobertas as vantagens para o consumidor de serviços de telecomunicações os negócios realizados na semana passada, apadrinhados por Lula e etc. Uma coisa é certa, porém : evitou-se que o governo, com seus braços empresariais do BNDES, dos fundos de pensão das estatais e outros tais, tivesse de dar uma mãozinha a mais do Tesouro à supertele nacional, agora binacional - luso-brasileira da silva. Há algum tempo escrevemos neste espaço que o governo faria tudo para desatar o mais rapidamente possível o nó da Vivo. Foi isto que foi feito.
terça-feira, 27 de julho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 111

BC, nada de novo O COPOM reduziu o ritmo de elevação da Selic. O aumento de 0,5%, elevando-a para 10,75%, não contrariou as expectativas, ao contrário, confirmou-as. Os últimos e moderados números de crescimento reforçaram a convicção de que o BC será mais leve na atual campanha de subida dos juros. Todavia, este é apenas um detalhe em meio à percepção de que, diante de elevados gastos públicos e atividade forte, a autoridade monetária vai continuar a protagonizar seu papel de "guardiã da moeda". Os juros estão em alta e vão continuar subindo. O ritmo mudou, mas o samba-enredo é o mesmo. Até o final do mandato de Lula. A política monetária vai mudar Se no curto prazo a política do BC não muda, há razões de sobra para acreditarmos que a partir do próximo mandato, seja quem for o presidente, vai sofrer alterações. A independência do BC é incômoda para os dois principais candidatos. Eles consideram a política monetária como parte integrante de toda política econômica (o que de fato é), mas têm visões que pregam que a harmonização deve ser feita em um âmbito no qual a Fazenda e o presidente possam defini-la. Ora, isto destoa do atual cenário do BC. Isto não significa necessariamente que haverá irresponsabilidade na condução da política de juros, mas a segurança de um BC mais autônomo deve ser perdida. Note-se que o caminho para tanto está mais pavimentado de vez que a constituição atual do COPOM é mais intestina ao próprio governo e isto facilita a mudança desejada por Serra ou Dilma. A política fiscal Se a política monetária será mais independente no próximo mandato, a política fiscal assumirá um papel mais substantivo. Disciplinar os gastos públicos e aumentar a eficiência dos investimentos estatais ganhará papel crucial para a manutenção da estabilidade de preços. Ora, aqui há diferenças e semelhanças entre os candidatos de toda a ordem. Destacamos apenas uma : Serra é um fiscalista convicto, conhece a máquina pública e exerce a coerção na execução dos gastos. Todavia, é um intervencionista nos moldes da CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e Caribe. O seu intervencionismo é relativamente flexível frente às regras de relacionamento com o setor privado, estimulando este último a participar dos investimentos. Já Dilma acredita menos em disciplina fiscal de curto prazo e mais nos resultados futuros dos investimentos públicos e seus efeitos sobre o setor privado. Ou seja, para ela o Estado é necessariamente uma locomotiva que corrige a ausência de investimentos privados. Assim, é menos propensa em ceder nas regras de relacionamento com o setor privado. Parece uma diferença sutil como alguns órgãos de imprensa - local e internacional - informaram. Todavia, não é nada sutil. Cenário confuso De um lado, resultados corporativos estimulantes da crença de que a economia mundial vai crescer, de outro números macroeconômicos sofríveis. Assim está a conjuntura nos EUA e na Europa. Uma confusão mental e tanto, para os analistas. Com efeito, somente no próximo trimestre do ano é que teremos mais luzes para iluminar as "bolas de cristais". Até lá, tanto o mercado quanto a economia vão oscilar muito e, na média, ficar onde estão. Radar NA REAL 16/7/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2946 estável estável - REAL 1,7643 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 66.322,99 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.093,67 baixa baixa - NASDAQ 2.245,89 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável As pesquisas e suas confusões Mesmos os analistas comprometidos com uma ou outra das principais candidaturas, possuidores lá de informações privilegiadas das pesquisas reservadas que as duas campanhas mandam fazer, estão confusos com a divergência de números nos últimos levantamentos do Vox Populi e do DataFolha. Algo não está batendo. As diferenças de metodologia - Vox pesquisa em casa, DataFolha nas ruas - e do tamanho da amostragem - pouco mais de 3 mil do primeiro, mais de dez mil do segundo - não explicam por si sós a vantagem de percentuais para Dilma num e de um p.p. para Serra no outro. Descarta-se, pela boa imagem dos dois institutos, qualquer hipótese de manipulação ou erro grosseiro. Mesmo um encadeamento de perguntas, ainda que involuntário, que possa induzir respostas favoráveis a um ou outro concorrente, não justifica tal discrepância. Muitas hipóteses foram levantadas por especialistas, jornalistas e palpiteiros, nenhuma conclusiva. Como não pode ser coisa do Sobrenatural de Almeida (homenagem a Nelson Rodrigues), nem artimanhas do Saci-Pererê ou do Boto, há que perscrutar mais. O Ibope vem aí até o fim de semana para talvez dar mais luz às dúvidas. Ou, para no melhor estilo Chacrinha, confundir ainda mais. Versão mineira para pesquisas Um experiente político mineiro, desses capazes de ouvir diretamente o sopro das urnas, sem precisar do auxílio da ciência estatística, e que por mineirismo no momento prefere o anonimato para não se comprometer, diz que a charada pode ser explicada pelo fato de nem a eleição nem os candidatos terem "pegado". Esperava-se que o eleitor, saído da Copa, mergulharia na campanha. Está preferindo outros divertimentos. Cinquenta por cento deles para o DataFolha e 45% para o Vox Populi ainda não definiram em quem votar. O campo está aberto, o que aumenta a relevância do horário obrigatório no rádio e na televisão e a responsabilidade dos marqueteiros. Na bolsa de apostas Nos meios mais bem informados, aqueles que já se ligaram nas eleições, a bolsa de apostas tende mais na ocasião para Dilma, mesmo entre os potenciais eleitores de José Serra. As razões para o palpite : a boa economia, Lula e a incrível falta de "pegada", de uma ideia forte, da campanha tucana. Ninguém, porém, esta jogando todas as fichas nas possibilidades da governista. Os donos do mundo Pelo que se pode inferir da longa entrevista de Michel Temer ao jornal Valor Econômico, o programa de governo de Dilma, caso eleita, será o do PMDB, ou mais próximo dele do que do PT que a candidata demonizou ao trocá-lo do TSE em menos de 12 horas. E quem dará as cartas neste governo futuro será quem fizer a maior bancada, isto é, se não sobrevier um desastre, o PMDB. Por trás de muitas ressalvas, Temer emergiu da entrevista já vestido com a faixa de primeiro-ministro ad hoc da provável gestão Dilma. É por essas e tantas outras que o PT está reforçando o cordão sanitário em torno de sua candidata e o tal conselho político da campanha da petista, com representantes de todos os partidos aliados não passa de um bibelô de penteadeira - enfeite de gosto duvidoso e inútil. Quem decide agora é Lula, Dilma, Palocci e José Dirceu. O restante é figuração. A dona do mundo Registra-se nos arrabaldes dilmistas cada vez mais irritação com conversas do tipo de que ela será submetida à vontade de Lula, à tutela de grão-petistas redivivos e de peemedebistas açodados. Passada a eleição, diz-se, ela vai mostrar de fato quem é : a Dilma de sempre, como naquela foto premonitória publicada pelo Estadão esta semana, com jeito crispado e dedo em riste. Uma seria persona eleitoral, que se deixa moldar. Outra seria a persona real. Para mostrar autonomia, ela pode tentar mudar muito mais que se imagina se for eleita. Daí a inquietação geral em Brasília, mesmo entre os adeptos da candidatura oficial, convictos de que ela já venceu. Pergunta inocente De um editorial do Estadão a respeito da desenvoltura financiadora do BNDES : "Trata-se de criar campeões nacionais ou apaniguados muito especiais ?" Ajuste de linguagem Por falar em BNDES, as autoridades econômicas precisam combinar o que vão dizer em público. O presidente do BNDES disse, viva voz, que era muito difícil calcular os custos para o Tesouro Nacional da operação "contabilidade de padaria" em que o governo toma dinheiro ao preço da taxa Selic (R$ 180 bilhões em duas operações, no ano passado e neste ano) e repassa ao banco para emprestar a 6% ou até menos. Dois dias depois, talvez com a ajuda de um super-computador, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, apareceu com um cálculo quase preciso : custa ao contribuinte, entre R$ 5 bilhões e R$ 5,5 bilhões anuais. Apetite pantagruélico Tem um gosto refinado o BNDES; ficou com quase 100% dos R$ 3,746 bilhões em ações lançados pelo frigorífico JBS e admite adquirir os R$ 2,5 bilhões também em debêntures que o frigorífico Marfrig anunciou que vai emitir caso não apareçam investidores privados interessados. Torcida no mundo da teles Em Brasília e num dos vértices do antigo "triângulo das bermudas estatal" no Centro do Rio, região onde se situam a Vale, a Petrobras e o BNDES, é imensa a torcida para que o negócio da compra da Vivo pela Telefônica se concretize o mais rápido possível e os portugueses da Portugal Telecom fiquem com o caixa gordo para desembarcarem na Oi. Isto evitaria desembolsos oficias e para-oficiais para a ex-quase multinacional brasileira de telecomunicações. O maior obstáculo, segundo gente do ramo, estaria na questão do controle acionário da Oi, o que estaria levando a certo desgaste da imagem de dois big bosses queridinhos na capital, generosos investidores eleitorais. Com as arcas recheadas e livres de um punhado de processos, Daniel Dantas gargalha nas arquibancadas. Dinheiro e política Faltando menos de dois meses para o "maior IPO do mundo" e a Petrobras ainda não explicou perfeitamente como vai proceder para vender algo como até US$ 80 bi de ações. Uma obrigação de transparência numa companhia com ações negociadas em bolsa no país e no estrangeiro e sob o controle acionário do governo. Há algo confuso nisto tudo. Pode ser apenas mera coincidência, mas as brigas pelo poder no seio oficial fazem circular, desde a semana passada, nomes de futuros presidentes da companhia. E na lista não há nada parecido com José Sérgio Gabrielli.
terça-feira, 20 de julho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 110

Confirmada a tendência negativa A divulgação dos resultados corporativos nos EUA somada com a maior fragilidade dos indicadores de consumo e, sobretudo, de expectativas, derrubou os preços dos ativos na semana passada. Mais importante que olharmos a "fotografia" daquilo que ocorreu pontualmente na semana passada, é importante nos fixarmos no "filme" dos últimos dois meses. A crise europeia reduziu substancialmente as perspectivas de crescimento mundial. A recuperação da economia norte-americana era consistente, mas ainda frágil naquele período. De lá para cá, o consumo se tornou mais instável e os investidores mais ariscos. Resultado : pouco a pouco, os fundamentos voltaram a se deteriorar e as expectativas entraram num ciclo vicioso. Agora, discute-se abertamente a possibilidade de uma dupla recessão mundial. Se ela vai ocorrer, ninguém pode ser categórico, assim como negligenciar os seus efeitos sobre as expectativas é erro substantivo. Brasil : atividade em redução A redução dos incentivos fiscais do governo a diversos setores, a elevação da taxa de juros e a dinâmica do investimento - em alta, mas ainda insuficiente - tem influenciado o desempenho da atividade econômica no Brasil. Nada que nos leve a concluir que se trata de uma reversão da tendência positiva da economia brasileira. Todavia, os sinais são de uma estabilização e provável queda da atividade neste segundo semestre. Isto coloca o BC numa posição mais delicada para aumentar a taxa de juros básica, bem como, faz com que os agentes olhem mais para o cenário externo e seus possíveis efeitos sobre as expectativas cá no Brasil. Não à toa, a bolsa de valores patina : ela sinaliza a fortaleza do país frente ao fraco cenário externo - uma vez que permanece com preços elevados - e, ao mesmo tempo, representa a ausência de uma atividade econômica crescente. Radar NA REAL Recomendar cautela aos nossos leitores tem sido uma prática constante desde quando detectamos, há dois meses, que os mercados mundiais tinham exaurido o desempenho eufórico iniciado no primeiro trimestre do ano passado. Agora o cenário é de alta volatilidade e inquietação constante dos investidores sobre o futuro. Do nosso ponto de vista, o risco dos mercados mundiais vai aumentar ainda mais nas próximas semanas em função da divulgação dos resultados corporativos do segundo trimestre do ano, bem como os sinais vitais emanados das principais economias mundiais, sobretudo os EUA. Preocupa-nos particularmente o andamento da política monetária brasileira. Como dissemos na nota acima, a atividade econômica parece estar se reduzindo e as pressões inflacionárias devem ceder. Ora, o BC arriscaria fazer um movimento adicional de elevação da taxa de juros ? Qual seria o ganho no médio prazo ? Estas são perguntas que vão se tornar mais enfáticas nas próximas semanas. Por fim, estamos mais pessimistas relativamente ao mercado acionário dos EUA. Nas próximas semanas, serão eles a sinalizar o humor do mercado. Que não anda bom, diga-se. 16/7/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2964 estável estável - REAL 1,7726 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 62.339,27 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.064,88 baixa baixa - NASDAQ 2.179,05 baixa baixa (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Bala envenenada Pelo andar do cabriolé, o Brasil vai engasgar feio com o tal TAV - Trem de Alta Velocidade - que está sendo empurrado goela abaixo do país em altíssima quilometragem. Nada explica tanta pressa num negócio avaliado em R$ 33 bilhões e alguns quebrados, inicialmente, com direito futuro aos aditamentos e outras providências naturais. 1. Na área de transportes, o Brasil tem outras necessidades muito mais vitais. 2. O maior problema do país, no setor, não é o transporte interurbano de passageiros. É o transporte público de massa nas grandes metrópoles e o transporte de cargas. 3. O projeto, que no passado foi vendido como "coisa da iniciativa privada", vai consumir mais dinheiro público do que se imagina, com os financiamentos subsidiados do BNDES, a capitalização de uma nova estatal em mais de R$ 3 bilhões e algo mais no futuro. A Usina de Belo Monte começou também como uma concessão e antes mesmo do início das obras já está com 80% do capital nas mãos do Estado ou dos fundos de pensão ligados às estatais. 4. O projeto está incompleto, pois menos de 5% dos estudos geológicos foram realizados até agora, o que poderá elevar substancialmente o custo final das obras. É por essas tantas que o TAV começa a ser chamado também de TAE  - Trem de Alta Eleitoralidade - e de TAP - Trem de Alta Periculosidade. Nem a "bala de prata" do Zorro é tão mortífera para os bandidos que o herói persegue quanto pode ser este trem bala para os cofres públicos nacionais. Mês produtivo. Produtivo ? Julho está sendo altamente produtivo para o lado mais estatizante do governo Federal. Viu, finalmente, nascer a Petro-Sal, com o aval do Congresso, e está para pôr de pé duas outras empresas estatais : a Segurobrás, para a área de seguros, e a Balabrás, com um capital superior a R$ 3 bilhões, para administrar o Trem de Alta Velocidade. Além da participação oficial na Usina de Belo Monte já ter passado dos 80%. Devagar, o Estado brasileiro vai engordando. É a emulação petista dos governos dos generais. Em nome do esporte A Copa de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 estão gerando medidas facilitadoras que, no futuro, poderão gerar coisas a respeito dos quais até Deus duvidará. A gestação destas medidas está com os burocratas do governo. Alguns torcem o nariz para o que veem. Todavia, a ordem vem de cima e com tom elevado. Competição ameaçada Embora o governo, pelo menos para o consumo externo, revele despreocupação, está crescendo entre os especialistas o temor com a acentuada perda de poder de competição da indústria nacional e com uma possível consequente desindustrialização do país. Somente entre sábado e ontem dois técnicos reputados trataram do tema : o professor David Kupfer, da UFRJ, e o economista Julio Gomes de Almeida, do IEDI - Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial e ex-secretário de política econômica do ministério da Fazenda sob a gestão Mantega. As análises se sustentam em dados da balança comercial. Por exemplo : as compras de bens de capital cresceram 26,2% no primeiro semestre na comparação com o mesmo período do ano passado, contra aumento de 49% nos bens de consumo. Ou seja, mais e mais estamos dependendo das exportações de produtos primários. No longo prazo pode ser desastre anunciado. E até antes, se a China, grande compradora dessas mercadorias, desacelerar de fato. Drogas : preocupação crescente O México viveu uma semana de terror - ou "narcoterror" como classificam suas próprias autoridades. Na madrugada de sábado um grupo armado invadiu uma festa de aniversário e matou 17 pessoas. Foram 57 mortes no fim de semana, ao todo. Na quinta-feira, um carro bomba explodiu pela primeira vez no país. A explosão e a chacina foram na região norte, na linha de passagem de drogas para os EUA. O México está definitivamente na rota do narcotráfico. No Brasil, pesquisas apontam a violência urbana (incluindo aí a questão das drogas e, em particular, o avanço do consumo de crack rumo à classe média) como a segunda maior preocupação dos brasileiros, atrás apenas da saúde (ver nota da semana passada). O governo lançou há menos de um mês um programa de combate às drogas, recebido sem entusiasmo, pois tinha ranço eleitoral. Desses que parecem feitos sob medida para cobrir lacunas de campanha, ao sabor dos eleitores. Não foi à toa que Serra há semanas acusou a Bolívia de Evo Morales, amigo de Lula - e, portanto, de Dilma - de propiciar o tráfico para o Brasil. Índio do Brasil, o vice de Serra, exagerou na dose, no tom e em tudo o mais quanto tentou ligar o PT e sua candidata ao terrorismo das Farc e tudo o mais, mas estava na rota da campanha oposicionista de acuar a situação neste assunto. O problema está ficando sério demais para ser tratado apenas com o olho gordo nas urnas. O ramerrão eleitoral Nada mais desinteressante, nada mais aborrecido no Brasil nos últimos sete dias - ou até mais - do que a campanha eleitoral, com sua charrete-chefe da sucessão presidencial. Os principais candidatos fazem todo o esforço possível para ficarem cada vez mais parecidos uns com os outros. E para que ninguém descubra suas ideias e intenções mais recônditas, apenas as mais óbvias. Esta semana talvez traga alguma emoção. Dois institutos - Vox Populi e DataFolha - vão divulgar pesquisas eleitorais nos próximos dias e, apesar de não ter ocorrido nada que justifique mudanças significativas em relação aos levantamentos de opinião anteriores, sempre pode surgir uma surpresa. Pouco a dizer Teremos também mais uma rodada de entrevistas, ainda não de debates, na TV Brasil : Dilma quarta, Serra quinta, Marina sexta. Será um teste a mais para o esconde-esconde dos candidatos e também para o jornalismo da televisão oficial. Se eles conseguirem manter o padrão das aparições anteriores, no Roda Viva da TV Cultura de SP, será tudo muito morno e dispensável. Urticária de Dilma Teremos na quarta-feira mais uma definição do BC em torno da taxa de juros básica da economia. Um assunto que causa urticárias no comitê de Dilma, pois dependendo do aumento escolhido pelo Copom ela não poderá calar, mas também não poderá falar muito. E que gera alvoroço no território de Serra, pois pode dar a ele mais um mote para bater na política monetária de Lula.
terça-feira, 13 de julho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 109

A "dupla recessão" I Depois da reunião dos países do chamado G-20, ficou evidente a divisão entre os países europeus e os EUA no tratamento da atual crise econômica. Há duas posições nítidas : os europeus estão investindo esforços políticos para viabilizar a disciplina econômica e reduzir os déficits fiscais nos países da eurolândia. Tudo isso em meio à recessão na maioria dos membros da UE. O desemprego está elevadíssimo e a atividade econômica, já carente de consumo, é mais capenga ainda de investimento. Já os EUA permanecem numa posição menos hesitante : estão dispostos a pagar o preço dos déficits elevados e tentar recuperar o emprego e o consumo que se perderam após o final de 2008. Há limites políticos para tanto, mas estes ainda não foram preenchidos. A "dupla recessão" II O cenário entre os países desenvolvidos se completa com as perspectivas mais positivas dos países emergentes, sobretudo a China. Todavia, há algumas dúvidas no front que inspiram cuidados : a China persiste crescendo ao redor de 10% ao ano, com a inflação e as contas públicas apresentando sinais negativos. É possível que em 2011 o governo comunista de Pequim resolva estabilizar o crescimento num patamar mais baixo, digamos, 6% ou 7%. Isso no momento em que a demanda mundial está fraca. Não se trata de algo promissor. O mesmo pode acontecer na Índia e Brasil. A Rússia depende muito das variações dos preços do petróleo. Estes aspectos não causam impacto no curto prazo, mas devem afetar o cenário no médio prazo. A "dupla recessão" III O problema das variáveis acima relacionadas é que os setores mais dinâmicos da economia, sobretudo o mercado de capitais, estão se tornando paulatinamente avessos a investir. Temem que a falta de impulsos concretos à demanda possa alimentar um longo período de fraqueza econômica e, até mesmo, uma outra recessão. Os preços dos ativos (ações, títulos de renda fixa, etc.) refletem um cenário de recuperação gradual, mas a discussão em torno de uma nova recessão deve alimentar uma nova rodada de especulação. A volatilidade voltou a subir nas últimas semanas, muito embora houvesse uma recuperação dos mercados. Não tenhamos ilusões : todo mundo está "com as barbas de molho". A discussão eleitoral no Brasil A campanha política deste ano será marcada por forte proselitismo em torno do crescimento. Todavia, é muito improvável que os eleitores tenham, da parte de Serra e Dilma, evidências mais concretas de como as barreiras fiscais, tributárias, sociais e de infra-estrutura - que impedem que o crescimento seja mais robusto - serão removidas. Assim, tudo não passará de uma discussão sobre quem é o "melhor gerente" do país. Todavia, a possibilidade concreta de um cenário externo frágil por longo tempo imporá mais critério na gestão fiscal e monetária a partir da inauguração do novo governo. Infelizmente, este aspecto não será tocado pelos candidatos e nem percebido pelos eleitores. (veja as duas notas abaixo) Caça aos eleitores Desde que as modernas técnicas de marketing político e eleitoral desembarcaram no Brasil, os ditos marqueteiros têm-se se esmerado em dar na comunicação dos candidatos aquilo que as pesquisas indicam ser a agenda, as reivindicações, as preocupações da população. As pesquisas determinam a pauta, as promessas, recheiam os discursos e alimentam os programas de governo, mesmo que o futuro governante tenha outras ideias. Acredita-se que a boa abordagem dos temas que a sociedade deseja ver resolvidos ajuda a angariar votos. No Brasil, antes do Plano Real e do atual processo de distribuição de renda e crescimento da economia, o topo desta lista era ocupado por inflação, emprego e salário, não necessariamente nesta ordem, dependendo da conjuntura. Agora, nessas eleições, a situação é outra. A saúde no topo Em primeiro lugar na lista das preocupações dos brasileiros neste ano da graça de 2010 está a saúde, curiosamente a área menos bem avaliada do governo Lula em diversas pesquisas. Em seguida, pela ordem, ficam : segurança pública (com a questão das drogas), desemprego, educação/fome e pobreza. Na opinião dos eleitores pesquisados, o candidato José Serra é o mais bem preparado para resolver os primeiros (saúde e violência urbana), Dilma o terceiro e o último (desemprego/fome e pobreza) e em educação os dois teriam as mesmas condições. Será fascinante acompanhar os ditos do tucano e da petista a respeito desses assuntos. A política externa Lula alterou substancialmente a rota da política externa do Brasil. Tornou-a multipolar e com alianças pontuais e dependentes do interesse temático. Não há alinhamentos automáticos, nem mesmo na América do Sul. O episódio do acordo com o Irã é talvez o mais emblemático. Resta saber o que pensam os candidatos sobre este tema que não atrai muitas preocupações dos eleitores, mas que será vital para os negócios do país. Sobretudo, quando a expansão dos investimentos estrangeiros no país está aumentando em velocidade e relevância. Dias de alívio passaram A semana promete pelo menos uma nova pesquisa eleitoral. Vai-se o sono da oposição e do governo, depois que as mais recentes sondagens convergiram para um empate entre Dilma e Serra. Um estudo do ex-prefeito César Maia, sobre a média dos levantamentos dos principais institutos, com base apenas nos votos válidos, aponta os dois, no fim de junho, com 44% cada na intenção de votos. A expectativa da oposição é que as novas pesquisas validem suas teses de que se esgotou a capacidade de transferência de votos de Lula para a pupila dele e que ela agora terá de andar sem as muletas presidenciais. A situação espera confirmar sua análise de que a recuperação de Serra é fruto da grande exposição que ele teve no rádio e na televisão por conta das aparições em programas dos partidos que o apóiam. Para os especialistas, o início oficial - quanta hipocrisia ! - da campanha não vai alterar o retrato do fim do mês passado. Agora, o grande eleitor vai ser a televisão. A não ser que aconteça algo de muito inusitado. BNDES no foco Dois grupos estão com suas atenções voltadas para o gigante do fomento. O primeiro, feliz, pois de lá está rolando dinheiro farto e barato. O outro, preocupado, pois a generosidade da instituição pode virar uma perversidade para as contas públicas e a economia nacional. Já causa apreensão ao BC, ciúmes no BB e é mais procurado do que o Ministério da Fazenda. É quase um superministério da Economia. Promiscuidade estatal Alerta de quem entende : está ficando perigosa a relação dos cofres do Tesouro Nacional com os de algumas empresas estatais. Já se fala em "orçamento paralelo", em "nova conta movimento" que nos tempos do regime militar funcionava como fonte para os projetos estatais via BB e outras bruxarias que custaram muito caro para a sociedade. E o Congresso ? Os parlamentos surgiram como um elemento de fiscalização e controle do erário. Fosse na era absolutista ou após as revoluções pós-1789, os políticos exerceram um papel fundamental para que o Estado não avançasse mais do que deveria sobre a sociedade. No Brasil, país de forte preponderância do Executivo, chega a ser impressionante o papel passivo do Legislativo na fiscalização dos gastos do governo. Os avanços do setor estatal são enormes, tanto quanto o acanhamento do Legislativo. Trata-se de uma questão vital para a sociedade, mesmo que esta também esteja passiva perante tudo que está aí. Para o veto de Lula Quando o Congresso estava para aprovar o aumento de 7,7% para as aposentadorias do INSS acima do salário mínimo, contra os 6 e poucos por cento propostos pelo Planalto, o governo ameaçou com o veto de Lula, caso deputados e senadores insistissem numa medida que, segundo o diagnóstico dos ministros Guido Mantega, seria um desastre para as contas públicas. Com os ventos eleitorais soprando cada vez mais fortes na sua nuca, o presidente fez com que os dois ministros encontrassem os cerca de R$ 1,6 bilhão que é o que custará a "bondade" do Congresso este ano e para todo o sempre, pois é uma despesa continuada. Semana passada, os congressistas, no bojo da LDO, com os aplausos das centrais sindicais, hoje totalmente engajadas na campanha presidencial patrocinada por Lula, deram curso a outra generosidade : determinaram que todas as aposentadorias e pensões do INSS devem ter um aumento idêntico ao que for dado ao salário. Pelos cálculos iniciais, tem um poder detonador de um "desastre" pelo menos dez vezes superior ao dos 7,7% que ele não vetou. Vetará agora em nome da apregoado responsabilidade fiscal de seus ministros econômicos ? Um segundo veto ? Na mesma LDO o governo deveria observar com atenção algumas "liberdades poéticas" concedidas pelos parlamentares a ministérios e órgãos públicos com potencial para produzir gastos excessivos e escândalos de bom tamanho. É o caso da exclusão das obras oficiais para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016 da lupa do TCU. E de normas que também dificultam o olhar o TCU sobre a Petrobras e a Eletrobrás ? Vetará Lula tais liberalidades, ele que nunca morreu de amores pelo TCU e seu rigor nos últimos anos ? Qual o jogo da Anatel ? Quem entende do riscado está alarmado com a decisão da Anatel, por medida cautelar, de tornar mais flexível o processo de concessão de TVs a cabo no Brasil. Em princípio, a liberalização é bem-vinda, pois ampliará a competição numa área ainda muito concentrada e de grande importância para a economia. Porém, do modo como está o setor e como ficaram as normas, apenas uma empresa poderá se beneficiar com as mudanças, ganhando vantagens no mercado mais cobiçado do momento e o considerado o negócio do futuro nas telecomunicações - o de banda larga. O mesmo no qual o governo está entrando, com mais volúpia do que admite publicamente, com a reinauguração da Telebrás. Segundo um estudo da IBM, conhecido na semana passada, em 2015 haverá no mundo 800 milhões de assinantes de banda larga fixa e 1 bilhão de banda larga móvel. E seria ilegal Juristas asseguram que, além de tudo, a decisão da Anatel é ilegal. Ela não pode, cautelarmente, suspender, como de fato o fez, normas da lei de TV a cabo. É função do Congresso, não de uma agência reguladora. Ainda mais uma agência cada vez mais submissa aos desejos do Executivo. Radar NA REAL Conforme dissemos nas notas que abrem esta coluna, a volatilidade dos mercados mundiais tem aumentado em função dos riscos de que haja uma nova rodada de desaquecimento da demanda global. Isto depende de muitas variáveis, é claro. Todavia, os riscos estão aí presentes e devem colocar um teto à crença de que há consistência na recuperação econômica. Assim, os diversos segmentos do mercado financeiro internacional estão nervosos com as perspectivas relativas à economia mundial. Nas próximas semanas, teremos a divulgação dos resultados trimestrais das principais empresas no mercado norte-americano. Estes resultados devem dar indicações sobre a saúde da recuperação mundial. Sobretudo, no caso das empresas transnacionais, os analistas irão se deparar sobre a origem destes resultados. Por enquanto, os resultados obtidos nas principais economias mundiais são sofríveis, exceção a uns poucos segmentos da área de tecnologia. Não estamos alterando o nosso radar que persiste negativo na maioria dos segmentos. Nas próximas semanas, teremos um aceso debate sobre a política monetária. Os indicadores brasileiros de consumo, investimento e inflação mostram sinal de estabilização. Nesse contexto, o quanto pode subir ainda a taxa de juros ? Esta pergunta ainda não tem resposta. 9/7/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2576 baixa baixa - REAL 1,7626 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 63.476,32 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.077,96 estável alta - NASDAQ 2.196,45 estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável
terça-feira, 6 de julho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 108

Como explicar ? Na média, umas pelas outras, as pesquisas de opinião pública dão a Lula uma popularidade superior a 80%. A aprovação de seu governo fica apenas uns números abaixo. Por onde passa, Lula encanta. A economia, vista no curto prazo, vai bem, obrigado. Há mais dinheiro no bolso da maioria dos brasileiros, principalmente nos de classe de renda mais baixa. Lula faz os diabos e um tanto mais para eleger o sucessor. Os eleitores brasileiros já estão informados que Dilma é o codinome de Lula na urna eletrônica. Nunca um candidato presidencial reuniu a seu lado tão amplo e heterogêneo arco de apoio partidário. Por que, com tantos e tão variados fatores positivos e com uma oposição tão sem rumo, Dilma até agora não se distanciou com grande vantagem de Serra ? É isto que intriga e planta caraminholas em muitas cabeças coroadas. Contas tucanas Com o segundo Ibope em menos de uma semana confirmando o DataFolha no empate técnico entre Serra e Dilma, contrariando prognóstico anterior do mesmo Ibope e do Vox Populi de que a petista tinha ultrapassado o tucano, além da margem de erro, o front oposicionista começou a trabalhar com a tese de que se esgotou a capacidade de transferência de grandes levas de voto de Lula para a pupila. Seria apenas marginal agora e a eleição seria olho no olho, onde Serra levaria vantagem. Contas petistas Naturalmente, não é o que se pensa nas hostes oficiais. Por lá fala-se em desvio estatístico - se não em juízos piores para os pesquisadores. No íntimo, o jogo é dado como liquidado no primeiro turno. Se alguém tem vocação para ser a seleção de Dunga, seria a oposição. Lula é craque, avalia-se (e não há dúvida de que o é na arte da política), e ainda não se expôs nem um décimo do arsenal de providências que tem para ajudar Dilma. O baú vai começar mesmo a ser aberto depois da viagem presidencial à África, esta semana. De todo modo, por precaução, Dilma vai continuar sendo preservada dos embates mais arriscados. Estratégia agressiva Se depender de alguns conselheiros, Serra será cada vez menos condescendente e cada vez mais contundente nas críticas às políticas do governo Lula. E não apenas Serra, todos os grandes nomes da aliança oposicionista seguirão na mesma linha. Veja-se o artigo do ex-presidente FHC no Globo e no Estadão deste domingo. O problema é como atingir um governo - e alguém - com os níveis de aceitação de Lula e de sua administração. Discurso complexo Para os trabalhadores, inclusos aí os da classe média, e substancial parte do empresariado a economia vai bem. Assim, é muito difícil articular a "política econômica" da candidatura presidencial da oposição. Ademais, faltam convicções da oposição em relação aos temas mais caros ao futuro do país, por exemplo, política industrial, gestão monetária e política fiscal. Há a dúvida de quanto isto rende votos. Ambos os candidatos estarão com um discurso favorável "a tudo que está aí", sendo que Serra venderá a imagem de melhor gestor do setor público quando comparado a Dilma. Se vai funcionar, é discussão para lá de longa. Estratégia da provocação Outro ponto da estratégia oposicionista é provocar o governo e a candidata Dilma a saírem do discurso e se manifestar na prática. Esta semana, por exemplo, a oposição poderá dizer-se em obstrução total no Congresso se não for colocada na pauta de votação da Câmara o projeto, já aprovado no Senado, de regulamentação da EC 29. A emenda estabelece o percentual mínimo que União, Estados e municípios devem aplicar na área de saúde. E fecha brechas para que despesas não tipicamente do setor, como pagamento de aposentadorias, por exemplo, sejam contabilizadas como tal, como fazem praticamente todos, a começar pelo maior. Calculam os especialistas que isto levaria mais cerca de R$ 10 bi por ano para os cofres do setor. O projeto não anda porque tem a forte resistência dos ministros econômicos. Para dar mais para a saúde é preciso cortar em outro lugar. A oposição quer provocar : quer mostrar se saúde é ou não é prioridade de Lula e Dilma. A área é uma das menos bem avaliadas do governo Lula. E Serra aposta na sua imagem de ministro da Saúde de FHC para alavancar votos. Confusão eleitoral O Congresso, em passado não muito distante, acabou com a verticalização eleitoral no país, a obrigatoriedade de se repetir no nível regional as alianças nacionais - um partido coligado com uma legenda nacionalmente não poderia ter parceiros diferentes nos Estados. Foi um "liberou geral". Quem vê as coligações estaduais hoje e olha as coligações nacionais vê a promiscuidade que se gerou. "Todo mundo é de todo mundo". De repente, já com o processo de formalização das coalizões eleitorais em fase decisiva este ano, o TSE estabeleceu uma nova verticalização : candidatos e apoiadores não poderão aparecer em programas de propaganda regionais se seus partidos não estiverem formalmente coligados. Assim, Dilma e Lula não podem surgir na propaganda de Geddel Vieira Lima, na Bahia, como quer o PMDB. Nem Serra pode ilustrar a publicidade de Fernando Gabeira no Rio, como desejam ele e o candidato verde. A confusão foi tanta, a reação irada dos partidos foi tamanha que o TSE decidiu suspender a validade da decisão tomada por ele mesmo até uma nova análise do assunto, em agosto. Até lá os partidos estão sem saber o que fazer. Analisa-se até a possibilidade de suspender formalmente algumas alianças, o que pode ocorrer até quarta-feira. Desfecho provável O mais provável é que as coalizões sejam mantidas, até porque as medidas de verticalização do TSE só terão efeitos quando o horário eleitoral começar. No início de agosto, o TSE falará de novo. Se não voltar atrás, a disposição dos líderes parlamentares é votar imediatamente no Congresso uma resolução anulando a determinação do TSE. Já há nos partidos e no Legislativo certa indisposição contra o excesso de interferência da Justiça nas regras eleitorais. A queixa é a de que ela não está interpretando a lei, está fazendo leis. As divergências no STF em relação à lei dos fichas-sujas - dois ministros deram liminares para registro da candidaturas suspeitas e um negou - reforça, segundo parlamentares, os argumentos deles. O presidente do Senado, José Sarney, político anguloso e que, por isso mesmo, contrariando o dito popular, não dá nó sem ponta, verbalizou esta insatisfação em seu artigo semanal na Folha de S.Paulo da última sexta-feira, cujo tema foi o da judicialização da política. O juiz está comprado ? Não se sabe por artes de quem, mas não é difícil desconfiar, surgiu, entre as normas da LDO de 2011, com votação prevista para esta semana, um mecanismo estabelecendo que, no caso das obras ligadas à Copa do Mundo - lembram-se há um PAC especial da Copa - a fiscalização do TCU não será necessária. No linguajar do futebol se dizia, quando um juiz - hoje árbitro - estava aliciado para patrocinar um determinado resultado para um jogo, que ele "estava na gaveta". Tivemos famosos "gaveteiros" em nossa história futebolística. Em outra dimensão - e que dimensão - parece que estão querendo reavivar a categoria no Brasil, na perigosa intersecção entre a política e o esporte. A propósito, não custa recordar a observação do jornalista inglês sobre o tema, publicada aqui neste espaço na coluna passada. Toda a atenção da sociedade será insuficiente. Tudo na mesma O mercado financeiro é conhecido pela sua capacidade de gerar fortes emoções. Neste momento em que os países do hemisfério norte estão iniciando o período de férias, há quase nenhuma emoção nos diversos segmentos do mercado. Algo sobre o qual já comentamos em diversas colunas anteriores. O cenário permanece pálido, com tendência negativa definida, valorização excessiva dos ativos comparativamente a um cenário externo fragilizado, sobretudo nos EUA e na Europa, e especulação acesa em relação ao futuro da inflação - o que mantém o segmento de metais preciosos com preços elevados. Brasil, riscos minimizados, retornos incertos Dez em cada dez economistas reconhece que os riscos de curto prazo - 12 meses a frente - da economia brasileira não são relevantes, sobretudo porque não há furos no financiamento externo. Todavia, as condições para um crescimento chinês sustentável no médio prazo ainda não são tão claras. Ora, como o cenário de curto prazo é bom e o de longo prazo é pouco visível, os investidores olham os preços dos ativos e concluem que a hora não é de comprar e também não é de vender. Resultado : o mercado flutua e "não sai do lugar". Radar NA REAL 2/7/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2534 baixa baixa - REAL 1,7721 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 61.429,79 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.022,58 estável alta - NASDAQ 2.091,79 estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Regulamentação do sistema financeiro norte-americano Esta coluna se aprofundou na análise das recentes medidas aprovadas pelo Congresso dos EUA em relação ao mercado financeiro do país. No fundo, trata-se de uma regulamentação de velha cepa e modernizada no que tange aos mecanismos de fiscalização e controle. Um passo relevante à frente com os olhos no passado. Todavia, os mecanismos de punição ainda são tênues frente ao potencial de "destruição" dos segmentos mais especulativos. Assim, a nova realidade do mercado é mais dura, mas dificilmente será suficiente para vedar os riscos de especulação. Tesouro dos EUA vende O governo norte-americano vendeu cerca de US$ 10 bi de ações do Citibank na semana passada ao mercado. Uma operação de sucesso, mas um aviso aos investidores : cada vez que os fundamentos dos bancos melhorarem haverá uma oferta governamental das ações que recebeu durante as operações de "salvação do sistema" entre o final de 2008 e meados do primeiro trimestre de 2009. O potencial de valorização das ações do setor financeiro está limitado pela farta oferta frente a demanda dos investidores.
terça-feira, 29 de junho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 107

Serra : da política à economia I Afora os passos políticos que tem sido dados pelo candidato tucano, temos de observar cuidadosamente as suas propostas econômicas, e as possibilidades destas seduzirem um vasto eleitorado. De fato, a campanha de Serra cai nas mesmas ciladas conhecidas na fracassada campanha de Alckmin, em 2006. Tudo é colocado na perspectiva de que Serra é um "gerente" melhor que Lula. O candidato paulista poupa argumentos contras as políticas de Lula, mas diz que é preciso avançar. Ora, do ponto de vista estritamente eleitoral isto parece pouco, pois não há razões, digamos, objetivas para o eleitor crer nisto. Para este eleitor a economia vai bem, o emprego e a renda melhorar (sobretudo entre as camadas mais pobres), o país não tem riscos no curto prazo e há crença da comunidade internacional - política e econômica - em relação ao país. Serra : da política à economia II Este "vazio" de propostas demonstra uma das faces mais efetivas na política brasileira : a oposição no exercício de seu papel fica esperando o tropeço do governo e, enquanto isto, não se estrutura para oferecer, à luz de sua ideologia, novos caminhos que sejam atraentes ao eleitor. Tudo fica no varejo, na ocasião e num proselitismo frágil. Há, ainda, a vaidade e os interesses regionais que reduzem as possibilidades de um discurso abrangente para o eleitor. Até mesmo o papel fiscalizador da oposição está desmoralizado pelas mesmas razões que esta acusa o governo : há "ligações perigosas" de todos os partidos, em diversas esferas governamentais, com esquemas de corrupção e tudo mais que verificamos nos jornais diários. Portanto, o que vimos, até agora, do principal opositor à candidatura de Dilma, foi muito pouco estimulante do ponto de vista eleitoral. Serra deveria seguir a sua própria máxima : "é preciso avançar !". A política econômica de Dilma De forma absolutamente sucinta podemos resumir as propostas da candidata do PT : ela é a favor de tudo o que aí está. Sem tirar nem pôr. Ausência de Lula no Canadá O Itamaraty e o Planalto precisam burilar a desculpa dada para cancelar a participação de Lula, na última hora, na reunião do G-20 no fim de semana no Canadá. Logo o G-20 que Lula tanto incentivou e que serviu de bom palco diplomático para o presidente. Esta de coordenar a ajuda ao nordeste é bem fraca. Inicialmente porque uma "coordenação", em tempos de tecnologia avançada da informação, internet e tudo mais, se faz em qualquer lugar, em Brasília, em Toronto ou na Eslovênia. Dois dias fora de Brasília não mudariam nada. O presidente demorou a se dar conta da tragédia nordestina. Ela começou a explodir na sexta-feira, dia 18, e ele apenas sobrevoou o local uma semana depois, na quinta-feira. Até aí o governo não viu urgência na história a ponto de o presidente se afastar da campanha eleitoral para ver Pernambuco e Alagoas arrasados. A ausência de Lula, segundo olhares diplomáticos "não-itamaratianos", tem mais a ver ainda com as reações de seus parceiros ricos à ação brasileira no Irã e com o que o G-20 poderia decidir e acabou decidindo : apoiar ações drásticas de corte de déficits públicos por parte dos europeus, posição contrária à do Brasil e a dos EUA. O "cara" não é de entrar em bolas divididas. G-20 : a Europa falou grosso Os EUA e os tais emergentes não acreditavam que a União Europeia viesse com um discurso tão pragmático e surpreendentemente unificado em relação à estratégia de superação da crise econômica que afeta o mundo. A posição europeia, como consta da nota acima, foi fiscalista : cortar o déficit fiscal drasticamente e assegurar a posição de crédito dos países do velho continente, sobretudo no caso da Itália, Portugal e Espanha. O Brasil ficou junto com os EUA neste tema, mas o diálogo entre ambos está truncado pela questão iraniana. Todos os países fora da esfera europeia queriam a continuidade do afrouxamento fiscal e monetário neste momento onde a recuperação é incipiente. Os efeitos desta divisão podem não ser sentidos no curto prazo, mas a união mundial em relação ao tema acabou. E há de repercutir no médio prazo. Para a atenção xerife A Petrobras perdeu em 2010, até sexta-feira, 25% do seu valor de mercado, correspondente à bagatela de US$ 52,9 bi. Um belo prejuízo. A empresa tem outros acionistas, além do governo Federal e negocia ações no exterior. Uma coisa é certa : parte desta desvalorização se deve ao falatório dos diretores da empresa e do governo em relação ao futuro da empresa. O "xerife do mercado", a CVM, está silenciosa demais, assistindo a tudo. Contabilidade de padaria - o retorno Notícia no jornal Valor Econômico da semana passada e que nos remete a nota com o mesmo título em nossa coluna anterior : "O custo fiscal dos dois empréstimos feitos pelo tesouro ao BNDES pode chegar a R$ 66,6 bi. Um estudo feito pela área financeira do BNDES calcula em R$ 36,6 bi o custo que o Tesouro terá de bancar pelo primeiro empréstimo, de R$ 100 bi, feito em 2009. A pedido do Valor, os técnicos fizeram uma estimativa muito simplificada do custo do segundo empréstimo, de R$ 80 bi. A perda fiscal, nesse caso, ficaria em torno de R$ 30 bi. As perdas ocorrem porque o dinheiro emprestado ao BNDES a longo prazo tem a TJLP como indexador - 6% ao ano -, enquanto o custo de captação do Tesouro é referenciado na Selic, hoje em 10,25% ao ano." Radar NA REAL Estamos passando por um momento em que o mercado mundial tende a andar de lado. Sem grandes variações e com paulatina redução da volatilidade nas variações dos preços dos ativos. Não há aspecto fundamental para mudarmos de opinião em relação aos principais segmentos do mercado financeiro mundial. A variação entre as principais moedas é que dará o tom do momento. Além disto, há a variação forte e para cima dos preços dos metais preciosos. A baixa taxa de juros vigente nos principais países faz com que os investidores se protejam de um cenário de inflação robusta no médio prazo - esta é uma especulação apenas dado o fato de que a "substância dos fundamentos" indica que a inflação pode ser controlada no futuro. 25/6/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2342 baixa baixa - REAL 1,7802 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 64.823,83 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.076,76 estável alta - NASDAQ 2.223,48 estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável O vice da discórdia. E do desespero ? E da confusão ? Até amanhã, muita ponte ainda vai ver águas turbulentas passarem por elas antes que volte a concórdia no ninho de tucanos e aliados por conta da escolha do vice de Serra. É bem provável que, por falta de opção, o DEM acabe aceitando Álvaro Dias, como um mal menor. Em processo de esvaziamento, o Democratas não está em condições de escolher muito. De todo modo ficou uma fratura na aliança oposicionista, marcada por desconfianças, de parte a parte, difícil de soldar em tão pouco tempo. Ficou também a clara evidência de que há mais confusão do que entendimento na campanha tucana. Viu-se que falta aos aliados o que se dizia faltar na campanha de Dilma : comando. Em grau variado, os oposicionistas estão repetindo nesse princípio da campanha presidencial de 2010, o mesmo vício das campanhas de 2002 e 2006 : mais desentendimento do que entendimento, muitas cabeças e excesso de sentenças. É apenas amadorismo ou constatação de que Lula está no caminho certo. Incógnita Se houve uma estratégia coerente com as projeções eleitorais para a escolha de Álvaro Dias como vice de Serra, e não só a tática minúscula envolvendo a eleição do PR, ela foi tão secreta que ninguém, até agora, fora do círculo íntimo do candidato tucano, atinou o que de fato seja. Um novo Maquiavel baixou nos poleiros do tucanato paulistano. Areias ardentes Aécio Neves, desde quando era governador de MG, tinha um hábito que não abandonou nem quando deixou o Palácio da Liberdade : costuma curar-se da agruras da política nas praias do RJ, sua cidade por adoção. Deve tomar cuidado ao pisar as areias cariocas neste tempo de confusão de vices no tucanato para não queimar os pés. Nunca seu nome foi tão referido em áreas de seu partido como nos últimos dias, a partir de sexta-feira. E não é de forma elogiosa. Ao que se diz : se ele quisesse não haveria tal confusão. A imagem de Serra Já informamos na nossa coluna passada que a campanha de Serra procurará enquadrar Dilma numa feição que seja negativa aos olhos do eleitor. Algo pessoal em que Serra é projetado como um "fazedor", um "professor", um "empreendedor", alguém que sabe projetar as suas virtudes pessoais em favor do povo. Dilma será a candidata "irritada", "de mal com a vida", aquela que é incapaz de "entender o povo" e assim vai. Tudo isto pode até funcionar, mas é algo de alto risco. Com Lula ao redor da candidata, esta estratégia pode não colar na governista. O eleitor pode ser até arisco, mas está longe de ser superficial. "Não está cabendo mais" Quanto mais Lula e Dilma alertam para os perigos do "já ganhou" - de público, pois no privado a vitória já é dada como conquistada no primeiro turno - mais cresce o salto agulha dos companheiros e aliados. As duas pesquisas, previstas para esta semana, do Vox Populi e do DataFolha, se confirmarem o que o Ibope escreveu no levantamento para a CNI, vai desencadear uma briga que já se trava clandestinamente pela divisão de um provável governo Dilma. Visto e ouvido em Brasília na quinta-feira : o PT não está disposto a pagar toda a conta que o PMDB está cobrando. Depois da urnas, medidos os votos, haverá acertos. Ele só pode estar brincando O líder do governo Cândido Vaccarezza sugeriu, como solução para arranjar recursos para a área de saúde - cerca de R$ 10 bilhões anuais que viriam da aprovação da regulamentação da EC 29 -, a aprovação também da legalização dos bingos. O dinheiro arrecadado com a taxação da jogatina seria destinado aos serviços públicos médico-hospitalares. Como deu tal declaração às vésperas do jogo do Brasil com Portugal e no auge das festas juninas, Vaccarezza só pode estar brincando. Eles só podem estar brincando Há muita gente certa de que, com muita pressão, vai faltar dinheiro público para construir um novo estádio em SP para a Copa de 2014, depois que a CBF comandou o descredenciamento do Morumbi. O governador substituto de Serra, Alberto Goldman, tem sido firme ao dizer que do mato do Palácio dos Bandeirantes não sai essa erva. O prefeito Gilberto Kassab não mostra a mesma convicção quando admite engenharias financeiras para bancar o projeto. Estádio para Copa do Mundo não é uma questão pública, é coisa privada. Vale lembrar, a propósito, uma declaração do jornalista britânico Andrew Jennings, especializado em negócios dos esportes ao jornal O Estado de S. Paulo deste domingo : "Qualquer brasileiro com mais de dez anos sabe que a corrupção em torno da Copa de 2014 já está instalada." Vamos guardar para comentar muito mais sobre o assunto no futuro. Embalando Mateus O governo mudou a lei para permitir que a Oi - ex-Telemar - comprasse a Brasil Telecom. Deu dinheiro público - empréstimos do BNDES, do BB, da CEF, investimentos do fundo de pensão - para financiar os maiores acionistas privados na transação. Acreditava-se, com isso e alguns pequenos e simples ajustes acionários, que estaria nascendo a grande multinacional brasileira de telecomunicações. Com forte viés estatal. Os ajustes não saíram ainda, um ano depois, porque não eram tão fáceis. A multinacional ainda está nas nuvens. E as dificuldades começaram a surgir, levando a nova multi - também conhecida como BrOi - a correr para as saias da madrinha. Primeiro, apareceu com um plano bilionário para ser a executora do Plano Nacional de Banda Larga. Era demais e não levou. Depois, foi pedir proteção contra uma eventual tentativa de compra por uma concorrente estrangeira. Agora, informa o Estadão, leva a Brasília um plano para montar um satélite brasileiro, em parceria com as Forças Armadas. Haja capital para os grandes sócios, que por acaso são do governo. Quem criou que ajude a embalar. Não foi por falta de aviso : a nova multi foi um negócio que poderia acabar nas arcas da viúva. Desmoralização Os ministros econômicos do governo estão se insurgindo, contra a proposta colocada na LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias, a ser votada provavelmente ainda esta semana no Congresso, para garantir um aumento real para o salário mínimo também em 2011, maior do que o governo pretendia dar. Eles também estão fechados para evitar que o Congresso aprove uma série de bondades para vários setores com o dinheiro público em época de quermesse eleitoral. Alegam, com razão, que não há recursos para tanto. Não comovem. É argumento desmoralizado. A viúva segundo um governista Observação de um governista que não tem nenhum resquício de rebeldia na alma : "Eles sempre dizem que não têm dinheiro e depois arranjam, como foi no caso dos aposentados. Eles querem que a gente faça o jogo sujo, mas aqui ninguém é bobo. Vão chorar noutras freguesias."
terça-feira, 22 de junho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 106

Fato novo e positivo Finalmente a China fez um movimento positivo em relação à atual conjuntura mundial. O governo comunista de Pequim parece estar iniciando um movimento de valorização de sua moeda. Usamos o "parece" porque em outros momentos as autoridades chinesas indicaram que iam fazer tal alteração de política econômica, mas acabaram não permanecendo nesta estratégia. Note-se que, na prática, a taxa de câmbio da China é estabelecida pelo governo independente das pressões por uma maior liberalidade em relação a esta variável. Por que esta alteração é importante ? A China é estruturalmente competitiva por uma série de razões, mas duas são determinantes : (i) o custo baixo de sua mão-de-obra e (ii) a política de manter o yuan desvalorizado. Numa conjuntura de baixa atividade mundial é fundamental que países como os EUA e aqueles que estão debaixo do euro sejam mais competitivos nas operações externas, seja para ativar as suas exportações, seja para aumentar a taxa de emprego via exportações. Ora, este passo dado pela China é importantíssimo para a consecução deste ajuste global. O país comunista sabe que é parte do jogo e lhe é conveniente esta flexibilização no momento. Todavia, não tenhamos ilusões : este ajuste será estrutural e as repercussões no curto prazo desta alteração de política econômica da China é apenas um pequeno passo na direção correta. Temos de observar mais. Efeitos nos mercados Há certo alívio no mercado mundial em relação à crise europeia. Este alívio pode ser apenas momentâneo em função da gravidade dos problemas encontrados no Velho Continente. Porém, é fato que o momentum é favorável nos diversos segmentos do mercado mundial. O anúncio da China relativamente à flexibilização de sua taxa de câmbio é, neste contexto, positivo e deve contribuir para levar o preço dos ativos para cima. Ainda não dá para ser mais enfático sobre a continuidade deste processo, mas é bom relevar as análises mais negativas em relação ao cenário. É o que estamos fazendo no que tange às nossas análises anteriores. Relembrando a Europa O BCE - Banco Central Europeu, as autoridades governamentais europeias e o próprio mercado ainda não sabem a dimensão dos riscos para o setor financeiro do financiamento das dívidas privadas e governamentais da Grécia, Espanha e Portugal, países mais afetados pela restrição de liquidez no mercado. Na imprensa internacional, tem saído uma série de notícias que indicam que a exposição do setor financeiro às tais dívidas é da ordem de US$ 2 trilhões. Um número gigantesco o que torna muito difícil saber qual pode ser o nível da inadimplência do sistema financeiro. De toda a forma, a restrição de liquidez no sistema permanece muito deficiente. Sobre o euro pesa o principal efeito no curto prazo perante estas enormes dúvidas. Radar NA REAL Estamos ligeiramente mais positivos em relação ao cenário externo, sobretudo no que se refere ao "fato novo" : a flexibilização da taxa cambial chinesa. Assim sendo, alteramos a nossa avaliação relativamente aos mercados acionários para estável. No cenário interno não existem "fatos novos". Ao contrário, a Copa do Mundo parece paralisar o andamento da política e da gestão econômica. O cenário de curto prazo é benigno e no médio prazo é possível que existam alterações mais substantivas na política econômica, especialmente no que se refere aos gastos públicos. Por enquanto, o que está mesmo a pesar é o cenário externo que passa por bom momento no curto prazo. 18/6/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2392 baixa baixa - REAL 1,7622 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 64.437,58 estável/baixa estável/baixa - S&P 500 1.117,51 estável alta - NASDAQ 2.309,80 estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável O que assusta em Dilma, o que assusta em Serra Nenhum dos dois é capaz de provocar turbulências como as que aconteceram em 2002, mas tanto Dilma quanto Serra são vistos com alguma desconfiança por investidores e agentes econômicos do alto da pirâmide. Teme-se em Serra possíveis guinadas mais fortes na política de câmbio e de juros, inovações tributárias que ele costuma adotar para aumentar a arrecadação e sua indisposição com o que classifica como excesso de autonomia do BC. De Dilma teme-se o gosto pelo estatismo, a inexperiência política, a dependência excessiva do pantagruélico PMDB e da estrutura burocrática do PT. O estômago do PMDB e os contrapesos do PT Não apenas os agentes econômicos parecem preocupados com o peso que o PMDB ganhou na campanha de Dilma - protagonista, não um coadjuvante. E assusta mais ainda a influência que o partido que já foi de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves deverá ter num futuro governo Dilma, a partir de sua bancada no parlamento. O PT, regionalmente, abriu tanto espaço para o PMDB - e para outros aliados, como o PSB - que já se fazem cálculos de que os peemedebistas terão representação na Câmara e no Senado maior do que a atual, enquanto o PT corre o risco de encolher. Sem contar que o PMDB deve aumentar também o número de governadores. Por essas e outras já se fala num possível "parlamentarismo caboclo" em 2011, com Dilma no Planalto e Michel Temer informalmente comandando o Legislativo. Pessoas-chave no PT É por essas e outras também que o PT está reforçando o cordão sanitário em torno de sua candidata, com o reforço dos papéis dos ex-ministros Palocci, um interlocutor mais do que confiável para o mundo econômico, e José Dirceu, um excelente "guarda de quarteirão" para enquadrar petistas renitentes e dar uns chegas pra lá em aliados inconvenientes. Não é ainda por outra razão que Lula tem dado sinais cada vez mais claros de que gozará a partir de 2011 de sua sonhada aposentadoria. Como o episódio do Irã, as frestas para a projeção exterior do presidente Lula estão fechadas, pelo menos por enquanto. Lula vai ficar ativo aqui mesmo. Não vai deixar Dilma entregue às feras, caso ela vença. Caso não vença, não deixará o sucessor em paz. O vice tucano - capítulo XXXX.....III Tudo indica que a escolha do companheiro de chapa de Serra se dê esta semana. Bem ao modo tucano, pode ser que fique também para depois, até a data fatal do dia 30/6. Tudo é incógnita. Certo mesmo é que os aliados oposicionistas desistiram de contar com Aécio Neves nesta vaga. Quase certo, também, é que a chapa deve ser "puro sangue", com dois tucanos que se biquem. O PP está descartado, porque ficou indeciso e também porque seu nome preferencial, o senador Francisco Dornelles, passou a dormir mal depois que ajudou a atenuar o projeto dos candidatos fichas-sujas. Os aliados PTB, DEM e PPS estão fazendo figuração externa, para consumo de seus filiados, de que estão disputando o lugar. Na realidade, vão acatar a decisão de Serra. Há muitos nomes na lista, porém ao que se saiba, Serra não abriu suas preferências para ninguém que não soubesse guardar muito segredo. Estratégia de comunicação de Serra Houve uma mudança, ainda não consolidada, em relação ao candidato tucano. Nas últimas aparições na TV é chamado de "Zé". Uma tentativa de popularizá-lo. Todavia, este é apenas um teste de conceito, como explanam os marqueteiros. A tendência é testar, além do conceito de "Zé", a imagem de professor. Uma coisa parece mais definida : o ataque em relação à Dilma vai ser mais pessoal, apostando na antipatia da candidata de Lula. A Justiça eleitoral e o caixa dois O TSE, depois de um bom tempo, aliás bons anos, validando todas as bandalhas político-partidárias e eleitorais praticadas por nossas legendas, agora resolveu fazer o que todos os eleitores esperam dele e é a sua própria razão de existir : fazer com que a atividade política no país seja mais limpa e competitiva. O primeiro sinal de que as coisas não seriam mais iguais veio com a decisão do TSE, depois confirmada pelo STF, estabelecendo normas de fidelidade partidária no país. A outra medida Em seguida, vieram as pressões, discretas, porém nada sutis, para que o Congresso aprovasse a lei dos fichas-sujas, uma iniciativa popular. Finalmente, na semana passada, veio a interpretação extremamente rígida das normas contra a inscrição eleitoral de políticos condenados, inibindo as manobras dos deputados e senadores para tornar a lei inócua. A Justiça eleitoral só não conseguiu, até agora, encontrar formas de acabar com o caixa dois e outros caixas menos nobres no financiamento das campanhas milionárias. O que já está jorrando de dinheiro agora não é brincadeira... Qualquer cálculo oficial de gastos apresentados por partidos e candidatos pode ser, sem risco de erro, ser multiplicado no mínimo por três. Com raríssimas, mas raríssimas mesmo, exceções. Campanhas estaduais inflacionadas Uma campanha para os governos estaduais dos grandes estados custa entre R$ 18 e R$ 20 milhões. Um número muito elevado se levarmos em conta que este valor não inclui os gastos comuns em relação às campanhas presidenciais. Esta informação foi repassada a esta coluna por gente que conhece muito bem o assunto de financiamento de campanhas. A fonte está impressionada com a "inflação do mercado eleitoral". Ego em baixa Levantamento feito pelo jornalista José Roberto Toledo, para o Estadão, nos discursos de aceitação de suas candidaturas, revelou que a candidata Marina Silva utilizou 28 vezes a palavra "eu", Serra, 18 vezes, e Dilma apenas 4 vezes. Nenhuma surpresa para tanta diferença Dilma não é Dilma, mas somente um codinome dele, Lula. Contabilidade de padaria No ano passado, com o balanço das contas da União consolidado, constatou-se que as principais estatais (Petrobras, BB, CEF, Eletrobrás, Correios, BNDES) entregaram ao Tesouro Nacional R$ 26,6 bilhões em forma de dividendos. Em tese, nada demais. Afinal, o governo é dono ou sócio majoritário de todas, e nada demais que usufrua de seus lucros, como qualquer acionista. Na realidade, porém, não é bem assim. O governo tem obrigado essas empresas a aumentar a transferência de seus ganhos para o Tesouro para poder mostrar que está cumprindo as metas fiscais, atenuadas no ano passado, de superávit primário. Parece que o governo obedece ao estabelecido na base de disciplina fiscal, com economia de gastos, porém não é tanto assim. No período de 1997 a 2006, segundo reportagem do jornal Valor Econômico, a contribuição dos dividendos das estatais para o superávit Federal foi em média de 11%. No ano passado, subiu para nada menos que do 67,8%, mais de dois terços. Além do mais, cria-se um problema mais sério. Para capitalizar o BNDES, por exemplo, o governo toma dinheiro emprestado ao mercado, pagando a taxa Selic. Ou seja, o BNDES dá dinheiro que ele tem de graça - seu lucro - para o Tesouro e depois o Tesouro paga juros para ajudar o BNDES. Indiretamente é o que faz também a Petrobras. Paga dividendos ao Tesouro Nacional e, em seguida, vai tomar empréstimos no BNDES e nos bancos para garantir seus investimentos. Não é nem como a contabilidade das velhas padarias.
terça-feira, 15 de junho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 105

O papel de Marina Para a saúde da política brasileira - e a própria sanidade do futuro governo -, depois da "comoditização" do debate eleitoral promovido pelos candidatos mais bem colocados nas pesquisas, ganha crucial importância a presença verde de Marina Silva na disputa. Deverão ser dela, no bom sentido, as melhores provocações para o debate, a introdução nas discussões de temas novos que não apenas as prioridades de praxe (educação, saúde, segurança), além do espírito verde que ela já despertou nos adversários. Principalmente, Marina será a consciência oculta da sociedade a atazanar a consciência excessivamente pragmática dos oposicionistas, liderados pelos tucanos, e dos governistas, comandados por Lula. Por imposição da livre atiradora, os dois serão obrigados a discutir - e a assumir compromissos que não pretendiam assumir e que pode lhes causar constrangimentos com aliados mais vorazes e menos comprometidos com a ética política. Marina é a esperança de que a sucessão presidencial este ano não caia num triste e vergonhoso ramerrão, desses, como diria Nelson Rodrigues, de fazer corar até um frade de pedra. Os formadores de opinião É mais significativa do que tem registrado a imprensa tradicional a penetração da candidatura da ex-ministra do Meio Ambiente nos meios intelectuais e em certos setores da classe média. Sem contar a conquista de viúvas do PT pré-poder e do tucanato dos primeiros movimentos. Não é uma massa, mas tem poder de vocalização capaz de ajudar a candidata do PV a galgar alguns degraus decisivos no termômetro das urnas. Marinistas já imaginam que ela pode chegar a 20% no primeiro turno. Com isso levará a eleição para o segundo turno e se tornará decisiva na disputa entre Serra e Dilma. PT e PSDB não estão, pelo menos para consumo externo, levando a sério esses movimentos. Alguém pode quebrar a cara com tal menoscabo. Temas-tabu Na lista de temas que Serra e Dilma querem evitar já podem ser incluídas definições sobre os termos da necessária reforma da Previdência e a questão que está na ordem do dia do Congresso, a reforma do Código Florestal. O assunto do Código está explodindo, e é séria a divisão entre ruralistas e ambientalistas ; não se sabe o que os dois pensam de fato sobre um assunto crucial. Medo de perder votos - e financiamentos de campanha. Marina - não importa se da melhor forma - já se definiu. Omissão neste caso é crime. Quanto à Previdência, o silêncio também é constrangedor. Dilma há poucos dias teve de fazer contorcionismos dignos de artistas do "Circo de Moscou" para desdizer o que tinha dito sobre o assunto. Serra e Dilma, sem definições econômicas Pode-se até especular sobre o que cada um dos candidatos à presidência da República pensa sobre os temas econômicos. Todavia, os discursos de lançamento das candidaturas não deixaram nenhuma evidência sobre as suas diferenças na condução da economia. Parecem irmãos siameses neste particular. Talvez sejam realmente iguais naquilo que diz respeito à intervenção do Estado na economia e o papel-motriz dos gastos do governo na execução de planos de desenvolvimento. Uma coisa é certa : não será na economia onde se registrará substanciais diferenças entre os candidatos : Dilma se fixará na defesa dos sucessos do governo Lula. Serra, na defensiva, terá de defender FHC. É o que parece. Enfim, oposicionista Pelo tom do discurso de sábado na Bahia, quando foi sagrado candidato tucano à Presidência, José Serra finalmente descobriu que concorre pela oposição e na corrida presidencial não há lugar para uma Dilma do B, como ele dava a impressão às vezes achar que poderia ser. Enfim, as coisas no lugar Como diz o personagem de uma série humorística na televisão, "sem querer, mas querendo", o presidente Lula estabeleceu de vez quem é candidato à Presidência na aliança governista : o próprio Lula. Dilma vai apenas ser um pseudônimo na urna, uma vez que, por injunções das leis eleitorais, há um vazio na cédula. Por essas e outras, as pulgas que ficam atrás das orelhas dos políticos dotados de mais acurácia começam a ter certeza de que o projeto político real de Lula depois de deixar o Palácio do Planalto no fim deste ano é o Palácio do Planalto em 2014. Noivado no escuro PT, PMDB e companheiros de menor porte já selaram suas alianças. Do lado da oposição de PSDB e DEM já se deu o mesmo. Faltam apenas ajustes menores. Nenhum dos dois, no entanto, apresentou seu dote, os planos de governo. É isto que eles clamam, de boca cheia, de aliança programática, "para melhor servir ao Brasil". Um bom cultor da língua pátria dá a isto outro nome bem menos nobre. Que tal convergência de interesses ? Na UTI Inspiram mais cuidados do que os analistas oficiais gostam de admitir as alianças governistas em Minas, com Hélio Costa na cabeça, e no Maranhão, liderada por Roseane Sarney. Já deixou sequelas irremediáveis. Nas terras maranhenses, pela força do clã Sarney - força em todos os sentidos - pode não dar necessariamente no desastre. Nas montanhas das Gerais, Hélio Costa caminha para ser o grande traído destas eleições. No limbo Serra e os tucanos se enrolaram tanto na escolha do vice da chapa oposicionista que estão correndo o risco de comprar um problema, qualquer que seja a escolha que venham a fazer agora. Não ter quem acrescente e sim alguém que trará complicações. O insaciável Bordão registrado por ouvidos planaltinos atentos durante a convenção peemedebista no sábado : "PMDB já decidiu. Michel e Dilma presidentes (grifo nosso) do Brasil". Michel Temer completou o recado quando disse que o PMDB não vai ser coadjuvante do poder, será condômino. Até agora, o PMDB está dando de goleada no PT na formação de alianças. No PT, já se pensa em formar um cordão sanitário, uma tropa de choque em torno de Dilma. Os mais assustados acham que o PMDB pode querer instalar uma espécie de parlamentarismo de fato na próxima gestão, com as grandes bancadas que pretende formar - com a ajuda do PT - na Câmara e no Senado e com a experiência do "presidente" Temer com as coisas do Legislativo. A história se repete ? Os Correios tiveram seus dias de glória no mensalão. Estão de novo na berlinda. São feudos do PMDB, com algumas glebas deixadas ao PT. Pré-sal eleitoral A rima do título é rima pobre, de pagodeiro ou sertanejo "muderno", mas os objetivos da pressa na votação dos projetos do governo das novas regras de exploração de petróleo no país, sabidamente não o são, do ponto de vista eleitoral. Antes de surgirem as plataformas em alto mar, nas ricas bacias do pré-sal, a riqueza marinha nacional foi escalada por Lula para integrar outra plataforma - a das eleições. Sabendo da pressa oficial, incluindo no negócio a velocidade para capitalizar a Petrobras antes que o cobertor dos fantásticos investimentos anunciados pela empresa fique curto, o Congresso e outros também quiseram ter a sua plataforma, que veio em forma da divisão equânime dos royalties do petróleo, velho e novo, sem distinção entre Estados e municípios produtores. Lula não queria que esta parte do projeto fosse votada agora, pois fere o Rio de Janeiro e o governo Sérgio Cabral do PMDB, aliados incondicionais de Dilma e onde a candidatura espera amealhar um "marzão" de votos. Mas como todos os outros também estão de olho no dinheiro e são maioria, e o pré-sal eleitoral pode render votos, o Senado confirmou esta semana o que a Câmara já havia determinado : o petróleo é de todos. Lula e Dilma até acham isto. Não confessam, ainda. E os votos do Rio ? É caso : quem com urna ameaça, com urna será ameaçado. Radar NA REAL Analistas mais independentes estão considerando seriamente, à luz dos últimos indicadores de consumo e investimento dos EUA, que a possibilidade de se voltar a um quadro recessivo é considerável. Não à toa, o ouro voltou a brilhar. Suas cotações novamente alcançam patamares próximos daqueles registrados no auge da crise financeira. Bem, os mercados de ações voltaram a patamares interessantes para realização de lucros. Aqui e lá fora. Por aqui, o BC mostrou que seguirá na sua política anti-inflação. A atividade econômica está muito acima daquela que é sustentável e os investidores poderão se surpreender com o patamar dos juros ao final desta ano, possivelmente superior ao esperado pelo mercado. 11/6/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2248 baixa baixa - REAL 1,8047 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 63.605,38 baixa estável/baixa - S&P 500 1.091,60 baixa/estável alta - NASDAQ 2.243,54 baixa/estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável
terça-feira, 8 de junho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 104

Os aloprados de 2002 e os aloprados de 2010 Nas eleições presidenciais anteriores, Lula, então disputando o segundo mandato, tinha todas as condições - e muita mais - de levar a vitória logo no primeiro turno. Por duas razões : 1. Depois do perigoso tropeção dos mensaleiros, quando por pouco não sofreu um processo de impeachment, ele entrou na disputa com a popularidade em alta, não tão alta como agora, mas já uma das maiores dos presidentes do Brasil República. 2. Seu adversário, Geraldo Alckmin, não era - como não é - de empolgar eleitor, uma desvantagem quando se disputa com alguém com o faro popular de Lula. E, ainda por cima, foi vítima do desânimo e da má vontade dos próprios companheiros. O dossiê paulista Mesmo com todas essas vantagens comparativas, no entanto, Lula acabou sendo forçado a disputar o segundo turno com Alckmin. Uma das razões pode ter sido a resistência de uma parte do eleitorado brasileiro - as tais elites ? - ao modo de ser petista. Não esquecer que em 2002, apesar de toda a empolgação popular e até de parte das "elites" com o novo PT, da impopularidade do presidente Lula e do pouco apelo para a oposição da então candidatura José Serra, Lula não ganhou no primeiro turno. Este fato pode ter influenciado em 2006, mas o grande fator mesmo foi a descoberta de um esquema para compra de um suposto dossiê contra o mesmo José Serra, com o fito de dar fôlego à candidatura de Aloizio Mercadante ao Palácio dos Bandeirantes. Lula classificou os companheiros envolvidos no episódio como aloprados e ficou por isto mesmo, tanto no âmbito partidário como na seara policial e jurídica. Politicamente, porém, fulminou de vez a já cambaleante pretensão governamental de Mercadante e respingou nos votos de Lula ao revelar métodos nada republicanos do petismo. Arapongagem de terceira geração Agora, ressurgem os aloprados no comitê de Dilma. O método da arapongagem e dos dossiês é o mesmo, mas as motivações são diferentes. No caso Mercadante, o sentido era simplesmente atingir o adversário e alavancar a candidatura petista. O alopramento 3G de 2010 tem mais de um objetivo do que o de meramente abater o concorrente. Um de seus alvos, talvez o principal, é formar, digamos, massa crítica contra os próprios companheiros, na disputa por cargos e influência numa futura administração. Como, com base nas análises principalmente do Vox Populi, os petistas estão já se vendo com o direito a mais quatro anos - ou oito ou até doze - no Palácio do Planalto, trata-se de uma nada surda e já pouco velada disputa interna de poder. Nesta caiu um assessor de escalão inferior, o ex-jornalista Luiz Lanzetta, e feriu-se com escoriações mais do que generalizadas uma figura de primeira linha - o ex-prefeito Fernando Pimentel, a quem seu grupo já atribuía, pela renúncia em MG, a chefia da Casa Civil. O mesmo lugar cobiçado pelo PT paulista para Antonio Palocci ou Ruy Falcão. Os aloprados 3G e as disputas antecipadas pelas graças de Dilma presidente podem fazer mais estragos à campanha governista do que tudo o que Serra e seus apoiadores podem imaginar e aprontar. O pior momento de Lula em seus oito anos não veio de tucanos e companhia, veio dos mensaleiros amigos. Manda quem pode... ...obedece quem tem juízo. Como estava escrito nas estrelas desde o início dos tempos, não chamasse o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, o PT de MG cedeu ao PMDB de Hélio Costa a primazia de disputar o Palácio da Liberdade. Do mesmo modo, onde Lula achou essencial, o PT seguiu a mesma sina, com nuances : no RJ, por exemplo, foi festivamente para os braços de Sérgio Cabral, sem dramalhões, ao estilo dos blocos carnavalescos. No MA, com estrilos, pôs-se neutro na disputa entre os aliados Roseana Sarney do PMDB e Flávio Dino do PC do B. Palanque duplo apenas onde Lula julgou viável. Ninguém arrosta uma popularidade acima dos 90%, ainda mais quando na sua jornada em torno do poder jogou ao mar, num estranho suicídio coletivo, suas lideranças mais promissoras trazidas com Lula à primeira cena com a eleição de 2002. Resta pensar as razões de tão forte "rebeldia" em MG, por exemplo, diante do que já se sabia inevitável e do extraordinário apego do PT e de Lula aos princípios do centralismo democrático. Para efeitos internos Desde sempre estranhou-se as resistências internas do PT mineiro, de tradição - não fosse mineiro ! - conciliadora, e de Fernando Pimentel a um aliança com o PMDB que não tivesse o próprio PT comandando a chapa. Pimentel, amigo de Dilma influente quadro nacional partidário, além de um político cordato e conciliador, sabia perfeitamente da importância do acerto em Minas para a campanha nacional de Dilma : consolidação da aliança nacional em torno dos seis minutos peemedebistas no rádio e na televisão e formação de palanque forte para a preferida de Lula no segundo maior colégio eleitoral do país, com quase 11% do eleitorado total. E, no entanto, Pimentel esticou os cordões da marionete até o fim. Esticou porque precisa dar satisfações ao PT mineiro, insatisfeito com a perda do que os petistas locais consideram como sua maior oportunidade de conquistar, pela primeira vez, o governo estadual. Eles tinham dois candidatos competitivos - o próprio Pimentel e o ex-ministro Patrus Ananias - e o adversário é tão ou mais neófito na política eleitoral quanto a petista federal Dilma. Pimentel precisava também conter a contaminação dos eleitores petistas pelo desânimo dos companheiros partidários. Quem farejou MG nesses dias percebeu que o trabalho no divã político do PT junto a seus eleitores será delicado. A alma petista mineira está sofrida. Foi bom para Lula também A dita "rebeldia" mineira no PT não foi de todo mal para Lula. Ao contrário. Tanto que em nenhum momento os "inconfidentes" mineiros foram atacados de público. E Lula sabe fazer tal com dureza e precisão cirúrgicas. Foram simplesmente admoestados, pelas vozes portadas em silêncio, oficiosamente. "Lula está agastado", "Lula não gostou" e tais, ditos sem certificado de origem. Para Lula, MG rebelada serviu de advertência ao PMDB para que ele moderasse seu apetite. Para mostrar ao time de Michel Temer que o PT tem limites que nem a razão eleitoral de Lula pode obscurecer. E que a aliança poderia ruir no momento em que Dilma cresce nas pesquisas e, segundo as contas oficiais, tem ritmo de fôlego para levar a eleição no primeiro turno. Até as convenções nacionais marcadas para o fim de semana - PMDB no sábado, PT no domingo - quando os palanques regionais estarão no mínimo apalavrados, será possível saber se o PMDB levou a sério o recado mineiro ou considerou que seu cacife de seis minutos na propaganda eleitoral era mais alto. Os gaúchos, a chave O comportamento do PMDB no RS dará a indicação para o enigma elaborado acima : se definir-se por conceder também palanque a Serra na campanha de Fogaça, o PMDB dará o sinal de que a ameaça de Lula não assustou e abre brecha para um rosário da traições partidárias pelo Brasil afora. Se fechar as portas para o tucano, reforça a aliança em todo o país. Os tucanos e sua vocação para Hamlet O PSDB e seus aliados chegam ao fim da pré-campanha - a partir de agora e até meados de julho tudo será Copa do Mundo e nada mais - e às vésperas da convenção do fim de semana com as mesmas dúvidas que o assolaram desde o lançamento oficioso de José Serra : sem um vice de convicção, sem uma estratégia clara de campanha e em busca um discurso claro e eficiente para se contrapor à palavra fácil de Lula. Por trás de seu estilo fidalgo e low profile, os oposicionistas parecem gostar de viver grandes emoções políticas. Será a falta de estratégia uma estratégia ? Nas contas tucanas, o empate absoluto entre seu candidato e a candidata de Lula no último Ibope é indício de que o devagar e sempre deles está certo dada as desproporções das campanhas até agora. Mais ajustes à vista I Há comentaristas e analistas econômicos colocando em dúvida se há correspondência fundamental entre a possibilidade de insolvência da Hungria - com PIB ao redor de US$ 160 bilhões e 10 milhões de habitantes - e os efeitos nefastos que esta possibilidade gerou na semana passada nos mercados mundiais. Pois bem : é preciso entender que o problema não é a Hungria, mas todo o sistema europeu, dentro e fora da eurolândia. Os países estão excessivamente endividados e sem perspectiva de sair do atoleiro no médio prazo (talvez coisa de dois anos à frente). Neste contexto, estão países como Portugal, Espanha, Itália, Bélgica, Irlanda e, claro, a Grécia. Portanto, o risco não é a Hungria, mas o que ela representa. Mais ajustes à vista II Há ainda o caso dos EUA que, a despeito dos sinais encorajadores de poucos meses atrás, ainda está num estágio muito frágil de recuperação. A crise europeia é um balde de água fria no sistema de crédito, este um elemento vital para a recuperação do consumo norte-americano. O fraco desempenho do setor laboral dos EUA, divulgado na última sexta-feira, é e será um dos sinais deste - novo ? - contexto de estagnação. Mais ajustes à vista III Se olharmos apenas o desempenho do mercado financeiro e de capital ao redor do mundo, veremos que estes estão ainda numa fase de ajustes, desta feita para baixo, nos preços dos ativos. Além disto, a volatilidade é alta e talvez crescente o que desestimulará investimentos com horizonte de médio e longo prazo. Sendo turvo o cenário, a tendência é de perda de valor. Já alertamos os nossos leitores para não abandonarem posições defensivas de investimento, em ativos reais e/ou financeiras. As variações diárias dos mercados muitas vezes deixam dúvidas aos investidores. Todavia, é melhor aproveitar processos de recuperação de preços para sair de posições e não aumentá-las. Brasil : ajustes e eleições I É certo que as condições macroeconômicas do Brasil são destacadas quando as avaliamos frente ao cenário confuso e negativo que impera dentre as principais economias mundiais. Todavia, se esta é uma constatação positiva, é preciso entender que não é suficiente para evitar os impactos diretos da crise externa sobre o nosso setor externo, bem como no que tange aos efeitos que as expectativas tem sobre o ânimo dos investidores. Adicionalmente, insistimos em alertar os nossos leitores sobre certa negligência relativamente aos riscos embutidos no processo eleitoral. Toda mudança de governo atrai naturais riscos ao mercado. No caso da eleição a ocorrer no último trimestre do ano, o próximo presidente será mais vulnerável politicamente que o atual. Isto há de repercutir na política econômica. Brasil : ajustes e eleições II Também não é novidade nenhuma que a situação fiscal do Brasil, embora sustentável no curto prazo, não é saudável. O recente ajuste promovido pelo governo no orçamento público é uma boa notícia, mas incapaz de retirar os obstáculos que enfrentaremos à frente, caso não existam modificações estruturais no andar das contas públicas brasileiras. Por fim, temos a inflação, a qual não está tão controlada quanto no passado uma vez que os preços estão sendo impulsionados para cima pelo aquecimento da demanda, sobretudo dos indivíduos. Os preços estão subindo num ritmo lento, mas constante e de forma generalizada. Preste atenção nas altas do setor de serviços... Assim sendo... Não cabe ilusão aos agentes econômicos. O cenário mudou e, infelizmente, para pior. É preciso paciência e cuidado na implementação de estratégias empresariais e junto ao mercado financeiro. Em tempos de tendência negativa, toda a atenção é necessária. Radar NA REAL O destaque da semana é o patamar do euro, abaixo do nível de 1,20 por dólar. Este fato simboliza a concretude e severidade da crise europeia. Também vale a pena ressaltar o desempenho do mercado acionário dos EUA que demonstra evidentes sinais de saturação e falta de demanda. Pelos nossos lados, salientamos a possibilidade do mercado financeiro estar subestimando a alta dos juros básicos acima do nível esperado pelo mercado : de até 11% doze meses à frente. No caso do mercado acionário, o Ibovespa tem se estabilizado em função do desempenho de poucas ações blue chips, mas este é fator passageiro e talvez injustificado para a manutenção do Ibovespa acima dos 60 mil pontos. 4/6/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,1949 baixa baixa - REAL 1,8648 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 61.675,75 baixa estável/baixa - S&P 500 1.064,88 baixa/estável alta - NASDAQ 2.219,27 baixa/estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Impostos : muita conversa Um pequeno balanço do que têm dito os principais candidatos à Presidência da República dá aos mais crédulos, a turma que acredita em mula sem cabeça, por exemplo, a sensação de que, em 2011, finalmente, a tão sonhada reforma tributária no Brasil vai sair. A leitura das promessas de tucano e petista, tanto no que se refere à cobertura de nossas fragilidades de infra-estrutura como de novas aplicações nas áreas sociais, leva também os mais céticos a desconfiarem que vem mesmo uma reforma tributária por aí. A primeira, um sonho, seria a simplificação do sistema, com redução gradual da carga de impostos. A segunda, com duro gosto de realidade, indica que virão ajustes para aumentar a capacidade de gastos do Estado, com aumento da arrecadação, não importa como. Por conta de nossa atávica tradição, ganha quem apostar na segunda. O resto é sonho de verão eleitoral. Como ensina o arrecadador-mor Everardo Maciel, secretário da Receita Federal no governo FHC, não se faz reforma tributária no Brasil, em prol da sociedade, sem se pensar, primeiramente, na revisão do lado das despesas. E desta eleição, dados os compromissos partidários que os candidatos e seus apoiadores estão adotando, não sairá uma força política em condições de enfrentar as forças poderosas, políticas e empresariais, que bocejam em torno do Estado brasileiro. Venceu o de resultados Durante os anos 1980 e parte dos anos 1990 se engalfinharam no Brasil dois tipos de sindicalismo : o novo sindicalismo ou sindicalismo autêntico, de Lula, e o sindicalismo novo-velho ou de resultados, de Luis Antônio Medeiros. Não se engalfinham mais : o de resultados é o hegemônico, com a instauração do sindicalismo governamental no Brasil, projeto que nem o Getúlio Vargas, em seus anos ditatoriais, conseguiu realizar com a extensão de hoje. Há um único risco de dissidência : os sindicalistas estatais, de repente insatisfeitos com a súbita avareza governamental. Mas o governo prepara para eles uma boa pancada na moleira se não se aquietarem. Os antigos sindicalistas autênticos agora acham insuportável reivindicações e greves no funcionalismo público. Nada como o mundo girar e a lusitana rodar. Greve de serviço público é greve contra a sociedade, porém a conversão dos "cristãos novos" do novo-novo sindicalismo não deixa de ser um sinal assustador desses novos tempos brasileiros, nos quais, na política, vale quase tudo, menos coisas como princípios e convicções. O dinheiro deve estar sobrando O Ministério dos Transportes, nos dois cortes promovidos pela turma da economia no orçamento deste ano, perdeu R$ 906 milhões. O Ministério da Educação nas mesmas tesouradas ficou sem mais de R$ 2 bilhões. Porém, tanto o ministro Paulo Passos quanto o ministro Fernando Haddad garantem que seus programas não serão afetados. Das duas uma, pois não se está apenas falando de algumas poucas centenas de reais : ou eles estavam com seus orçamentos inchados, com previsões de gastar no que não é necessário ou, com base nos ventos eleitorais na herança - maldita ? - que poderão deixar para seus sucessores, não têm intenção de cumprir a ordem de cortes. Governo pode ser a salvação Sob ataque quase hostil da Telefônica para vender a sua parte na Vivo, a Portugal Telecom, sócia meio a meio da espanhola na tele celular, deve ter no governo Lula um aliado de peso para não sucumbir. Dentro do plano traçado lá no passado para as telecomunicações brasileiras, a partir do patrocínio da compra da BrT pela Oi, de fortalecimento de uma empresa genuinamente nacional, para competir com as gigantes Embratel (Carlos Slim) e a Telefônica (da Espanha, com sociedade na italiana TIM), pode sofrer um baque. Em tempo : a Portugal Telecom tem ligações com o grupo Oingoing, que edita no Brasil o diário Brasil Econômico.
terça-feira, 1 de junho de 2010

Política & Economia NA REAL n° 103

Alvíssaras, que alívio ! Desde a última sexta-feira, deixamos de trabalhar para o governo, para pagar os impostos Federais, estaduais e municipais e passamos a trabalhar para nós mesmos e o país. Mas é bom não espalhar porque eles estão atentos e a qualquer momento podem pedir um pouco mais do nosso suor. Já não era sem tempo. Para se ter uma ideia dos níveis de espoliação a que o Brasil está submetido, vai aqui uma tabela, elaborada pelo economista Amyr Kahir para FIESP com o peso dos impostos sobre a renda dos brasileiros, por classe de renda : - Ganhos até 2 salários mínimos : 48,89 da renda familiar são consumidos por impostos e tributos.- Mais de 2 até 5 SM : 35,9%- Mais de 5 até 10 SM : 31,8%- Mais de 10 até 15 SM : 30,5%- Mais de 15 até 20 SM : 28,5%- Mais de 20 até 30 SM : 28,7%- Mais de 30 SM : 26,3%. A dura realidade. Vai mudar ? Na nossa peculiar justiça social às avessas, paga mais quem pode menos. Outra amostra de nossas distorções tributárias : enquanto o peso dos impostos no preço final dos remédios de uso humano chega a 31%, sobre os remédios veterinários é de 13% somente. Com grande desenvoltura os candidatos à presidência andam prometendo mais a torto que a direito. José Serra e Dilma falam como se fossem fazer isto num átimo. Apenas Marina Silva tem advertido que mudar é um extraordinário desafio. Palocci, o apaziguador Curiosa - e esclarecedora - a estreia de Palocci como colunista do jornal Folha de S.Paulo no domingo. Palocci é o principal homem de economia na coordenação da campanha de Dilma e com todas as credenciais para virar o primeiro e único. Os outros concorrentes dele para função estão perdendo espaço : José Eduardo Dutra, presidente do partido, não tem a mesma dimensão e o mesmo desembaraço do ex-ministro da Fazenda ; Fernando Pimentel confundiu-se demais em MG e acabou se desgastando com parte do partido e com o aliado PMDB. Os outros papéis Está reservado a Palocci o papel que coube a ele mesmo em 2002 (a interlocução com os empresários), além de parte do que coube a José Dirceu : a interlocução política. É dele também a função que estava reservada para Henrique Meirelles quando do presidente do BC se cogitou a vice-presidência : acalmar o mercado financeiro, interno e externo, sobre possíveis arroubos mais "desenvolvimentistas" da ex-chefe da Casa Civil. Pois bem. Palocci estreou no colunismo falando de contas públicas e apregoando a responsabilidade fiscal. Exatamente o ponto em que Dilma desperta mais desconfiança. E sob o qual o próprio governo Lula está sob escrutínio. Em tempo Como, do ângulo de boa parte do petismo, a eleição presidencial já está decidida pró-Dilma, Palocci já desperta ciúmes e já é alvo de alguns petardos bélicos, até agora de festim apenas. Enquanto isso Os últimos dados não deixam mais nenhuma dúvida : o crescimento do país está acima daquele que pode ser construído sem inflação. A atividade econômica pode ser contida de duas formas, as quais podem ser combinadas : aumento da taxa de juros e/ou contenção fiscal. Como a segunda opção é muito difícil - e, portanto, improvável - de ser exercida, o aumento do juro básico é inevitável. O mercado pode estar subestimando a probabilidade de uma "puxada' na taxa básica acima dos patamares registrados no mercado futuro de juros. Investimentos Não há espaço fiscal nas contas do governo federal e em grande parte dos governos estaduais para incrementar os investimentos em infra-estrutura. O investimento privado neste segmento tem sido pequeno frente às necessidades. Assim sendo, o redemoinho "atividade em alta versus alta dos juros" persistirá até uma reforma fiscal séria. Inflação Também estão sendo negligenciados pelo mercado e pela sociedade a perspectiva de uma inflação bem mais alta que a esperada pelos agentes. Setores do comércio já falam em demanda muito aquecida e os preços, pouco a pouco, estão subindo. Radar NA REAL Mantemos a nossa visão negativa em relação ao andamento do mercado financeiro internacional e nacional. A crise europeia em meio à frágil recuperação da economia norte-americana é significativa barreira para a redução da volatilidade e sustentação dos preços dos ativos de renda fixa e variável. Ademais, o desempenho da economia brasileira proporciona redobrada atenção : o combate à inflação exige alta de juros e atividade econômica deve cair "na margem", sobretudo no ano que vem. Os lucros projetados das empresas de capital aberto podem estar superestimados. Por fim, há o cenário eleitoral, fonte de incertezas para os investidores. 28/5/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2409 baixa baixa - REAL 1,8505 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 60.259,33 baixa estável/baixa - S&P 500 1.087,69 baixa/estável alta - NASDAQ 2.229,04 baixa/estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Minas : traição no ar Dia 6/6, domingo, termina o prazo estabelecido pelas direções nacionais do PT e do PMDB para a formação da chapa governista - oposicionista em MG - para disputar a Palácio da Liberdade. O acordo da cúpula reza que o PT entregue o comando a Hélio Costa e fique com a vice e a principal vaga do Senado. Esqueceram de combinar, porém, com os eleitores petistas. E a semana começou com um ambiente pouco favorável ao acordo nas Alterosas. Tanto os peemedebistas quanto os próprios petistas temem traições, de parte a parte. Ao balanço das pesquisas Enquanto Serra aparecia ainda como líder na corrida presidencial em algumas pesquisas, o PP andou bem assanhadinho para entrar na aliança oposicionista, dando as costas para o PT de Dilma e o PMDB de Michel Temer. A direção da biruta de aeroporto do partido de Paulo Maluf deu uma reviravolta desde que a preferida de Lula empatou com Serra em todos os levantamentos confiáveis. Agora as chances do PP abraçar Serra são bem menores, a não ser que a vaga de vice que Aécio está recusando vá para o primo dele, o senador Francisco Dornelles, do RJ. Mas desde que Dornelles pôs no projeto dos "fichas-sujas" uma correção polêmica, deixando mais difícil barrar as candidaturas de quem tem contas na Justiça, o entusiasmo tucano com ele diminuiu. O jogo de gato e do rato Não dá para distinguir bem quem é o caçado e quem é o caçador nesta corrida do PMDB e do PT nesses minutos que ainda faltam para a convenção dos dois partidos, marcados para 12 e 13/6, quando ambos definirão a aliança em torno da candidatura governista. O PMDB espalha que o PT está dominado e vai ceder mais do que deseja nos Estados. O PT rebate, contando, à boca pequena, que o PMDB já foi devidamente engabelado. Os dois estão fadados - ou condenados - a se associarem. O PT tem como trunfo : o crescimento de Dilma e a sua força política. O PMDB tem, por seu lado, seis minutos no rádio e na televisão e uma infinita capacidade de causar problemas para o governo no Congresso e mesmo nos palanques estaduais. Quem conhece o ondular da política brasileira aposta que as ondas estão mais para os surfistas do PMDB. E que o PT terá de ceder, a ferro e fogo, em MG e no MA, hoje dois maiores empecilhos à paz nacional. Sem ao menos o direito de chiar. O que dá prá rir dá prá chorar O título é tirado de um samba do Paulinho da Viola. Mas se encaixa perfeitamente no programa de governo que o PMDB vai apresentar quando oficializar a candidatura de Temer a vice-presidente da República na chapa oficial e oferecerá ao PT e à candidata Dilma. Tudo para consolidar o que Temer define como uma aliança "político-eleitoral programática". Logo, a segunda mais voraz legenda eleitoral brasileira (só perdeu a primazia para o PT no governo Lula), o PMDB, sugere, entre outras coisas, o fim do aparelhamento do governo. O PMDB também quer o fortalecimento da independência das agências reguladoras, envolvido ao mesmo tempo numa disputa ferrenha com o parceiro PT por um amontoado de vagas desocupadas nesses órgãos e outras que ficarão livres até o fim do ano. Os peemedebistas proporão ainda limitar o aumento dos gastos do governo, fora investimentos e programas sociais, em um teto 2% abaixo do crescimento do PIB. Pode ser sério ? Sinceridade é isto Ninguém precisa se esforçar para responder. O ex-senador - suplente de Hélio Costa - Wellington Salgado, aquele de cabelos longos e ideias, o faz com candura e surpreendente sinceridade : "Em política é assim : surgiu uma vaga todo mundo corre para ver se pega. Igual a Cosme e Damião. Onde estão dando um saquinho de bala, todos correm para pegar. Querem pegar os nossos saquinhos." (alusão as brigas com o PT pelos 'princípios' da aliança programática) A pressa da Petrobras Homem de fé o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza. Ele acredita que poderá levar deputados a Brasília nos dias 15 e 16 próximos para votar definitivamente o novo marco regulatório do petróleo, com as regras para exploração do pré-sal. Vai ter de rezar a santos e orixás com muita devoção. Com o feriado desta semana e a conhecida má vontade da oposição, vai ser um parto doloroso aprovar as propostas no Senado, mesmo que se deixe para depois o polêmico projeto dos royalties. Brasil na copa Dia 15/6 é o dia da estreia do Brasil na Copa e os abnegados parlamentares fazem questão de vibrar pela seleção de Dunga com seus eleitores. Tanto que o próprio Vaccarezza chegou a propor o recesso parlamentar deste ano para que deputados e senadores pudessem cumprir este dever cívico sem se sentirem constrangidos e ir a Brasília. Como líder do governo, Vaccarezza está apenas vocalizando os desejos da Petrobras e do governo. Está marcada para o dia 22/6 a assembleia da Petrobras para definir as regras da nova capitalização da empresa. A Petrobras quer dinheiro urgente para tocar seu ambicioso programa de investimento. Na semana passada, anunciou-se na China que ela vai pegar mais de US$ 10 bilhões emprestados, como os R$ 10 bilhões tomados no ano passado. Em tempo : os apressados que atentem para o - mau - exemplo da British Petroleum no Golfo do México.
terça-feira, 25 de maio de 2010

Política & Economia NA REAL n° 102

A tendência é negativa A crise europeia é fato significativo o bastante para engendrar um processo negativo na economia mundial. Além das suas consequências diretas sobre as principais e menores economias do continente, há dois aspectos que merecem observação e análise neste momento : (i) os efeitos negativos sobre a (enfraquecida) economia mundial e (ii) o fato de que as políticas fiscais expansionistas estão sob severo ceticismo da parte dos agentes econômicos. Infelizmente, neste contexto, o mais recomendável seria que os governos insistissem em atacar o problema mais severo, a saber, a fraqueza da demanda e a "doença" do desemprego agudo. Todavia, a fragilidade política não permite que a maioria das principais economias mundiais viabilize este tipo de política. O risco de crédito contaminou o processo econômico e a retração do capital é evidente. Este é o fato novo e grave que está sendo reconhecido pelos mercados. É preciso incorporá-lo nas estratégias de investimento e no mercado financeiro e de capital. Ativos de risco em queda Considerando os aspectos brevemente mencionados acima, estamos prevendo um ciclo continuado de queda nos preços dos ativos do mercado. Note-se que esta é a principal característica da - nova - tendência negativa. Assim como, a partir de meados do primeiro trimestre de 2009, os indicadores começaram a evidenciar um ciclo positivo e muito lucrativo do ponto de vista dos investidores do mercado de ações e de títulos de renda fixa, desta feita deveremos verificar a inversão deste processo. Lamentavelmente, a economia norte-americana, que tem apresentado consistentes e encorajadores números econômicos os quais mostram a recuperação da atividade econômica, ainda está num estágio incipiente para mobilizar uma demanda suficiente para influenciar a economia mundial. Os EUA não são mais a "locomotiva" do mundo e os países emergentes, sobretudo a China, não serão capazes de absorver os impactos da crise europeia. Assim, veremos movimentos de preços dos ativos financeiros negativos no médio prazo, apesar dos curtos períodos de maior tranquilidade e de recuperação das cotações. A volatilidade elevada é a vedete do mercado. O Brasil neste contexto O Brasil não é uma ilha nos movimentos negativos do mercado mundial. Não foi assim no período posterior à crise financeira dos EUA, ao final de 2008, e não será agora. De outro lado, o desempenho relativo do país deve permanecer superior às principais economias. Todavia, essa superioridade não retira o caráter geral negativo dos impactos da crise mundial sobre o país. Há dois agravantes específicos que nos preocupam e que temos deixado claro em colunas anteriores : (i) o primeiro diz respeito à corrida eleitoral e à inauguração de um novo mandato presidencial, em janeiro de 2011, que gerará tensões e trará uma nova liderança política mais fraca frente ao presidente Lula, que goza de inédita popularidade. Neste sentido, estaremos politicamente mais parecidos com o negativo momento político mundial. Além disso, (ii) a possibilidade de sustentação de uma taxa de crescimento de, digamos, 7% é improvável num contexto de baixa inflação, pouco investimento e elevado gasto público (vide nota abaixo sobre os cortes no orçamento). Assim, "na margem" o crescimento é negativo, quem sabe para um patamar de 4%. Isto não é bom, por exemplo, para os diversos segmentos do mercado financeiro e de capital e nem para o entusiasmado setor privado que está a investir e crescer. Projeções e "bola de cristal" Quando fazemos as observações acima nos guiamos pelo nosso melhor juízo sobre economia e política. Todavia, abdicamos de usar qualquer bola de cristal. O que estamos a dizer é nossa opinião no melhor interesse de nossos leitores em função dos fatos. Se os fatos mudarem, mudaremos de opinião, mas por enquanto a tendência nos parece negativa e temos de ser sinceros em explicitar esta visão. Radar NA REAL O mercado acionário, como na maioria das vezes, será o principal termômetro dos movimentos econômicos mundiais. No caso da bolsa brasileira, acreditamos que o patamar de 50 mil pontos do Índice Bovespa pode ser o patamar - negativo - a ser testado nas próximas semanas. Este, obviamente, não é um processo retilíneo. Ao contrário, os movimentos curtos de altas e baixas das cotações são talvez a principal característica de todos os segmentos do mercado. De outro lado, os juros devem avançar mais, de vez que o aumento da taxa de juros por parte do BC pode ser superior ao estimado pelo mercado. O Real deve se desvalorizar, mas de forma limitada em função da grandeza das reservas cambiais e do melhor desempenho da economia local frente à mundial. O nosso radar permanece como na semana passada. As tendências negativas já foram incorporadas nas últimas edições desta coluna. 21/5/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2409 baixa baixa - REAL 1,8505 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 60.259,33 baixa estável/baixa - S&P 500 1.087,69 baixa/estável alta - NASDAQ 2.229,04 baixa/estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Lula e o desafio dos vetos Lula terá, nos próximos dias, excelentes oportunidades para confirmar, no papel, sua disposição de manter a austeridade fiscal em seu governo, mesmo em pleno festival de caça aos votos. Chegam a sua mesa alguns resultados das bondades eleitorais postas em práticas nas últimas semanas pelos deputados e senadores, de todas as legendas, de variados credos políticos, do governo e da oposição. Os dois primeiros, segundo cálculos apregoados pelos ministros econômicos, quando combatiam as duas propostas no Congresso, têm o potencial de gerar um aumento nos gastos da Previdência Social de mais de R$ 5 bilhões anuais, a preços de hoje. Trata-se de R$ 1,6 bilhão por conta do aumento acima do salário mínimo, de 7,7% (contra previstos 6,14%) nas aposentadorias do INSS, e cerca de R$ 3,4 bilhões com o fim de fator previdenciário. Não importa se as ações são justas. O governo apregoou que elas eram inaceitáveis e fez todo tipo de ameaça para evitar sua aprovação. A Previdência está mesmo em dificuldades e o governo vendeu quase o apocalipse. Com essa posição de "responsabilidade fiscal" só há uma indicação : o veto. No entanto, Brasília acena com uma solução "salomônica" - sanção dos 7,7% dos aposentados (cerca de 22 milhões de também eleitores) e veto ao fim do fator previdenciário (menos visível e de efeitos mais difusos). Nada como o clamor surdo das urnas. Outras contas Nem só na área previdenciária o Congresso atacou de bondades eleitorais e criou oportunidades para o presidente Lula reafirmar, juntamente com seus ministros econômicos, seu alardeado senso de responsabilidade fiscal. Uma série de emendas apostas pelos congressistas à MP 472 ampliou a farra de gastos em tempos de consulta aos eleitores. Com esta MP o governo concedia R$ 3 bilhões em renúncias fiscais a diversos setores, ainda como parte da política anti-crise. Na passagem pela Câmara e o Senado, ela saiu com 43 emendas que, no mínimo, dobram os benefícios. Sobrou um pouquinho para todo mundo : pequenos agricultores, índios, funcionários públicos, empresários, Estados, municípios. O veto total seria o caminho, porém nada como o clamor surdo das urnas para comover espíritos mais sensíveis. Os cortes não convencem As dificuldades dos ministros do Planejamento e da Fazenda apontarem com clareza de que modo e onde o governo fará os cortes, é que aumentam as dúvidas sobre se a economia de mais de R$ 10 bilhões nas previsões de gastos do governo este ano são para valer ou não. Lula e o mundo irreal Do presidente da República, para uma plateia de prefeitos que encheu Brasília na semana passada : "Por que a emenda 29 - que aumenta os recursos orçamentários obrigatoriamente destinados para a saúde - não passa ? Não é porque o presidente da República não quer. Quando eu sair daqui, perguntem ao presidente da Câmara por que - os deputados - não querem, por que não passa ? É uma vergonha !". Se os prefeitos resolverem seguir mesmo a sugestão presidencial e forem interpelar Michel Temer e o presidente da Câmara zelar pela verdade, certamente receberão uma resposta que não será do gosto de Lula : a emenda não passa porque os ministros econômicos não deixam - dizem que o Orçamento não comporta mais gastos com esta área. Só se for aprovada nova fonte de receita. É a pressão para sair a CSS - Contribuição Social para a Saúde, sonho governista para substituir a extinta CPMF. A CSS foi defendida explicitamente por Dilma há menos de dez dias. Em lua de mel Dois fatores influíram nos quase dez pontos de percentagem que Dilma tirou de Serra da antepenúltima para a última pesquisa do DataFolha divulgada no sábado. Descontada a margem de erro, a candidata de Lula e o candidato da oposição estão literalmente empatados nos 37%, empate técnico antes registrado pelo Vox Populi e pelo Sensus. O primeiro fator foi a influência de Lula, a transferência de votos, neste momento, está se dando em ritmo maior do que a oposição gostaria. O segundo fato foi sua aparição nos "programetes" de 30 segundos e no "programão" de 10 minutos na televisão. Apesar de toda a badalação da campanha na internet e nas redes sociais, a campanha ainda será marcada pela televisão. E já está provado que os "programetes" podem influenciar mais o eleitor do que o longo programa obrigatório de todas as tardes e noites. De público, PT, Lula, aliados e candidatos estão calçando franciscanas sandálias. Internamente, a euforia é alta. Fala-se em avalanche e em vitória no primeiro turno. Os efeitos da avalanche Com a íntima certeza de que Dilma subirá a rampa planaltina, no PT e até nos parceiros começam as tomadas de posição em relação ao futuro governo e aos cargos de peso na nova administração. José Eduardo Dutra, presidente do partido e, em tese, coordenador-geral da campanha, desistiu de disputar cargo eletivo. O mesmo o fez o deputado Palocci, homem forte do grupo eleitoral - e não somente na economia. Fernando Pimentel, amigo pessoal de Dilma e também do núcleo duro do staff da candidata, vai renunciar à disputa pelo governo de MG. Estão no ar os nomes de três ministros - não fariam o que estão fazendo por menos. E não erra quem achar que o destino de Palocci pode ser a Casa Civil, o gerenciamento do governo. O Dilma da Dilma. Cabeça quente Também é mais para efeito externo do que realidade o ar quase blasé da oposição diante do crescimento da intenção de votos na ex-ministra, coisa que o próprio tucanato já sentia que estava acontecendo antes mesmo da divulgação das pesquisas Vox Populi, Sensus e DataFolha. Só não se pode dizer que está se descabelando porque ela confia que pode conseguir a recuperação de Serra com os programas eleitorais do DEM e do PSDB no ar nos próximos dias. De qualquer modo, avalia-se, entre tucanos serenos, que o candidato da oposição precisa criar um fato novo para não deixar que Dilma se distancie do candidato oposicionista nas pesquisas. O fato novo, sonham todos, é Aécio correr para vice. Aécio está menos reticente, deu sinais de boa vontade, mas daí a dar o salto vai ainda uma distância muito grande. O PMDB, como sempre O deputado Michel Temer e o comando nacional do PMDB deram o recado : esperam apenas a resposta a uma consulta feita por Eduardo Cunha ao TSE sobre a obrigação de fidelidade partidária nos palanques regionais para agir contra os dissidentes. E receberam a resposta no mesmo diapasão : cuidado com o que vão fazer porque eles dependem da convenção nacional para garantir a vice-presidência e, num eventual governo Dilma, a divisão do governo. E quem tem voto nas convenções são os líderes estaduais. Mas o jogo do convencimento já começou. No Maranhão, segundo denúncia da revista Veja, bem ao estilo do partido : com oferendas a petistas para que eles abandonem a aliança já aprovada com o PCdoB para cair no terreiro de Roseane Sarney. É o PMDB de sempre. Desde que deixou de ser o partido de Ulysses, de Tancredo... Olhares desatentos Fora de círculos muito restritos, a sociedade brasileira está dando muito pouca atenção a duas discussões que o governo está travando e que em breve pode virar lei : as regras sobre o marco civil para a internet e a nova lei de direito autoral. O primeiro está em consulta pública até o dia 30 deste mês. A segunda, já tem anteprojeto, que está nos últimos retoques antes de ser enviado ao Congresso. Ambos, pelas versões oficiais, trazem o vírus de outras propostas oficiais : a concentração das decisões e dos controles de áreas vitais nas mãos do Estado em detrimento das ações dos atores privados. Fundos de pensão em uso A propósito da necessidade legal de substituir Sérgio Rosa na presidência da Previ, o milionário fundo de pensão dos funcionários do BB, e outros diretores, o governo fez modificações mais profundas na entidade, trocando também outros dirigentes e colocando gente de extrema confiança da atual diretoria do BB. E mais sujeita à influência dos comandantes oficiais da economia. Rosa, ligado ao PT, era homem de confiança do Palácio do Planalto e, segundo testemunhas de confiança, fez um trabalho de alto nível na Previ. Porém, seu estilo, mais "técnico" do que "político" não é o mais indicado para os desejos oficiais. Tanto que não conseguiu indicar seu sucessor, apesar do sucesso admitido até pela oposição. O governo prepara para a Previ um grande papel - financeiro - em seus novos projetos. A mesma linha deve ser adotada pelo BNDES. Capitalismo sem risco Disposto a fazer antes de outubro a licitação para o trem bala de R$ 34 bilhões ligando Campinas/São Paulo/Rio de Janeiro, e diante da recalcitrância de possíveis investidores - quanto ao custo real e à viabilidade econômica do projeto -, o governo admitiu que o Tesouro nacional também poderá ajudar a financiar a obra e aceita incluir no edital de concessão uma espécie de gatilho financeiro para as empresas : se os cálculos de fluxo financeiro não se confirmarem, os concessionários serão compensados. Nada como o capitalismo sem risco tupiniquim. O BNDES e seus investimentos Em novembro de 2008, já, portanto, no auge da crise dos subprimes, o BNDES investiu R$ 250 milhões no Frigorífico Independência. Não é que, menos de quatro meses depois, em fevereiro de 2009, a empresa entrou com um pedido de recuperação judicial. Agora, o BNDES está recorrendo à câmara arbitral da BMF/Bovespa para recuperar esse dinheiro. O banco tem cerca de 13% de participação no capital do encalacrado Independência. Nada como o capitalismo de Estado no Brasil. Copa : manobras abertas Na coluna da semana passada, chamamos a atenção para o lobby do "atraso nas obras para a Copa" como uma tentativa para amolecer os corações oficiais e conseguir verbas de recalcitrantes prefeitos e facilidades oficiais. Não se passaram nem três dias da notícia e menos de um mês das pressões mais explícitas, com visitas da FIFA e tais, e as almas oficiais tapuias se derreteram. Um decreto de Brasília determinou que podem ser concedidas isenções fiscais para negócios ligados à Copa. E uma MP autorizou a Infraero a gastar R$ 5 bilhões em obras nos aeroportos, contratando obras em regime de urgência, com liberação de licitações.
terça-feira, 18 de maio de 2010

Política & Economia NA REAL n° 101

A crise europeia está no começo Não devemos nos enganar com os movimentos diários dos mercados e a emissão de notícias da parte dos países da UE. A crise iniciada pela Grécia não é apenas econômica. Diz respeito a todo um modelo econômico e político, tido pelos próprios europeus como "altamente civilizado", mas que se mostrou ineficaz e desvinculado dos reais requisitos para que os países possam ser considerados uma "união". O maior símbolo deste processo é a Alemanha, país que se mostra um gigante econômico e um nanico político e diplomático. A coordenação econômica entre os países é frágil e a coordenação monetária uma ilusão. Isso custará caro : o euro já está se desvalorizando fortemente e não está descartado um cenário de colapso da moeda europeia, apesar desta probabilidade ser, por ora, remota. Os mercados prosseguirão instáveis e toda esta volatilidade se refletirá em taxas de riscos (spreads) mais elevados nas rolagens de dívidas. Anões políticos A aliança política - impensável para quem lê os programas dos partidos - entre liberais-democratas e conservadores no Reino Unido coroa a "chanchada" que se passa na arena política do Velho Continente. Lembra muito o cenário vivido nos anos 30 do século passado, quando Hitler, Mussolini e Franco se fortaleciam dentro do continente e Stálin jogava cartas com todos. Esta fragilidade política é, ao mesmo tempo, causa e efeito da falência das concepções que os europeus têm de si mesmos. Sabemos que isso não será resolvido no curto e, até mesmo, no médio prazo. Daí, decorre a análise de que o sobe-e-desce dos mercados vai trilhar um longo caminho. Brasil : e a análise de risco ? Há muitas considerações macro e micro-econômicas a serem feitas pelo atual e futuro governo brasileiro em relação à Europa. O país tem volumosos investimentos europeus alocados em sua economia e riscos financeiros assumidos pelas empresas e pelos governos. Alguém no governo está rastreando oportunidades e riscos deste cenário ? (Era assim que faziam conosco quando o Brasil vivia suas "décadas perdidas") Os conselhos dos sábios A Eurolândia tem um "Grupo de Reflexão para o Futuro da Europa", também conhecido como "Grupo dos Sábios", de 12 membros, presidido pelo ex-primeiro-ministro espanhol Felipe González, e formado, entre outros, por Lech Walesa, ex-presidente da Polônia, Vairavike Freiberga, ex-presidente da Letônia, Richard Lambert, presidente da Confederação da Indústria Britânica e Rainer Münz, economista austríaco consultor da OCDE e do Banco Mundial. No fatídico domingo em que a União Europeia anunciou uma ajuda de quase um bilhão de dólares para os países da região enfrentarem a crise que os ameaça, o grupo de González anunciou em Bruxelas o "Projeto Europa 2030", com críticas pesadas às políticas locais. "Tenho certeza que o relatório não vai agradar a todos os chefes de Estado e de Governo", avisou o ex-primeiro-ministro socialista. Na contramão As sugestões em boa parte andam na contramão do que os países europeus começam a fazer para conter o que é o seu mais imediato problema - os desarranjos fiscais. Enquanto Grécia, Espanha e Portugal já anunciam cortes de despesas, os sábios sugerem que os governos mantenham as medidas anti-crise, adotadas no auge do problema gerado pelos subprimes norte-americanos para garantir o crescimento e o emprego, e proclamam que os países que têm margem de manobra em suas contas públicas assumam a liderança do processo : um recado indireto para a Alemanha. Os sábios defendem ainda a economia social de mercado ao modo europeu, o Estado do bem estar social desenvolvido por lá depois da segunda Guerra Mundial, "altamente competitiva e sustentável ambientalmente". Pois é exatamente este Estado do bem estar que está sendo posto, em parte, em xeque, com a crise e o alto endividamento da maioria dos países da área do euro. Lula no Irã Há que se reconhecer que o presidente Lula obteve um significativo e positivo resultado na sua missão no país dos aiatolás. Diante do enorme ceticismo mundial e, sobretudo, da imprensa local, o anúncio do acordo envolvendo Brasil, Turquia e Irã mexeu nas peças do complicado tabuleiro do Oriente Médio. Diante de poucos dados dá para tecer poucos comentários, mas não dá para nos omitirmos em alguns pontos : 1 - As sanções planejadas pelos EUA contra o Irã estão mais distantes de serem executadas. A sua viabilidade política encontra barreiras fortalecidas por parte da China e da Rússia ; 2 - O Brasil acaba por firmar-se mais um pouco no cenário diplomático internacional. Todavia, temos de avaliar os efeitos : o Brasil atrapalha planos ambiciosos da maior potência mundial e este não é um movimento que ficará sem resposta. Lula colocou o seu dedo num assunto que complica demasiadamente a política externa conduzida por Hillary Clinton ; 3 - Ainda não se sabe como vão reagir os órgãos multilaterais em relação ao acordo, sobretudo no caso da Agência Internacional de Energia Nuclear, que terá de dar seu aval sobre os aspectos técnicos do acordo; e, 4 - Por fim, não devemos esquecer que o Irã tem a tradição de ir em frente com um acordo por alguns dias ou semanas e depois recuar. Esperemos que não seja o caso deste surpreendente acordo. Popularidade internacional A pressa que a chancelaria turca teve em anunciar o acordo com o Irã - em antecipação à divulgação oficial do Itamaraty - indica que o assunto tem não apenas efeitos externos, mas efeitos domésticos relevantes. No caso de Lula, tais efeitos são positivos, mesmo que os assuntos externos não sejam parte essencial do "imaginário eleitoral" dos brasileiros. Lula não tem apoio substantivo entre os chamados "formadores de opinião" no Brasil, mas de outro lado, sabe transformar seus feitos econômicos e políticos em dados assimiláveis pela grande massa de eleitores. Não será diferente em relação ao acordo com o Irã, o qual contava com franca oposição da imprensa local, mas será "fato novo" a entrar no proselitismo político. Dilma há de se beneficiar disso. Por fim, restará ao presidente brasileiro os "resíduos" favoráveis, caso este acordo se torne um sucesso completo, para futuros passos políticos em casa ou no universo dos organismos multilaterais. Coisa que poucos conseguiram. Brasil : as contas oficiais preocupam A decisão dos ministros econômicos de fazer um corte adicional de R$ 10 bilhões, além de R$ 21,8 bilhões podados anteriormente, nas previsões orçamentárias de 2010, foi recebida com reservas pelos especialistas e pelo dito mercado. Primeiramente, porque dá a impressão de improviso : anunciou-se o tamanho do corte para depois se começar a procurar onde é possível passar a tesoura. O que somente se saberá no próximo fim de semana. Depois, porque a margem de poda é pequena, preservado o que é "incortável" e o que Lula não admite rever. Intenções e expectativas A intenção é atuar mais sobre as expectativas dos agentes econômicos e conter qualquer sanha do BC em relação a novas elevações significativas da taxa de juros. O Boletim Focus desta semana, com novos reajustes nas expectativas dos agentes do mercado, mostrou que a primeira investida não foi bem sucedida. A previsão do PIB de 2010 passou de 6,26% para 6,30% e a da inflação cresceu de 5,50% paras 5,54%. Os departamentos econômicos dos principais bancos, no entanto, trabalham com números maiores : PIB acima dos 7% e inflação no topo da meta 6,5%. Venezuela : atenção para o crédito Uma eventual piora do cenário externo vai cair como se fosse uma bomba atômica sobre o governo do caudilho Hugo Chávez. Os problemas de crédito do país são muito sérios e podem desabar num cenário de riscos concretos para sua solvência. Petrobras, luz quase vermelha A Petrobras, com as pressões diretas e indiretas para a aprovação pelo Senado, o mais rápido possível, da proposta que permitirá sua capitalização na base da concessão onerosa de poços do pré-sal que receberá do governo, já começa a despertar desconfianças. A empresa ameaça, inclusive, recorrer ao mercado se a autorização não passar rapidamente no Senado, o que muitos analistas consideram complicado, pois exigiria desembolsos diretos do Tesouro Nacional, sem recursos para tanto. Alega a Petrobras que o atraso prejudicará os programas do pré-sal. Pode ser. Há outra razão Desconfia-se de outra razão também : com muitos investimentos, a empresa precisará de mais recursos de caixa para fechar as contas. Há lembranças de 2008, quando a empresa precisou se socorrer, numa emergência, na CEF, no BB e até numa operação pouco ortodoxa de diferimento no pagamento de impostos. Radar NA REAL Anote aí : pelos nossos lados, até o final do ano, o cenário que está se desfraldando é o de mercado de ações em baixa e câmbio em alta. Tudo em sintonia com a crise europeia e com o cenário eleitoral que será emocionante. Lá fora, os EUA permanecerão na liderança da recuperação econômica desde que a "contaminação" europeia não seja vigorosa - grave já é. O mais provável cenário para o mercado financeiro local é aquele em que o real desliza para baixo, juntamente com as ações, enquanto os juros sobem. Resta saber qual o grau de volatilidade que será experimentado pelo país. 14/5/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2349 baixa baixa - REAL 1,8052 baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 63.412,47 baixa/estável baixa - S&P 500 1.135,68 baixa/estável alta - NASDAQ 2.346,85 baixa/estável alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Os temores do PT Apesar do alívio - para o PT- trazido pelas pesquisas do Vox Populi (empate técnico, mas com três pontos de vantagem para Dilma) e do Sensus (Dilma 35,7% versus Serra 33,2%), ainda permanecem alguns temores em relação ao desenrolar da campanha de Dilma. Questões que podem fazer estragos na imagem dela, laboriosamente em construção por seus marqueteiros a partir dos insights do presidente Lula. Temia-se - agora se teme um pouco menos - que se pudesse pespegar na criatura de Lula a imagem de quem não tem muitos compromissos com a verdade, a partir de casos envolvendo o currículo de Dilma postado na internet e do embate sobre encontros - negados - que ela teve com a ex-secretária da RF, Lina Vieira, com pedidos para amaciar investigações sobre a família Sarney. Por isso, inclusive, o PT atacou com veemência o site "Dilma Mente" patrocinado pela oposição. A experiência de Dilma Afastou-se também em parte o temor entre o confronto entre a grande experiência de Serra e a dita pouca experiência de Dilma e até de um confronto entre os dois nesse campo. Mas ficou muito vivo ainda outro empecilho : a possibilidade de a oposição tentar pregar os selos de "terrorista" e "assaltante de bancos" na candidata situacionista. É coisa capaz de assustar a parte mais conservadora da classe média brasileira. Por isso, não foi gratuita a comparação que Lula insinuou na televisão entre sua pupila e o líder sul-africano Mandela, apontado pelo presidente como alguém que também aderiu à luta armada para depois salvar seu país de suas agruras sociais, a começar pela luta contra o apartheid. Marta fez a sua parte Na mesma linha, está mais um escorregão (terá sido mesmo escorregão ou coisa de caso pensado ?) da ex-prefeita Marta Suplicy sobre o candidato verde ao governo do Rio, com apoio dos tucanos : "Vocês notaram que do Gabeira ninguém fala ? Esse sim sequestrou. (...) Ele era o escolhido para matar o embaixador. Ninguém fala porque o Gabeira é candidato ao governo do Rio e se aliou com o PSDB". "Lulodependência" em baixa ? Outro fantasma que o PT tentou afastar em seu programa da semana passada foi a visão que já começava a ganhar corpo de que Dilma só existe por causa de Lula. Com habilidade, Lula tentou transferir parte do sucesso de seu governo, traduzido em seus altos índices de audiência, para auxiliar, primeiro a "Ministra das Minas e Energia" e depois "poderosa condutora da Casa Civil e mãe do PAC". Reviravolta mineira ? Sinais emitidos desde o front mineiro - e sem desmentidos enfáticos - trouxeram alento para as hostes oposicionistas : o ex-governador Aécio Neves estaria reconsiderando sua antiga posição e admitindo formar a chapa PSDB-DEM-PPS como vice-presidente de José Serra. As fontes são das melhores e Aécio está de novo no Brasil depois de um mês de férias na Europa. A reconsideração do neto de Tancredo, no entanto, depende de uma análise da situação que encontrará em Minas Gerais. A prioridade de Aécio é eleger Antonio Anastasia como sucessor. Pela lógica da política mineira, quem não tem o Palácio da Liberdade fica capenga e sem força na política regional. E mesmo senador, sem força em Minas, Aécio perde poder de fogo na política Federal e em seu partido. Depende, então, repetimos, do que ele e seus assessores julgarem melhor para ajudar Anastasia. E nesta conta entram os movimentos do PT e do PMDB no Estado. Quando mais o governo Federal aperta o cerco para fechar um acordo para valer do PT com Hélio Costa e mais tenta limitar os espaços de Aécio mais ele pode olhar para a vice-presidência. Facho baixo Se os tucanos estão com caras mais animadas pelos sinais de fumaça desde Minas, as pesquisas mais recentes do Vox Populi e do Sensus baixaram o facho oposicionista. Eles andavam muito animados com os sucessos públicos de Serra e os ditos escorregões de Dilma. As sondagens mostraram que estas coisas ainda não chegaram aos eleitores. O que está chegando mesmo é a identificação cada vez maior entre Dilma e Lula. O PMDB e suas confusões Preocupado com as dissidências regionais em seu partido, o presidente do PMDB, Michel Temer, prepara uma contra-ofensiva. Afinal, calcula-se que em cerca de 12 Estados o PMDB local poderá optar pela candidatura de Serra ou por ficar neutro, negando palanques para Dilma Roussef em conjunto com o PT. Temer quer que a Executiva Nacional do partido dê um apoio formal, ainda que não oficial, à sua candidatura a vice de Dilma, mostrando que com o PT e Cia. está a aliança preferencial. Temer deseja também aval para intervir nos Estados nos quais o PMDB local vai preferir Serra. A dúvida, porém, é : como o PMDB é uma confederação de seções estaduais, terá o comando nacional força para se impor ? Nas condições vistas de hoje a resposta é um explosivo não. Marina, devagar e sempre Sem o estardalhaço do PT e do PSDB, o PV da ministra Marina Silva fez uma festa bem singela - ao estilo dela - para lançamento da candidatura oficial do partido. Mas, apesar de simples, foi significativa, pois permitiu à ex-ministra introduzir no debate eleitoral outros temas mais próximos da realidade do dia a dia do eleitor brasileiro, ausentes (ou pouco clamados) nos discursos dos dois principais partidos concorrentes ao Palácio do Planalto. É uma estratégia que pode angariar votos preciosos para a ex-ministra do Meio Ambiente. Insuficientes, é quase certo, para levá-la a um segundo turno, mas caros o bastante para que ela tire votos de um ou de ambos os candidatos e para que Marina comece a pautar também o debate. Não deve impressionar a estagnação de Marina registrada nas pesquisas. Somente agora ela começa a ser mais conhecida como candidata, ao contrário dos dois adversários. Um vício da imprensa ? Não deu para entender o destaque dados pelos principais órgãos de imprensa à escolha do vice de Marina, um dos donos da Natura, Guilherme Leal, e o fato de se tratar de um "milionário" em detrimento das ideias e das propostas levantadas pela candidata do PV. Preconceito ou um falso viés social ?  Copa : manobras ? Quem lida com obras, em áreas do setor público, não se impressiona com as ameaças da FIFA, de algum modo endossadas pela CBF, de que a Copa do Mundo de 2014 pode ser tirada do Brasil porque já há atrasos nos projetos apresentados pelo país para ganhar a concorrência. Os atrasos não seriam significativos a ponto de inviabilizar agora a candidatura brasileira. As pressões - na verdade, um poderoso lobby - viriam para forçar derrubadas de limites e imposições legais no processo e licitação e para amaciar o coração de governadores e prefeitos e fazê-los abrir mais generosamente seus cofres. Perguntar não faz mal O que foi feito (ou o que será feito) dos cerca de R$ 10 bilhões recolhidos pelo FUST (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) e depositados nos escaninhos do Tesouro Nacional ?
terça-feira, 11 de maio de 2010

Política & Economia NA REAL n° 100

A Europa e não apenas a Grécia A envergadura do pacote da UE - 750 bilhões de euros, US$ 960 bilhões aproximadamente - dá uma dimensão mais real para os problemas de liquidez dos países que fazem parte do euro e aqueles que pretendem nele ingressar. Ao contrário do que muitos pregaram fora das salas fechadas dos ministérios econômicos europeus, a crise não era somente da Grécia. O país helênico era apenas o pavio da bomba instalada no mundo financeiro do Velho Continente. Fundo de Estabilização. Estabilização ? A resposta imediata dos mercados mundiais ao anúncio (na madrugada da segunda-feira) foi de alívio, mas não deve ser de euforia. O tratamento à crise tem chance de ser um sucesso, mas a dimensão dos problemas estruturais da Europa indica que a recuperação da atividade econômica deve ser muito mais lenta que a dos EUA. Os problemas de coordenação econômica da UE ficaram evidentes, sobretudo quando o tema é financeiro. Além disso, falta à grande maioria das nações europeias condições estruturais de competir com as nações em desenvolvimento, sobretudo a China, e os EUA. O sistema de proteção social do Velho Continente é um sistema de proteção comercial e gera um insulamento impossível no mundo atual. Assim sendo, é muito provável que assistamos nos próximos meses variações bruscas no humor dos investidores em relação à zona do euro. A Grécia não está salva Muito embora o pacote de 110 bilhões de euros possibilite a rolagem da dívida grega nos próximos anos, o programa de ajuste fiscal é incompatível com as possibilidades sociais do país. Logo, não se deve descartar novas e severas turbulências, incluindo a possibilidade de reestruturação de sua dívida, bem como sua saída do sistema monetário europeu. Portugal, Espanha, Itália A prontidão dos europeus para que outros países mediterrâneos não adentrassem no cenário da Grécia deve evitar o pior no curto prazo. Todavia, como imaginar que estes países, cujas taxas de desemprego estão entre 15% e 20%, superem suas mazelas ao mesmo tempo em que fazem ajustes fiscais ? Seria infantil acreditar em um cenário de estabilização sem que esta questão seja enfrentada do ponto de vista político e econômico. Alemanha só funciona quando pressionada O ministro das relações exteriores da França Bernard Kouchner resumiu bem o quão nefasta foi a demora de ajuda à Grécia : "Não podemos viver segundo a graça dos mercados. A zona do euro deveria ter ajudado mais rapidamente a Grécia." Recado direto à Chanceler Alemão Angela Merkel, responsável maior pela péssima gestão da crise por parte da UE. Britânicos mais distantes do euro O debate sobre a entrada do Reino Unido no sistema monetário europeu foi um dos principais temas debatidos entre os três principais candidatos à cadeira de primeiro-ministro britânico. A crise atual distancia o país da Europa continental. Já há muita confusão em casa para ser resolvida. EUA fingem não ver, mas "fazem figa" A crise europeia é, neste momento, o principal obstáculo para a recuperação da economia americana, a qual emitiu bons sinais nos últimos três meses. O fortalecimento do dólar norte-americano dificulta o ajuste externo do país e a queda prolongada da atividade econômica europeia impede o espalhamento do aumento de demanda no mercado mundial. Os EUA são o país mais aberto do ponto de vista comercial dentre os países ricos. O andamento da economia mundial é muito mais vital para os americanos que para os europeus. Além disso, reviver uma crise bancária a esta altura dos acontecimentos é ver muitos fantasmas novamente... FMI, tão criticado e tão presente Depois do pacote de 750 bilhões de euros da UE, começa-se a falar num "fundo monetário europeu". Por enquanto, contudo, quem está colocando as mangas de fora é o velho FMI e seu receituário ortodoxo para que os "civilizados europeus" o sigam. Amarga ironia, não é mesmo ? Brasil : arrogância e recomendação Quem viu as declarações de Guido Mantega sobre a participação brasileira na ajuda financeira a Grécia não deixou de notar certa ironia do ministro em relação à condição do FMI de "devedor" em relação ao Brasil. É certo que o FMI sempre foi um órgão que tratou o país dentro de uma ortodoxia muitas vezes insensível à realidade. Todavia, a condição brasileira não é imutável e os caminhos da política econômica por aqui não são tão louváveis quanto imagina o governo atual. Moderação é recomendável neste momento. Brasil perde a preferência Não dá para prever a profundidade dos efeitos da crise europeia sobre o Brasil, mas dá para se afirmar que esta crise afetará mais sensivelmente os investimentos externos para o Brasil que no caso da crise americana. Durante a crise dos EUA, os ativos do Brasil - sobretudo os do mercado financeiro e de capital - ficaram baratos e tinham perspectivas de recuperação num prazo relativamente curto. Os especuladores perceberam isso rapidamente. No momento, os ativos brasileiros estão caros e o cenário de médio e longo prazo se tornou mais incerto. As oportunidades mais especulativas estão nos EUA e na Europa. Isto já era uma tendência, a qual se aprofundará a partir de agora. China : por ora, esquecida Há sinais de que a sustentação da atividade econômica da China nos níveis atuais - de 8% a 10% de crescimento anual - é incompatível com o cenário mundial e com as crises creditícias ao redor do globo. Resta saber o quão afetado será o - pouco transparente - setor financeiro do país comunista. Além dos problemas relacionados à atividade econômica, o setor financeiro da China é um destes mistérios que ninguém está muito disposto a desvendar. Crises : sem respostas teóricas e práticas Vejamos : crise do México em 1995, crise asiática em 1997, crise russa em 1998, bolha especulativa de 1999/2000 nos EUA, crise cambial do Brasil em 1998/2000 e 2002, crise Argentina ao longo da década dos 90 e início dos anos 2000, colapso do sistema financeiro norte-americano em 2008 e insolvência soberana dos países meridionais da Europa. Pergunta-se : a era financeira que vivemos não merece indicar a obsolescência dos sistemas de regulação no mundo global ? As respostas a esta pergunta por parte dos governos não são apenas incipiente, beiram a irresponsabilidade. Radar NA REAL Não estamos alterando as tendências estruturais dos mercados acompanhados por este radar as quais já vinham sendo alteradas nas últimas edições deste informativo. Todavia, alertamos para o fato de que o aumento da volatilidade veio para ficar pelo menos durante o resto deste ano. O cenário que parecia ser saudável sofreu um revés de natureza estrutural e não apenas conjuntural. No caso do Brasil, há o agravante de que teremos uma transição política que é mais delicada que parece. 7/5/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,2870 baixa baixa - REAL 1,7868 estável/baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 62.870,88 baixa estável/baixa - S&P 500 1.110,88 alta alta - NASDAQ 2.265,64 alta alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Banda larga ou charanga eleitoral ? Após uma longa gestação, saiu de uma cesariana improvisada a proposta do governo de universalização do acesso à internet de banda larga no Brasil. Apesar do tempo de gravidez - está na mira do governo desde os tempos de José Dirceu na Casa Civil - e de ter tido uma enfiada de padrastos e madrinhas, saiu apenas um esboço, incompleto. A tal ponto que Lula, que adora tais eventos midiáticos, não emprestou seu prestígio à festa de lançamento semana passada em Brasília. Telebrás reativada De certo mesmo, há a notícia da reativação da Telebrás, com aportes de 3,2 bilhões de reais em quatro anos, mais a intenção de multiplicar por cerca de 2,4 vezes - de 12 milhões para 28 milhões até 2014 o número de casas com banda larga no país. Não há metas específicas nem prazos a serem cumpridos nas diversas etapas do processo, não há indicações da origem dos recursos a serem usados - entre investimentos e recursos fiscais calcula-se o total em 13 bilhões de reais. Dúvidas e mais dúvidas Não se explicou como serão resolvidas as dúvidas jurídicas pertinentes levantadas por especialistas a respeito da nova Telebrás e de suas atribuições. Nem o decreto presidencial dando vida à empresa ficou pronto. Isto pelo menos depois de umas trinta entrevistas de Rogério Santana, escolhido para presidir a Telebrás Plus, nos últimos meses, sempre com detalhes do que seria o Plano Nacional de Banda Larga. Há informações de que o pacote poderá sair por R$ 15 reais para uma velocidade de 1 mega. Seria sensacional. O problema está em saber como este patamar será alcançado. Haverá certamente redução de impostos, caso contrário o milagre fica impossível. Acontece que o peso tributário maior nas telecomunicações, na média algo como 30% de uma carga média em torno de 40%, vem do ICMS. O ICMS é o principal imposto dos Estados, parte depois repassada aos municípios. Governadores e prefeitos foram consultados sobre a disposição liberarem esta receita, sem compensações ? Capitalização da Telebrás e metas A capitalização da Telebrás foi jogada para futuros governos. Este ano ela receberá pouco mais de 250 milhões de reais dos 3,2 bilhões previstos. Porém, já está pronta para montar sua diretoria. Inicialmente, o projeto era "encher" o Brasil inteiro de banda larga no menor prazo possível. Este ano mesmo o Brasil já estaria bem espetado de antenas. Depois, definiu-se que para 2010 seriam atendidas 300 cidades com projetos pilotos, palavras de Rogério Santana. Agora, serão contemplados este ano 15 capitais e mais o DF. O Brasil ainda não tem de fato um PNBL - Plano Nacional de Banda Larga. Mas desde a semana passada tem um PNBE - Plano Nacional de Banda Eleitoral. Grávidos de si mesmos Quem assistiu com os olhares menos turvados a festa de pré-lançamento da candidatura de Geraldo Alckmin ao governo de SP, evento do PSBD com amparo do DEM e do PPS, que se transformou num evento pró-Serra, sentiu certo cheiro de excesso de confiança nas searas oposicionistas Federais. Parece que os ventos favoráveis que têm soprado na campanha tucana somados às agruras internas e externas que a principal adversária vem enfrentado, subiram prematuramente à cabeça do tucanato e cia. Tucano já tem fama de não ser muito humilde... e eleitor não gosta de soberba. Fatos para a mídia O PSDB e seus aliados terão de fazer um esforço maior esta semana para criar novos fatos positivos, de repercussão, para a candidatura Serra. Apesar das dificuldades que a campanha da ex-ministra Dilma vem enfrentando em vários Estados para completar suas alianças e em que pese a convivência com um PMDB cada vez mais exigente, o grande evento da semana será da candidata petista : o horário eleitoral do PT quinta-feira, todo ele montado em torno dela. É quase certo que algum instituto sairá em campo depois da aparição da ex-ministra no rádio e na televisão e os resultados, talvez no fim de semana, poderão refletir esta exposição dela. E como a atual fase da campanha tem se caracterizado por uma guerra de pesquisas...  Marketing de Serra cheio de dúvidas O pessoal de marketing ligado a Serra ainda não está convicto sobre as linhas de campanha para lançar e manter o candidato em crescimento. A popularidade de Lula impõe redobrados cuidados na mensagem a ser emitida. É preciso mirar cirurgicamente em Dilma, mas essa não é tarefa fácil no campo da comunicação. Moeda de troca Quem estranha os arroubos de independência de partidos, outrora cães de guarda fiéis do governo, não está atento a alguns detalhes : 1. Há ciúmes demais com a prioridade total dada ao PMDB. Ciúmes até no PT. 2. O governo está sem um dos seus principais "trocos", aquilo que amalgamou a coalizão governista por muito tempo - os cargos Federais. Agora eles valem pouco com Lula. E com Dilma ainda não chegaram e são já muito cobiçados por PMDB e PT, com riscos de sobrar pouca coisa para o restante. 3. A única moeda de troca disponível imediatamente são as emendas parlamentares. Porém, há o complicador dos gastos públicos. Lula faz campanha para... ...Lula. Políticos de faro mais acurado estão cada vez mais convictos de que o presidente está menos preocupado com Dilma do que com ele mesmo, seu futuro e sua imagem. E há fatos que não negam esta interpretação. Em Recife, por exemplo, diante de insinuações de que sua candidata está estagnada, Lula lembrou que isto vai mudar e que Dilma não cresceu mais nas campanhas porque "eu ainda não subi ao palanque com ela para pedir votos". Mais significativa ainda foi a resposta da própria Dilma a uma pergunta da equipe da revista IstoÉ que a entrevistou : "P - A Sra. cederia a possibilidade de uma reeleição para o presidente Lula, no caso de ele querer se candidatar em 2014 ? R - Ele já me disse para não responder a essa pergunta." Neste ritmo, os comunicadores da ex-ministra vão ter se de desdobrar para convencer parte do eleitorado de que ela não é apenas uma espécie de boneca de ventríloquo de Lula e que o candidato de fato é ela e não ele. Um exemplo mercurial A propósito do caso Tuma, há muita gente lembrando-se do complicado presidente Itamar Franco. Diante de uma suspeita levantada contra o então ministro chefe da Casa Civil, Henrique Hargreaves, seu amigo e conterrâneo, o presidente afastou-o sem vacilar do cargo. Feitas as investigações e comprovado que as suspeitas eram infundadas, Hargreaves voltou ao governo. Qualquer falta de semelhança entre este episódio e o que agora toca o secretário de Lula, não é mera coincidência. É diferença de padrão e de conduta.
terça-feira, 4 de maio de 2010

Política & Economia NA REAL n° 99

Grécia : problema estrutural, agravamento conjuntural A Grécia está endividada e há anos necessitava de ajustes do ponto de vista fiscal. É fato. Todavia, o agravamento de sua situação deveu-se a dois fatores essencialmente conjunturais : (i) a crise internacional que fez com que os dispêndios governamentais aumentassem para socorrer o seu sistema financeiro e (ii) o ataque especulativo da parte de fundos e posições próprias dos bancos, crescente nos últimos meses, que inviabilizou a rolagem de suas dívidas a custos razoáveis. A desunião Europeia O pacote de 110 bilhões de euros para viabilizar a rolagem da dívida da Grécia é o maior da história do sistema financeiro mundial. Este valor poderia gravitar em torno de 40-50 bilhões não fosse a ausência de mecanismos inteligentes e rápidos que viabilizassem a solvência dos países membros da UE em momentos de crise. O ajuste grego era necessário, mas a sua agonia foi um custo irresponsável da parte do sistema financeiro europeu. Há que se considerar que a Grécia não tem a opção de desvalorizar a sua moeda para iniciar o ajuste de seu balanço de pagamento de vez que a moeda é comum. A falta de mínimo consenso entre os países da UE foi um mal maior no agravamento da crise e mostrou para o mundo a debilidade do sistema monetário que rege as relações entre os países do Velho Continente. Alemanha fez um papelão Desde o início do século passado, toda vez que a Alemanha projetou as suas ambições econômicas e geopolíticas no continente europeu o resultado foi desastroso : dela nasceram duas guerras sanguinárias. Agora, a Alemanha quer "comandar" o euro, mas a sua ação em relação à Grécia mostrou que o governo germânico quer liderar sem ter os custos correspondentes impostos aos líderes. Angela Merkel nunca foi uma estadista, já se sabia. Agora, sabe-se que não passa de uma governante provinciana, incapaz de ampliar as suas visões quando as decisões são relevantes. Veja-se o exemplo de Helmut Kohl que, contra a opinião pública da então Alemanha Ocidental, lutou pela reunificação da Alemanha depois da queda do muro. Merkel se ajoelhou perante contingências políticas imediatas e impôs um custo social e político à Grécia inaceitável para um país-membro da UE. Fez mais : pregou contra o país dos helênicos e ajudou os especuladores. Angela Merkel é a personificação da incompetência europeia. O euro é moeda inferior A exposição das fragilidades da Europa na gestão de crises deve distanciar o euro do papel de alternativa, enquanto moeda-reserva, ao dólar norte-americano. Os investidores sabem disto e se sentem mais seguros para especular contra o euro. Portugal, Espanha e Itália O imbróglio na gestão dos problemas dos gregos certamente agravará os custos de rolagem da dívida dos países mais endividados da Europa, sobretudo no caso de Portugal, Espanha e Itália. Mas há outros : Irlanda e Bélgica. Note-se que no caso destes países o desemprego está acima de 15% e, no caso da Espanha, chega a 20% (dados da semana passada). Não se deve descartar a possibilidade de processos especulativos contínuos sobre estes países, nas próximas semanas, meses e anos. O risco global Se nas próximas semanas não houver controle significativo da crise europeia, há o risco de que tenhamos efeitos rápidos e significativos sobre a atividade econômica mundial, já cambaleante em função da crise do final de 2008. É difícil estabelecer uma probabilidade de colapso de outros países, mas uma coisa é provável : caso haja uma nova crise como a da Grécia, esta será mais aguda e relevante para a moeda europeia. O silêncio dos EUA Poucos comentários foram conhecidos da parte do governo dos EUA sobre os problemas da UE. Sábia decisão. Todavia, do ponto de vista geopolítico, a América ganhou espaço para fazer prevalecer os seus pontos de vistas na vasta agenda contenciosa entre os dois lados do Atlântico. FMI ressuscitado A UE, em geral, e a Alemanha, em particular, conseguiram reavivar os ânimos do FMI. O órgão multilateral, conhecido pela sua inoperância perante os riscos globais, parece muito competente quando a referência são os gestores da moeda comum europeia. E as reformas ? O exemplo grego demonstra que os mecanismos especulativos que permitem o colapso de economias inteiras continuam vivos e saudáveis. Por enquanto, não há consenso de como agir solidariamente em situações especulativas. Os governos continuam a tratar as consequências destas doenças sem que existam iniciativas para evitá-las. A reforma do sistema financeiro internacional é uma necessidade, mas permanece esquecida nas gavetas dos executivos e legislativos dos países mais ricos do mundo. Brasil : é preciso acordar I É visível a deterioração das contas públicas. As despesas continuam crescendo mais do que a receita, sem sinais de que vamos gastar menos ou arrecadar muito mais do que estamos arrecadando. Nada de assustar no curto prazo (12 meses à frente), porém o ritmo é incompatível em relação ao crescimento futuro do país. Mais um exemplo : a MP 487, editada discretamente na semana passada, escancara portas para o financiamento de empresas públicas com mais recursos do tesouro. Por exemplo : o Fundo Brasil Soberano poderá ser usado para capitalizar a Petrobras, a Eletrobrás, o Banco do Brasil. Não era esta a sua finalidade quando foi pomposamente anunciado... Brasil : é preciso acordar II A política fiscal expansionista praticada depois da eclosão da crise financeira ao final de 2008 foi uma sábia decisão do governo. Todavia, é injustificável no momento em que o ciclo econômico já se mostra saudável. O governo, ao não contrair o setor público, comete o erro clássico de não adotar uma política "anti-cíclica" quando as coisas vão bem. Isto abriria espaço para futuros aumentos de gastos governamentais quando a atividade eventualmente cair. Senão, corremos o risco de ter de fazer ajustes em meio a ciclos negativos. O exemplo grego poderia ser um fator a alertar as autoridades e a sociedade. Não é. Infelizmente. O banco eleitoral ? O BNDES está se tornando um poderoso fornecedor de financiamentos, tanto para o setor público quanto o privado, com uma facilidade e uma generosidade que surpreendem até os beneficiários. Com um dinheiro que, em boa parte, custa mais caro para ele que ele recebe de quem empresta. Radar NA REAL Mudamos a nossa visão em relação à moeda europeia, com base nos resultados de momento da crise grega. O euro deve seguir numa trajetória descendente no curto e médio prazo. De outro lado, é preciso ficar muito atento relativamente à contaminação de outras economias e seus efeitos sobre a atividade econômica mundial. Os mercados de ações devem acompanhar as variações entre as principais moedas, sobretudo a relação entre o dólar norte-americano e o euro. Eis um ponto de muita atenção. De outro lado, a trajetória da taxa de juros no Brasil se tornou vital para controlar a inflação. É hora de privilegiar os títulos pós-fixados em detrimento dos pré-fixados. (Vide abaixo sobre a decisão do COPOM). 30/4/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,3227 baixa baixa - REAL 1,7294 estável/baixa baixa Mercado acionário - Ibovespa 67.529,73 baixa estável/baixa - S&P 500 1.186,69 alta alta - NASDAQ 2.461,19 alta alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável COPOM : atrasado ? O BC seguiu pelo caminho correto ao aumentar a taxa de juros básica para 9,5% ao ano na reunião do COPOM da semana passada. Todavia, o aumento de 0,75% é sinal de que a autoridade monetária está atrasada em relação às perspectivas da inflação. Sobretudo, porque neste momento o ritmo de crescimento do consumo doméstico segue a ritmo chinês : mais de 10%. O problema estrutural é que os investimentos caminham lentamente. Portanto, o risco de um salto na inflação é considerável, em que pese a calma do tal do mercado em relação ao tema. Voltei, aqui é o meu lugar Como se viu em seu pronunciamento de 1º/5 no rádio e na televisão e nos comícios do dia dos trabalhadores, o presidente Lula retornou à linha de frente da campanha de Dilma. Isto se deve às trapalhadas dos companheiros do PT em relação à campanha da candidata. Já não era sem tempo, segundo a opinião de petistas bem postados. Foi Lula dar-se o direito a um descanso e a campanha desandou mais que maionese rançosa. De um lado, começaram a complicar as alianças já praticamente ajustadas. O PSC e o PP, partidos tidos como aliados incondicionais, estão ameaçando desgarrar e exigem cuidados e ofertas. O PP é caso de urgência, uma vez que está sendo assediado com uma vice de Serra para seu presidente o senador Francisco Dornelles, o que aproximaria mais os Neves de Aécio e Tancredo (e MG) do candidato tucano. O PT, que parece ter aprendido a valorizar seu passe com o PMDB, está se mostrando mais arredio aos apelos presidenciais e de sua direção nacional para abrir espaços regionais para parceiros de coalizão. Até agora as ameaças de intervenção não funcionaram e em alguns lugares a demora do acerto está deteriorando a situação em níveis quase sem volta. Só o superLula pode botar o paiol aliado em ordem. Antes que outros episódios Ciro Gomes floresçam. Hora da ordem unida Os desarranjos verificados na campanha de Dilma, admitidos até por muitos petistas ativos e outros apenas de carteirinha, tem uma origem bem visível : há coordenadores demais, muita gente mandando ou dando palpite, sem uma diretriz geral. Onde há muitos comandantes não há comandante algum. Bate-se cabeça e nada sai direito. É este papel que Lula terá de exercer, como exerceu em suas outras campanhas. E terá de começar ceifando vaidades. Mais do que ajudar a empurrar Dilma em direção à presidência, muitos dos seus assessores estão mesmo é tentando empurrar suas próprias carreiras. Entre os aliados, PT incluso, há muita gente que não vê Dilma como força e liderança suficiente para administrar o "balaio de gato" político que está se formando na aliança. E cada um que pode já quer ir cevando o seu feudo. Lula terá de descer para valer o bastão de comando nas costas dos parceiros e amigos. Esta pode ser a semana da decretação de "estado de sítio" e de uma ordem unida geral no campo oficial. Enquanto eles não se entendem... As divergências na campanha governista, de tantas e algumas tão infantis, proporcionam ao comando oposicionista oportunidade para administrar suas próprias idiossincrasias sem grandes marolas. Serra, com fama de concentrador, está mesmo com a campanha totalmente controlada - até quando ? - e continua levando vantagem sobre a adversária na qualidade de suas exposições públicas. As diferenças das perspectivas que hoje os dois lados vislumbram também contribuíram para que um lado demonstre algum juízo e outro caminhe para algum tipo de "alopramento" : 1. O que a oposição vê a possibilidade mais de 8 anos com Dilma ou mais 4 com Dilma e mais 8 com Lula depois, o que seria o seu fim. 2. Os do governo, eufóricos com a popularidade de Lula e do governo, já se vêem por mais 8 ou 12 anos no poder e tratam de assegurar seu lugar ao sol antes mesmo das urnas falarem. Em política, o medo, a perspectiva da desgraça, pode unir ; a certeza do sucesso, a glória, comumente divide. O meu pirão primeiro I Muito se comentou das razões que levaram o PSB a esganar, com humilhação, a candidatura do deputado Ciro Gomes ao Palácio do Planalto pelo partido. Sim, houve um pouquinho de tudo : fidelidade a Lula, medo de uma derrota acachapante com Ciro, abraçar o mais cedo possível o vencedor para garantir espaços no futuro governo, necessidade de alianças regionais com o PT para garantir eleição de governadores, senadores e deputados da legenda... O meu pirão primeiro II Mas houve também outra motivação, esta muito negligenciada : Ciro, além de ser um socialista relativamente recente, era um incômodo para o principal líder do partido, o governador Eduardo Campos. E incomodava não por seu estilo mercurial um tanto independente. Atrapalhava porque, do ponto de vista eleitoral, Ciro era  - ainda é - muito mais figura pública que o neto de Miguel Arraes. Tem mais votos, mais presença nacional, mais articulação fora do eixo partidário. Ciro é, digamos, universal. Campos, provinciano ainda. Portanto, o ex-ministro era um possível obstáculo aos planos de voos futuros do jovem governador. Campos, assim como Ciro, num certo período ensaiou se lançar vice na chapa de Dilma. Depois do segundo mandato, o governador espera sair de "Pernambuco para o mundo". Vingança que se come fria Mais do que as palavras, pois estas sempre podem se perder, os primeiros gestos do deputado Ciro Gomes depois que saiu do forno de microondas em que foi torrado pelo PT e o PSB, indicam que o ex-ministro da Integração Nacional não vai levar desaforos para casa. A decisão da ex-mulher dele, a senadora Patrícia Saboya, de disputar uma arriscada reeleição em lugar de uma vaga garantida para a Câmara dos Deputados complica a vida da aliança governista no CE. Na composição do PSB de Patrícia, e do candidato à reeleição do governo estadual Cid Gomes, entra o tucano Tasso Jereissatti, buscando também reeleger-se para o Senado. Abre-se, provavelmente, um espaço para Serra num dos Estados onde ele tem menos penetração. Quem dá mais ? Resumindo a ópera das buscas de coligações partidárias no plano federal : tudo se resume ao tempo de cada partido no rádio e na televisão. O tal "horário gratuito", mas que de gratuito não tem nada : as emissoras são ressarcidas pela Receita Federal do que deixam de arrecadar em publicidade quando os candidatos estão no ar. Públicas ? Não, estatais Sem entrar nas discussões das credenciais de quem saiu ou de quem entra, ambas indiscutíveis, o episódio da substituição do jornalista Paulo Markun pelo economista João Sayad, no comando da Fundação Padre Anchieta, é lastimável do ponto de vista institucional. Urdida no Palácio dos Bandeirantes, principal patrocinador financeiro da TV Cultura, demonstra apenas que no Brasil o conceito de televisão pública é uma ilusão. A injunção política fala mais alto, manda o poderoso de plantão com seus desejos e idiossincrasias. A TV Brasil (a dita "tevê do Lula"), totalmente dependente do governo federal, é uma regra no país. E a TV Cultura, apesar de algumas aparências, não é uma exceção. São televisões estatais. De públicas têm apenas o dinheiro que gastam. Nem sempre com bom proveito. Minas : teoria e prática O PT/MG já deu sua demonstração de autonomia : em prévia no fim de semana indicou o ex-prefeito de BH, Fernando Pimentel, como seu candidato ao Palácio da Liberdade. O ex-ministro Patrus Ananias, derrotado na disputa, poderá ficar com uma das vagas ao Senado. Esta é a teoria. Cumprido o ritual para consumo externo, o PT deverá agora cumprir o desígnios estabelecidos por Lula : aceitar a aliança com o PMDB, com o ex-ministro Hélio Costa disputando a sucessão de Aécio. Pimentel e Ananias poderão ser acomodar na vice e no Senado, de acordo com suas conveniências. O partido no Estado vai espernear só mais até o fim do mês. Para a platéia Sempre que algo acontece no governo ou na política que pode parecer desagradável ou contrário a idéias de Lula, há sempre uma fonte oficiosa de plantão para contar a alguns jornalistas que o presidente Lula ficou "irritado" com tal fato. Agora mesmo, diz-se que ele se irritou com as prévias do PT em Minas, como já se irritou com ministros, com a base aliada, com o PT e o diabo mais. Ora, com o poder e o prestígio que o presidente tem, como já demonstrou, por exemplo, na fritura da ex-ministra Marina Silva e no tempo em que passou assando Ciro Gomes, Lula age cirurgicamente quando quer. Se ele deixa coisas que o "irritam" prosperar, é porque tem outras intenções. No caso de Minas, precisava manter o ex-ministro Hélio Costa e o PMDB em quarentena.
terça-feira, 27 de abril de 2010

Política & Economia NA REAL n° 98

  Grécia : dívida, moeda e ajuste Muito tem sido comentado sobre a situação econômica da Grécia e sua correspondente influência sobre os mercados mundiais. O pequeno e notável país da Europa tem uma relação dívida sobre o PIB da ordem de mais de 100% e um déficit fiscal de cerca de 13% do PIB. Como se vê, uma situação insustentável, sobretudo depois do débâcle do sistema financeiro norte-americano e sua influência no mundo. Mas perguntamos : há novidade neste fato ? Não, não há. Ele existe há anos e o sistema financeiro internacional continuou financiando irresponsavelmente este cenário. Agora, questiona-se sobre a capacidade de pagamento do país. Uma contradição. O problema grego não é único Ocorre que a Grécia não é o único país nesta situação. A Itália, a Espanha e Portugal tem exatamente o mesmo perfil. E certamente merecerão questionamento no futuro sobre a sustentação da capacidade de solvência. Em menor medida, há quem questione o próprio Reino Unido, sócio maior da irresponsabilidade dos EUA na gestão do setor bancário. O problema é o câmbio Usualmente, quando países chegam a um cenário como o da Grécia e de outros países da UE, o ajuste é via câmbio : desvaloriza-se as moedas (e, por derivação, os salários) e constrói-se resultados no balanço de pagamentos que restitui a capacidade de pagamento no médio prazo. O risco é a inflação devastar este ajuste. Todavia, os países europeus estão "amarrados" ao euro que, na prática é administrado pela Alemanha e França. Portanto, nenhum dos países mais afetados pelo excesso de endividamento têm, na prática, a opção cambial.  Um teste para o euro e a UE Ora, no contexto acima devido, a Alemanha e a França tem de ajudar a viabilizar uma saída para a rolagem das dívidas da Grécia. Todavia, são estes países que mais atrapalham na tentativa do desgastado governo grego em garantir a sua solvência. Angela Merkel e Nicolas Sarkozy se deleitam com a liderança da UE, mas não assumem as responsabilidades de financiar os países mais penalizados pela crise internacional. Uma contradição, protegida pela necessidade de aprovar nos seus respectivos parlamentos o apoio à Grécia. A opção da moratória Restaria ao governo helênico exercer a sua soberania e impor uma moratória - negociada ou unilateral - para evitar um desastre na atividade econômica. Se esta opção fosse tomada, certamente o prejuízo à UE seria muito maior de vez que a pressão sobre Portugal, Espanha e Itália passaria a ser gigantesca, além de uma provável desvalorização substantiva do euro. A Grécia resiste à opção da moratória e protege a UE, a mesma que lhe nega franco apoio. Uma contradição que perdurará enquanto o povo grego suportar e não levantar suas fileiras para manter o seu interesse interno o qual sempre prevaleceu em sua história e civilização. Cadê os profetas ? A situação da UE deixa evidente que o euro está longe de se consolidar como alternativa de ser a "moeda-reserva" da comunidade internacional. Ocorre que há não muitos meses, sobravam analistas e economistas célebres pregando o declínio da moeda americana. Quem apostou nesta opção vê prejuízos pela frente. Não são poucos. No curto prazo, é possível ser categórico : o euro vai cair ainda mais frente ao dólar e as outras moedas mundiais. No longo prazo, não se sabe por uma única razão : não há modelo analítico razoável que permita esta previsão. A despeito dos irresponsáveis que dizem ter esta capacidade, digamos, "mediúnica". Radar NA REAL Não há novidades em relação ao nosso radar. Reforçamos apenas suas visões já emitidas : (i) o mercado de ações brasileiro parece estar em seu limite superior. O cenário é positivo na economia, mas parece refletido no preço das ações ; (ii) a valorização do real deve continuar no curto prazo, mas está instalando na economia brasileira riscos significativos no médio prazo. Basta vez os dados minguantes da balança comercial e no resultado externo como um todo. 23/4/10   TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,3338 estável/queda estável/baixa - REAL 1,7466 estável/baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 69.386,40 baixa estável/baixa - S&P 500 1.208,67 alta alta - NASDAQ 2.519,07 alta alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável COPOM : dito, mas será feito ? Já emitimos diversas notas em colunas anteriores dando conta das pressões da inflação e da impossibilidade de se sustentar uma taxa de crescimento do consumo no padrão chinês sem a contrapartida nos investimentos. Assim sendo, a probabilidade de um aumento de 0,75% na próxima reunião do COPOM é quase de 100%. Ademais, um aumento de 1% é possível e seria uma forma de afirmação do BC perante o governo. Na semana passada, Guido Mantega deu o tom da disputa entre o Planalto e a sede do BC : "quem disse que o país não pode crescer um pouco mais ?", disse o ministro. O recado tem endereço certo : os ouvidos de Henrique Meirelles e seus colegas de diretoria do BC. Eles estarão moucos a este tipo de afirmação ? Onde está o Wally planaltino ? Causou espanto a ausência do presidente Lula na festa do PT no sábado passado para lançamento do senador Aloizio Mercadante ao governo de SP, Estado de origem do partido, onde o PT nunca governou e que marca 16 anos de hegemonia do PSDB. Mercadante não queria concorrer, preferia, com grandes chances, tentar continuar senador. Foi empurrado por Lula. Dilma apareceu, muito animada, embora ainda sem jeito para o palanque. Fato será recorrente Não é de estranhar a ausência de Lula. Ele não foi também a uma festa idêntica de seu partido, no RJ, no domingo. Era o pré-lançamento de Lindberg Farias como candidato petista ao Senado. Foi uma tentativa de mostrar que vai tudo muito bem na aliança PT/PMDB por lá. Dilma e Sérgio Cabral compareceram ao evento, muito animados, diga-se. A razão é simples e não deveria espantar os parceiros : Lula não pode sair pelo país afora participando de cada evento de lançamento de pré-candidatura de aliados. Ainda mais porque há muita confusão em um bom número de Estados. O outro motivo Mas há outro motivo, mais oculto, não confessado, visível há pelo menos três semanas : Lula está, nesta fase de pré-campanha, evitando eventos de cunho eleitoral. Não abandonou sua candidata, mas está deixando ela mais sozinha. E, assim, evita polêmicas diretas com a oposição. Vai durar até quando esta posição ? Difícil saber. Mas coincide com a confirmação, pelo TSE, de duas multas - R$ 15 mil - aplicadas ao presidente por fazer campanha antecipada para sua predileta e com o endurecimento verbal da Justiça Eleitoral. Nas duas últimas semanas tanto o antigo como o atual presidente do TSE fizeram advertências ao presidente. Errou nos primeiros passos De todo modo, esse "abandono" temporário do presidente em relação à pupila está sendo prejudicial : ela ainda não está preparada para caminhar sem o amparo da cadeira de rodas presidencial. Desde a saída dela do Ministério, sua campanha praticamente só gerou fatos negativos, externa e internamente. A qualquer momento PT e aliados vão passar a empunhar um cartaz com os dizeres : "Volta Lula". Erro de cálculo e prepotência Já avisávamos nesta coluna há semanas : acuado, humilhado, o ex-ministro Ciro Gomes poderia reagir com uma biruta de aeroporto dotado de um bom estoque de mísseis. Por que o governo deixou o problema chegar tão longe ? Excesso de confiança, prepotência e coisas tais. O tal : sabemos/sei de política e podemos/posso tudo. O estrago desta primeira explosão de Ciro deverá ser eleitoralmente pequeno. O problema é se o ex-ministro gostar da brincadeira... Mordeu a isca ? A combinação, na seara governista, era que ninguém entraria em polêmica com o "mercurial" ex-ministro da Integração Nacional. Dilma, porém, não resistiu e foi ao microfone dizer que está preparada para governar. O que confirma o que se dizia em Brasília desde o primeiro momento : o que mais doeu e preocupou nas declarações de Ciro Gomes foi o ponto em que ele diz que Serra tem mais condições de governar do que Dilma. Parte da estratégia eleitoral de Serra é esta mesmo : mostrar que ele é bem mais preparado para o governo do que a ex-ministra chefe da Casa Civil. Contas a pagar A fatura que o PSB está apresentando para degolar Ciro Gomes hoje - salvo reviravoltas de última hora, impensáveis nesta altura - está inflacionando o mercado. Outros aliados estão revendo suas notas fiscais eleitorais. Há gente escolhendo até que cargo o PT deve disputar e quem compõe o quê. No PR, por exemplo, o PDT de Osmar Dias - irmão do tucano Álvaro Dias - quer que Gleise Hoffmann, mulher do ministro Paulo Bernardo, seja candidata a vice-governadora na chapa pedetista e não concorrente ao Senado. A razão : temor de algum tipo de traição. No RJ, o PMDB fincou praça e não deu espaço na chapa governista para o senador Marcelo Crivella, nem aceita Lula e Dilma no palanque de Garotinho. Com isso, isola dois bons puxadores de voto na campanha da predileta presidencial. Modéstia a parte Para completar um mês em que a exposição de seu candidato tem sido muito mais positiva do que a candidata adversária, a oposição faz um redobrado esforço para mostrar-se humilde e coesa. Mas há ebulições internas e a fogueira das vaidades está próxima de voltar a arder no campo de Serra. Especialmente no emplumado tucanato. Coalizão ou esculhambação ? O analista político Sergio Abranches inventou a expressão "presidencialismo de coalizão" para definir, na nossa balbúrdia partidária, a necessidade que o governo no Brasil - qualquer governo - tem de montar uma ampla e amorfa aliança de partidos para garantir um mínimo (mínimo mesmo) de governabilidade no Congresso. Essas alianças, legítimas numa democracia, por aqui nunca foram muito republicanas, ou melhor, nunca foram apegadas à santidade. Mas, do modo como se está caminhando nos ajustes de pré-campanha deste ano, brevemente passaremos a um "presidencialismo de esculhambação". Ou de rimas mais pobres e chulas. Ela está certa Vamos deixar de barato que a ex-ministra Marina Silva age assim para atrair a simpatia de Ciro Gomes, embora a brava senadora do AC tenha dado demonstrações completas de sua capacidade de ser generosa. Vamos deixar de barato, também, que o deputado Ciro Gomes plantou a humilhação que agora está colhendo por sua prepotência, embora ele não tenha escondido de ninguém que estava na corrida presidencial para valer e tinha esperanças de que Lula não seria contra ele, sem nunca ter sido contrariado. Ainda assim, é perfeito sobre o processo de trucidamento de Ciro o que escreveu a candidata do PV em seu blog : "Qual o sentido político da democracia ? É a liberdade de escolha bem informada. Numa eleição em dois turnos, como a presidencial, o primeiro foi concebido para oferecer ao eleitor um leque de alternativas políticas. A partir da diversidade de ideias e do debate entre elas, compete ao cidadão escolher as que entende serem as melhores para si e para o país. É particularmente perverso que esse processo, que está no cerne da democracia, seja instrumentalizado para impedir abalos na manutenção de projetos de poder. Não é admissível que se queira manipular o direito de escolha por meio da redução forçada do leque de opções. Assistimos agora, com o veto à candidatura de Ciro Gomes, uma expressão exemplar desse tipo de intolerância democrática. É fácil prever que os mesmos grupos que trabalharam para tirar Ciro da disputa presidencial tentarão agora assimilá-lo. Os que costumam agir dessa maneira são aqueles que têm dificuldade em transformar a visão democrática em ação e não admitem a alternância de poder. Primeiro, buscam eliminar os adversários que querem disputar legitimamente a preferência dos eleitores. Depois, tentam se colocar como o único hospedeiro possível para que os expurgados consigam sobreviver na vida pública. Aquele que foi empurrado para fora do processo passa então a ser apontado como bom companheiro, patriota, desde que aceite ser assimilado por aqueles que articularam o seu expurgo. Perde o país, perde a democracia." Limpa ou suja ? Está prometida para esta semana a aprovação na CCJ do Senado do projeto conhecido como dos "fichas-sujas" (ou "fichas-limpas" sob outro ângulo). Jogo para a arquibancada. O que se está tramando vai gerar no máximo uma proposta "ficha meio-suja" (ou meio-limpa). E ainda assim, para ficar no limbo. Se passar rapidamente no plenário da Câmara, empaca no Senado. Para não valer nada nas eleições deste ano. Talvez não valha nem para a eleição de 2012. MP : ameaça e chantagem A decisão da AGU de fazer uma representação contra dois integrantes do MP que atuaram contra o leilão de Belo Monte é uma tentativa inaceitável de tentar intimidar a instituição responsável pela defesa dos interesses da sociedade e da lei. Entende-se que o MP às vezes erra, exagera, mas estas falhas são poucas se comparadas com o excelente trabalho de vigilância que eles exercem sobre os poderes da República. Uma das grandes conquistas institucionais do país nos últimos anos foi o conjunto de obrigações e prerrogativas que a CF/88 legou ao MP. Mas como sabemos, não há poder, por mais democrático e republicano que seja que conviva bem com críticas, com fiscalizações, com contraditórios. Ainda mais quando ele se julga superior, acima do bem e do mal.
terça-feira, 20 de abril de 2010

Política & Economia NA REAL n° 97

A cruzada de Mantega e o dilema de Meirelles Há alguns anos, quando era ainda ministro do Planejamento, Guido Mantega classificou-se como um "levantador de PIB". Quando foi para a Fazenda, justiça se faça, Mantega se comportou como "halterofilista econômico", na retórica e em atos. Agora, ele está agindo exatamente ao contrário - pelo menos nos discursos. Diante dos evidentes sinais de que a economia brasileira caminha para um crescimento quase chinês - já há instituições prevendo um PIB 7% maior neste ano - o ministro da Fazenda nega de pés juntos e mãos atadas que isto irá ocorrer. A cruzada de Mantega tem um objetivo : evitar que o BC, na semana que vem, seja duro demais na previsível paulada, para cima, que dará nos juros. A aposta mínima dos especialistas é a de que o ajuste será de 0,75 ponto percentual, porém já há algumas pessoas pensando que pode ser de até 1 ponto. A questão é outra E a questão é menos econômica do que política : como os efeitos sobre a inflação da movimentação dos juros, tanto para cima como para baixo, demoram uns bons meses para ocorrer, o que Mantega quer conter é o efeito simbólico de uma medida dessas sobre o ânimo da população e a disposição eleitoral dela. Um encarecimento das prestações do crediário nesses meses pré-eleição pode ter consequências nas preferências eleitorais, principalmente da "nova" classe média. No fundo, o governo parece aceitar um pouco mais de inflação no futuro em troca de um pouco mais de votos nas urnas de outubro. É este o dilema do presidente do BC : isenção técnica ou comprometimento político. Contradições do ministro Para quem quer conter um pouco o crescimento da economia sem precisar apelar para o aumento dos juros, Guido Mantega tomou uma decisão contraditória ao autorizar a prorrogação da redução de impostos para materiais de construção até o fim do ano. Dá para entender, porém tem peso no marketing eleitoral da candidata do governo o programa "Minha Casa, Minha Vida". A ameaça de Mantega Mais de uma vez o ministro da Fazenda avisou os empresários que poderá reduzir as alíquotas de importação de produtos que tiverem seus preços reajustados acima do razoável. É retórica, apenas ameaça. Dificilmente qualquer importação terá efeitos imediatos para conter a inflação nos próximos meses. E há o sério problema das contas externas : aumentar as importações, ainda mais artificialmente, é um tiro. Na realidade, o governo precisa pensar em como conter a deterioração do balanço de pagamentos. Lula vai aceitar ? Com ou sem "PIB potencial" ou "hiato do produto", boa discussão para os economistas, a verdade é que começa a haver um consenso de que será preciso mesmo conter um pouco a velocidade de fórmula 1 com que vai correndo a economia brasileira. Alguns acreditam que o PIB deste ano já está dado, não há mais o que fazer, somente para o ano que vem pode-se tentar algo mais duro. Outros acham que dá para fazer algo ainda este ano, para não deixar a inflação ultrapassar até o limite superior da meta, de 6,5%. O centro de 4,5% já estaria fora de propósito. A questão é saber : Lula resistiria à tentação de encerrar seus oito anos de governo com um crescimento econômico ao redor de 7%, como nos bons (porém, não saudosos) tempos do "milagre econômico" dos governos militares ? BC deve mais explicações Não há fatos novos no que tange ao crescimento acelerado do país. Aqui mesmo nesta coluna já alertávamos para o fato. Ora, por que a autoridade monetária não agiu preventivamente em relação ao assunto ? Uma elevação - necessária - da taxa de juros básica em 1% é sinal de que o BC está atrasado em relação à prevenção da inflação. Isto lhe retira credibilidade, mesmo que a sua ação seja no sentido de conter a inflação vindoura. Tudo isto parece confirmar a intenção eleitoreira do próprio presidente do BC, o qual andou crente na sua viabilidade eleitoral em Goiás e, especialmente, como candidato à vice-presidência na chapa governista. Mais transparência A publicidade das ações do setor público é uma obrigação tanto quanto a probidade e a legalidade. No caso do COPOM, parece-nos necessário que os votos proferidos nas reuniões do comitê sejam identificados. Isto aumentaria a transparência, bem como a capacidade de análise dos rumos da política monetária por parte da sociedade. Os tribunais assim o fazem. Por que isto não deveria valer no caso do BC ? O novo escândalo financeiro Um dos mais importantes bancos de investimento de Wall Street, o Goldman Sachs está implicado em investigações e acusações sobre a sua falta de transparência em relação às suas operações. De fato, trata-se de uma acusação de fraude na medida em que certas operações visavam esconder a exposição do banco relativamente aos empréstimos para o setor imobiliário. Pois bem : este escândalo mais uma vez levanta dúvidas sobre a necessidade de maior regulação do sistema financeiro norte-americano (uma tese que o Congresso não abraçou, mas que Obama deseja), bem como a irresponsabilidade dos diretores na condução dos negócios bancários, o que muitas vezes favorece os seus próprios - e enormes - bolsos. Este escândalo, por cima de tudo, obscurece as boas notícias do front econômico que dão conta do aumento do consumo e do emprego, bem como da redução do nível das expectativas negativas sobre o futuro. Radar NA REAL Não há nada eminente que possa afetar estruturalmente a economia brasileira. Todavia, é bom que se reconheça de que há um acúmulo significativo de problemas no médio prazo - seis meses à frente - e no longo prazo. O principal deles é a inflação que está se generalizando e os riscos que a atividade econômica acelerada no Brasil e em aceleração no mundo possam sofrer. O BC terá de agir e sua ação é tardia. Assim sendo, estamos fazendo duas alterações no nosso radar : a primeira diz respeito ao mercado acionário local, o qual está, em nossa opinião, muito valorizado diante desta conjunção de riscos. Isto vale para o curto e o médio prazo. A segunda diz respeito ao Real. Apesar de todo o capital que foi recebido pelo país nos últimos anos, verifica-se que os saldos positivos estão se reduzindo e os riscos eleitorais não estão incorporados na taxa de câmbio. O Brasil não deixará de ser prioridade dentre os emergentes, mas deixou de ser "a" prioridade. 16/3/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,3437 estável/queda estável/baixa - REAL 1,7599 estável/baixa baixa Mercado Acionário - Ibovespa 69.421,35 baixa estável/baixa - S&P 500 1.194,37 alta alta - NASDAQ 2.481,26 alta alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável Bom para Dilma A discrepância entre as duas mais recentes pesquisas eleitorais - do Sensus, com empate técnico, e do DataFolha, com 10 pontos de vantagem para Serra - embaralhou muitas cabeças políticas. E serviu para a execração dos institutos de um modo geral por quem se sentiu prejudicado. Político acredita que as pesquisas influenciam os eleitores, o que não tem nenhuma comprovação científica. Contudo, apesar dessa confusão, há indicações de que o mar está mais para o peixe governista no momento do que para o peixe oposicionista. Um dado, especialmente : na pesquisa espontânea - na qual o entrevistado lembra o nome do candidato, sem que seja apresentada a ele uma lista dos concorrentes - o DataFolha apresenta Dilma na frente de José Serra. O que não quer dizer que muita marolinha, marolas maiores e até tsunamis não possam alterar este quadro. A campanha de Serra, no momento, segue mais serena do que a de Dilma. Pode complicar As pesquisas indicam também que a candidatura de Marina Silva tem consistência, não é um simples meteoro. Só um terremoto de elevados graus ajudaria a elegê-la, mas ela vai ter votos. E complicar a vida de algum concorrente. Inspira cuidados Há um pote de mágoas prestes a entornar na sucessão presidencial. Somente a reconhecida lábia do presidente Lula será capaz de evitar a explosão de desgosto do ex-ministro e deputado Ciro Gomes. Belo Monte : negócio estatal O leilão, marcado para hoje salvo impedimentos de última hora, da usina de Belo Monte, é coisa de governo : 1. Nos dois consórcios, há estatais com participação de 49%. 2. A Eletronorte está autorizada a entrar no grupo vencedor, como operadora da usina. 3. Os fundos de pensão das estatais também poderão compor os consórcios, posteriormente. 4. O BNDES pode financiar até 80% do projeto, com juros amigos, de 4% ao ano mais TJLP, com prazo de até 30 anos. 5. Haverá subsídios no IR, com normas válidas para a Sudam. O dono da conta A conta final vai cair nas costas dos cidadãos : será o tesouro nacional quem bancará todos os subsídios, a começar pela diferença entre os juros que as empresas pagarão e o que o governo paga ao mercado pelo dinheiro que encaminha ao BNDES. É um estilo novo de "privatização", outra "privatal" ao estilo inaugurado na compara a Brasil Telecom pela Oi. Leilão eleitoral A pressa do governo para realizar o leilão de Belo Monte, atropelando prazos e deixando dúvidas imensas sobre o real valor do projeto - o governo calcula em R$ 19 bilhões, as empresas em R$ 30 bilhões - e sobre a preservação ambiental na área, confirma que, antes de produzir energia, Lula espera que a hidrelétrica produza votos em outubro. E, neste aspecto, Belo Monte se torna mais relevante ainda uma vez que o Senado está criando problemas para aprovar logo um outro manancial de votos direcionado para a ministra Dilma : os projetos do pré-sal. Dedo oficial O governo, com o BNDES à frente, manobrou de todas as maneiras para que um outro consórcio surgisse na disputa de Belo Monte, depois da desistência da Camargo Correa e da Odebrecht. Na praça, diz-se que vem apenas pro forma, para dar foros de validade ao leilão. O que se verá hoje ainda. De todo modo, a movimentação do BNDES lembra outro episódio, muito cobrado pelo PT durante anos, e também protagonizado pelo banco estatal : a formação de um consórcio às pressas para tornar mais competitivo o leilão das subsidiárias de Telebrás. Foi quando nasceu a Telemar, hoje Oi, uma empresa agora quase para-estatal tal a quantidade de sócios estatais e financiadores estatais que ela tem. Foi quando também o economista Ricardo Sérgio foi flagrado num grampo ilegal dizendo que na negociação para formação desse consórcio havia se chegado ao "limite da irresponsabilidade". Outro negócio estatal Com o patrocínio do BNDES, a Oi habilitou-se a ser a operadora do Plano Nacional de Banda Larga, depois que as denúncias sobre negócios não muito santos envolvendo a Telebrás e a Eletronet tornaram difícil o plano de entregar à estatal em liquidação o comando do plano. A Oi pode ter sucesso na sua intenção. Mas está pedindo alto : quer subsídios, corte de impostos e financiamentos oficiais. Onipresença Não há grande negócio no Brasil no qual, direta ou indiretamente, o BNDES não esteja envolvido. Onde está Wally ? Depois de muita movimentação política no ramo da sucessão presidencial, rodando o Brasil inteiro e participando da festa de pré-lançamento da candidatura da ex-ministra Dilma, sem fazer nenhuma questão de ser discreto, o ex-ministro e hoje consultor de empresas José Dirceu desapareceu da linha de frente das ações eleitorais PT.
terça-feira, 13 de abril de 2010

Política & Economia NA REAL n° 96

Juros : política e economia no mundo real A próxima reunião do Copom acontecerá apenas nos dias 27 e 28 próximos, mas já está acesa a disputa entre os "políticos" do governo, na figura de Guido Mantega, e a dos "técnicos", na figura de Henrique Meirelles. Embora pareçam conformados, os "políticos" não consideram inevitável o aumento dos juros básicos, que o BC praticamente já anunciou, e o chamado mercado já aguarda. Deve vir algo como 0,75% de aumento da Selic na próxima reunião e até o final de ano a taxa deve chegar a 12,75% ou 13%. Estes patamares não agradam em nada os "políticos". As declarações de Mantega, de que o Brasil não passa no momento por um choque de demanda, e as análises do presidente do BNDES, Luciano Coutinho, em entrevista ao Estadão, de que o Brasil não vive um surto inflacionário, fazem parte deste cenário para angariar ajuda contra o BC do setor não-financeiro da economia. As pressões partidárias e Meirelles As pressões veladas da área partidária são ainda maiores. E saem do PT e aliados, do estafe de Dilma, e mais discretamente ainda do palácio do Planalto. Uma das estratégias - notas já começam a pulular na imprensa - é enfraquecer a autoridade de Meirelles, mostrando que ele perdeu credibilidade por conta de sua aventura política. O objetivo é isolar Meirelles, reduzindo a influência dele sobre os demais diretores do BC. A direção da instituição, com a saída do diretor Mário Mesquita, não tem mais nenhum alienígena, ou seja, é toda composta de funcionários públicos de carreira. Eles seriam mais susceptíveis aos apelos e desejos ministeriais e presidenciais. Este será um ponto a conferir. Se os adversários de um aumento mais pesado da Selic não conseguirem justificar-se com argumentos objetivos e convincentes, em vez de desacreditar Meirelles, desacreditam o BC e as promessas do governo de que não se deixará influenciar por injunções vindas do palanque. Não gostaram Muita gente na Esplanada dos Ministérios ficou profundamente infeliz com a decisão do Meirelles de abandonar prematuramente uma carreira política que ele nunca iniciou de fato. Discretamente, Meirelles foi incentivado a prosseguir, porém, na última hora, Lula não seguiu o script e deu a oportunidade a ele de recuar e ficar no BC. A disputa pela indicação do seu substituto estava acirrada e algumas áreas viam nisto a possibilidade de retomar o controle sobre o BC, perdido para Meirelles com sua interlocução direta com Lula. Outra disputa Nas rodas brasilienses, um dos nomes aventados para substituir Meirelles era o do presidente do BNDES, Luciano Coutinho. Dizia-se que era uma vantagem, pois já começaria a ser formada a equipe do BC no futuro governo Dilma. Coutinho não mordeu a casca de banana. E não foi simplesmente porque está muito bem onde está - o BNDES é hoje um dos órgãos mais influentes na política econômica de Lula. Mas porque tem outros planos mais elevados para 2011. Os mesmos de alguns daqueles que quiseram promovê-lo ao BC agora. Inflação é mesmo preocupação Os aumentos de preços do início deste ano foram fortemente influenciados pelos efeitos das chuvas sobre os produtos agrícolas. Portanto, não se tratava de inflação - que é o aumento contínuo dos preços -, mas de um aumento localizado dos preços. Todavia, os últimos dados de quase todos os indicadores de inflação demonstram que (i) o aumento de preços se espalhou por diversos setores econômicos e (ii) as expectativas sobre os aumentos de preços estão se deteriorando. Assim sendo, se é fato que não estamos em meio a um surto "superinflacionário", de outro lado é certo que há riscos contra a estabilidade de preços. A ação do BC é mais do que necessária. Terá de ser suficiente. A bolsa é o termômetro Após uma rodada de conversas desta coluna com investidores brasileiros e estrangeiros, podemos afirmar que já há um consenso de que as ações não devem apresentar um desempenho positivo e excepcional este ano. Muitos analistas falam em "seletividade" como a palavra da hora. A maioria absoluta acredita que o Ibovespa pode superar o patamar dos 73,5 mil pontos no curto prazo, mas que dificilmente este nível será mantido. Além disto, o Brasil já não é mais o queridinho dentre os emergentes. A Índia e (ainda) a China devem receber mais atenção dos investidores que o Brasil neste ano. Além disto, os EUA, caso confirmem as indicações de recuperação da demanda, terão muita demanda para o mercado acionário. A conferir. Radar NA REAL 31/3/10 TENDÊNCIA SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo Juros ¹ - Pré-fixados NA alta alta - Pós-Fixados NA alta alta Câmbio ² - EURO 1,3585 estável/queda estável/baixa - REAL 1,7579 estável/alta estável/baixa Mercado Acionário - Ibovespa 71.417,27 alta estável - S&P 500 1.194,37 alta alta - NASDAQ 2.454,05 alta alta (1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais). (2) Em relação ao dólar norte-americano NA - Não aplicável A coisa está ficando feia Demissões no Ibama, explicadas apenas em parte pelas questões envolvendo a usina de Belo Monte. Demissões aparentemente sem justificativas plausíveis no ministério da Cultura. O segundo escalão Federal está fervilhando. São os preparativos para a troca de poder, as forças se reposicionando para permanecerem onde estão ou então subirem de posto. A arrancada do PSDB Com um entusiasmo não muito próprio de um partido frio (cerebral ?) como o dos tucanos e com uma demonstração de unidade nunca antes vista entre eles, o tucanato deu a partida oficial para a sucessão presidencial melhor até do que seus dirigentes imaginavam. Surpreendeu até o governo, que sempre apostou no contrário : frieza na campanha e na divisão entre Aécio e Serra. Aécio surpreendeu pela vontade e pela contundência das críticas. Certamente o entorno de Dilma deverá rever seus planos. Estratégia oposicionista Ficou muito clara na festa para Serra sábado em Brasília a estratégia da oposição para se contrapor à estratégia de campanha de Lula, de esconder um pouco Dilma e concentrar as discussões na comparação entre o governo dele e suas realizações e o governo de FHC e seus feitos. Serra vai mostrar os planos de governo e do embate direto com Dilma. A discussão sobre o passado ficará por conta de Fernando Henrique, Aécio e outros líderes tucanos e dos aliados. O mote está no discurso de Aécio. O governador mineiro, aliás, nem demorou a começar a provocação. No Estadão de ontem apareceu dizendo que Dilma terá de explicar como se haverá com o PT ideológico e o PT dos aloprados. Aliados complicados A inesperada decisão do ex-ACM senador César Borges de troca uma aliança de seu PR na Bahia com o PT do governador Jaques Wagner por um acordo com o PMDB de Geddel Vieira Lima expõe outra dificuldade da formação dos palanques regionais : a coligação nas eleições proporcionais para a Câmara dos Deputados e para as Assembléias Legislativas. Wagner, em busca da reeleição, garantiu o apoio petista à candidatura de Borges ao Senado. O PT, com o justo medo de perder cadeiras de deputados estaduais e federais para o PR, partido do senador, se a aliança for total, vetou o acordo nas eleições proporcionais. Esta confusão aparece em outros lugares, inclusive na enrolada relação PT/PMDB em Minas. O partido de Lula já parece conformado com a ordem de dar a vaga de candidato a governador para o peemedebista Hélio Costa. Mas teme a eleição proporcional casada, principalmente porque o PMDB em Minas está muito mais espalhado pelos mais de 800 municípios do Estado do que o PT. Isto poderia roubar dos petistas vagas preciosas de deputados. Outra complicação em Minas Na terra de Aécio há outra pedra a pôr em risco a aliança governista por lá : o fato de o candidato tucano, Antônio Anastásia, disputar a eleição para o Palácio da Liberdade no cargo de governador. Com isso, ele não poderá ser candidato à reeleição. Já Hélio Costa, se eleito, poderá pleitear num novo mandato em 2014, o que pode significar, para o PT, ficar longe do poder em MG até 2018. Portanto, Anastásia pode ser uma solução para o futuro do PT mineiro do que o ex-ministro das Comunicações. Confusão à vista ? Do modo como está sendo atabalhoadamente o leilão da usina de Belo Monte é prenúncio de confusão na certa. Ainda mais se a disputa se ancorar na generosidade do BNDES e dos fundos de pensão das estatais. Os colonizadores e os colonizados Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, o aumento real acumulado na remuneração dos trabalhadores da administração pública e autarquias, entre 2003 e 2009, foi de 56,1%. Já o dos trabalhadores no setor privado foi menos da metade : 26,65%. Brasília é mesmo a metrópole de um país real colonizado. Mais um "não fato" político A política brasileira vive mais de "não-fatos" - ou factóides - do que de fatos reais. Mais um acaba de ser desmascarado. O vice-presidente José Alencar anunciou no fim de semana o que todo mundo já sabia : não será candidato a nada em outubro. Nunca foi de verdade. Entrou de mentirinha na eleição mineira, a pedido de Lula, ora como candidato ao Senado, ora como candidato a governador, para fazer confusão no mundo tucano e assustar Aécio Neves. Como a confusão se instalou mais na seara governista e Aécio não perdeu um segundo de sono com a história, tratou de, com ensinava o filósofo do futebol Neném Prancha, de "arrecuá os arfes, para evitar a catrastre (catástrofe governista em MG)". Esqueçam Trecho de uma matéria de ontem, na Folha de S.Paulo, com uma entrevista da ex-ministra Dilma : "Questionada se a reforma tributária será um dos temas de sua campanha, ela diz que sim, mas acrescenta que os 'empresários sabem da dificuldade de se fazer reforma tributária no Brasil por conta da questão federativa'. Quanto à desoneração da folha de pagamentos, ela, a princípio, diz que não preferia comentá-la. Diante da insistência, afirma que 'é fundamental, temos de caminhar para isso, temos de buscar a desoneração, é uma distorção que temos. Agora não é coisa simples de fazer. É o bom senso'". Traduções : 1. Sem o prestígio de Lula, se eleita Dilma não vai comprar briga deste tamanho no Congresso. 2. Não quer falar sobre desoneração da folha salarial porque este assunto divide os sindicatos de trabalhadores e ela não quer se indispor com este eleitorado. O fato e o marketing Há meses, quando de um dos surtos de entusiasmo oficial com o trem bala RJ/SP, dissemos aqui, com base em informações de especialistas do setor de construção civil pesada, que no máximo a obra atingira o trecho Campinas-São José dos Campos, o único tido como economicamente viável, sem precisar de subsídios governamentais. A ladainha do trem bala total, no entanto, prosseguiu. Ficou como uma estrela do PAC 1, com promessas de um leilão "amanhã". Ressurgiu ampliado há três semanas no PAC 2, ampliado para BH, Uberaba e Curitiba. De R$ 30 bilhões, saltou para mais de R$ 46 bilhões. A realidade, porém, é outra. Como disse Dilma na mesma entrevista da Folha citada acima, numa primeira etapa o trem vai apenas até São José dos Campos. O Rio fica para depois, um depois que não se sabe quando. Os cariocas de Sérgio Cabral não vão gostar. Ficha limpa Se a pressão externa se tornar insuportável, a Câmara pode aprontar para o Senado : ela aprova a proposta de barrar os "fichas-sujas" nas eleições e deixa para os senadores o desgaste de condenar a sugestão ou fazer corpo mole para que ela não vigore nas eleições deste ano. A tragédia do Rio As inundações e soterramentos na Cidade Maravilhosa e em todo o Estado são o retrato mais fiel dos efeitos da "realpolitik" sobre a administração pública. Sabe-se que a gestão urbana no Brasil é uma das faces de maior descaso, corrupção e falta de investimentos do setor público. Os acontecimentos do RJ não são apenas a consequência de tudo isto. É a alvorada de problemas crescentes no setor urbano. Em tempo Haverá efeito dos últimos acontecimentos no Rio de Janeiro sobre as pesquisas eleitorais. Pode não ser pequeno e aqueles que estão sem querer aparecer pelos lados da população carioca poderão se surpreender. Já há ensaios estatísticos correndo na praça que mostram que há mudanças relevantes na opinião pública do Rio. Cúpula atômica A presença de Lula na cúpula sobre segurança atômica promovida pelo governo Obama não deve apenas respirar constrangimentos ao país quando o assunto for o Irã. Há possibilidade concreta de mudanças na posição chinesa e, neste caso, o país poderá ficar isolado no que se refere ao tema.