Reforma tributária 21: O setor de transporte
Analise do artigo à sistemática de tributação do setor de transportes.
sexta-feira, 9 de maio de 2025
Atualizado às 09:16
O setor de transporte é muito importante em qualquer lugar, ainda mais em um país de dimensões continentais como o Brasil. Na reforma tributária, não poderia ser diferente, e o legislador regulamentou os serviços de transporte de passageiros e de cargas.
1. Os custos de logística
Os custos de logística chegam a representar 20% dos custos de produção. As justificativas para termos custos tão altos são variadas, especialmente pela ausência de ferrovias que possam viabilizar valores menores. Há também a questão da cabotagem, pois, no Brasil, os transportes entre portos somente poderiam ser realizados por navios brasileiros, impedindo que embarcações estrangeiras executassem essa operação.
Recentemente, contudo, essa restrição foi flexibilizada com a criação do Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar), sancionado em 2022. A lei 14.301/22 permite o afretamento de navios estrangeiros em situações específicas, incentivando a navegação entre portos nacionais.
As empresas brasileiras de navegação podem afretar navios estrangeiros, por tempo ou por viagem, mediante autorização prévia, especialmente quando não houver navios brasileiros do tipo e porte adequados disponíveis. Esse afretamento está sujeito a regras e condições, como a obrigatoriedade de haver brasileiros nos principais cargos (comandante, mestre de cabotagem, chefe de máquinas e condutor de máquinas) das embarcações estrangeiras afretadas, conforme a lei 14.301/22.
O objetivo do BR do Mar é aumentar a oferta e melhorar a qualidade do transporte por cabotagem, promovendo a integração entre diferentes modais de transporte e reduzindo a dependência do transporte rodoviário.
2. O tratamento da LC 214/25
A prestação de serviço de transporte de passageiros está incluída entre as atividades sob o manto da incidência do art. 4°, da LC 214/25. Mas há uma grande distinção sobre a tributação do transporte de cargas do transporte de passageiros quanto ao lugar da operação e o fato gerador.
O fato gerador ocorre no transporte de cargas IBS/CBS:
Art. 10. Considera-se ocorrido o fato gerador do IBS e da CBS no momento do fornecimento nas operações com bens ou com serviços, ainda que de execução continuada ou fracionada.
§ 1º Para fins do disposto no caput deste artigo, considera-se ocorrido o fornecimento no momento:
I - do início do transporte, na prestação de serviço de transporte iniciado no País;
II - do término do transporte, na prestação de serviço de transporte de carga quando iniciado no exterior;
É importante tal distinção porque a partir da fixação da ocorrência do fato gerador teremos a identificação do Estado e município que se beneficiará da arrecadação. No de cargas, é devido ao Estado e município de destino. Para o transporte de passageiros é devido ao Estado e município de embarque.
Assim, fica claro na redação dada pelo art. 11 que trata do local da operação: no serviço de transporte de passageiros, o local de início do transporte; e no serviço de transporte de carga, o local da entrega ou disponibilização do bem ao destinatário constante no documento fiscal.
3. Desoneração do transporte autônomo de cargas
Com isso, o legislador, por meio da LC 214/25, a princípio desonerou o setor de transporte de cargas, como se observa no art. 26, ao prever que o transportador autônomo de carga não será contribuinte do IBS e da CBS.
Mais adiante, no mesmo artigo, o § 1º estabelece que esses profissionais poderão optar pelo regime regular do IBS e da CBS. Mas por que o legislador fez isso?
Na prática, o que pretende o adquirente da mercadoria é poder se creditar do tributo recolhido pelo profissional autônomo, consagrando o princípio da não cumulatividade plena, que é um dos pilares da nova legislação.
Mesmo havendo um posicionamento legislativo favorável à atividade do transportador autônomo e à sua desoneração, é possível que o tomador do serviço exija o lançamento para fins de creditamento. O que na prática será feito, o que torna a previsão com alcance relativamente restrito. O transporte autônomo é desonerado, mas o transporte convencional realizado por transportadoras.
4. Transporte de passageiros
De acordo com o art. 284, ficam sujeitos a regime específico de incidência do IBS e da CBS os serviços de transporte coletivo de passageiros:
I - rodoviário intermunicipal e interestadual;
II - ferroviário e hidroviário intermunicipal e interestadual;
III - ferroviário e hidroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano; e
IV - aéreo regional.
O transporte coletivo de passageiros é o serviço de deslocamento de pessoas acessível a toda a população mediante cobrança individualizada. As modalidades intermunicipal, interestadual e regional, nas formas ferroviária, rodoviária e aérea, ficam sujeitas ao pagamento do IBS e da CBS.
Entretanto, no transporte aéreo regional - entendido como a aviação doméstica com voos de origem ou destino na Amazônia Legal ou em capitais regionais, centros sub-regionais, centros de zona ou centros locais, conforme definido pelo IBGE e regulamentado pelo Ministério de Portos e Aeroportos -, as alíquotas são tratadas de forma diferenciada.
Conforme o art. 284, as alíquotas do IBS e da CBS relativas aos serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário, ferroviário e hidroviário intermunicipais e interestaduais ficam reduzidas em 40%.
O art. 287 estende essa redução às alíquotas do IBS e da CBS incidentes sobre o fornecimento do serviço de transporte aéreo regional, coletivo de passageiros ou de carga.
Em ambos os casos, é permitida a apropriação e a utilização de créditos de IBS e de CBS pelos adquirentes dos serviços, observando-se o disposto nos arts. 47 a 56 da LC 214/25.
5. Isenção, alíquota zero e desconto de 100% nos serviços de transporte urbano
De acordo com o art. 285, os serviços de transporte público coletivo de passageiros, ferroviário e hidroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano terão suas alíquotas do IBS e da CBS reduzidas em 100%.
Nesse caso, não há possibilidade de as concessionárias e permissionárias se creditarem dos tributos recolhidos na cadeia de suprimentos.
O art. 157 trata da isenção para o transporte urbano e metroviário, usando expressamente o termo. A diferença entre isenção e alíquota zero e desconto de 100% é teórica e dogmática: na isenção, há fato gerador, mas não há lançamento do tributo. Na alíquota zero ou no desconto de 100% há o lançamento, mas, na prática, também não haverá possibilidade de creditamento de IBS/CBS.
Em ambos os casos, o descumprimento das disposições legais pode ensejar a aplicação de penalidades, como multas.
6. Razões econômicas e sociais
O transporte coletivo é de imensa importância para os cidadãos, empresas e para a economia local. Até a reforma, havia a cobrança de ISS sobre o serviço de transporte municipal. O objetivo do legislador, ao desonerar esse serviço, é claro.
Nesse contexto, a concessionária ou permissionária passa a ser considerada o consumidor final, não podendo realizar os abatimentos decorrentes do princípio da não cumulatividade.
Na precificação dos serviços, em licitações para concessão ou permissão, deve ficar claro que a vencedora será responsável pela totalidade dos tributos incidentes.