Averbação pré-executória da CDA nos municípios
Averbação pré-executória da CDA. Mecanismo de eficiência e efetividade na cobrança dos créditos tributários. Importância das procuradorias municipais nas averbações nos registros de bens.
sexta-feira, 9 de maio de 2025
Atualizado às 09:21
A gestão da dívida ativa constitui um dos grandes desafios enfrentados pelos municípios, impactando diretamente a eficiência da arrecadação e na recuperação dos créditos fiscais.
Para enfrentar esses desafios, a busca por mecanismos extrajudiciais e pré-processuais que confiram maior celeridade e efetividade à recuperação de créditos tributários e não tributários vem ganhando espaço quando se fala em eficiência administrativa.
Um dos exemplos desses mecanismos, é a averbação pré-executória da CDA - Certidão de Dívida Ativa, instrumento já utilizado pela PGFN - Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e pela PGESP - Procuradoria Geral do Estado de São Paulo e que emerge para os municípios como uma importante ferramenta, especialmente pelo potencial emprego no âmbito municipal pelas procuradorias municipais, notadamente através de sistemas como Renavam e da plataforma do SERP - Sistema Eletrônico de Registro Públicos.
A averbação pré-executória da CDA consiste em um ato administrativo que confere publicidade à existência de um débito inscrito em dívida ativa, mediante a anotação dessa informação nos registros de bens e direitos do devedor, antes mesmo do ajuizamento da execução fiscal e independentemente do ajuizamento desta. Ou seja, anota-se a restrição (a existência de uma dívida municipal vencida e não paga, como o IPTU, ISS, ITBI ou mesmo uma Taxa) no registro do bem móvel ou no registro do bem imóvel da situação do bem.
Trata-se de medida que busca proteger terceiros de boa-fé, alertando-os sobre a existência do crédito fiscal e, consequentemente, desestimulando a ocorrência de alienações ou onerações fraudulentas de bens que poderiam frustrar a futura cobrança.
Embora a anotação não implique a indisponibilidade dos bens (ADIns 5.881, 5.886,5.890, 5.925, 5.931 e 5.932), o que somente se admite com amparo em decisão judicial, a publicidade conferida pela averbação atua como um mecanismo de prevenção à fraude contra a Fazenda Pública, em consonância com a presunção legal de fraude estabelecida pelo art. 185 do CTN com redação dada pela LC 118/05.
Destaca-se nesse sentido o entendimento que prevaleceu nos julgamentos das ADIns acima apresentadas, assim ementado:
[...] é medida proporcional que visa à proteção da boa-fé de terceiros adquirentes de bens do devedor, ao dar publicidade à existência da dívida. Além disso, concretiza o comando contido no art. 185, caput, do Código Tributário Nacional, que presume "fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa". Tal presunção legal é absoluta, podendo ser afastada apenas "na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. (ADIs 5886, 5886, 5890, 5925, 5931 e 5932, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) para o acórdão: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 09-12-2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-061DIVULG 30-03-2021 PUBLIC 05-04-2021). (grifamos).
O fundamento legal para a averbação pré-executória da CDA, no âmbito federal, encontra-se no art. 20-B, § 3º, inciso II, da lei 10.522/02, com a redação dada pela lei 13.306/18, comando normativo que autoriza a Fazenda Pública a averbar, inclusive por meio eletrônico, a certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora.
Referido dispositivo previa na redação original do inciso II a indisponibilidade dos bens, contudo, essa parte final foi declarada inconstitucional pelo STF, mantendo-se, contudo, a constitucionalidade da averbação.
A constitucionalidade da averbação pré-executória foi expressamente reconhecida pelo STF no julgamento das ADIn - Ações Diretas de Inconstitucionalidade 5.881, 5.886, 5.890, 5.925, 5.931 e 5.932. A Corte Suprema entendeu que a simples averbação da CDA não viola o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a reserva de jurisdição ou o direito de propriedade e considerou-a uma medida proporcional que protege a boa-fé de terceiros adquirentes de bens do devedor, ao dar publicidade à existência da dívida, e que concretiza o comando do art. 185 do CTN.
Ao propósito, destaca-se trecho da ADIn 5.886, abaixo descrito:
"(...) 3. Constitucionalidade da averbação da certidão de dívida ativa em registros de bens e direitos em fase anterior ao ajuizamento da execução fiscal. A mera averbação da CDA não viola o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, a reserva de jurisdição e o direito de propriedade. É medida proporcional que visa à proteção da boa-fé de terceiros adquirentes de bens do devedor, ao dar publicidade à existência da dívida. Além disso, concretiza o comando contido no art. 185, caput, do Código Tributário Nacional, que presume "fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa". Tal presunção legal é absoluta, podendo ser afastada apenas "na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita". (...)" (ADI 5886. Órgão julgador: Tribunal Pleno. Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO. Redator(a) do acórdão: Min. ROBERTO BARROSO. Julgamento: 09/12/2020. Publicação: 05/04/2021).
No âmbito do Estado de São Paulo, a matéria está prevista formalmente na lei Estadual no 17.843/23, cujo art. 27 dispõe que a Procuradoria Geral do Estado poderá averbar, inclusive por meio eletrônico, a certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos, bem como comunicar a inscrição em dívida ativa aos serviços de proteção ao crédito.
No âmbito municipal, a importância da averbação pré-executória para a cobrança da dívida reside na sua capacidade de conferir maior efetividade da cobrança e da recuperação de créditos, muitas vezes de pequeno valor, para os quais o ajuizamento da execução fiscal pode se revelar antieconômico e ineficiente, questões discutidas no âmbito do Tema 1.184 da repercussão geral do STF e da resolução CNJ 547/24.
Situação também favorável que se projeta com a instrumentalização da averbação pré-executória é a possibilidade de refletir em ponto positivo na aferição do indicador fiscal pertinente à composição do IEG-M - Índice de Efetividade da Gestão Municipal, calculado pelo TCE/SP na instrução das prestações de contas anuais, conforme destacou o próprio Tribunal de Contas do Estado de São Paulo no manual de boas práticas volume I, 2024, p. 27.
Ao permitir que as procuradorias municipais deem publicidade à dívida antes da judicialização, a averbação pré-executória pode estimular o devedor a buscar a regularização do débito por meios administrativos, como o pagamento ou o parcelamento, evitando os custos e a morosidade do Judiciário.
Além disso, a medida protege o patrimônio público ao dificultar a dilapidação de bens pelo devedor, garantindo que, caso a execução fiscal se torne necessária, haja bens passíveis de constrição.
A PGFN - Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional já utiliza desde 2018 a averbação pré-executória de forma integrada com sistemas de registro de bens, o que pode ser verificado na portaria PGFN 33, de 8/2/18, onde através do sistema RENAVAM, inclui-se a "restrição PGFN" no RENAVAM do veículo com o objetivo de publicizar a terceiros de boa-fé que o proprietário possui débitos inscritos em dívida ativa da União. Trata-se de procedimento realizado de forma eletrônica e ocorre a partir da integração do sistema da PGFN com o sistema do RENAVAM, visando da publicidade, promover a cobrança e a recuperação dos créditos através da restrição e evitar alienações fraudulentas.
Importante sobrelevar que o potencial uso da averbação pré-executória pelos municípios para impor restrições não se limita aos bens móveis, mas também alcança os bens imóveis, o que poderá ser feito através do SERP JUD - Sistema Eletrônico dos Registros Públicos do Brasil, destinado ao Poder Judiciário e aos Órgãos da Administração Pública, funcionalidade que poderá representar um avanço significativo na gestão da dívida ativa municipal.
Sobre esse sistema, o ONR - operador Nacional do Sistema Eletrônico dos Registros Públicos vem desenvolvendo uma nova funcionalidade na Plataforma SERP, acessível em https://serp.registros.org.br, especificamente para as Procuradorias da Fazenda (nacional, estadual e municipal), denominada "averbação pré-executória". Por meio dessa ferramenta, as procuradorias municipais poderão encaminhar pedidos de averbação de Certidões de Dívida Ativa em bens imóveis, bem como solicitar o cancelamento dessas averbações.
Denota-se que o papel das procuradorias municipais na utilização dessa ferramenta disponibilizada na Plataforma SERP é central. São os procuradores municipais os responsáveis por identificar os créditos passíveis de averbação, selecionar as CDAs correspondentes, indicar os imóveis a serem averbados e gerenciar os pedidos de averbação e cancelamento diretamente na plataforma eletrônica.
A funcionalidade em desenvolvimento pelo ONR permitirá que os procuradores preencham formulários com os dados do devedor e da CDA, indiquem a matrícula do imóvel, e enviem o pedido eletronicamente ao registro de imóveis competente. Além disso, haverá, inclusive, a possibilidade de consulta a CDAs protestadas via integração com sistemas como o CENPROT/SC, facilitando a vinculação pelo CPF/CNPJ do devedor.
Essa atuação direta e eletrônica das procuradorias municipais no SERP proporcionará maior agilidade e eficiência no processo de averbação, reduzindo a necessidade de intervenção judicial prévia para a publicidade da dívida sobre bens imóveis.
A implementação e o uso efetivo da averbação pré-executória pelos municípios via SERP JUD estão em consonância com as disposições trazidas pelo Tema 1.184 do STF e pela resolução CNJ 547/24. O Tema 1.184, ao legitimar a extinção de execuções fiscais de baixo valor por ausência de interesse de agir e condicionar o ajuizamento à prévia adoção de medidas extrajudiciais, como o protesto do título e a tentativa de conciliação ou solução administrativa, reforça a necessidade de os entes públicos buscarem alternativas à judicialização.
A averbação pré-executória, ao conferir publicidade à dívida e desestimular a fraude, atua como uma importante medida pré-processual que pode aumentar a taxa de cobrança e recuperação de créditos sem a necessidade de ajuizar a execução fiscal, ou, caso esta seja inevitável, garantir a existência de bens para a satisfação do crédito.
A resolução CNJ 547/24, por sua vez, ao regulamentar o Tema 1.184 e estabelecer critérios para a extinção de execuções de baixo valor, também incentiva a adoção de medidas extrajudiciais e a racionalização da cobrança. A averbação da CDA em registros de bens e direitos é expressamente mencionada no art. 3º, parágrafo único, inciso II, da resolução como uma das hipóteses que podem dispensar a exigência do protesto prévio para o ajuizamento da execução fiscal, demonstrando o reconhecimento pelo CNJ da relevância dessa ferramenta na estratégia de cobrança eficiente.
Pautado nessas considerações introdutórias, possível concluir que a averbação pré-executória da CDA, poderá representar um instrumento importante para as procuradorias municipais na busca pela eficiência na cobrança e na recuperação da dívida ativa.
A disponibilização dessa funcionalidade no sistema RENAVAM e na Plataforma SERP JUD permitirá que os municípios, por meio de suas procuradorias, utilizem essas ferramentas de forma ágil e eletrônica para averbar débitos em bens móveis e imóveis, conferindo publicidade à dívida, prevenindo fraudes e, potencialmente, aumentando a recuperação de créditos sem a necessidade de recorrer à custosa e morosa via judicial.
A efetiva utilização dessa ferramenta pelas procuradorias municipais, em alinhamento com as diretrizes do Tema 1.184 do STF e da resolução CNJ 547/24, é fundamental para a racionalização das execuções fiscais, a melhoria da gestão da dívida ativa e a contribuição para a eficiência do sistema de justiça como um todo.
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1 BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 out. 1966. Seção 1, p. 1. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 30.abr.2025.
2 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 547, de 18 de setembro de 2018. Institui medidas de tratamento racional e eficiente na tramitação das execuções fiscais pendentes no Poder Judiciário. Diário da Justiça, Brasília, DF, 22/02/2024. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/5455. Acesso em: 30.abr.2025.
3 BRASIL. Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002. Dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 jul. 2002. Seção 1, p. 1. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10522.htm. Acesso em: 30.abr.2025.
4 BRASIL. Portaria PGFN nº 33, de 8 de fevereiro de 2018. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 9 fev. 2018. Seção 1, p. 20. Disponível em: https://normasinternet2.receita.fazenda.gov.br/#/consulta/externa/90028/visao/multivigente. Acesso em: 30. abr.2025.
5 BRASIL. Sistema Eletrônico dos Registros Públicos do Brasil (SERP - JUD). Sistema destinado ao Poder Judiciário e aos Órgãos da Administração Pública. Disponível em: https://serp.registros.org.br/. Acesso em: 30 abr. 2025.
6 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 5886. Relator: Ministro Marco Aurélio . Julgamento: 09/12/2020. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5344151. Acesso em: 30.abr.2025.
7 Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP). 2024. Racionalização na Cobrança de Dívida Ativa: Instrumentos para a Recuperação Extrajudicial dos Créditos, Volume I. São Paulo: TCESP.