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Benefícios das alterações da NR-1 antes da sua entrada em vigor

Sob as perspectivas jurídicas e de recursos humanos, destacam-se os benefícios da adoção da nova redação da NR-1 desde já para o meio ambiente laboral das empresas, além da esquiva das penalidades.

segunda-feira, 9 de junho de 2025

Atualizado às 15:09

1. Introdução

Neste dia 26 de maio de 2025 estava prevista a entrada em vigor das alterações da NR-1, aprovadas pela portaria MTE 1.319, de 27 de agosto de 2024, dentre as quais estão as inclusões expressas da necessidade de levantamento, avaliação, mitigação e eliminação dos riscos psicossociais no ambiente de trabalho. No entanto, em razão da portaria MTE 765, de 15 de maio de 2025, o início da vigência foi prorrogado para 25 de maio de 2026.

Desde a aprovação da portaria, as alterações foram motivo de grande preocupação entre empregadores, em razão das penalidades que a não aplicação das disposições pode resultar. O que não ficou claro, porém, foi que, apesar da inexistência de menção expressa, na atual redação da NR-1 os empregadores devem levantar todos os riscos existentes no ambiente de trabalho, de modo que os fatores psicossociais já deveriam fazer parte dos estudos e dos planos de ação de gerenciamento de riscos.

O presente artigo, portanto, busca esclarecer, a partir de uma análise conjunta das perspectivas jurídica e de recursos humanos, quais são as alterações da NR-1 que entrarão em vigor a partir de 25 de maio de 2026, de que forma os empregadores podem se adequar a elas e, principalmente, quais os benefícios decorrentes da implementação de medidas de gerenciamento dos riscos psicossociais para todas as partes da relação de trabalho, os quais superam, em muito, os valores investidos.

2. Impactos da saúde mental no trabalho em dados

Após a pandemia de covid-19, a preocupação da população mundial com o bem-estar físico e mental se intensificou, com o aumento na busca pela melhoria na qualidade de vida de um modo geral, inclusive no trabalho. Em outubro de 2023, um estudo global da Wellhub com aproximadamente 5 mil colaboradores nomeado de "Panorama do Bem-Estar Corporativo 2024"1 mostrou que "96% afirmaram que levarão em conta apenas empresas que priorizam bem-estar no próximo emprego", "93% consideram o bem-estar tão importante quanto o salário" e que "87% sairiam de uma empresa que não prioriza o bem-estar".

Esses dados refletem a importância da priorização do cuidado com a saúde mental, não somente no âmbito pessoal, como também nas relações de trabalho, em que o zelo deve estar relacionado à forma com que o ambiente laboral é organizado, à jornada de trabalho, distribuição de demandas, comunicação entre líderes e equipe, compliance, existência de um canal de denúncias, entre outras. No Brasil, os números de benefícios previdenciários associados à saúde mental concedidos anualmente são alarmantes e demonstram a necessidade de atenção dos empregadores para os riscos psicossociais existentes no ambiente laboral.

A plataforma "Smartlab" - iniciativa conjunta do MPT e da OIT Brasil - traz uma seção específica de afastamentos por saúde mental a partir de dados coletados pelo Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho2. Aponta-se que de 2023 para 2024, o número de concessões de benefícios previdenciários associados a fatores psicossociais quase dobrou, totalizando 471.649 somente no último ano. Desses, 9.827 foram auxílio-doença acidentário, decorrentes diretamente do trabalho, sendo bancos múltiplos (20%), administração pública em geral (11,3%) e atividades de atendimento hospitalar (10,2%) os setores econômicos mais afetados.

Os dados estimam que, apenas em 2024, aproximadamente 1,4 milhões de dias de vida saudável e de atividades produtivas por problemas de saúde mental foram perdidos em razão de afastamentos de natureza acidentária, e 44,4 milhões por afastamentos de natureza comum. No acumulado desde 2012 o número chega a 644,7 milhões de dias perdidos. Essa métrica é utilizada tanto para medir os prejuízos de produtividade para a economia formal quanto a quantidade total de dias em que a população afastada viveu com transtornos mentais.

Na Justiça do Trabalho, as estatísticas fornecidas pelo CNJ no "Justiça em Números"3 também são alarmantes. Só em 2024 foram 46.131 novos processos contendo o objeto de assédio moral, 3.013 de assédio sexual, 23.122 de dano moral por doença ocupacional, 115.758 de horas extras e 122.435 de supressão de intervalo intrajornada.

3. Alterações da NR-1 e penalidades por descumprimentos

Diante da inclusão expressa dos riscos psicossociais na NR-1, as empresas deverão realizar o levantamento dos potenciais problemas envolvendo saúde mental no ambiente de trabalho, bem como elaborar planos de ação específicos para eliminá-los ou mitigá-los. Isso deve ser feito a partir do PGR - Programa de Gerenciamento de Riscos da empresa ou, em caso de dispensa legal, na AEP - Avaliação Ergonômica Preliminar ou AET - Análise Ergonômica do Trabalho.

Os empregadores devem incluir os fatores psicossociais ao considerarem as condições de trabalho quando da elaboração do gerenciamento de riscos nos termos da NR-17. Isso porque esta NR, que dispõe sobre ergonomia, determina como devem se dar as condições de conforto no ambiente laboral, o que está diretamente ligado a fatores de risco psicossociais, muitas vezes decorrentes de problemas na organização e na gestão do trabalho.

Após elaborados os documentos de levantamento de riscos e o plano de ação, os empregadores implementam e avaliam a necessidade de modificações, conforme os resultados práticos na redução de acidentes e doenças ocupacionais, e o cumprimento dos planos de ação é fiscalizado pela SIT - Secretaria de Inspeção do Trabalho do MTE.

Apesar da NR-1 não delimitar os responsáveis por elaborar os documentos, o que em geral é feito pelos empregadores, é de suma importância que o profissional tenha conhecimento técnico condizente com a complexidade dos riscos avaliados, conforme item 3 da Orientação Técnica SIT 3 de 2023.

Caso constatada alguma irregularidade relacionada à NR-1, mais especificamente em relação ao PGR e à sua aplicação, os empregadores ficam sujeitos à multa prevista no Anexo I da NR-28. Além disso, podem sofrer condenações em ações civis públicas para reparar os danos coletivos que a não ou a má aplicação da norma ocasionaram à saúde mental dos trabalhadores, ou em ações individuais, um significativo passivo para as empresas, que se intensificam ainda mais quando os problemas psicossociais decorrem diretamente do trabalho.

4. A importância do investimento em saúde mental e seu retorno em números

Frederick Herzberg, psicólogo e teórico da administração, desenvolveu a teoria dos dois fatores, segundo a qual o ambiente de trabalho é influenciado por dois tipos distintos de fatores: os higiênicos e os motivacionais. Os fatores higiênicos - como as condições de trabalho e a supervisão - são fundamentais para prevenir a insatisfação, mas, isoladamente, não são capazes de promover a satisfação. Por outro lado, os fatores motivacionais - como o reconhecimento e as oportunidades de crescimento - são determinantes para estimular a satisfação e o engajamento dos colaboradores.

A NR-1 pode ser vista como uma ferramenta para gerenciar fatores higiênicos, enquanto a implementação de programas de bem-estar psicológico está englobada nos fatores motivacionais, promovendo, em conjunto, um ambiente de trabalho mais satisfatório e produtivo.

Investir em saúde mental no ambiente de trabalho não é apenas uma responsabilidade ética, mas também uma estratégia eficiente do ponto de vista econômico. Estudos demonstram que transtornos mentais, como depressão e ansiedade, são responsáveis por elevados índices de presenteísmo, situação em que o trabalhador está fisicamente presente, mas não desempenha suas funções de forma eficaz4, resultando em perdas significativas de produtividade para as empresas.

Além disso, a OMS - Organização Mundial da Saúde estimou que em 2020 a depressão seria a doença mais incapacitante do mundo, refletindo a urgência de ações preventivas e corretivas no ambiente de trabalho. Programas de apoio psicológico, treinamentos de líderes para identificar nos colaboradores sinais de sofrimento psíquico e a promoção de um ambiente de trabalho seguro e inclusivo são medidas eficazes para mitigar esses riscos.

De acordo com o relatório anual State of the Global Workspace5, divulgado pela Gallup em 2024, apenas 21% dos colaboradores estão engajados em suas atividades de rotina enquanto 59% estão apenas cumprindo tabela. Segundo a pesquisa, essa queda no engajamento dos profissionais resulta em uma perda estimada em 438 bilhões de dólares para a economia mundial. O mesmo relatório revela o impacto positivo do gerenciamento de riscos psicossociais e investimento em clima organizacional: poderia haver um crescimento de até 9,6 trilhões de dólares na economia global - algo que representa quase 10% do PIB Mundial.

Este retorno financeiro pode ser observado também em um estudo de 2021, onde a BrightPlan identificou que 81% dos empregadores que implementaram programas de controle de riscos psicossociais e iniciativas de bem-estar perceberam um ROI positivo6. Isso se deve, principalmente, a dois fatores cruciais: a diminuição de gastos e afastamentos médicos e o aumento de até 23% na produtividade e comprometimento das equipes, comparado com colaboradores que não têm acesso a estes programas.

Ainda sobre este tema, um estudo realizado pela PwC em parceria com a Beyondblue analisou o ROI - retorno sobre investimento de ações para promover ambientes de trabalho mentalmente saudáveis. Os resultados indicaram que, em média, para cada dólar investido em ações eficazes, há um retorno de 2,30 dólares em benefícios para a organização, principalmente na forma de aumento da produtividade, redução do absenteísmo e presenteísmo, e menor número de reclamações trabalhistas. Além disso, a implementação de múltiplas ações direcionadas tende a gerar um ROI ainda maior, especialmente em organizações de menor porte, onde a participação dos funcionários é mais direta e efetiva7.

Em contrapartida, segundo a consultoria organizacional Korn Ferry, substituir um funcionário afastado por questões de saúde mental pode custar entre 120% e 200% do seu salário. Estes cálculos envolvem pagamento de verbas rescisórias, além de todo o processo de contratação de um substituto; recolhimento integral de FGTS do funcionário afastado, despesas com processo seletivo (anúncio de vagas, horas de trabalho de recrutadores, consultorias especializadas para cargos de liderança), treinamentos, salário e benefícios do novo contratado.

Quando se trata de afastamentos por doenças relacionadas ao trabalho, custos com ações trabalhistas posteriores ao desligamento do empregado também devem ser considerados, conforme se depreende dos números levantados anteriormente com dados da Justiça do Trabalho.

5. O clima organizacional como ferramenta de bem-estar: Como as empresas podem aplicar a NR-1?

As atualizações da NR-1 trazem consigo algumas questões que líderes mais atentos já debatem há algum tempo, como a relação direta entre o clima organizacional e a melhora no rendimento e resultado das equipes.

O Clima Organizacional é a percepção coletiva e prevalente dos colaboradores sobre o ambiente, a cultura e a atmosfera da empresa em que trabalham. Está diretamente relacionado a fatores como comunicação, liderança, reconhecimento e suporte. Um clima organizacional positivo, apesar de não ser algo palpável, está associado a maior satisfação no trabalho, redução de estresse e aumento da produtividade.

Estudos demonstram que empresas com clima organizacional favorável apresentam aumento significativo na produtividade, além de redução no turnover (rotatividade) e nos custos relacionados à substituição de funcionários8. Investir no desenvolvimento do clima organizacional é, portanto, uma estratégia eficaz e essencial para promover a saúde mental no trabalho e alcançar melhores resultados organizacionais.

Na prática, algumas medidas podem ser aplicadas para melhorar o clima organizacional: comunicação aberta e transparente, com a implantação de canais efetivos de comunicação interna; realização de reuniões regulares entre líderes e equipes para o alinhamento de expectativas com feedbacks verticais e horizontais; liderança humanizada e engajadora com investimento em treinamentos com foco em inteligência emocional e empatia; promoção da qualidade de vida no trabalho, com o oferecimento de programas de apoio à saúde mental; reconhecimento e valorização dos colaboradores; e gestão participativa, com a inclusão dos colaboradores em decisões e programas corporativos.

Além disso, é essencial que os empregadores invistam em desenvolvimento e capacitação contínua dos trabalhadores, com o oferecimento de treinamentos e cursos periódicos, workshops e palestras; além de um plano de carreira estruturado, a fim de demonstrar as possiblidades de crescimento profissional. Quanto ao ambiente físico, os empregadores devem garantir condições ergonômicas, de iluminação, de ventilação e de conforto adequadas, e investir e capacitar os colaboradores em tecnologias e ferramentas que facilitem ou reduzam retrabalho ou estresse.

Por fim, é importante definir os valores e as diretrizes éticas da empresa, para que os colaboradores possam se identificar e alinhar propósitos, promover um ambiente de trabalho diverso e inclusivo, com o estímulo ao respeito às diversidades, ações afirmativas, criação de políticas inclusivas para garantir equidade no ambiente de trabalho, celebração de datas que simbolizem representatividade, entre outros.

6. Conclusão

Embora as alterações da NR-1 entrem em vigor apenas em 25 de maio de 2026, recomenda-se sua adoção antecipada, pois os benefícios trazidos por suas adaptações podem superar em muito os custos de sua implementação.

A aplicação das medidas pode promover maior bem-estar, produtividade e retenção de talentos, além de reduzir despesas com rotatividade, penalidades administrativas e passivos judiciais, configurando um investimento estratégico para as organizações.

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1 assets-cdn.wellhub.com

2 Smartlab - Retrato de Localidade - Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho

3 Estatísticas do Poder Judiciário

4 https://hbr.org/2004/10/presenteeism-at-work-but-out-of-it

5 https://www.gallup.com/workplace/349484/state-of-the-global-workplace.aspx

6 https://www.brightplan.com/blog/four-critical-steps-to-promoting-employee-wellness-and-maximizing-engagement

7 https://www.pwc.com.au/publications/pdf/beyondblue-workplace-roi-may14.pdf

8 https://assets-cdn.wellhub.com

Lucas F. G. Bento

VIP Lucas F. G. Bento

Sócio das áreas de Societário e Mercado de Capitais do TN Advogados. Advogado e estudante de Finanças e Negócios pela USP, com passagens pela University of Illinois e University of Chicago, ambas nos EUA.

Marcela Reino Mori

Marcela Reino Mori

Advogada Associada da área de Remuneração Executiva e Relações de Trabalho do Thielmann Advogados. Graduada em Direito pela FDRP - USP. Pós-graduanda em LL.M. Direito do Trabalho Insper.

Juliana Issa Coraça

Juliana Issa Coraça

Head Head de Administração, Finanças e Recursos Humanos do Thielmann Advogados. Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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