O novo horizonte do mercado de seguros brasileiro
Nova lei e regras ESG transformam o setor de seguros em 2025, exigindo adaptação regulatória e foco em sustentabilidade.
quarta-feira, 11 de junho de 2025
Atualizado às 08:56
O ano de 2025 tem sido um período de significativas transformações para o mercado de seguros no Brasil. A entrada em vigor da nova lei de contrato de seguro - lei 15.040/24, promulgada no final de 2024 e com vigência a partir de dezembro deste ano, inaugura um novo marco jurídico e regulatório no país, exigindo que seguradoras, resseguradoras, corretoras e demais agentes do setor se adaptem a essa nova realidade.
Para além da promulgação da lei de contrato de seguro, que tem mobilizado os principais players do mercado na busca por conformidade com as diretrizes da nova legislação, outros normativos e regulamentos vêm ganhando destaque no Brasil, que também estão exigindo adequações estratégicas por parte de todo o setor.
O cenário tem sido dinâmico e desafiador em um ano que certamente entrará para a história do mercado segurador no Brasil. A seguir, destacamos os principais normativos que tem aquecido o mercado de seguros neste ano de 2025.
Lei 15.040/24: A nova lei de contrato de seguro
Não há como iniciar esse escrito senão com a nova lei de contrato de seguro. A sua promulgação, após mais de duas décadas de tramitação no Congresso Nacional, impõe ao mercado a necessidade de se preparar para enfrentar as mudanças que estão por vir, exigindo adaptação de todos os agentes ao longo do ano corrente.
Se por um lado a nova lei introduz mudanças estruturais, por outro há uma crescente preocupação com o impacto regulatório e operacional que essas novas diretrizes trarão para as seguradoras. A entrada em vigor da nova lei representa um desafio significativo, demandando adaptações contratuais, revisão de processos internos e uma nova abordagem na relação com os tomadores e segurados.
Entre os aspectos mais importantes da nova lei, destaca-se a interpretação do contrato de seguro, que passa a favorecer o segurado em casos de divergência entre as garantias previstas no contrato e os documentos registrados na SUSEP.
No campo do resseguro, agora em destaque na norma brasileira, a nova lei estabelece que, após 20 dias de silêncio do ressegurador, a proposta de resseguro será automaticamente aceita, com o objetivo de promover maior celeridade nas operações.
A regulação de sinistros sofrerá mudanças muito expressivas. A nova legislação diferencia regulação e liquidação de sinistros, tratando-as como institutos distintos, embora sujeitas a regras e prazos similares. Outro ponto sensível para as seguradoras é a perda do direito de negar cobertura caso não se manifestem dentro de 30 (trinta) dias após o aviso de sinistro devidamente instruído. Além disso, os prazos para solicitação de informações adicionais tornam-se mais restritos, permitindo apenas uma interrupção para seguros de veículos e contratos de até 500 salários-mínimos, e no máximo 2 interrupções para os demais casos.
A regulamentação do cosseguro é outro ponto relevante de atenção. A nova lei confere à seguradora líder a responsabilidade de representar as cosseguradoras em litígios, incluindo a obrigação de notificá-las sobre eventuais demandas judiciais dentro do prazo de resposta.
No que tange aos prazos prescricionais, a legislação estabelece o prazo de um ano a partir da negativa de cobertura da seguradora para o segurado pleitear os seus direitos, permitindo apenas uma única suspensão desse prazo em caso de pedido de reconsideração. Para litígios entre players do mercado, o prazo prescricional é o mesmo, contado da ciência do fato gerador.
As disputas judiciais no setor securitário também ganharão novos contornos. A lei reforça a aplicação obrigatória da legislação brasileira e a competência absoluta da Justiça nacional, com foro do domicílio do segurado. Para arbitragens e litígios envolvendo resseguro, a regra é que todas as partes respondam no foro de seu domicílio no Brasil.
Outra inovação relevante é a inclusão de multa de 2% sobre o montante devido, acrescida de juros e correção monetária, em caso de atraso no pagamento da indenização securitária. Ademais, o regulador e o liquidante passarão a ser solidariamente responsáveis pelo atraso na comunicação à seguradora dos valores apurados para pagamento ao segurado. A recusa de cobertura também passa a exigir fundamentação expressa, vedando inovações posteriores, salvo se novos fatos relevantes forem revelados após a recusa inicial.
Com a promulgação da lei de contrato de seguro dispositivos fundamentais do decreto-lei 73/1966 e do Código Civil, incluindo os arts. 757 a 802, ficam revogados, alterando também o prazo prescricional do art. 206, §1º, II.
Diante desse novo cenário de mudanças significativas, a expectativa do mercado é ainda que a SUSEP atue com sensibilidade para mitigar os impactos da nova legislação, oferecendo diretrizes claras e equilibradas que garantam previsibilidade e segurança jurídica para as operações das seguradoras.
Circular SUSEP 666/22: ESG como pilar estrutural
Entre os principais temas regulatórios de 2025, destaca-se a obrigatoriedade de apresentação do Relatório de Sustentabilidade, exigida pela Circular SUSEP 666/22. As seguradoras classificadas nos segmentos S2, S3 e S4 têm até o dia 30 de junho de 2025 para demonstrar, formalmente, seu comprometimento com princípios ambientais, sociais e de governança (ESG), evidenciando que suas práticas operacionais estão alinhadas com os objetivos de desenvolvimento sustentável.
A referida normativa estabelece parâmetros fundamentais para a governança e para a gestão de riscos no setor de seguros, com ênfase especial na sustentabilidade.
Companhias seguradoras, entidades abertas de previdência complementar (EAPCs), sociedades de capitalização e resseguradoras nacionais devem implementar processos e mecanismos de controle que possibilitem a identificação, avaliação, mensuração, tratamento, monitoramento e reporte adequado dos riscos aos quais estão expostas, em particular os riscos climáticos, ambientais e sociais.
Dentre as obrigações mais relevantes está a necessidade de uma gestão ativa dos riscos de sustentabilidade, por meio da realização de Estudo de Materialidade que permita classificar esses riscos conforme sua probabilidade de ocorrência e os impactos esperados. A norma também impõe o estabelecimento de limites operacionais para fins de subscrição, precificação e concentração desses riscos. As seguradoras devem elaborar e implementar tanto uma Política Geral de Sustentabilidade quanto uma Política de Gestão de Riscos de Sustentabilidade.
Quanto à divulgação do Relatório de Sustentabilidade, o documento deverá ser previamente aprovado pela diretoria e submetido à ciência dos órgãos de administração e das comissões e comitês responsáveis. A Circular SUSEP 666/22 também amplia o escopo da gestão de riscos ao incluir os chamados riscos de litígio, englobando perdas associadas a eventos climáticos extremos, mudanças regulatórias, adoção de novas tecnologias, degradação ambiental e violações de direitos humanos.
Para garantir uniformidade na apresentação dos dados, a SUSEP instituiu o uso obrigatório de tabelas padronizadas (GVR, EST e GER), além de modelos facultativos (MEM e OPO). Esses instrumentos devem consolidar informações detalhadas sobre colaboradores, unidades organizacionais envolvidas, bem como os impactos previstos dos riscos a curto, médio e longo prazos.
Os prazos para a publicação da Política de Sustentabilidade, da Gestão de Riscos de Sustentabilidade e do Estudo de Materialidade expiraram ainda em 2024, valendo para todos os segmentos. A única obrigação pendente refere-se à entrega do Relatório Anual de Sustentabilidade pelas seguradoras dos segmentos S2, S3 e S4, com prazo final até 30 de junho 2025. Para o segmento S1, a exigência foi cumprida em meados de 2024.
A Circular SUSEP 666/22 representa, assim, um avanço notável na estruturação de um mercado segurador mais resiliente e atento aos desafios contemporâneos. Em um contexto de aumento da sinistralidade decorrente de eventos climáticos e transformações nos padrões de risco, a adoção de práticas sustentáveis deixa de ser apenas uma obrigação legal para se tornar elemento estratégico essencial à longevidade e estabilidade do setor.
LC 2.013/25: Pluralidade e acesso
A LC 2.013/25 tem se mostrado um importante vetor de transformação para o setor de seguros ao longo de 2025, ao ampliar o escopo de atuação e facilitar a entrada de novos participantes no mercado brasileiro. Com a flexibilização dos critérios exigidos para o ingresso de novos players, vislumbra-se um ambiente mais competitivo e diversificado, marcado por uma oferta ampliada de produtos e serviços.
Entre as principais inovações trazidas por esta norma, destaca-se a regulamentação das operações mutualistas de proteção patrimonial e a expansão das atividades das cooperativas de seguros. A nova legislação autoriza que entidades sem fins lucrativos operem em setores até então restritos, como o agrícola, de saúde e de acidentes de trabalho, estendendo essa possibilidade a outras áreas, o que promove uma alteração significativa na dinâmica do mercado.
O marco regulatório recém-estabelecido incorpora cooperativas de seguros e associações de proteção patrimonial ao Sistema Nacional de Seguros Privados, estendendo a estas entidades o controle regulatório da SUSEP. Com isso, amplia-se a esfera de fiscalização da autarquia, que passa a monitorar de maneira mais abrangente a atuação desses novos agentes.
A aprovação da lei foi recebida com entusiasmo por diversos segmentos do mercado segurador, sendo reconhecida como uma das mudanças mais relevantes dos últimos anos. Sua promulgação representa não apenas a consolidação da atuação da SUSEP como órgão regulador, mas também o fortalecimento de sua capacidade institucional para lidar com a complexidade crescente do setor.
Nesse contexto, o Plano de Regulação da SUSEP para o exercício de 2025 já contempla a implementação das diretrizes estabelecidas pela nova Lei Complementar, sinalizando o compromisso do regulador em garantir a efetividade da norma e a integridade do mercado frente à multiplicação de modelos de negócios e à inovação institucional trazida por esse novo cenário normativo.
As inovações tecnológicas: A tecnologia redesenhando o setor
As inovações tecnológicas vêm provocando transformações profundas no setor de seguros, abrindo espaço para novas possibilidades e desafios. Em 2025, observa-se uma clara tendência de uso dessas ferramentas para aumentar a eficiência operacional, oferecer produtos sob medida e elevar a qualidade da experiência do cliente.
Gradualmente, as seguradoras têm incorporado soluções de Inteligência Artificial em seus processos, utilizando a análise massiva de dados para desenvolver ofertas personalizadas e realizar a precificação de apólices com maior precisão.
Paralelamente, algoritmos baseados em aprendizado de máquina vêm sendo aplicados na identificação de fraudes e na automatização de rotinas internas, o que contribui para a redução de custos e o aprimoramento da performance operacional.
A Internet das Coisas (IoT) também se destaca como uma tecnologia promissora, com sensores conectados que fornecem dados em tempo real sobre veículos, residências e outros bens segurados. Essa conectividade permite a criação de produtos baseados no uso efetivo dos ativos, como é o caso do monitoramento de cargas e contêineres em transporte marítimo, que viabiliza uma análise contínua de riscos.
Outra ferramenta que vem ganhando relevância é o blockchain. A tecnologia de registros distribuídos oferece uma infraestrutura segura e transparente para o armazenamento e compartilhamento de informações, favorecendo a automação de contratos inteligentes e acelerando a liquidação de sinistros. Ao mesmo tempo, reduz a burocracia, trazendo benefícios tangíveis tanto para as seguradoras quanto para os consumidores.
Com a digitalização, as seguradoras passaram a oferecer seus produtos e serviços por meio de plataformas virtuais, facilitando o acesso e a comparação de propostas pelos clientes. Nesse contexto, o modelo de Open Insurance vem ganhando força ao promover a interoperabilidade entre diferentes participantes do setor, resultando em soluções mais integradas e centradas nas necessidades do usuário final.
A intensificação das ameaças cibernéticas também tem impulsionado investimentos robustos em ferramentas de proteção digital. Além de proteger dados sensíveis, as seguradoras vêm expandindo sua atuação com produtos voltados à cobertura de riscos cibernéticos, em resposta à crescente demanda por segurança digital diante do aumento dos crimes virtuais.
A adoção de tecnologias para automatizar atividades tradicionalmente manuais está sendo ampliada de forma progressiva, abrangendo desde a emissão de apólices até a análise e pagamento de sinistros. Essa automatização visa eliminar falhas humanas, encurtar prazos de resposta e elevar a eficiência dos processos internos, promovendo uma experiência mais fluida e satisfatória para o consumidor.
A transformação digital deixou de ser uma tendência futura para se afirmar como realidade consolidada na indústria de seguros. As inovações vêm redesenhando a estrutura do setor, tornando-o mais ágil, acessível e ajustado às expectativas do mercado contemporâneo.
A adoção de tecnologias para automatizar atividades tradicionalmente manuais está sendo ampliada de forma progressiva, abrangendo desde a emissão de apólices até a análise e pagamento de sinistros. Essa automatização visa eliminar falhas humanas, encurtar prazos de resposta e elevar a eficiência dos processos internos, promovendo uma experiência mais fluida e satisfatória para o consumidor.
A transformação digital deixou de ser uma tendência futura para se afirmar como realidade consolidada na indústria de seguros. As inovações vêm redesenhando a estrutura do setor, tornando-o mais ágil, acessível e ajustado às expectativas do mercado contemporâneo.
A retomada de interesse pelo seguro M&A: Crescimento estratégico
Nos últimos anos, o segmento de fusões e aquisições enfrentou uma série de entraves, refletindo os impactos de instabilidades econômicas e alterações normativas relevantes no Brasil. Apesar desse cenário, observa-se em 2025 uma retomada do interesse pelo seguro de M&A - conhecido como Warranty and Indemnity Insurance ou Reps and Warranties - como uma ferramenta eficaz para a mitigação de riscos nas transações societárias.
O seguro de M&A vem ganhando espaço como um mecanismo essencial para a proteção das partes envolvidas em processos de aquisição ou fusão empresarial. Ele atua como salvaguarda contra passivos ocultos, omissões em processos de due diligence ou litígios posteriores à conclusão do negócio, proporcionando maior previsibilidade e segurança jurídica para as partes contratantes.
O fortalecimento desse tipo de seguro está diretamente à reativação do apetite por investimentos estratégicos no país. Em um ambiente de maior complexidade regulatória e jurídica, o uso do seguro de M&A se torna quase indispensável para garantir a integridade e o êxito das operações, ao mitigar riscos que poderiam comprometer a execução contratual.
No mais, o aumento da sofisticação das transações, muitas vezes envolvendo setores altamente regulados ou estruturas internacionais, tem impulsionado a demanda por esse tipo de apólice. O contexto jurídico multifacetado e os requisitos legais em diversas jurisdições tornam o Seguro de M&A uma medida prudente para proteger as partes contra eventuais contingências não identificadas no curso da negociação.
Ao oferecer uma camada adicional de segurança jurídica e financeira, o seguro de M&A permite equilibrar assimetrias informacionais entre comprador e vendedor, reduzindo o potencial de disputas. Nesse cenário, cada vez mais seguradoras vêm se especializando para atender a essa demanda com produtos mais abrangentes.
Outro fator que não podemos deixar de mencionar é o avanço das seguradoras em seus métodos de análise e subscrição de riscos, que tem aumentado a confiabilidade dos produtos ofertados, permitindo a elaboração de apólices mais ajustadas às características específicas de cada transação.
Em síntese, o ressurgimento do interesse por esse tipo de cobertura reflete a necessidade crescente de soluções jurídicas e financeiras que confiram maior segurança às transações societárias. O seguro de M&A, assim, fortalece a confiança entre as partes e contribui decisivamente para a viabilidade e sucesso dos negócios no atual ambiente de mercado.
Lívia Santos Mathiazi
Advogada da área de Seguros e Resseguros do FAS Advogados in cooperation with CMS.
Renata Sesaki
Advogada da área de Seguros e Resseguros do FAS Advogados in cooperation with CMS.