Nova lei de cotas em concursos: O que muda para candidatos negros, indígenas e quilombolas?
A lei 15.142/25 amplia para 30% as cotas em concursos públicos federais, incluindo negros, indígenas e quilombolas, promovendo inclusão racial efetiva.
quarta-feira, 25 de junho de 2025
Atualizado em 24 de junho de 2025 14:30
A nova lei 15.142/25: Marco histórico na inclusão racial nos concursos
Sancionada em 3 de junho de 2025, a lei 15.142 representa um marco jurídico e social ao elevar de 20% para 30% a reserva de vagas para candidatos negros (pretos e pardos), indígenas e quilombolas em concursos e seleções públicas federais. Com vigência inicial de dez anos, a legislação visa promover uma maior representatividade de grupos histórica e estruturalmente excluídos do serviço público.
A norma altera substancialmente a lei 12.990/14, ampliando tanto o percentual de reserva quanto o seu alcance. Além dos concursos públicos para cargos efetivos, passa a abranger também processos seletivos simplificados para contratação temporária, aplicando-se a toda a administração pública federal direta e indireta.
Quem são os beneficiários?
A lei contempla candidatos que se autodeclarem pretos ou pardos segundo os critérios do IBGE, indígenas e quilombolas. A autodeclaração permanece como critério inicial, podendo ser confirmada por comissões de heteroidentificação, desde que garantidos o contraditório e a ampla defesa.
A inclusão explícita de indígenas e quilombolas é uma novidade relevante. Embora a jurisprudência já assegurasse essa possibilidade, a ausência de previsão legal gerava interpretações divergentes entre os órgãos públicos e editais de concursos.
Como funciona a aplicação das cotas?
A aplicação das cotas está condicionada à existência de pelo menos duas vagas. O percentual de 30% será calculado sobre o total de vagas e arredondado para cima quando houver fração.
Por exemplo, em um concurso com 7 vagas, o cálculo de 30% resulta em 2,1. Nesse caso, deverão ser reservadas 3 vagas para os grupos beneficiários.
Autodeclaração e heteroidentificação: Garantias e desafios
A autodeclaração continua sendo o ponto de partida para o reconhecimento do direito à cota. Contudo, o edital pode prever mecanismos complementares de heteroidentificação, conduzidos por comissões capacitadas e imparciais. A lei estabelece critérios para garantir a legitimidade desses procedimentos, inclusive com a obrigatoriedade de direito a recurso.
Foram vetadas proposições que tornariam obrigatória a unanimidade nas decisões das bancas de heteroidentificação e que limitariam o direito ao recurso administrativo, evitando rigidez excessiva e possíveis inconstitucionalidades.
Impacto social e jurídico da nova legislação
A nova legislação deve promover uma mudança significativa na composição racial do funcionalismo federal. Dados do IBGE revelam que negros, indígenas e quilombolas são sub-representados nos quadros da administração pública, sobretudo em cargos de liderança e alta remuneração.
Sob o aspecto jurídico, a lei 15.142/25 reafirma a constitucionalidade das cotas raciais, em consonância com a jurisprudência do STF, que reconhece a validade das ações afirmativas com base no princípio da isonomia (art. 5º, caput) e no dever de erradicar as desigualdades (art. 3º, III e IV).
Considerações finais: Uma política com prazo e responsabilidade
A nova legislação é um passo importante para a justiça social, mas seu caráter temporário impõe a necessidade de avaliação constante. Com vigência prevista até 2035, caberá à sociedade civil, aos especialistas e aos gestores públicos acompanhar sua execução, corrigir distorções e assegurar que a inclusão se torne uma realidade permanente.
Mais que uma meta numérica, trata-se de uma política de reparacão histórica e reconhecimento étnico-racial. O desafio está posto: transformar a oportunidade legal em transformação estrutural.
Ricardo Nascimento Fernandes
Militar da Reserva, Professor Doutorando em Filosofia do Direito, Advogado Especialista em Direito Processual Civil, Direito Administrativo, Direito da Pessoa com Deficiência e Concurso Público, Escritor e Palestrante.