Decisão judicial em Alagoas repreende captação ilícita de cliente e má-fé
Decisão da 3ª vara Cível de Arapiraca/AL extingue ação movida com vício de representação e pune advogado por captação ilícita de cliente e má-fé processual.
quarta-feira, 25 de junho de 2025
Atualizado em 24 de junho de 2025 14:33
Em mais um exemplo da atuação rigorosa do Poder Judiciário contra práticas processuais abusivas, o juiz Carlos Bruno de Oliveira Ramos, da 3ª vara Cível de Arapiraca/AL, extinguiu uma ação movida em nome de uma idosa contra uma instituição financeira, após constatar irregularidades na origem da demanda.
Durante a análise do caso, constatou-se que a autora não conhecia o advogado que a representava nem compreendia o conteúdo da ação, tendo sido induzida por um captador que compareceu à sua residência a assinar documentos sem o devido esclarecimento. Tal ausência de vínculo real entre cliente e patrono caracteriza vício de representação, em afronta ao art. 34, III e IV, do Estatuto da Advocacia (lei 8.906/94).
O juiz classificou o episódio como uma grave infração ética, destacando a proibição expressa da captação indevida de clientes pela OAB. Além de extinguir o processo, a decisão impôs penalidades ao advogado responsável, incluindo multa de 10% sobre o valor da causa, pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais fixados em 20%. Também foi determinado o envio de ofício à OAB para apuração disciplinar, conforme prevê o art. 32 do Estatuto da Advocacia, que responsabiliza o profissional por atos dolosos ou culposos com prejuízo a terceiros ou ao processo.
A sentença também chama a atenção para os danos sistêmicos causados pela litigância abusiva. O magistrado enfatizou que tais práticas geram sobrecarga ao Judiciário e comprometem a credibilidade do sistema, mencionando não só o entendimento recente do STJ no REsp 1.817.845/MS, mas também orientações do CNJ, como a nota técnica 002/23, que trata do enfrentamento à litigância predatória.
O caso reforça a crescente postura do Poder Judiciário no combate a práticas temerárias, especialmente no contexto de ações fraudulentas e movidas sem consentimento das partes.
No entanto, a repressão judicial, embora fundamental, não pode agir isoladamente. A contenção da advocacia abusiva exige cada vez mais uma resposta institucional coordenada entre Poder Judiciário, OAB, Ministério Público, Defensoria Pública e sociedade civil. Cada um desses atores possui atribuições específicas que, se articuladas, podem gerar um sistema de contenção eficaz.
A decisão da 3ª vara Cível de Arapiraca não é um caso isolado, mas deve servir de referência. O processo judicial não pode ser instrumento de intimidação, de lucro indevido ou de manipulação estatística.
Garantir uma jurisdição digna e eficiente exige vigilância permanente e aplicação rigorosa dos mecanismos legais para coibir práticas abusivas. O fortalecimento da ética processual, da boa-fé e da lealdade entre as partes deve ser uma prioridade concreta - não apenas um ideal.
Annelise Arruda Adames
Sócia no escritório Ernesto Borges Advogados, com atuação em Direito Civil e Consumidor. Graduada em Direito pela Universidade Anhanguera-Uniderp (2012), Pós-Graduada em Direito Civil e Empresarial pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus (2015) e Pós- Graduada em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2019).