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Gestão mais inteligente de licitações municipais: Por que medir é o primeiro passo para melhorar

A gestão pública pode transformar licitações e contratos com práticas baseadas em dados, tornando os processos mais eficientes, transparentes e focados em resultados concretos para a sociedade.

quinta-feira, 26 de junho de 2025

Atualizado às 12:06

Introdução: O desafio de fazer mais com menos

Em tempos de orçamentos enxutos e cobranças crescentes por eficiência, os gestores municipais enfrentam um dilema constante: como garantir que as compras públicas sejam ágeis, transparentes e, acima de tudo, tragam resultados concretos para a população, sem abrir mão da legalidade? A resposta pode estar em uma mudança fundamental de perspectiva: adotar práticas de gestão que se apoiem em dados e evidências, especialmente no complexo universo das licitações.

Este artigo explora como a simples, porém poderosa, prática de medir pode ser o catalisador para uma transformação significativa na gestão pública municipal.

Por que medir? O poder dos indicadores na rotina municipal - E a lição de um pioneiro da qualidade

Imagine tentar administrar as finanças de sua casa sem nunca olhar o extrato bancário ou controlar as contas a pagar. Seria um caminho rápido para o desequilíbrio e a incerteza, concorda? No universo complexo da gestão municipal, especialmente nas licitações - onde cada real investido e cada dia de processo impactam diretamente a vida do cidadão -, a lógica é a mesma, porém com responsabilidades e consequências amplificadas.

Aqui, ressoa com força uma máxima poderosa, cunhada por William Edwards Deming, um dos mais influentes pensadores da gestão da qualidade do século XX, cuja filosofia revolucionou indústrias e inspirou líderes em todo o mundo: "O que não pode ser medido, não pode ser gerenciado." Essa frase, aparentemente simples, carrega uma verdade profunda e transformadora muito utilizada como diretriz no ambiente privado, mas é ainda pouco explorada por quem lida com a coisa pública.

O que Deming, com sua profunda compreensão sobre como os sistemas podem ser otimizados, nos ensina com essa afirmação é a semente do que hoje o mundo corporativo e as organizações de vanguarda chamam de cultura data-driven: uma gestão que, de forma sistemática, substitui a intuição e o "achismo" pela análise de evidências concretas para orientar suas decisões. Para a gestão pública, isso significa parar de administrar no escuro e, finalmente, acender as luzes dos dados para iluminar o caminho, tornando as escolhas mais inteligentes, defensáveis e eficazes.

Pense, por exemplo, em um indicador não estritamente financeiro, como a quantidade de impugnações e pedidos de esclarecimento por edital. Um número elevado não representa uma perda monetária imediata, mas é um dado valiosíssimo que funciona como um termômetro da qualidade e da conformidade do seu processo. Ele sinaliza, de forma inequívoca, que o instrumento convocatório pode estar ambíguo ou com falhas, aumentando o risco de atrasos, recursos e, no limite, de uma contratação malsucedida. Gerenciar esse número - buscando sua redução através da melhoria contínua dos editais - é um exemplo claro de como os dados aprimoram a segurança jurídica e a eficiência do processo como um todo, muito além da planilha de custos.

Para um gestor municipal, que carrega o peso da expectativa da comunidade e a responsabilidade de aplicar bem cada centavo do contribuinte, ignorar a medição nos processos licitatórios é como abrir mão de uma das ferramentas mais estratégicas para o sucesso de sua administração. É renunciar à oportunidade de:

  • Enxergar a realidade como ela é, e não apenas como gostaríamos que fosse: Os números, quando bem coletados e analisados, são imparciais. Eles podem revelar, por exemplo, que aquela fase da licitação que parecia ágil é, na verdade, um grande consumidor de tempo quando olhamos o todo, ou que um tipo específico de edital gera consistentemente mais dúvidas e atrasos.
  • Focar os esforços e recursos (sempre escassos) onde realmente importa: Ao invés de tentar resolver todos os problemas de uma vez - uma tarefa hercúlea e muitas vezes frustrante -, os indicadores apontam para os pontos críticos. Atacar esses nós com precisão cirúrgica é o que trará o maior impacto positivo e a sensação de avanço real.
  • Tomar decisões mais seguras e embasadas: Precisa justificar a necessidade de mais um servidor para a equipe de contratação? Ou defender o investimento em um novo sistema de gestão de processos? Dados concretos de desempenho, que mostram sobrecarga, ineficiência ou oportunidades de melhoria, são argumentos infinitamente mais fortes e convincentes do que meras percepções ou pedidos genéricos.
  • Engajar e motivar a equipe, mostrando o valor do trabalho de cada um: Quando a equipe percebe que seus esforços para otimizar um processo são acompanhados, que as melhorias são visíveis através de indicadores positivos (como a redução do tempo de um trâmite ou a diminuição de erros), o sentimento de propósito, de pertencimento e a própria produtividade tendem a aumentar significativamente. As pessoas gostam de ver o fruto do seu trabalho.
  • Construir um legado de eficiência e transparência: Melhorar a gestão licitatória não é apenas resolver um problema pontual da administração atual. É criar um sistema mais robusto, ágil e transparente que beneficiará o município e seus cidadãos a longo prazo, independentemente de quem esteja no comando. É deixar uma marca de gestão profissional.

Portanto, medir não é um luxo, nem uma burocracia a mais a ser cumprida. É a essência do gerenciamento eficaz e da melhoria contínua, como preconizado por Deming. É a chave para transformar boas intenções em resultados palpáveis e a forma mais inteligente e responsável de garantir que os recursos públicos sejam aplicados com a máxima eficiência, gerando valor real para a comunidade que você serve. Medir e adotar indicadores é o primeiro e indispensável passo para sair do ciclo vicioso de "apagar incêndios" e progredir na gestão pública.

Benefícios concretos: Ganhos para o município e para o gestor

A decisão de adotar uma gestão de licitações orientada por indicadores transcende a esfera técnica, refletindo-se em benefícios palpáveis para toda a administração e, principalmente, para o cidadão. Municípios que investem nessa prática podem esperar:

  • Redução de prazos: Processos licitatórios mais céleres significam que obras, bens e serviços chegam mais rapidamente à população, atendendo às suas necessidades de forma mais tempestiva.
  • Economia de recursos públicos: A identificação de gargalos e a otimização de etapas levam à diminuição de retrabalho, desperdícios e, consequentemente, a uma melhor aplicação do dinheiro do contribuinte.
  • Aumento da transparência e do controle social: Dados objetivos sobre o desempenho das licitações facilitam a prestação de contas e permitem que a sociedade acompanhe de perto a gestão dos recursos públicos.
  • Valorização e desenvolvimento da equipe: Processos mais claros e a possibilidade de mensurar o impacto positivo do trabalho tendem a aumentar a motivação e o engajamento dos servidores envolvidos.
  • Fortalecimento da imagem do gestor: Uma administração que demonstra compromisso com a eficiência, a transparência e a inovação na gestão pública constrói uma reputação sólida perante a comunidade e os órgãos de controle.

Como começar? Pequenas mudanças, grandes resultados

Implementar uma cultura de medição e gestão por indicadores não requer, necessariamente, grandes investimentos em tecnologia ou uma reestruturação complexa e imediata. O início pode ser pontual, departamentarizado, simples e gradual:

  1. Identifique os pontos críticos: Quais são os maiores desafios ou as queixas mais frequentes relacionadas às licitações no seu município? É o tempo? A qualidade dos editais? O número de recursos?
  2. Escolha poucos indicadores para começar: Selecione dois ou três indicadores que se relacionem diretamente com esses pontos críticos. Por exemplo: Tempo total da licitação, número de impugnações por edital, percentual de editais retificados.
  3. Defina metas claras e realistas: Aonde se quer chegar com esses indicadores? Qual a melhoria esperada em um determinado período?
  4. Estabeleça uma rotina de coleta e análise: Determine como os dados serão coletados (pode ser em planilhas simples inicialmente) e com que frequência serão analisados pela equipe e pela gestão.
  5. Promova a cultura da melhoria contínua: Utilize os resultados para discutir abertamente os problemas, celebrar os avanços e planejar as próximas ações.

Com o tempo, e à medida que os primeiros resultados positivos aparecem, a cultura de medir e melhorar tende a se consolidar, tornando a gestão pública mais profissional, ágil e preparada para os desafios do futuro.

Conclusão: O futuro da gestão pública é data-driven e orientado para resultados

Gestores municipais que abraçam a gestão por indicadores nas licitações não estão apenas modernizando um processo administrativo; estão, fundamentalmente, reafirmando seu compromisso com uma Administração Pública eficiente, transparente e que coloca o interesse do cidadão em primeiro lugar. Medir é, de fato, o primeiro e indispensável passo para melhorar.

O grande desafio do administrador público moderno é conciliar a estrita legalidade com a busca por eficiência. É nesse ponto que uma cultura data-driven se torna a maior aliada do gestor. Ao invés de um conflito, dados e leis se complementam: os indicadores permitem otimizar processos, tomar decisões mais ágeis e seguras, e, principalmente, justificar cada ação de melhoria com evidências concretas, garantindo a conformidade e a segurança jurídica.

Trata-se, portanto, de um investimento estratégico na modernização administrativa. Considerando o curto prazo das gestões municipais para promover mudanças substanciais, a recomendação é clara: qualificar equipes para o desafio da gestão por dados e, se necessário, buscar o apoio de especialistas. Contratar consultorias que auxiliem na implementação de sistemas de medição de desempenho é uma forma eficaz de assegurar não apenas a otimização dos processos, mas também sua plena conformidade legal, transformando a gestão pública de forma rápida e segura.

Clóvis de Paula Pupo Nogueira

Clóvis de Paula Pupo Nogueira

Graduado pela PUC Minas - 2009. Experiência com estrutura corporativa, assessoria empresarial, Jurídica e de gestão de contratos Administrativos (públicos). Atua no escritório Cunha Pereira e Massara Advogados Associados.

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