Isenção por doença grave dispensa pedido administrativo
O presente artigo tratará da desnecessidade de pedido administrativo para que portadores de doenças graves busquem judicialmente o direito à isenção fiscal no contexto jurisprudencial atual.
segunda-feira, 21 de julho de 2025
Atualizado às 15:57
Muito tempo se discute na jurisprudência dos Tribunais do nosso país um tema de contorno relevante e, de certa forma espinhoso para nós, operadores do Direito. A possibilidade de buscar diretamente a tutela jurisdicional do Estado através de ação judicial para casos de obtenção do direito à isenção do imposto de renda para portadores de doenças graves sem a necessidade prévia de ingresso de pedido administrativo junto a fonte pagadora do detentor do direito.
Tal situação para os advogados, sempre era algo que gerava grande desconforto, uma vez que alguns juízes interpretavam ser necessária a provocação prévia do órgão administrativo para o ingresso da ação judicial nos casos em que se discute a isenção do imposto de renda para portadores de doenças graves. A justificativa de muitos magistrados era uma questão eminentemente processual, mas especificamente a alegação de um pressuposto processual positivo - a falta de interesse de agir - que sobre os ensinamentos do doutrinador Fredie Didier Júnior ensina em seu novo curso de direito processual civil sobre o tema que:
"O interesse de agir é um requisito processual extrínseco positivo: é fato que deve existir para que a instauração do processo se dê validamente. Se por acaso faltar interesse de agir o pedido não será examinado.
(...)
A constatação do interesse de agir faz-se, sempre, in concreto, à luz da situação narrada no instrumento da demanda. Não há como indagar, em tese, em abstrato se há ou não interesse de agir, pois ele sempre estará relacionado a uma determinada demanda judicial". (Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Juspodivm. 2015. 17ª ed., p. 359).
O interesse processual está apoiado na adequação/necessidade e na utilidade do processo. Adequação é a relação entre a pretensão e o provimento jurisdicional requerido. A necessidade se traduz na impossibilidade de obter a satisfação do alegado direito sem a intervenção do Estado-Juiz.
Entretanto, esse contexto por muito tempo debatido nas ações envolvendo isenção fiscal para portadores de doenças graves obteve um novo contorno. A questão chegou as portas do STF que aplicou ao tema repercussão geral a partir do leading case oriundo do REsp 1.525.407.
No REsp em questão, o STF, a partir da relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, analisou a constitucionalidade da questão suscitando a jurisprudência já consolidada da Corte no sentido da desnecessidade de prévio requerimento administrativo para o ajuizamento de ação de reconhecimento de isenção de imposto de renda por doença grave e para a repetição do indébito tributário, fixando a tese do Tema 1.373 da seguinte forma:
"O ajuizamento de ação para o reconhecimento de isenção de imposto de renda por doença grave e para a reprodução do indébito tributário não exige aviso prévio requerimento administrativo."
Em que pese o RE 1.525.407 (leading case) até o presente momento não ter transitado em julgado, alguns tribunais de nosso país como o Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª região já vem adotando o entendimento esposado pelo STF (por força do art. 927, inciso III, do CPC) que em casos concretos como no julgamento do recurso de apelação 5002467-66.2025.4.04.7201/SC decidiu acertadamente em favor do jurisdicionado que teve extinta sua ação declaratória visando a isenção de imposto de renda e repetição de indébito tributário por não ter provocado previamente a via administrativa para a obtenção do direito almejado. No caso recente em questão, a 2ª turma do Tribunal Regional Federal da 4ª região decidiu pela desnecessidade do prévio requerimento administrativo para isenção fiscal para portadores de doenças graves, remetendo os autos para o juízo de origem para o regular processamento e julgamento da causa.
Aqui se conclui que a edição do Tema 1.373 do STF foi uma grande vitória aos contribuintes que se encontram com doenças graves (art. 6º, inciso XIV da lei 7.713/1991) e muitas vezes se vem na contramão do alcance de seu direito com análises de pedidos administrativos, muitas vezes demorados.
Indo mais além, percebe-se em alguns casos práticos que as análises dos órgãos administrativos são superficiais e submetem a pessoa com doença grave a reexames periódicos para validação do direito à isenção fiscal do imposto de renda além de que, muitos órgãos tem a sua burocracia interna para exigência de documentos difíceis da pessoa com doença grave conseguir, o próprio procedimento administrativo em si ser demorado de ser concluído ao passo que os documentos que a pessoa possui já comprovam a doença que lhe confere o direito, sendo muito mais pertinente a busca do mesmo pela via judicial.
É importante trazer a seguinte reflexão: quem possui doença grave tem pressa e o tempo destas pessoas é diferente da ideia de tempo de uma pessoa sem problemas de saúde, tal circunstância é inegável.
Por fim e mais importante é que às pessoas portadoras de doenças graves deve ser estritamente respeitado o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (art. 5°, inciso XXXV da Constituição Federal) chancelado acertadamente pelo Tema 1.373 do STF, garantindo que nenhuma lesão ou ameaça a direito poderá ser excluída da apreciação do Poder Judiciário, de modo que a necessidade prévia de provocação do órgão administrativo para obtenção do direito à isenção fiscal, além de ferir tal princípio que possui status constitucional, se traduz um obstáculo a busca do direito.
_______
Bibliografia
EMENTA: TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO FISCAL. ART. 6º, XIV, DA LEI 7.713/1988. MOLÉSTIA GRAVE. TEMA 1.373 DO STF. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. Tema 1.373 do STF: O ajuizamento de ação para o reconhecimento de isenção de imposto de renda por doença grave e para a repetição do indébito tributário não exige prévio requerimento administrativo. (TRF4, AC 5002467-66.2025.4.04.7201, 2ª turma, relatora para acórdão MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, julgado em 17/6/2025)
Tema 1.373 - Exigência de prévio requerimento administrativo para ajuizamento de processo com o objetivo de isenção de imposto de renda, por doença grave e/ou para a repetição do indébito tributário, em face da garantia de inafastabilidade do controle jurisdicional.
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Salvador: Juspodivm, 2015.