Compensações de créditos tributários decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado
Decisões judiciais podem gerar créditos, mas sua aplicação exige cuidado orçamentário e legal.
terça-feira, 9 de setembro de 2025
Atualizado em 8 de setembro de 2025 09:32
A compensação tributária de crédito tributário, decorrente de decisão judicial transitada em julgado, não deve ser apreciada exclusivamente pelo viés tributário.
Compensação é forma de extinção das obrigações quando duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor. Nessa hipótese, as obrigações se extinguem até onde se compensarem, nos termos do art. 368 do CC.
Devido à sua praticidade, a compensação tributária vem sendo utilizada como sucedâneo da restituição em dinheiro.
Atualmente, por força do art. 74 e parágrafos da lei 9.430/1996, com redação dada pela lei 10.637/02 e alterações posteriores, é possível a compensação com qualquer tributo administrado pela Secretaria da Receita Federal, sob ulterior homologação dessa compensação pelo fisco.
Quanto ao crédito previdenciário, a compensação só poderá se operar de ofício. O contribuinte que pleitear a repetição de indébito, se tiver dívida previdenciária, a Receita Previdenciária promoverá sua compensação de ofício.
Quando do advento da lei 9.430/1996, o legislador não atentou para o aspecto financeiro da questão.
Só para argumentar, se milhares de contribuintes fizerem a compensação tributária ao mesmo tempo, irá causar um desequilíbrio orçamentário afetando a realização da receita prevista, de um lado, e a realização de despesas imprevistas na LOA - Lei Orçamentária Anual -, de outro lado.
Não se pode perder de vista o princípio constitucional da legalidade das despesas públicas que impede a realização de gastos públicos sem a fixação de seu importe na LOA - Lei Orçamentária Anual.
Despesas fora da LOA inviabilizam o mecanismo de fiscalização e controle das despesas públicas.
Por isso, chegamos a preconizar a inclusão orçamentária anual de um valor fixo a título de despesas com compensação a serem executadas dentro da ordem cronológica, como acontece com o pagamento de condenações judiciais contra Fazenda.
A MP 1.202/23, convertida na lei 14.873/24, adotou outro mecanismo de preservação do equilíbrio orçamentário.
As compensações tributárias decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado devem ser realizadas no período entre 12 a 60 meses, conforme o valor do crédito a ser compensado, o que dará certa previsibilidade das despesas públicas.
Essa lei foi logo contestada pelos contribuintes-credores.
Há uma tendência de firmar jurisprudência contra aplicação da nova lei em relação às decisões judiciais transitadas em julgado antes do seu advento.
Nesse sentido, o TRF 3ª região confirmou a decisão de primeira instância (processo 5000572-39-2024.4.03.6100 da 13ª Vara Federal) que autorizou a compensação, porque os créditos compensandos tiveram origem nas decisões transitadas em julgado em 3 de agosto de 2022 e 28 de abril de 2023, enquanto que a MP 1202 só foi editada em 28 de dezembro de 2023.
Aplicou-se, no caso, os precedentes do STJ firmados nos julgamentos de recursos repetitivos (Temas 265 e 345).
No Tema 345 ficou consignado que "a lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte".
No que tange ao Tema 265 o STJ firmou o entendimento de que "em se tratando de compensação tributária, deve ser considerado o regime jurídico vigente à época do ajuizamento da demanda, não podendo a causa ser julgada a luz do direito superveniente".
No âmbito do TRF da 2ª região, também, prevalece a tese da inaplicação da lei superveniente (MP 1.202/23 convertida na lei 14.873/24) em relação a créditos tributários assegurados por decisões judiciais anteriores.
Essas decisões que abordaram e decidiram sob o aspecto temporal do fato gerador, de acordo com o princípio tempus regit actum resolve o passado, mas, não deita luz sobre os créditos tributários obtidos após o advento da MP 1.202/23.
É válida a periodicidade entre 12 a 60 meses estabelecidos discricionariamente pelo legislador palaciano e encampada pelo Congresso Nacional?
Há que se sopesar o interesse privado, de um lado, e o interesse da Fazenda, de outro lado, sendo certo que vige entre nós o princípio da legalidade das despesas.
Como dissemos anteriormente, a compensação surgiu como sucedâneo de restituição em dinheiro, hipótese em que se submete ao princípio constitucional da prévia inclusão orçamentária, para fazer-se o pagamento segundo a ordem cronológica da apresentação dos requisitórios judiciais (art. 100 e § 5º da CF).
Kiyoshi Harada
Sócio do escritório Harada Advogados Associados. Especialista em Direito Tributário pela USP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário - IBEDAFT.