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Por que os casamentos no Brasil duram, em média, 13,8 anos?

Análise sobre a duração média dos casamentos no Brasil, suas causas socioculturais, impactos jurídicos e propostas de fortalecimento da família como base da sociedade.

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Atualizado às 13:07

A vivência matrimonial no Brasil tem passado por mudanças sensíveis ao longo das últimas décadas. De acordo com dados recentes do IBGE, a duração média dos casamentos, até sua dissolução por divórcio, caiu de cerca de 16 anos (em 2010) para 13,8 anos. Esse recuo é sintomático de transformações sociais profundas, que repercutem no Direito de Família, no volume e no perfil das demandas judiciais e extrajudiciais, e na percepção que a sociedade brasileira tem sobre o casamento. Este artigo busca discutir o fenômeno em profundidade: quantificar, interpretar, problematizar e sugerir caminhos de prevenção e fortalecimento institucional, especialmente à luz da atuação de juiz de paz.

Panorama estatístico

A principal base de dados é a Pesquisa Estatísticas do Registro Civil, do IBGE, que reúne informações sobre casamentos, divórcios judiciais e extrajudiciais. Vale observar que, desde a EC 66/10, que eliminou o requisito da separação prévia, o mecanismo de dissolução ficou mais célere - fator que pode alterar o perfil temporal dos divórcios registrados.

Em 2023, os divórcios cresceram 4,9% em relação a 2022. Do total de 439,6 mil divórcios com informações sobre tempo de casamento, 47,8% ocorreram em menos de dez anos de união, ou seja, quase metade dos casamentos dissolveu-se antes da primeira década. Quanto à idade, em 2023 os homens se divorciaram em média aos 44,3 anos e as mulheres aos 41,4 anos.

Fatores socioculturais e comportamentais

Entre os fatores que se entrelaçam, pode-se destacar:

  1. Redefinição dos papéis de gênero e autonomia feminina;
  2. Menor tolerância à infelicidade conjugal e maior busca por autorrealização;
  3. Mudanças nas expectativas matrimoniais, muitas vezes idealizadas;
  4. Urbanização e mobilidade que facilitam rompimentos e novos vínculos;
  5. Impacto das redes sociais, que ampliam comparações e oportunidades.

Reflexões jurídicas

O CC/02 prevê, no art. 1.571, as hipóteses de dissolução da sociedade conjugal. Antes da EC 66/10, exigia-se separação prévia, mas a emenda permitiu o divórcio direto, sem prazos intermediários.

A doutrina especializada, notadamente Maria Berenice Dias, reforça que o divórcio é direito potestativo e que o Direito de Família deve acompanhar as transformações sociais. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald também destacam a necessidade de equilíbrio entre autonomia da vontade e estabilidade familiar.

Embora não haja jurisprudência "direta" sobre tempo médio de casamento, algumas decisões do STJ sobre dissolução de sociedade conjugal, partilha de bens e reconhecimento de união estável podem ser mencionadas para ilustrar a prática iterativa do Direito.

Por exemplo, decisões que reconhecem efeitos patrimoniais em relações estáveis, mesmo após separação de fato, ou que exigem pedido expresso de partilha na dissolução (em casos de divórcio, separação ou união estável) são frequentes.

Em recente publicação institucional, o ministro Humberto Martins tratou da dissolução da sociedade conjugal e sua ligação com o divórcio, destacando que o vínculo matrimonial e o patrimônio devem ser considerados separadamente em tais dissoluções.

Outro aspecto relevante sob a ótica jurisprudencial é a construção de entendimento de que a separação de fato acarreta efeitos jurídicos, em especial quanto à comunicação patrimonial e à caracterização da união estável subsequente. Maria Berenice Dias comenta esse entendimento em textos ligados ao IBDFAM.

A relevância para a Justiça de Paz e medidas preventivas

Como juiz de paz, pode-se atuar preventivamente promovendo:

  • Educação jurídica prévia ao casamento;
  • Reflexão consciente sobre regime de bens e pactos antenupciais;
  • Mediação e conciliação familiar para evitar litígios;
  • Acompanhamento pós-cerimônia, por meio de questionários e feedback;
  • Parcerias com políticas públicas de fortalecimento familiar.

Ao integrar essa atuação, o juiz de paz deixa de ser mero registrador e pode ser agente de fortalecimento comunitário da instituição matrimonial.

Conclusão

A queda na duração média dos casamentos no Brasil revela que o casamento moderno enfrenta desafios que não são meramente jurídicos, mas profundamente socioculturais.

Para o Direito, isso impõe a necessidade de equilibrar proteção e liberdade: proteger os vulneráveis, assegurar estabilidade, mas também reconhecer que a ruptura pode ser legítima.

A atuação proativa do juiz de paz, por meio de educação, mediação e integração com políticas públicas, pode ajudar a reverter parte dessa tendência negativa, elevando não apenas a "duração", mas a qualidade das uniões.

O casamento continua sendo um projeto de convivência humana e social digno de respeito e estímulo, e o Direito, em sua melhor face, pode colaborar para que ele não se torne uma instituição fadada à dissolução precoce.

Rudyard Rios

VIP Rudyard Rios

Juiz de Paz pelo TJDFT - Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Formado em Direito e Filosofia, pós em Ciência Politica, Mestrando em Direito pela UNB com foco em Direito de Familia.

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