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Astreintes, cumprimento provisório e recuperação judicial

O STJ reafirma em 2025 que as astreintes nascem do descumprimento da ordem judicial, não do contrato, definindo efeitos no cumprimento provisório e na recuperação judicial.

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Atualizado às 13:10

Astreintes, cumprimento provisório e recuperação judicial: Novos contornos no entendimento do STJ

A natureza das astreintes sempre desafiou a doutrina e a jurisprudência. Embora concebida como instrumento de coerção indireta, destinada a compelir o devedor ao cumprimento de uma ordem judicial, a multa diária ganhou contornos que, em muitos casos, tangenciam o campo indenizatório. O STJ, entretanto, tem procurado restabelecer seu sentido originário e reafirmar sua função estritamente processual.

Recentemente, a Corte definiu que o fato gerador das astreintes é o descumprimento da decisão judicial, e não o ilícito contratual que deu origem à demanda. A multa, portanto, nasce de um comportamento processual, posterior e autônomo, que viola a autoridade do Estado-juiz - e não da relação material entre as partes. Essa compreensão preserva a coerência sistemática do CPC e reforça o caráter público da sanção processual.

No campo empresarial, o tema assume especial relevância quando se entrelaça com a recuperação judicial. O STJ consolidou o entendimento de que a natureza concursal ou extraconcursal do crédito deve ser definida pela data em que se deu o descumprimento da ordem judicial. Assim, quando a violação ocorre após o pedido de recuperação, o crédito decorrente das astreintes é extraconcursal, não se sujeitando ao juízo recuperacional. A ratio decidendi reside em que o fato gerador se dá no curso do processo, e não em momento anterior.

Outro ponto que merece destaque é a compatibilidade das astreintes com o cumprimento provisório de sentença. O art. 537, § 3º, do CPC autoriza a execução provisória da multa, especialmente quando a tutela foi confirmada em sentença e o recurso interposto não tem efeito suspensivo. Nesse cenário, admite-se o prosseguimento da execução, mas o levantamento do valor deve aguardar o trânsito em julgado. Trata-se de equilíbrio entre efetividade e segurança jurídica, evitando o esvaziamento da sanção e a irreversibilidade indevida de valores.

No tocante à revisão da multa vencida, a Corte Especial do STJ reforçou, em 2025, que a redução somente alcança a multa vincenda, vedando-se a revisão retroativa de valores já consolidados. Todavia, o magistrado pode, de ofício, converter a obrigação em perdas e danos (CPC, art. 499), ou determinar medidas substitutivas que garantam resultado prático equivalente ao cumprimento da decisão. A linha de precedentes revela a preocupação da jurisprudência em compatibilizar proporcionalidade e autoridade judicial, sem premiar o descumprimento.

Esses parâmetros reafirmam o protagonismo do processo civil como instrumento de concretização de ordens judiciais eficazes. A multa não é um fim em si mesma, mas um meio de tutela. Sua execução - provisória ou definitiva - deve observar os limites da razoabilidade e a lógica da temporalidade processual.

Para advogados e empresas capixabas, compreender a natureza e o regime jurídico das astreintes é indispensável. O adequado acompanhamento processual e o planejamento jurídico podem evitar a escalada de valores que, em muitos casos, superam o próprio proveito econômico da demanda.

Paulo Vitor Faria da Encarnação

VIP Paulo Vitor Faria da Encarnação

Mestre em Direito Processual. UFES. [email protected]. Advogado. OAB/ES 33.819. Santos Faria Sociedade de Advogados.

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