Como a reforma tributária pode redesenhar as compras públicas
Do iss ao ibs: Como a reforma tributária pode redesenhar as compras públicas. Qual o impacto para sua empresa a Administração Pública.
sábado, 11 de outubro de 2025
Atualizado em 10 de outubro de 2025 14:24
Em 20/12/23, foi promulgada a EC 132, a qual promove alterações significativas no sistema tributário brasileiro. Algumas das mudanças importam em substituição de alguns tributos, repartição das novas receitas, transição para o sistema criado e administração e gestão do novo modelo.
A referida EC entrará em vigor a partir de 2026 e entre as alterações mais relevantes, está a extinção de cinco tributos que há décadas compunham a complexa realidade fiscal brasileira: o PIS, a Cofins, o ICMS, o ISS e o IOF sobre operações de seguro. Além disso, o IPI foi mantido unicamente como instrumento de proteção da Zona Franca de Manaus, com alíquotas reduzidas a zero para a maioria dos produtos, excetuados aqueles que concorrem diretamente com a produção incentivada no polo industrial amazonense.
Em contrapartida, serão criados três tributos: o IBS - Imposto sobre Bens e Serviços, de competência compartilhada entre Estados, Distrito Federal e municípios; a CBS - Contribuição sobre Bens e Serviços, de competência da União; e o Imposto Seletivo, incidente sobre bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
A legislação do IBS e da CBS será harmonizada, de modo que ambos seguirão as mesmas regras quanto a fatos geradores, bases de cálculo, hipóteses de não incidência, imunidades, regimes diferenciados e a aplicação do princípio da não cumulatividade, com direito a creditamento.
A base de incidência do IBS e da CBS abrange tanto operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, como prestações de serviços. Também incidirão sobre a importação realizada por pessoas físicas ou jurídicas, ainda que não sejam contribuintes habituais. Não haverá incidência sobre exportações nem sobre serviços de radiodifusão gratuita.
Já o Imposto Seletivo recairá sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços considerados nocivos à saúde ou ao meio ambiente, ressalvando hipóteses como exportações, operações com energia elétrica e telecomunicações, bem como situações em que já houver redução de 60% das alíquotas de IBS e CBS.
Como nosso sistema tributário será alterado, questiona-se: como ficarão as compras públicas e quais os possíveis impactos? Para se adaptar aos novos ditames da reforma, a Administração Pública deverá revisar editais de licitação, planilhas de custos e contratos administrativos, inclusive aqueles que já se encontram em execução.
A transição para o novo modelo tributário também exigirá uma gestão de riscos eficaz, um tema já abordado pela nova lei de licitações (lei 14.133/21). O art. 103 da nova lei estabelece que os contratos podem prever uma matriz de alocação de riscos, alocando-os entre contratante e contratado. O dispositivo é especialmente relevante, pois, em seu inciso II ele considera entre os riscos a serem analisados, o aumento ou à redução, por legislação superveniente, dos tributos diretamente pagos pelo contratado em decorrência do contrato.
Dessa forma, a lei já fornece o instrumento necessário para que os gestores públicos possam analisar e, se necessário, renegociar contratos durante a longa transição da reforma tributária.
Sobre a obrigatoriedade de pesquisa de preços, o art. 23 da nova lei cita que a pesquisa deve ser compatível com o preço de mercado ou serviço, porém, atualmente o preço de mercado ou serviço é afetado pelo imposto ICMS o qual sua incidência difere de Estado para Estado. Com a criação do imposto IBS e o princípio da não-cumulatividade plena, o IBS unificará as alíquotas e com isso a Administração Pública terá um parâmetro de preços mais precisos e uniformes.
Além disso, a unificação das alíquotas coaduna com o princípio da competividade, um dos princípios basilares da licitação. Ao invés dos licitantes competirem pelas vantagens fiscais, agora o diferencial será eficiência operacional, pela qualidade do produto e pelo custo-benefício real. Logo, essa alteração contribuirá para uma competição mais justa e transparente.
Com relação aos pedidos de reequilíbrio econômico e financeiro dos contratos administrativos, a transição para o novo sistema tributário ocorrerá a partir de 2026 e 2032. A CF/88 em seu art. 37, inciso XXI, prevê como manutenção dos contratos as hipóteses de equilíbrio econômico-financeiros dos contratos administrativos.
O art. 124 da nova lei de licitações, na alínea d-) do inciso II aborda casos de equilíbrio-econômico-financeiros nos contratos, como quando ocorre o fato do príncipe, fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis. A partir dessa previsão, os gestores deverão renegociar os contratos a fim de viabilizarem a continuidade dos contratos administrativos que já estão em execução. Assim, será possível estabelecer ao menos um cenário de previsibilidade e promoção do instituto da segurança jurídica.
Por fim, um dos impactos mais específicos da reforma tributária nas compras públicas será por meio do chamado "Imposto Seletivo", um novo tributo que recairá sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. O imposto seletivo popularmente denominado "imposto do pecado" impactará quando a Administração Pública adquirir bens considerados nocivos. Portanto, no momento de elaborar os editais, o ente público deverá considerar essa nova carga tributária na estimativa de custos e análise das propostas.
Desse modo, é cristalino que a reforma tributária impactará na maneira da Administração Pública realizar as compras públicas, apresentando vantagens quanto ao cálculo de impostos devido à simplificação dos impostos, a diminuição da disputa entre Estados e municípios devido aos benefícios fiscais e a melhora da competitividade.
Porém, a implementação da reforma tributária pode apresentar desafios como o período de transição entre as regras atuais e as antigas, a EC que prevê a reforma ainda está em processo de regulamentação, isso pode ocasionar dificuldade tanto para o ente público como para as empresas se planejarem diante da elaboração de novas normas e por fim, sobre a mudança da carga tributária, o que gera um cenário de imprevisibilidade sobre quanto os preços irão aumentar ou diminuir.
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NUNES, Fabiano da Silva; ARAUJO, José Evande Carvalho; OLIVEIRA, Marco Antônio Moreirade; PALOS, AurélioGuimarães Cruvinel e. Síntese do conteúdoda Emenda Constitucional nº 132, de 20 de dezembro de 2023 (ReformaTributária). Brasília: Câmara dos Deputados, Consultoria Legislativa, fev. 2024.Nota técnica.
Disponível em: https://bd.camara.leg.br/bd/items/9bd88e5b-b6c1-4c1e-aab2- 334b3c9f3887. Acesso em: 20 ago. 2025.