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Due diligence imobiliária e segurança jurídica

O objetivo é demonstrar como a due diligence imobiliária se torna indispensável para mitigar riscos e promover eficiência em um setor marcado por alta complexidade.

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

Atualizado às 15:02

1. Introdução

A due diligence imobiliária tem se consolidado como uma prática essencial no mercado imobiliário, especialmente no Brasil, onde a complexidade legislativa e a fragmentação de normas representam desafios significativos para a realização de transações seguras. Este procedimento consiste em uma análise detalhada da situação jurídica, ambiental e técnica de imóveis, com o objetivo de identificar riscos e garantir que as partes envolvidas possuam informações suficientes para tomar decisões informadas.

A relevância da due diligence está atrelada à sua capacidade de mitigar riscos relacionados a passivos ocultos, como débitos tributários, litígios judiciais e contaminações ambientais, bem como de promover a valorização de ativos ao assegurar sua conformidade legal. Este artigo examina os fundamentos jurídicos que sustentam essa prática, as etapas que a compõem, os desafios enfrentados no Brasil e as inovações tecnológicas que podem transformar o processo.

2.1. Fundamentos jurídicos da due diligence imobiliária

A due diligence imobiliária encontra base em diversos princípios e normativas do ordenamento jurídico brasileiro. O princípio da boa-fé objetiva (art. 422 do CC) exige que as partes atuem com lealdade e diligência durante as negociações, garantindo transparência e evitando conflitos futuros. Complementarmente, o princípio da função social da propriedade (art. 5º, inciso XXIII, da CF/88) reforça a necessidade de regularidade e adequação do uso do imóvel aos interesses sociais.

Entre as legislações aplicáveis, destaca-se a lei de registros públicos (lei 6.015/1973), que regula a matrícula imobiliária, documento essencial para verificar a titularidade e a existência de ônus ou gravames. Adicionalmente, o CTN, em seu art. 130, estabelece que débitos tributários relacionados ao imóvel acompanham sua titularidade, impondo a necessidade de análise detalhada de certidões fiscais.

No âmbito ambiental, a lei 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) institui a responsabilidade objetiva por danos ambientais, exigindo que compradores e investidores realizem a verificação de passivos ambientais associados ao imóvel.

2.2. Etapas da due diligence

A due diligence imobiliária é um processo metódico composto por várias etapas que garantem a análise integral do imóvel:

Análise documental

A primeira etapa consiste na verificação de documentos, como matrícula imobiliária, contratos de compra e venda, alvarás de construção, certidões negativas de débitos fiscais e trabalhistas, alvarás municipais e estaduais, regularidade ambiental e de segurança junto aos órgãos competentes. A análise documental é essencial para identificar irregularidades que possam comprometer a segurança jurídica da transação.

Verificação de passivos

Inclui a análise de litígios judiciais, administrativos e ambientais que possam envolver o imóvel ou seus proprietários. Essa etapa é particularmente relevante no Brasil, onde ações judiciais frequentemente resultam em penhoras ou restrições sobre o bem.

Inspeção técnica e ambiental

Além da verificação documental, é imprescindível a realização de inspeções in loco para avaliar as condições físicas do imóvel e sua conformidade com as normas urbanísticas e ambientais. Esta etapa identifica problemas estruturais ou contaminações que possam impactar o uso do imóvel.

Relatório de conclusão

O relatório final consolida as informações levantadas, indicando os riscos identificados, as pendências a serem sanadas e as medidas recomendadas para mitigar possíveis problemas. Este documento orienta as partes quanto à viabilidade da transação e às estratégias de mitigação de riscos.

2.3. Desafios no Brasil

A aplicação da due diligence imobiliária no Brasil enfrenta desafios significativos, muitos dos quais estão relacionados à complexidade do sistema normativo e à falta de integração entre órgãos públicos. A fragmentação legislativa entre as esferas municipal, estadual e Federal dificulta a obtenção de informações completas e confiáveis, aumentando o tempo e os custos do processo.

Outro desafio é o custo da due diligence, que pode ser proibitivo em transações de menor escala. Isso ocorre porque, além de demandar profissionais especializados, o processo envolve taxas e despesas com levantamentos técnicos e jurídicos. Embora seja indispensável, a prática ainda é subutilizada em negociações de menor porte, deixando os envolvidos expostos a riscos significativos.

2.4. Inovações tecnológicas e tendências

O avanço tecnológico oferece soluções promissoras para superar os desafios enfrentados pela due diligence no Brasil. Ferramentas como IA - inteligência artificial e blockchain têm transformado o mercado imobiliário em países como Suécia e Estados Unidos, proporcionando maior transparência e eficiência.

A inteligência artificial é utilizada para automatizar a análise de documentos, identificando inconsistências e riscos em tempo reduzido. Já o blockchain oferece um registro imutável e seguro de informações, permitindo a rastreabilidade e a integridade dos dados imobiliários.

No Brasil, iniciativas como o "Projeto Registro Eletrônico de Imóveis", promovido pelo CNJ, têm como objetivo digitalizar e integrar os registros imobiliários, facilitando o acesso a informações e reduzindo a burocracia. No entanto, a implementação de tecnologias ainda enfrenta desafios estruturais, como a interoperabilidade entre sistemas e a capacitação de profissionais.

3. Conclusão

A due diligence imobiliária é um instrumento indispensável para garantir a segurança jurídica, a proteção patrimonial e a eficiência nas transações imobiliárias. Ao longo deste artigo, destacaram-se seus fundamentos jurídicos e técnicos, bem como as etapas que compõem o processo e os desafios enfrentados no contexto brasileiro.

A modernização tecnológica e a adoção de boas práticas internacionais são essenciais para superar os obstáculos atuais e tornar a due diligence mais acessível e eficiente. Ferramentas como inteligência artificial e blockchain, aliadas a iniciativas de digitalização dos registros imobiliários, têm o potencial de transformar o mercado, promovendo maior transparência e confiança entre os agentes envolvidos.

Futuras pesquisas podem explorar o impacto das mudanças legislativas e da integração tecnológica no Brasil, além de avaliar o papel da due diligence na conformidade com critérios ESG - Environmental, Social and Governance. Esses avanços consolidarão a due diligence como uma prática estratégica para o desenvolvimento sustentável do mercado imobiliário.

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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 29 dez. 2024.

BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 29 dez. 2024.

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 29 dez. 2024.

IRIB. Da auditoria documental da matrícula imobiliária e seus reflexos para a concretização do negócio imobiliário. Disponível em: https://www.irib.org.br. Acesso em: 29 dez. 2024.

LAND REGISTRY SWEDEN. Blockchain in Real Estate: A Pilot Project in Sweden. Disponível em: https://chromaway.com. Acesso em: 29 dez. 2024.

SKYLINE AI. Artificial Intelligence in Real Estate Due Diligence. Disponível em: https://www.skyline.ai. Acesso em: 29 dez. 2024.

CNJ. Projeto Registro Eletrônico de Imóveis. Disponível em: https://www.cnj.jus.br. Acesso em: 29 dez. 2024.

Allinne Rizzie Coelho Oliveira Garcia

VIP Allinne Rizzie Coelho Oliveira Garcia

Especializada em Direito Digital para o mercado de infoprodutos. Advogada, Consultora, Professora e Palestrante, atualmente Diretora Jurídica do Grupo Marçal. E-mail: .

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