MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Migalhas de peso >
  4. Cabozantinibe (Cabometyx): Planos de saúde devem cobrir o tratamento?

Cabozantinibe (Cabometyx): Planos de saúde devem cobrir o tratamento?

O Cabozantinibe (Cabometyx) é um avanço no tratamento de câncer renal, hepático e de tireoide. Entenda se o plano de saúde deve custeá-lo, quanto custa e como garantir o acesso ao medicamento.

domingo, 2 de novembro de 2025

Atualizado em 31 de outubro de 2025 14:02

Neste artigo, analisamos como funciona a cobertura do Cabozantinibe pelos planos de saúde, quais são os fundamentos legais que garantem o fornecimento do medicamento, o papel do relatório médico, as decisões judiciais recentes sobre o tema, e como agir rapidamente em caso de negativa.

O objetivo é esclarecer o caminho técnico e jurídico que assegura ao paciente oncológico o acesso efetivo a um tratamento aprovado pela Anvisa e prescrito pelo médico assistente - um direito que, muitas vezes, precisa ser garantido pela via judicial para que a vida não espere.

1. O que é o Cabozantinibe (Cabometyx) e quanto custa o tratamento

O Cabozantinibe, nome comercial Cabometyx, é um medicamento inovador utilizado no tratamento de diversos tipos de câncer - especialmente carcinoma de células renais avançado, carcinoma hepatocelular (fígado) e carcinoma medular de tireoide metastático.

Trata-se de um inibidor de tirosina quinase (TKI) que bloqueia a multiplicação desordenada das células tumorais e impede a formação de novos vasos sanguíneos que nutrem o tumor (angiogênese).

De uso oral e contínuo, o Cabometyx oferece uma alternativa menos invasiva e com resultados clínicos consistentes em controle tumoral e sobrevida.

O medicamento foi aprovado pela Anvisa, com base em estudos clínicos internacionais robustos, como o CheckMate 9ER, que demonstrou superioridade do cabozantinibe associado ao nivolumabe em relação à terapia padrão.

Segundo a bula aprovada pela Anvisa, o Cabozantinibe está indicado para:

  • CCR - Carcinoma de células renais, isoladamente ou em combinação com nivolumabe;
  • CHC - Carcinoma hepatocelular após tratamento prévio com sorafenibe;
  • Carcinoma medular de tireoide metastático ou inoperável.

Essas indicações reforçam seu papel como terapia-alvo de última geração, desenvolvida para pacientes que apresentam resistência a outros tratamentos oncológicos.

Por seu mecanismo de ação seletivo, o medicamento representa um avanço farmacêutico expressivo, com menores efeitos adversos e melhor qualidade de vida em comparação à quimioterapia convencional.

O preço médio da caixa com 30 comprimidos de 40 mg pode variar de R$ 35 mil a R$ 45 mil, conforme a dosagem e o local de compra. Em regimes contínuos, o custo anual do tratamento pode superar R$ 400 mil, valor inviável para a maioria dos pacientes sem o custeio do plano.

Por isso, a negativa de cobertura viola o princípio da acessibilidade terapêutica e pode comprometer a continuidade do tratamento oncológico, justificando intervenção judicial imediata, e é isso que será tratado neste artigo.

2. O que diz a lei sobre a cobertura do Cabozantinibe pelo plano de saúde

Do ponto de vista jurídico, o Cabozantinibe deve ser coberto pelos planos de saúde sempre que houver prescrição médica fundamentada e registro sanitário válido na Anvisa - ainda que o medicamento não conste do rol da ANS.

Quando o medicamento é antineoplásico - ou seja, destinado ao tratamento do câncer -, possui registro sanitário vigente na Anvisa e foi prescrito por médico habilitado, o plano de saúde é obrigado a custeá-lo integralmente, independentemente do preço ou da via de administração (oral, subcutânea, intravenosa ou hospitalar).

Essa obrigatoriedade decorre de um conjunto normativo robusto.

O art. 12, inciso II, da lei 9.656/1998 determina que os planos de saúde devem garantir a cobertura dos procedimentos e tratamentos antineoplásicos previstos na segmentação contratada.

Com a edição da lei 12.880/13, essa regra foi ampliada para incluir medicamentos orais e de uso domiciliar utilizados no tratamento do câncer, eliminando a antiga distinção entre medicamentos administrados em ambiente hospitalar e aqueles utilizados em casa.

ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, por sua vez, consolidou essa interpretação, reconhecendo que o fornecimento de medicamentos antineoplásicos é cobertura obrigatória sempre que houver prescrição médica, registro sanitário e indicação terapêutica compatível.

Assim, ainda que o medicamento não conste expressamente do rol de procedimentos da ANS, o dever de custeio subsiste, pois o rol tem caráter referencial mínimo, não exaustivo.

Negar o fornecimento de medicamento antineoplásico com base em seu alto custo, uso domiciliar ou ausência no rol da ANS contraria não apenas o arcabouço legal e regulatório, mas também princípios constitucionais - como o direito à vida, a dignidade da pessoa humana e a boa-fé contratual.

A saúde suplementar tem função complementar e solidária em relação ao Sistema Único de Saúde (art. 199, § 1º, da Constituição), e não pode subverter essa função impondo barreiras econômicas a tratamentos reconhecidamente eficazes e indispensáveis.

Em suma, uma vez preenchidos os requisitos o plano de saúde tem o dever legal e contratual de custear o tratamento integral, quais sejam:

  • Registro vigente na Anvisa;
  • Comprovação científica de eficácia;
  • Indicação médica fundamentada;
  • Inexistência de alternativa terapêutica equivalente no rol;
  • E ausência de vedação expressa pela Conitec ou pela própria ANS.

Mesmo com prescrição médica clara, é comum que operadoras neguem cobertura sob alegações genéricas como "uso domiciliar", "tratamento experimental" ou "fora do rol da ANS".

Nesses casos, recomenda-se:

  1. Solicitar a negativa formal por escrito;
  2. Reunir toda a documentação médica, incluindo relatório do oncologista, laudos, exames e comprovação do registro na Anvisa;
  3. Protocolar recurso interno junto à operadora, anexando o relatório médico detalhado;
  4. Buscar auxílio jurídico especializado, caso a negativa persista, para propor ação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgência.

A Justiça tem reconhecido que o tratamento oncológico é de caráter vital e alimentar, e decisões liminares costumam ser concedidas em 24 a 72 horas, determinando o fornecimento imediato do medicamento.

3. O que deve constar no relatório médico para garantir o Cabometyx

O relatório médico é o principal documento de suporte técnico ao pedido.

Deve conter:

  • Diagnóstico completo com CID;
  • Histórico clínico e terapias anteriores;
  • Justificativa da necessidade do Cabozantinibe;
  • Referência científica (protocolo NCCN, SBOC, ESMO ou estudos publicados);
  • Menção ao registro sanitário na Anvisa;
  • E declaração da inexistência de alternativa terapêutica equivalente no rol da ANS.

Quanto mais detalhado e fundamentado o relatório, maior a chance de cobertura imediata - seja administrativamente, seja judicialmente.

4. Decisões judiciais sobre o Cabozantinibe e o dever de cobertura dos planos

A jurisprudência brasileira vem consolidando a proteção do paciente oncológico frente às negativas de cobertura de medicamentos inovadores pelos planos de saúde.

Decisões recentes têm reafirmado que a recusa de fornecimento de medicamentos com registro na Anvisa é abusiva, ainda que o fármaco não conste do rol da ANS ou seja de uso off-label.

Um exemplo é a apelação cível 1029089-08.2024.8.26.0100, relatada pelo desembargador Domingos de Siqueira Frascino, julgada em setembro de 2024 pelo TJ/SP.

O processo envolveu uma paciente diagnosticada com câncer renal avançado, cujo médico prescreveu o medicamento Cabozantinibe (Cabometyx) como parte essencial do tratamento. O plano de saúde recusou o custeio, alegando que o medicamento não estava incluído no rol de procedimentos da ANS e que a cláusula contratual excluía expressamente essa cobertura.

Diante da negativa, a paciente ingressou com ação de obrigação de fazer, obtendo sentença favorável em primeiro grau, que determinou o fornecimento do medicamento

O TJ/SP manteve integralmente a sentença de procedência, reafirmando três pontos fundamentais que hoje orientam a jurisprudência nacional sobre medicamentos oncológicos de alto custo:

(i) Rol da ANS não é taxativo.

O Tribunal aplicou o entendimento consolidado pelo STJ e pela lei 14.454/22, reconhecendo que o rol é exemplificativo e serve apenas como referência básica mínima.

Assim, a ausência do Cabozantinibe na lista da ANS não autoriza a negativa de cobertura, pois o medicamento possui registro sanitário válido na Anvisa e indicação médica devidamente fundamentada.

(ii) Prevalência da prescrição médica.

A Corte destacou que cabe exclusivamente ao médico assistente definir o tratamento mais adequado ao paciente, conforme o Código de Ética Médica (resolução CFM 2.217/18).

O plano de saúde não pode substituir o juízo clínico do profissional por critérios administrativos, sob pena de violar o princípio da boa-fé contratual e o direito fundamental à saúde (art. 196 da CF/88).

(iii) Proteção do consumidor e interpretação favorável ao paciente.

Com base no art. 47 do CDC, o Tribunal reforçou que cláusulas contratuais restritivas de direitos devem ser interpretadas da maneira mais favorável ao beneficiário.

Além disso, o acórdão citou o art. 35-F da lei 9.656/1998, que assegura o dever dos planos de garantir atendimento e tratamento de todas as doenças listadas pela OMS, incluindo o câncer.

O precedente também demonstra que o Cabozantinibe (Cabometyx), além de clinicamente necessário, está juridicamente amparado por um sistema normativo que protege o paciente oncológico contra práticas restritivas e incompatíveis com os princípios constitucionais da dignidade humana, solidariedade e boa-fé.

5. Conclusão: Cabozantinibe (Cabometyx): Inovação que salva vidas e deve ser acessível

O Cabozantinibe (Cabometyx) simboliza um dos avanços mais significativos da oncologia moderna.

Negar sua cobertura é negar tempo, esperança e dignidade a pacientes que dependem dessa terapia para prolongar e melhorar a vida.

A legislação, a regulação sanitária e a jurisprudência convergem para um mesmo ponto: A prescrição médica é soberana, e o plano de saúde deve custear o tratamento antineoplásico indicado, quando houver registro na Anvisa e respaldo científico.

Aline Vasconcelos

VIP Aline Vasconcelos

Advogada especialista em Direito da Saúde, com 15 anos de experiência na defesa de pacientes contra planos de saúde e na garantia de acesso a tratamentos e direitos essenciais.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca