Circulação e permanência de pets em áreas comuns do condomínio
Questiona-se a possibilidade da regulamentação da circulação e permanência de animais domésticos nas áreas comuns do condomínio.
quinta-feira, 27 de novembro de 2025
Atualizado às 09:22
Questiona-se a possibilidade da regulamentação da circulação e permanência de animais domésticos nas áreas comuns do condomínio. A nosso ver, temos como plenamente possível estabelecer regras que restrinjam, de forma razoável, a circulação e a permanência de animais domésticos em determinadas áreas comuns, sem que isso configure violação a direitos individuais ou afronta à propriedade privada.
Tal possibilidade encontra respaldo na legislação civil, nos princípios constitucionais da função social da propriedade, na doutrina majoritária e na jurisprudência consolidada dos tribunais pátrios, conforme se passa a expor.
Nos termos do art. 1.336, IV, do CC, é dever do condômino não usar a propriedade de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.
Além disso, o art. 1.334, §2º, e o art. 1.335, II, do mesmo diploma legal, atribuem ao regulamento interno e à Convenção Condominial a função de definir regras de convivência e utilização das partes comuns, impondo limites razoáveis ao exercício do direito de propriedade individual.
Portanto, é lícito ao condomínio, por deliberação em assembleia, estabelecer restrições ao trânsito de animais nas áreas comuns, com o objetivo de garantir a segurança, higiene e sossego dos demais condôminos, desde que tais imposições normativas não venham a implicar vedação total de se manter animais nas unidades autônomas.
Observa-se, ademais, que a CF/88, em seu art. 5º, XXIII, dispõe expressamente que "a propriedade deve atender a sua função social". No contexto condominial, a função social da propriedade implica que o exercício do direito de cada condômino deve se harmonizar com os direitos da coletividade e com o uso comum das áreas destinadas a todos.
Assim, o direito de manter ou circular com animais de estimação não é absoluto: ele encontra limites nos direitos à segurança, à saúde, ao sossego e à convivência pacífica dos demais condôminos. A liberdade de um morador não pode comprometer o bem-estar coletivo, essência do princípio da função social.
A doutrina civilista reconhece que o condomínio edilício constitui uma forma peculiar de propriedade, dotada de regime jurídico próprio, no qual o exercício do domínio individual é condicionado ao interesse comum.
Conforme leciona Sílvio de Salvo Venosa:
"O condômino não é senhor absoluto de sua unidade autônoma, pois seu direito de propriedade se encontra limitado pelo interesse coletivo e pelas normas internas de convivência. A liberdade de uso não pode colidir com o sossego, a segurança e a salubridade dos demais." (Direito Civil: Direitos Reais, 19ª ed., Atlas)
Dessa forma, as limitações impostas à circulação de animais em áreas comuns configuram exercício legítimo do poder de auto-organização do condomínio, desde que amparadas em critérios objetivos e aprovadas em assembleia.
A jurisprudência pátria distingue entre proibição total de manutenção de animais (inadmissível, salvo em casos de risco comprovado) e restrição à circulação ou permanência em determinadas áreas comuns (admissível, se razoável e justificada).
O STJ firmou entendimento nesse sentido:
"É vedado ao condomínio proibir, de forma genérica, a criação de animais em unidades autônomas, desde que não haja risco à segurança, higiene ou sossego dos demais condôminos. Por outro lado, é possível estabelecer restrições à circulação dos animais nas áreas comuns, a fim de preservar o interesse coletivo."
(REsp 1.783.076/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 14/05/2019)
Tribunais estaduais seguem a mesma linha:
"Não há ilegalidade na restrição imposta pelo condomínio à circulação de animais em áreas comuns, desde que não inviabilize o acesso às unidades e seja voltada à segurança e higiene do local."
(TJSP, Apelação Cível nº 1006249-59.2017.8.26.0100, 1ª Câmara de Direito Privado, j. 12/03/2020)
Portanto, a restrição é legítima quando pautada pela razoabilidade e proporcionalidade, observando-se a finalidade das áreas comuns e o direito de todos ao uso pacífico delas.
Podemos assim concluir que o condomínio pode, legitimamente, por meio de seu regulamento interno ou deliberação assemblear, restringir a circulação e a permanência de animais domésticos em determinadas áreas comuns, desde que não proíba sua permanência nas unidades, nem inviabilize o trânsito dos pets da unidade autônoma para os acessos do edifício, bem como em relação à circulação na direção do próprio pet place.
Tal restrição deve visar à proteção e a tutela da coletividade condominial, garantindo segurança, higiene e sossego, e respeitar os princípios da função social da propriedade e da proporcionalidade.
A jurisprudência e a doutrina reconhecem que tais limitações não violam direitos individuais, mas harmonizam o exercício da propriedade privada com o interesse comum, conforme a finalidade social e condominial do bem.
Assim, a restrição razoável e regulamentada da circulação de animais em áreas comuns é juridicamente válida, constitucionalmente adequada e socialmente necessária.


