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Franchising parasitário e crise de confiança: Um chamado à transparência

No franchising parasitário, o franqueado não é um parceiro em uma relação jurídica saudável; é o hospedeiro do qual o parasita extrai todos os recursos, exaurindo-o financeira e emocionalmente.

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Atualizado às 09:29

O sistema de franquia tem por imperativo de sobrevivência a confiança. A confiança de que o franchising é capaz de entregar modelos de negócio sólidos, testados e validados, diluindo os riscos inerentes à atividade empresarial, sobretudo no contexto brasileiro, em que desafios econômicos e tributários colocam em xeque a capacidade do empresário em exercer o comércio de maneira eficaz e lucrativa.

A perenidade deste sistema, portanto, depende da capacidade de seus agentes indutores fazerem observar a política de transparência e do efetivo combate a práticas agressivas que corrompam a confiabilidade adquirida ao longo de décadas. Sem uma efetiva e proativa política de integridade, o franchising brasileiro tende a caminhar para o descrédito e obsolescência.

Atualmente, o mercado de franquias alcança um cenário de crise de transparência sem precedentes. A COF - Circular de Oferta de Franquia, objeto de exaustiva disciplina pela lei 13.966/19, cujo escopo central é oferecer um panorama fidedigno do franqueador, passou a ser utilizada para um sem número de deliberadas omissões que comprometem a decisão informada do candidato.

A adesão a uma determinada franquia, atualmente, deixa de ser pautada em assertiva decisão respaldada por um modelo de negócio efetivamente viável economicamente e arcabouço informacional idôneo. Cada vez mais, as decisões são lastreadas em um conjunto de informações precárias, pouco transparentes e, em muitos casos, sem efetivo respaldo na realidade do franqueador.

No retrospecto recente, vê-se que inúmeros modelos de negócio estão amplamente invalidados pela realidade do mercado - ou seja, se mostraram inservíveis no cenário de economia interna. Não obstante, continuam disputando espaço com outros modelos de negócio efetivamente dignos de investimento, corrompendo a lógica do franchising e minando a confiança de seu público-alvo.

O olhar crítico e técnico a respeito da assertividade e viabilidade de um modelo de negócio deixou de ser a pedra de toque em voga por boa parte das redes franqueadoras optantes pelo franchising parasitário.

Sob os influxos do que se convencionou também rotular de franchising exponencial, o sistema tem caído no lugar-comum das publicidades exageradas, alicerçando-se não na segurança que um modelo franqueável oferece, mas, sim, na arregimentação de investidores através de práticas publicitárias que cumprem, apenas, o papel de "quebrar objeções" e "vender franquias", ainda que o custo adjacente a esta prática seja o ativo patrocínio à insolvência civil de franqueados, com um efeito cascata que envolve desemprego, superendividamento e, no cenário macro, queda de receitas tributárias relevantes.

O franchising brasileiro, portanto, anda na contramão da lógica que potencializa e garante a confiança no próprio sistema. 

Quem opta por "escalar" sem preocupações com o futuro digno do franchising, transformando o mercado em uma mera disputa por arrecadação de taxas de franquia ou, ainda, desova de produtos e taxas aos seus franqueados presta um sério e grave desserviço a este setor econômico pulsante e importantíssimo para a sustentabilidade empresarial.

O rompimento da integridade do franchising é uma realidade, e não uma hipótese. Os olhares desconfiados do investidor se multiplicam, a crença na diluição de risco na adesão a um modelo de negócio franqueado se dissipa a cada dia. A crise de confiança está instaurada e fechar os olhos para ela não é uma alternativa plausível.

Enquanto houver praça e liberdade para se evocar o sistema de franquias para mera arregimentação de numerários, sem efetivo compromisso com a transparência, com a seriedade informacional, estaremos servindo ao propósito de um sistema que assiste, talvez incrédulo, talvez silente, à própria ruína.

Enquanto houver praça e liberdade para se apostar na rotatividade dos franqueados e potencializar a sua vulnerabilidade através de instrumentos jurídicos - multas abusivas, silenciamento estrutural, cláusula arbitral -, estaremos patrocinando, ativamente, o massivo descrédito do sistema.

A confiança não é um dado, é um construído. A transparência não é um favor, é um imperativo legal, que sustenta e dá razão ao sistema. Portanto, deve ser potencializado em sua máxima extensão.

Quando o marketing agressivo, omissões estruturadas e práticas abusivas passam a compor a tríade verificável pelo público-alvo do sistema de franchising, a crise de confiança se instaura e a recuperação da simpatia do investidor se torna cada vez mais difícil. 

A integridade de um sistema não se preserva escondendo o problema, mas combatendo-o. O franchising de amanhã depende, portanto, de uma postura ativa para preservá-lo hoje. Romper o ciclo de perversão e uso parasitário do franchising é, portanto, servir ao compromisso de preservar vidas, empregos, rendas e, em última análise, não transformar o sistema de franquia em sinônimo de abusos e práticas empresariais desonestas.

Males desta magnitude, portanto, devem encontrar um combate sério, técnico e efetivo. Afinal, ou o franchising acaba com os parasitas, ou os parasitas acabam com o franchising.

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Nota: No franchising parasitário, o franqueado não é um parceiro em uma relação jurídica saudável; é o hospedeiro do qual o parasita extrai todos os recursos, exaurindo-o financeira e emocionalmente. Quanto os "nutrientes" se esvaem, o parasita o descarta e busca um novo hospedeiro. Como na natureza, o parasita do mercado de franquias também precisa de nutrientes e um ambiente que propicie o seu crescimento e desenvolvimento - um sistema omisso e que deixa de defender sua integridade favorece a sua proliferação. Essa é a realidade do franchising brasileiro hoje.

David Maxsuel

VIP David Maxsuel

Sócio-fundador da M&R Advogados, banca de advocacia voltada à atuação exclusiva em favor de franqueados. Diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Franqueados (ASBRAF).

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