CNJ discute resolução que veda mandado de prisão em regime aberto
Conselheiro Rabaneda votou por reafirmar validade da orientação do CNJ. Vista regimental conjunta suspendeu julgamento.
Da Redação
quarta-feira, 28 de maio de 2025
Atualizado às 14:21
Nesta terça-feira, 27, o CNJ começou a julgar recurso da DPE/CE no pedido de providências relacionado à aplicação da resolução CNJ 474/22.
A norma em questão - que alterou o art. 23 da resolução CNJ 417/21 - determina que pessoas condenadas a regime aberto ou semiaberto devem ser intimadas para iniciar o cumprimento da pena, sem que se expeça de imediato mandado de prisão.
Segundo a Defensoria, a regra vem sendo desrespeitada por diversos tribunais, o que tem levado ao encarceramento indevido de condenados que poderiam cumprir pena em liberdade.
O relator, conselheiro Ulisses Rabaneda, votou por dar parcial provimento ao recurso para reafirmar a obrigatoriedade de observância da norma por todos os juízos e tribunais do país, com exceção do STF, e ajustar a redação do dispositivo impugnado.
O conselheiro Marcelo Terto acompanhou integralmente o voto. No entanto, o julgamento foi suspenso por pedido de vista regimental conjunta dos conselheiros Renata Gil, José Rotondano e Guilherme Feliciano.
Voto do relator
Ao votar, o conselheiro Ulisses Rabaneda reconheceu a procedência das alegações, destacando que o tema envolve "matéria de absoluta relevância e urgência" diante do quadro estrutural de violações reiteradas no sistema prisional brasileiro, já reconhecido pelo STF na ADPF 347.
"Evitar que alguém seja recolhido ao cárcere quando a pena imposta não exige regime fechado é proteger a dignidade da pessoa humana e a credibilidade do sistema de Justiça", afirmou.
O relator classificou como "esquizofrenia estrutural" a contradição entre o que prevê a legislação e o que ocorre na prática.
Citou dezenas de casos concretos levados ao CNJ por órgãos como a DPU e o Conselho Penitenciário do Ceará, que atuaram como amici curiae e relataram a prisão de pessoas mesmo quando condenadas a penas em regimes mais brandos.
Rabaneda também destacou estudo do pesquisador David Metzger, publicado no Migalhas, que aponta que entre janeiro de 2023 e abril de 2025 o STJ concedeu 571 habeas corpus com base na violação da resolução CNJ 474 - sendo 133 apenas em 2025.
Em voto, o conselheiro propôs manter a decisão anterior que determina a todos os juízos e tribunais com competência criminal (exceto o STF) o cumprimento da resolução, mas modificou a expressão "sob pena de responsabilidade funcional" para "sob pena de apuração pela corregedoria local ou nacional".
A mudança visa evitar interpretação de responsabilização automática, resguardando o contraditório e a independência funcional da magistratura.
Por fim, Rabaneda sublinhou que o juiz permanece com plena autonomia para valorar o caso concreto e, se entender que a norma não se aplica à situação sob julgamento, poderá decidir fundamentadamente sem que isso implique violação à decisão do CNJ.
Veja trecho do voto:
Pedido de vista
Ao justificar o pedido de vista, a conselheira Renata Gil ponderou que, apesar da boa fundamentação do voto do relator, a decisão impõe um comando geral a todos os juízes criminais do país com base em casos concretos trazidos por uma defensoria estadual, o que, em sua avaliação, exige maior aprofundamento.
"Minha impressão, ao ler o voto, foi a de que estava no banco dos réus", afirmou, apontando a necessidade de mais dados sobre o real alcance do descumprimento da norma ao nível nacional.
Ela ressaltou conhecer de perto as dificuldades do sistema prisional brasileiro - especialmente após anos de atuação na fiscalização de presídios - e reconheceu a motivação da norma na tentativa de evitar prisões indevidas em regime mais gravoso.
A conselheira propôs reavaliar a questão em conjunto com o conselheiro José Rotondano, responsável pela pasta do DMF - Departamento de Monitoramento e Fiscalização, e destacou que o tema merece análise cautelosa por seu potencial impacto sobre a atuação da magistratura criminal.
Veja a fala:
- Processo: 0008070-64.2022.2.00.0000